google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014): Alfa Romeo
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(pelicanparts.com)

Power” é uma palavra da língua inglesa que para nós tem duplo sentido: poder e potência são traduções possíveis dela. Lembrem de Jeremy Clarkson gritando: More POWER!!!!” em seu programa Top Gear, um uso emblemático deste duplo sentido. Para eles, power é poder e é potência, é tudo a mesma palavra. O por quê dessa pífia aulinha de inglês, já vão entender, prometo.

As máquinas a vapor do inventor escocês James Watt (1736-1819) impulsionaram a revolução industrial inglesa e ajudaram a Grã-Bretanha a se tornar o país mais poderoso do mundo. Grande pesquisador e inventor, tornou o que era apenas uma idéia (a máquina a vapor) em algo prático, útil e vendável. Ele também foi nada menos que o inventor do conceito do cavalo-vapor, que conhecemos tão bem. Mas seu sucesso financeiro só veio quando se tornou sócio do industrial Mattew Boulton (1728-1809), formando uma fábrica de motores que se chamou Boulton & Watt.

Pois bem, diz a lenda que James Boswell, um nobre escocês que ficaria famoso como escritor de biografias (o famoso crítico americano Harold Blomm o considera o maior biografista da língua inglesa até hoje), estava visitando uma das fábricas de Boulton quando entrou em um galpão onde Watt trabalhava em alguma de suas evoluções do motor a vapor. Impressionado com o enorme, fumegante, barulhento e desconhecido artefato, Lord Boswell pergunta a Boulton o que era aquilo. O sócio de Watt olha o escritor bem nos olhos, e depois de uma pausa dramática, diz:

“I sell here, Sir, what the entire world desires to have: POWER!”
(Eu vendo aqui, meu senhor, o que todo o mundo deseja ter: PODER!)

E é este poder que experimentamos toda vez que apertamos o pedal do acelerador. O motor a combustão interna foi uma revolução tão grande como o vapor: pequeno, e extremamente frugal no consumo de combustíveis líquidos, fez quantidades prodigiosas de poder se tornarem extremamente portáteis. Existem motocicletas hoje que conseguem níveis de potência que outrora moveriam navios de carga.
Fotos não creditadas: divulgação

Puma GT (foto O Globo)



Quem acabou com o automóvel foi o navio.” – LJK Setright


Leonard John Kensell Setright (1931-2005), historiador, músico, escritor, advogado, motociclista, piloto de testes e teólogo inglês, foi certamente o mais erudito autor que já escreveu sobre carros. A frase acima foi usada repetidas vezes por ele para defender uma teoria de que, ao invés dos famosos “carros mundiais”, o ideal é que cada povo e país pudesse projetar seus próprios automóveis. A antítese completa do mundo moderno, onde o caminho é claro para a padronização.

É claro que é algo impossível a completa proibição de exportação que a frase deixa implícita ser o ideal; o absurdo aqui é usado para nos fazer pensar apenas. Apesar de absurda, faz todo sentido, se é que me entendem. Nós adoramos a latinidade e a óbvia aura italiana de um Fiat ou um Ferrari dos anos 1960. Também preferimos, sem saber muito por que, um Charger 1969 ou um Buick GNX a qualquer outra coisa que tenha saído dos Estados Unidos de hoje. Até os japoneses são ainda mais japoneses em seus pequenos kei-cars. E certamente tenho saudades dos antigos Mercedes-Benz sóbrios e arrogantes em sua falta de decoração eminentemente teutônica. Mesmo que a Alemanha, de certa forma, tenha ditado com sua lógica e culto à engenharia, e por conseqüência a eficiência, o padrão básico do automóvel moderno, hoje mundial.

O que Setright dizia na verdade é que os carros deveriam ser um reflexo dos países e do povo que o criaram, e assim seriam adaptados totalmente ao seu ambiente. Quase como Darwin provou ser o caso com os seres vivos. O temperamento do povo, a topografia das estradas, e as características das cidades definiriam os automóveis de um país.


