O ano de 2014 representa vários aniversários significativos na História da
França. Há 100 anos, em 1914, começava a
Primeira Guerra Mundial, então chamada de “Grande Guerra” por ainda não haver a segunda. A maior parte dela
se desenrolou na própria França, apesar de ter participantes ambos perto e
longe do país. Setenta anos atrás, em 6 de junho de 1944, houve a invasão
aliada nas praias da Normandia, o que ficou conhecido como o “Dia D”, que no
fim resultou na libertação da França do jugo alemão. E há 60 anos, em 1954, a França sofria uma
sangrenta e trágica derrota no vale infernal de Dién Bién Phu, significando o
fim da colônia da Indochina e a formação dos novos países, Laos, Camboja e
Vietnã.
Os franceses estão no mínimo observando
o centenário do início da Primeira Guerra Mundial, celebrando os acontecimentos da Normandia e, por motivos difíceis
de compreender, convenientemente
esquecendo a vergonhosa derrota em Dién Bién Phu.
1914
Na Retromobile
não havia referências diretas à Normandia. Isso vai só acontecer quando a
primavera e o verão chegarem daqui a pouco. Mas havia uma apresentação completa
sobre o início da primeira guerra. Como era seu hábito fazer, os alemães começaram
a guerra invadindo a França. E quase chegaram a Paris, o que teria significada
mais uma vez a derrota do estado francês e provavelmente o fim da guerra com
uma vitória alemã e austro-húngara. Mas foram carros que salvaram o dia para os
franceses. Carros, e não blindados, aviões, canhões ou artilharia? Sim, carros mesmo.
Não havendo condições de transportar a infantaria francesa de Paris até o Vale
do Marne, a uns 60 km
a leste do capital, para enfrentar o avanço alemão, o exército francês
apropriou milhares de táxis parisienses para levar as tropas. A maioria era táxis fabricados pela Renault.
Carros normais, nesse caso cheios de tropas e as suas armas leves.
Os táxis salvaram o dia. Os franceses chegaram a tempo de defender a
linha e os alemães tiveram que deter o avanço. E foi aí, nesses campos miseráveis
de lama e gelo, que foi conduzida o restante da guerra até terminar em 1918. Paris
nunca mais foi ameaçada nem atingida. Bem, pelo menos não até a próxima guerra,.a
de 1939.
Na Retromobile havia um diorama com táxis Renault como atração central (Pourquoi pas?) e outros veículos em
volta para completar o cenário. Um deles
foi um maravilhoso Renault Town Car de 40 cv fiscais, tão nobre e elegante como
qualquer Rolls-Royce Silver Ghost, Napier, Mercedes, Benz, Graf und Stift,
Laurent et Klement, Packard ou Pierce Arrow da época. Um carro sumamente caro e
grande para a sociedade não só mais alta da Franca, mas do mundo inteiro. Vendo
os carros bem mais modestos e populares da Renault hoje em dia, é difícil
acreditar. Os tempos mudam, e o vento vai levando.
Também apresentaram caminhões e alguns blindados leves, fornecendo a evidência
óbvia de que andar num tanquinho cheio de balas e combustível devia ser uma existência
no mínimo miserável e, no máximo, sumamente perigosa. Que jeito de morrer!
Tanque leve Renault FT 1914 |
Alfa Romeo 2000
Berlina 1960 – O que é que eles estavam pensando?
No leilão da Artcurial apareceu um Alfa 2000
sóbrio, mas ainda assim bonito e elegante. O leitor brasileiro provavelmente iria dizer, "uai, um JK!" Mas não é. A história é a seguinte.
Antes da 2ª guerra a Alfa Romeo só fabricava carros caríssimos e de alta
distinção. Mas com o fim do conflito
era óbvio que uma Itália física e economicamente devastada jamais poderia
suportar uma só marca servindo o topo do mercado. Era necessário desenvolver carros mais
populares. Como todos já sabem, carros populares não dão tanto lucro quanto os
mais requintados, e de qualquer maneira a Fiat já dominava o mercado de carros
populares no país. O que fazer? A Alfa (na época independente e concorrente da
Fiat) resolveu desenvolver uns carros mais populares e também ir atrás do
dinheiro. Como dizia o ladrão americano Willie Sutton, “Por que roubo os bancos? É porque aí que está o dinheiro!”
No início da década 1950,
a Alfa lançou um modelo “berlina” (sedã em italiano) com
cilindrada de 1.900 cm³. Linhas sóbrias,
sem grande distinção. Vendas modestas, dentro da expectativa considerando as
circunstâncias econômicas da Itália na época. Mas o dinheiro grosso não estava na Itália. Onde estava então? Nos Estados Unidos! E com isso a Alfa
resolveu lançar um carro baseado no 1900 diretamente dirigido ao mercado
americano. Fácil fazer: desenhe uma carroceria ligeiramente mais moderna, coloque
uns rabos de peixe na traseira e aí os americanos vão adorar!
