O certo teria sido postar este texto antes, mas começamos já pelos 4 cilindros em linha, 4 tempos, com o assunto das árvores balanceadoras. Mas vamos lá, vamos agora do início, do princípio de tudo, para que realmente possamos ter tudo bem explicado.
Discorrendo sobre motores precisamos observar na essência que todos se referem ao que ocorre com um motor monocilíndrico. Temos que um motor monocilíndrico apresenta em seu funcionamento elementos de que nos levam a ter vibrações, que se devidamente entendidas proporcionaram a possibilidade de fazer arranjos nos quais as vibrações poderão ser atenuadas, e com a pluralidade de cilindros se obter também uma maior maciez e suavidade na saída de torque do motor.
É necessário verificar que basicamente teremos 2 tipos de peças móveis em um motor de combustão interna reciprocante: as que giram e as que reciprocam. Então o virabrequim é rotativo e pistão com anel, pino e travas. é reciprocante. Lembramos de que existem bielas, como elas seriam classificadas? Teremos que observar que o pé da biela, a parte menor onde é colocada o pino do pistão, vai se deslocar verticalmente no eixo do cilindro e apenas reciprocará (sim, a biela é um órgão mecânico que trabalha de cabeça para baixo).
Já a cabeça da biela, a parte maior onde fica a bronzina, apenas gira junto com o virabrequim. A parte central da biela, que fica entre a cabeça e o pé apresentará um misto dos 2 movimentos, e para efeito de compensação de massas ela terá de ser pesada em gabarito adequado para que se possa determinar o que é rotativo e o que é reciprocante.
Apenas para ilustração, esse gabarito adequado é apenas um dispositivo capaz de fazer com que a biela, durante o evento da pesagem, tenha a linha imaginária que contém os seus 2 centros geométricos (da cabeça e do pé) absolutamente paralela ao nível do solo, ou seja, completamente perpendicular à força da gravidade que atua na peça e comprime a célula de pressão da balança. Então teremos determinado que o que pesa junto com a cabeça é reciprocante e o resto é rotativo.
Em um motor monocilíndrico vamos notar que na árvore de manivelas teremos que pensar em compensar o peso das partes reciprocantes e das rotativas. Como a árvore tem apenas uma manivela, ela deverá apresentar, em um ponto diametralmente oposto ao braço da manivela, um contrapeso. O dimensionamento deste contrapeso será feito da seguinte forma:
Inicialmente o contrapeso deverá anular o peso da manivela em si. Depois, conter massa equivalente à porção rotativa da biela e da bronzina da biela. Ao analisarmos o movimento de vai-e-vem do pistão, vemos que ele vai atribular o motor grandemente nas proximidades dos pontos mortos inferior e superior. Mas durante o meio-curso nada atribula a árvore. Então vemos que nos pontos mortos o percentual de atuação das massas reciprocantes é de 100%, enquanto nos meio-cursos tende a zero. De 100 a 0, variando senoidalmente, temos então que o valor médio de importância é de 50%.
Ao se utilizar um coeficiente de balanceamento de 50%, se anula a força que tende a jogar o motor para cima e para baixo, inerente ao sobe e desce do pistão e à aceleração e desaceleração desta massa com o funcionamento do motor alternadamente.
Vemos que essa atitude de utilizar 50% desta massa reciprocante vai cancelar em 50% a força inicial que tende a agitar o motor verticalmente. Acontece que, como há uma variação não-linear desta força, vemos surgir uma força de segunda intenção, de segunda ordem, compreendida também no plano vertical. Como essa força é desconfortável ao condutor de um veículo, pode-se então, aumentar o coeficiente de balanceamento e utilizar um valor maior que 50% do peso reciprocante, que tenderia a diminuir a aparente falta de compensação de massas nos pontos mortos, mas que aumentaria a sobrecompensação quando o pistão estiver em meio-curso.
Como o cilindro é vertical ou quase, o meio-curso seria horizontal. Nota-se que se essa força de segunda ordem e a de primeira estiverem no sentido de deslocamento do veículo (horizontal) ela será menos incômoda ao condutor. Em um motociclo de motor pequeno, com massas reciprocantes desprezíveis, isso é pouco notado, mas em uma motocicleta com um motor maior, essas resultantes são bem incômodas ao condutor.