Um Alfa Romeo em sua terra natal: um completa o outro. (foto: villasanrafaello.com)

foto: Paulo Keller/AE

Tudo começou com um e-mail do Bill Egan. O amigo e ex-colaborador deste blog estava maravilhado com o novo carro na sua garagem eclética: um vermelhíssimo Alfa Romeo Duetto 1300 Junior. Queria que a gente o experimentasse, queria conversar sobre ele, queria mais. Pensou até em voltar a escrever para o blog, algo que o incentivei a fazer veementemente. Um talento desperdiçado é um dos maiores pecados que se pode cometer usando roupas, afinal de contas.

Marcamos um dia então, um domingo de manhã em um posto de gasolina no caminho para minha casa, já fora de São Paulo para facilitar para mim, e tirar o trânsito do encontro. Andando por ali acabamos por encontrar, quase por acidente, uma estradinha maravilhosa: longa, mão dupla, vazia, cheia de curvas legais, e belíssima naquele dia de sol. Encontrar algo tão bom de andar tão perto de São Paulo já valeu o dia.

Um monte de amigos resolveu vir junto, o que tornou o encontro ainda mais legal. O Paulo Keller, renovando sua vontade de trabalhar no blog que ele mesmo fundou, apareceu com seu maquinário retratista para registrar tudo. Mas o que Egan não esperava era a horda de viaturas bávaras que apareceu para mudar totalmente o foco do negócio: eu obviamente fui com minha perua 328i de câmbio manual, porque ela é meu carro de uso diário, meu meio de transporte primário. O Rafael Tedesco também veio com o seu E36 de uso diário, um bem surradinho cupê 325i, também com o raro e desejável câmbio manual. Mas a estrela do passeio prometia ser outra: O M3 de primeira geração (E30) de nosso amigo e ex-colaborador VR.


Foto: Paulo Keller/AE

Muita coisa acontecendo na F-1

Ecclestone, propinas, Massa dentro, Raikkonen fora … Fim da temporada promete emoções, e não são aquelas do famoso show na noite de Natal








Ecclestone se explica à Justiça na Alemanha e na Inglaterra (foto Autoandrive.com)


Estivéssemos falando do Brasil da era Lula e caberia muito bem o chavão “Nunca antes na história deste País…”, mas como o personagem em questão é um certo octagenário de nome Bernard Charles Ecclestone é pouco prudente usar esse expediente. Afinal, muitas vezes na história da F-1 a partir dos anos 1970 esse inglês que completou 83 anos no último 28 de outubro já foi dado como vencido e derrotado, prognóstico jamais consumado. Desta vez a possibilidade de uma mudança radical no reino que ele comanda com mão de ferro, inteligência superior e poder inabalável parece menos figurativa e mais punitiva: em audiência na Alta Corte de Londres Bernie teria admitido que comprou os votos de Alain Prost, Eddie Jordan e Tom Walkinshaw para assinar o Acordo de Concórdia de 1998 em troca de US$ 10 milhões para cada um.

Tivesse o dinheiro sido pago em contas bancárias das equipes Prost Grand Prix, Jordan e Arrows, respectivamente, e não na conta pessoal destes envolvidos a situação poderia ter contornos diferentes no julgamento em questão. Além desse caso a Justiça alemã também analisa o pagamento de um pagamento US$ 10 milhões maior que a soma desses “investimentos” a Gerhard Gribkowsky. Este banqueiro alemão teria trabalhado para que a venda das ações da FOM fosse fechada com a CVC Partners (nenhuma relação com a empresa brasileira de turismo) e não com outra interessada nesse investimento. Gribkowsky agora colocou pimenta em cima do dendê desse vatapá e através dos seus advogados afirmou que sofreu coação física de Bernie para aceitar a propina e o acordo.



Apesar do emblema e do crédito, o estúdio italiano Zagato não foi o autor único  desse carro inconfundível, diferente e maravilhosamente esquisito, típico de figurar nas minhas listas de preferidos de sempre. Sua designação vem de Sports Zagato, e teve uma versão conversível, o RZ, Roadster Zagato.