Genial, pensando bem. Resultado desse exercício: o Alfa 2000 berlina
tinha dimensões européias (curto, estreito e alto) e preço equivalente ou até
mais que um Cadillac, Lincoln ou Packard contemporâneos. Oferecia cinco marchas manuais na coluna, mas
nada de câmbio automático. E para conquistar os corações americanos, motores
quatro-cilindros de dois litros num mercado dominado pelos V-8 de cinco ou seis litros. Óbvia fórmula de
sucesso!
O 2000 berlina nunca chegou a ser oficialmente vendido nos Estados
Unidos e fracassou totalmente na Itália. Para recuperar o pouco que poderia se salvar do projeto, o carro foi
mandado ser fabricado no nosso querido Brasil, e aí tivemos o FNM 2000 JK.
Renault Espace 1985
– a primeira minivan ou não?
Os neuróticos
que pensam sobre essas coisas discutem qual foi a primeira minivan, vamos
dizer, “moderna”. Poderia se dizer que foi a Kombi ou umas contemporâneas alemãs como a Lloyd LT600 ou a DKW Bus/Schnellaster,
todas do início da década 1950. Ou até a
“nez de cochon” (“nariz de porco”) da Citroën, que, enfim, era mais van
comercial que minivan de passageiros. Os
especialistas dizem que não, que todas essas eram primariamente vans de
trabalho antes de serem vans para carregar pessoas. Isso deixa na frente as
vans gêmeas Chrysler T115 — Plymouth Voyager e Dodge Caravan — que foram
lançadas antes da Renault Espace. Ou a Renault Espace, lançada depois das
Chrysler mas era francesa e por isso bem mais genial. Resolvido, pelo menos na
Franca: a primeira foi a Espace!
Bem, ninguém pode discordar de que a Espace da primeira geração era
genial. Linda por fora, com painéis
externos de plástico e com bancos dianteiros que giravam 180 graus para trás,
resultando numa sala de estar para 4/5 pessoas. Com uma mesa dobrável no
centro. A Espace tinha grande flexibilidade no interior, tecidos e plásticos
interiores sumamente bonitos e um aspecto geral absolutamente adorável.
A Espace chamava-se “Renault”, mas o desenvolvimento foi do fornecedor
(e fabricante de foguetes) Matra. Na Retromobile não só foram apresentados dois
exemplares da Espace de produção, mas também o protótipo definitivo da Matra
que acabou, com certas modificações, sendo a Espace. Falando sério, as vans de
hoje não são tão memoráveis nem tão geniais.
Dino 206 SP 1967,
um dos carros mais bonitos da História
Não é preciso
criar palavras para descrever esse carro, as fotos dizem tudo. Onde alguém vai achar um mais bonito?
Citroën Traction
Avant 11 Familiale 1936. Cabem quantas
pessoas aí dentro?
Parece um carro normal, mas com bancos dobráveis
no meio, cabem nove adultos. Nove! Não sei se andavam com conforto, mas pensem
bem, um carro de 1,9
litro, 56 cv e 1.200 kg peso em ordem de marcha andando com
uma carga de passageiros pesando uns 600 kg. Melhor evitar as subidas!
Alfa 2600 Bertone
Sprint berlinetta 1964, desenhado pelo então jovem Giorgetto Giugiaro
Esse branquinho aí foi arrematado no leilão da
Artcurial por € 53 mil, correspondente a uns R$ 173 mil.
Um amigo meu aqui na Califórnia recentemente me ofereceu o 2600 Sprint
dele de presente. De graça. Está um
caco, debaixo de uns móveis e ferramentas colocadas em cima dele umas décadas atrás.
Precisa de uma restauração completa.
Carro de graça — parece bom negócio, não é? Vamos fazer umas contas. Uma restauração completa aqui custaria, digamos,
uns US$ 100 mil, ou R$ 245 mil. Isso independente do custo emocional e dos anos
de tortura de qualquer restauração. Ainda parece bom negócio? Acho que não. Ainda assim, acho o carro sedutor e gostaria
de ter um assim um dia. Pelo menos, um já
restaurado!
Clique aqui para ver mais 41 fotos.
RP
Clique aqui para ver mais 41 fotos.
RP
Lembro-me que uma concessionária de SP fazia uma modelo (fora-de-série) igual à Renault Espace, salvo engano, com componentes do Versalles/Santana.
ResponderExcluirAtt.
Leo-RJ
Chamava-se "Grancar Futura", segue o link da revista Quatro Rodas da época: http://4rturbo.blogspot.com.br/2013/03/revista-quatro-rodas-abril-de-1990.html
ExcluirO comentário do Anônimo acima só confirmou o que eu já havia constatado. O conhecimento automobilístico dos leitores daqui é bem vasto.
ResponderExcluirMichael Schumacher
Belo post, ótima viagem cultural e histórica....que beleza essa Space "creminho", dá vontade de subir nela e pegar a estrada.
ResponderExcluirParabéns!
MFF
Rex,
ResponderExcluirbelos posts para uma incrivel exposição.
Obrigado por compartilhar.