Daí ser algo comum se utilizar em motores de moto um coeficiente de balanceamento superior a 50% do peso reciprocante como uma forma de amenizar o desconforto ao condutor. Devemos observar também que apenas uma vez a cada duas voltas é gerado um pulso mecânico em um monocilíndrico 4-tempos. Ou seja, há um curso motor de 180° e mais 540° de movimento do virabrequim sem que haja nenhuma geração de torque, apenas consumo. Observa-se então que é necessário um volante motor de grande massa para que a inércia do mesmo venha a suavizar a saída do torque do motor e assegurar a continuidade de seu funcionamento.
Naturalmente, se um cilindro apenas tem várias limitações como exposto acima, poderemos pensar em adicionar um segundo cilindro para facilitar as coisas. Mas, como dispor este segundo cilindro?
Absolutamente paralelo ao primeiro como um segundo motor atrelado a ele, simétrico em tudo, ou paralelo, mas com uma desfasagem de 180° na manivela, adjacente ao primeiro ou mesmo diametralmente oposto ao primeiro?
Cada uma das hipóteses terá vantagens e desvantagens. O número de ciclos do motor determinará, inclusive, qual a mais proveitosa, sendo esse arranjo de 2 cilindros um dos quais mais se fará importante o número de ciclos para determinação de características físicas deste motor. No caso de um 4-tempos e com cilindros paralelos, vemos que se o segundo cilindro tiver movimento solidário ao primeiro, todas as considerações sobre balanceamento e compensação de massas se farão válidas. Os 2 pistões sobem e descem juntos, mas há uma enorme vantagem: como dão 2 voltas a cada ciclo motor, desfasa-se os momentos de ignição por 1 volta, e o problema do motor ter que dar 2 voltas para cada ciclo motor diminui à metade, e então a cada volta do motor teremos 1 ciclo motor, alternado entre um e outro cilindro. A necessidade de um volante exageradamente pesado como gerador de inércia para o funcionamento eficaz do motor diminui brutalmente.
Vejamos, no entanto, que os problemas de balanceamento e compensação de massas permanece absolutamente a mesma.
Mas, se agora pegarmos esse mesmo motor e alterarmos as manivelas de modo a que elas de situem diametralmente opostas? O que acontecerá? Inicialmente veremos uma mui vantajosa compensação das massas reciprocantes dos pistões, visto que um estará em cima e o outro embaixo. Vejamos também que essa compensação ocorrerá em torno do centro geométrico das 2 manivelas, ou em um mancal central que fica entre as duas. Essa compensação de forças gerará um binômio ou momento. Será requerida a compensação de massas da mesma forma que no monocilíndrico, mas esse momento irá ser um fato novo. Em um motor de 2 tempos, esse arranjo se fará extremamente desejável, já que como há um pulso mecânico por rotação, um segundo cilindro fará sentido se adicionar um segundo pulso a cada meia-volta do motor. Vemos então que esse arranjo será inicialmente muito inerente ao motor de 2 tempos.
Mas este arranjo, por cancelar as forças de primeira ordem inerente à inércia de fim de curso dos pistões, se torna atrativo ao uso mesmo em um motor de 4 tempos. Mas há o momento: esse é de 1a. ordem, então além de compensar as massas reciprocantes, um par de contrapesos diametralmente opostos na árvore ajudará muito a compensação dele. Mas as forças de 2a. ordem, no plano vertical permanecem Todos os comentários sobre o deslocamento da árvore desta força com sobrecompensação de massas permanece. O único evento digno de nota deste arranjo nos 4-tempos é que, ao contrário do arranjo com os 2 cilindros paralelos, não teremos uma saída de torque uniforme, com um pulso a cada 360° de rotação, mas um intervalo menor, de 180°, entre um pulso e outro maior, de 540°. Eles vão se alternando sempre, e isso podemos chamar de um motor com sequência de ignição ímpar ou odd-fire. O outro arranjo, simétrico, seria even-fire.