Veio em  1990 para dar uma força à imagem da Alfa Romeo após seu controle ter sido assumido totalmente pela Fiat, desgastada pela falta de confiabilidade de seus carros cheios de alma e coração, por mais estranho que esses termos humanos possam ser quando aplicados a máquinas. Tão humanos que os adoradores da marca consideram seus defeitos normais, como as personalidades das pessoas. Fato não exclusivo da Alfa, diga-se de passagem.

Para a fábrica, era o projeto ES-30, esportivo experimental de 3 litros, mas ganhou na prática o apelido Il Mostro (o monstro), pois era muito diferente do que a marca fizera de forma a ter sua fama completamente estabelecida num passado mais remoto, quando os desenhos de estilo eram bastante refinados, delicados, quase femininos. Isso havia mudado muito nos anos 1970, com linhas muito mais retas e ousadas, mas o SZ levava essa característica a um novo patamar.


Fotos sem crédito: net car show.com



It’s not the kill, It’s the thrill of the chase!
(Não é o ato de matar, é a emoção da perseguição!)

Quando a banda inglesa Deep Purple disse a frase acima, na música “Knocking at your back door”, faixa de introdução de seu antológico vinil de retorno “Perfect Strangers” (1984), usou uma expressão comum entre caçadores, mas o assunto aqui era outro tipo de caça: as mulheres. A música fala que o legal é perseguir mulheres difíceis, especiais, interessantes, que o real desafio está na busca, na conquista. A melodia é sensual, e a gente se sente meio compelido em acreditar que o bom mesmo é perseguir uma doce dançarina chamada Lucy, cujos dedos disparam sombras elétricas inalcançáveis... 

O que a canção diz é que ótimo estar com elas, mas uma vez atingido o objetivo inicial, o chamado da busca incessante é ouvido, o que era inatingível e excitante se torna fácil e comum, e inevitavelmente é a emoção da caça que se sobrepõe. Assim dizem as sagradas escrituras do rock’n’roll.

Mas eu sou, por natureza e opção, um cara monógamo. Entendo e já senti, na juventude, a emoção deste tipo particular de caça, mas não é algo presente em minha vida. Mas quando falamos daquele que é o tema deste ilustríssimo blog, o automóvel, a coisa muda de figura. Como muitos de vocês, acredito, vivo minha vida em busca a um elusivo e inalcançável Graal automobilístico, aquele carro perfeito, raro, barato, interessante, que será para sempre ligado indelevelmente à minha pessoa, e que, perfeitamente ajustado às minhas necessidades, desejos e taras, se tornará a escolha definitiva. 

Apesar disso, ou talvez por causa desse irreal objetivo, se com mulheres tive muito sucesso na monogamia, com carros fracassei completamente. Me saí um sujeito safado cuja promiscuidade não tem limites. De velhos Fuscas a novos Ferraris, e todo resto no meio, tudo me atrai e me excita, tudo consegue chamar minha atenção e se tornar o objetivo dos meus desejos e a musa de meus dias. Não há marca que me segure, não há tabus nem coisa proibida: vale tudo e tudo parece estar disponível se eu persistir de verdade. Sou decididamente infiel quando se trata de automóveis.

É por causa disso que volto aqui, apenas alguns meses depois de ter feito minha última lista deste tipo, e de por resultado ter comprado meu Cruze, para compartilhar mais uma vez com meus queridos leitores o que passa em minha cabeça doentia e pervertida quando me coloco à caça novamente.


No automobilismo mundial existem inúmeras categorias, desde os carros do tipo fórmula monoposto, os dragsters, carros de rali, protótipos, GTs e os chamados carros de turismo. Esta última, a categoria de turismo, provavelmente é a mais difundida de todas, pelo fato de se utilizar como veículo base um carro de produção normal em grande série.

Nem sempre estas bases são mantidas a rigor, como no caso da nossa Stock Car, onde o carro não tem nada a ver com um modelo de rua, começando pelo chassis de construção tubular. Outros campeonatos, entretanto, seguem a regra do carro base de produção. A Supercar V-8 australiana utiliza carros de produção modificados para corrida, com o monobloco original.

O campeonato alemão de turismo de hoje, o famoso DTM (Deutsche Tourenwagen Masters, Torneio Alemão de Carros de Turismo) é um dos mais tradicionais do mundo. Os carros seguem a mesma linha conceitual do nosso Stock Car, uma carroceria que se assemelha com um modelo de produção, mas um chassi completamente diferente, com direito a compósito de fibra de carbono e tudo mais.

   
Fotos: wikicars.org, awdwiki.com, wheelsofitaly.com

O interessante está entre as rodas traseiras, um diferencial


O Alfa Romeo 164 foi sucesso aqui no Brasil quando apareceu, trazido pela Fiat quando as importações foram reabertas em 1990. Era uma situação de alegria para os adeptos da marca, que não tinham um modelo no mercado desde que o 2300 SL/Ti4 saíram de produção em 1986. Infelizmente o topo da linha não veio oficialmente, e desconhecemos se esse modelo em questão chegou a girar suas rodas por aqui. Estamos nos referindo ao Q4, Quadrifoglio 4, o modelo com tração nas quatro rodas.

Em 1993, o Alfa Romeo 164 ganhou seu modelo mais complexo, versão raríssima fora da Itália, que adotava um sistema de tração integral, claramente seguindo o sucesso que a Audi experimentava, e não totalmente novidade na marca italiana, que já havia tido outros modelos com as quatro rodas motrizes, como o 33 e o 155.

Foi desenvolvido não apenas pela Alfa, mas sim com a colaboração da austríaca Steyr-Puch, especialista em carros com tração em todas as rodas de usos emergenciais e militares.  O resultado foi um conjunto bastante moderno e eficiente.





A história do Alfa Romeo 158, do projeto ao ápice da marca nos primórdios da Fórmula 1 e à sua sucessão pelo Ferrari.

Observação inicial:
Em meu último post sobre o FW-15C, vários leitores e amigos pediram artigos sobre a Fórmula 1 antiga, a memorável, a entusiástica. Este post é uma resposta a este pedido.

Ele não é novo. Foi escrito em 1999 para um grupo pequeno de amigos do extinto newsgroups de carros do UOL, e posteriormente reeditado no fórum da Car Audio Brasil em 2004.

Entretanto, nenhum destes meios tinha a capacidade de difusão que o blog AUTOentusiastas tem hoje, e espero que muitos que não o conhecem tenham a oportunidade de apreciá-lo pela primeira vez.

Vamos a ele.


Década de 1920: Um jovem de nome Enzo Ferrari, apaixonado por velocidade, começa a trabalhar para um fabricante de automóveis ainda obscuro na Itália, chamado Alfa Romeo.Vindo de outra empresa concorrente, a Costruzioni Meccaniche Nazionali (CMN), vem para desempenhar a mesma função: trabalhar nos carros de competição, onde seria o responsável pelos testes e, algumas vezes, o piloto nas provas. Suas habilidades na condução eram pouco acima dos níveis adequados.

Ao final de uma prova que vencera, Enzo foi presenteado pelo pai de um ás da aviação italiana, Franco Barraca (morto em batalha na Primeira Guerra Mundial), com o escudo da cidade de Modena enfeitado com o símbolo que ornava seu avião, o cavalo empinado. Enzo adotaria este estandarte como seu símbolo pessoal, e mais adiante como logotipo de sua futura empresa.


Harry C. Stutz (1876–1930), assim como o mais famoso e contemporâneo Henry Ford, era um moleque criado na fazenda que tinha aguda paixão por máquinas. Como Ford, ainda antes do século 20 aparecer, já estava construindo automóveis. Mas ao contrário de Ford, que desejava tornar a mobilidade do automóvel um direito de todo mundo, Stutz queria apenas uma coisa: Velocidade.


Desde o primeiro carro com a marca Stutz, competição era o principal objetivo da marca de Indianápolis e em seu início apenas carros de competição eram produzidos. Mas logo Harry Stutz faria talvez sua maior contribuição para a história do automóvel: para fazer algum caixa, resolve vender carros de passeio, e cria um carro que podia ser usado tanto em competições quanto nas ruas, como transporte veloz para duas pessoas apenas. Efetivamente, foi um dos criadores do que hoje convencionamos chamar de carro esporte.