Outra possibilidade seria instalar o segundo cilindro não-simétrico ao primeiro. Em um arranjo inicial em que se pusesse o segundo cilindro a 9o° do primeiro, fazendo um "V" de 90°, teríamos de cara uma situação no qual os eventos se alternariam a 90°. Então, pelo ciclo trigonométrico de variação dos módulos do seno e coseno a 90°, teríamos um grande facilitador do balanceamento.
Devemos observar alguns detalhes: do mesmo modo que o 2-cilindros alternado, odd-fire tem um momento devido à alternância das manivelas, vemos que os 2 cilindros idealmente devem ter seus eixos de centro concorrentes, ou estarem ambos contidos em um único plano geométrico. Isso evitaria momentos que não estariam contidos no eixo do motor. Isso é possível de 2 formas: usando bielas especiais concêntricas como nas motos Harley ou nos motores aeronáuticos V-12 da Rolls-Royce, onde uma das bielas é fendida e a outra singela, trabalhando uma por dentro da outra, sendo que esses dois arranjos são os mais desejáveis por deixar ambas bielas com o mesmo tipo de movimento. Há uma segunda opção muito menos desejável, porém de execução bem mais simples: seria o mesmo tipo de biela usado em motores aeronáuticos radiais, onde há uma biela maior com a cabeça muito maior que vai ter uma protuberância com um pino extra, que chamaremos de biela-mestra, e outra biela menor, que vai se fixar nessa pino existente na biela-mestra. Devemos ver que esse arranjo vai gerar uma progressão anômala de movimento da biela-filha.
O resultado dinâmico desse arranjo quanto à compensação de massas é bastante satisfatório, há como resultante apenas um momento de primeira ordem, totalmente compensáveis através de um segundo momento simétrico no virabrequim criado por um contrapeso dimensionado dentro da fórmula original de 100% do peso rotativo e de 50% do peso reciprocante. Mas há um inconveniente grande, do mesmo modo que no motor de 2 cilindros em linha alternados, os eventos de ignição serão odd-fire, 90° + 630° ou 450° + 270°, ambos regidos por outros fatores que podem ser o aproveitamento da carga de ignição do primeiro para auxiliar o enchimento do segundo, caso no qual a 1a. opção seria mais interessante. Um arranjo interessante sob aspecto de compensação de massas, mas não tão interessante sob a ótica da suavidade da saída de torque da árvore motora.
Note-se também que um arranjo com bielas postas lado a lado como na maioria dos motores em "V" multicilindros geraria um mui indesejável momento, que agiria perpendicular ao virabrequim, e que seria de difícil compensação, mesmo que se considere que o desalinhamento dos cilindros, que seria igual ao braço de alavanca desse momento, seja inerentemente pequeno. Vale comentar que o uso de um ângulo de "V" diferente de 90° iria anular a inicial vantagem de ter os cilindros atados em um vínculo trigonométrico perfeito. Isso geraria como resultante um momento com componentes horizontais e verticais com valores diferenciados, sendo portanto de difícil compensação. Um contrapeso único não seria suficiente, resultando então um momento de primeira ordem com magnitudes variadas vertical e horizontalmente.
Resta-nos os contrapostos. Esse arranjo vai exigir um virabrequim com 2 manivelas diametralmente opostas, de modo que os pistões sempre atingirão o PMS e o PMI simultaneamente. Vemos com isso a mesma homogeneidade de saída de torque dos 2-em-linha de cilindros solidários, o cancelamento das forças de primeira e segunda ordem pela simetria dos pistões, mas teremos também momentos de primeira e de segunda ordem . Nesses momentos a componente de grande importância é a distância entre os eixos dos cilindros: quanto menor a distância, menor o momento. Um motor razoavelmente largo a ponto de se obter nenhum mancal central e um septo apenas no eixo entre as 2 manivelas geraria uma resultante muito pequena às custas de uma maior fragilidade mecânica.
Como vemos, permanece viva a máxima de que não existe almoço grátis.
Continuamos mais à frente.