O carro de Stutz era uma coisa realmente interessante: baixo, espartano, leve e com um enorme quatro em linha de 5,9 litros e 65 cv (quando um Ford modelo T tinha apenas 20 cv), e quatro válvulas por cilindro, com duplo comando. Mas não da maneira que você imaginou, no cabeçote, mas no bloco, fazendo a câmara de combustão parecer um T. Chamado de Stutz Bearcat (abaixo), o carro (corrente de 1913 a 1925) povoaria a imaginação de entusiastas mundo afora por muitas décadas adiante. Eu sei que ainda povoa a minha...Harry Stutz comanda sua empresa até 1919, quando vende o controle.




Depois de contada a história da Coleção Schlumpf, este post apenas se concentra em contar mais um pouquinho sobre alguns dos carros da coleção, usando as fotos que tirei em 1987 no museu como ponto de partida. Muitas das fotos estão fora de foco e borradas, mas valem como documento de como era o museu naquele tempo. A elas então:



Começando pelos Alfa Romeo, este é um exemplar do mais raro e especial carro da marca: o 8C 2900B. Equipado com um oito em linha DOHC e suspensão independente nas quatro rodas (exótico na época), o 2900 é o Bugatti Veyron dos anos 30, o mais veloz, caro e raro carro esporte de seu tempo. Acima vemos o carro dos Schlumpf, com carroceria Pininfarina, hoje. Abaixo, como o conheci em 1987. Bem ao fundo pode se ver um Ferrari 250 LM.


Texto de Arnaldo Keller

Fotos: Autor

Outro dia guiei bastante um Alfa Giulia GT Sprint Veloce ano 1967; guiei-o por mais de 150 km em estrada boa e sinuosa. Postei até um filminho de uma voltinha que nele demos, o Carlão e eu. Esse Giulia está muito bem acertado de chão. Está justinho.

O dono é piloto dos bons, é um alfista antigo e sabe quando um Alfa está mostrando seu potencial. Merece o carro que tem. Digo isso porque tem gente que tem carro esporte antigo e não sabe quando o carro está acertado ou não, já que não manja nada e comprou o carro só por boniteza.

Por sinal, abrindo um parênteses, há coisa de dois meses fui à loja da Aston Martin, que estão espetaculares. Fucei até que encontrei um com câmbio manual. Ufa! Seis marchas. Sentei e estava tudo no lugar certo. Uau!



Quando falamos de corridas por ruas e estradas, o primeiro nome que vem à cabeça é a Mille Miglia italiana. Alguns outros lembram da Carrera Panamericana do México, mas curiosamente não muitos no Brasil falam primeiro da clássica Targa Florio.

O resultado da paixão do italiano Vincenzo Florio pelas corridas de automóveis no começo do século passado resultou em 1906 numa das mais desafiadoras provas de velocidade de todos os tempos, passando por ruas e estradas, cidades e pequenos vilarejos na Sicília.


CENT´ANNI DI ALFA ROMEO
Por José Rezende Mahar

Desde sempre, a emoção de dirigir com brio foi vital à marca do Biscione, a cobra que simboliza Milano.


O coração esportivo da Anonima Lombarda Fabbrica Automobili começou a bater em 24 de junho de 1910. Nasceu das cinzas de uma frustrada tentativa de Alexandre Darracq, um dos grandes fabricantes daqueles primórdios do automóvel na França, de montar seus carros em solo italiano para evitar o pagamento de altas taxas de importação. Só que o público comprador local achava os Darracq sem espírito de luta - e o modelo francês encalhou nas vendas apesar de sua alta qualidade.

Foi assim que, naquele 1914, o grupo de investidores liderados pelo Cavaliere Ugo Stella se separou de Darracq e decidiu fazer um automóvel próprio, contratando para tanto Giuseppe Merosi, primeiro dos grandes projetistas que foram a alma da marca ao longo deste glorioso centenário.

Merosi criou uma série de carros leves e velozes capitaneados pelo Alfa 24 HP (a denominação que se referia à categoria fiscal calculada sobre a cilindrada do motor). E foi aí que começou a fama, a lenda e o mito do CUORE SPORTIVO, a essência esportiva da marca. Logo começou a participação em competições, com uma bela participação na Targa Florio de 1911.

ALFA 24 HP (1910)

E desse jeito foi até 1915, quando a I Guerra Mundial interferiu na história da marca. Um napolitano chamado Nicola Romeo, que produzia armas e equipamentos militares no bairro de Portello, mesmo bairro de Milão onde estava a sede da Alfa, entrou na sociedade acionária. Em apenas três anos, ele assumiu o controle da companhia, que foi rebatizada de Alfa Romeo. A guerra trouxe contratos militares lucrativos e a fábrica cresceu muito, só retornando aos automóveis em 1920.

O primeiro modelo com o nome Alfa Romeo foi o 20/30 HP. Foi com um destes que o piloto Enzo Ferrari (que, mais adiante, se revelaria como chefe de equipe) chegou em segundo lugar na prova de estrada Targa Florio.

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Merosi continuava a ser o engenheiro de automóveis (como o vitorioso RL), enquanto a fábrica de Nicola Romeo fazia armas, motores aeronáuticos e equipamentos militares a pleno vapor. E o jovem Ferrari tinha opiniões fortes - entre elas, de que Merosi estava velho e desatualizado.

Foi então que Ferrari conseguiu convencer Vittorio Jano a deixar de ser o projetista de carros de corrida da Fiat para entrar no time da Alfa Romeo. De cara, o Alfa P2, criação inicial de Jano na nova casa, foi vencedor do primeiro campeonato mundial de Grand Prix, em 1925 - a Fórmula 1 da época.

P2 GRAND PRIX (1924)
Outros carros do mesmo projetista foram a série imortal de veículos com duplo comando de válvulas, que ia do 6C 1500, ao 1750 e ao 2000, mais os de oito cilindros em linha, o 2300 e o 2900, (estes,uniam dois blocos de quatro cilindros pelo meio). Com câmara de combustão hemisférica, vela central e as válvulas em ângulos de 90 graus, estava feita a marca da Alfa na tecnologia e nos motores potentes e confiáveis.

ALFA ROMEO 6C 1500 SUPER SPORT (1928)
Esses carros eram os Ferrari de seu tempo - quando Enzo não passava de capo della squadra corse (chefe da equipe de competição) e ainda não era um ícone italiano. Ele provou ser melhor como chefe da equipe do que ao volante dos carros.

Voltando a 1928, os contratos militares acabaram e, com eles, o interesse de Nicola Romeo na marca, que foi definhando até 1932. Foi quando o primeiro-ministro Benito Mussolini resolveu fazer da Alfa Romeo um símbolo italiano e ordenou ao IRI, o Istituto di Ricostruzione Industriale (um BNDES deles) que assumisse o controle acionário e mantivesse a fábrica funcionando.

Aí começou o período de ouro da marca, com carros velocíssimos como o Alfa 8C 2900 de rua que, em suas confecções Touring, bem leves, rendia 220 cv e superava os 200 km/h - algo do outro mundo para os padrões de então.


8C 2900 A (1935 A 1937)

8C 2900 LE MANS (1938)

Nas pistas, o problema eram as verbas do amigo de Mussolini na Alemanha: Hitler proveu a Mercedes-Benz e a Auto Union com caminhões de dinheiro e gerou monstros inalcançáveis, mesmo com a pilotagem heróica de Tazio Nuvolari como no GP de Tripoli, por exemplo. Mas foram dessa época os gloriosos 8C 2900 Tipo 35 de corrida e os primeiros Alfetta Tipo 158, monopostos destinados a muitas glórias já no pós-guerra.

TIPO 158 ALFETTA (1938 A 1940)
Como adendo deve-se registrar que alguns carros, principalmente do tipo 6C 2500, foram produzidos a conta-gotas durante a guerra, no meio de material militar como os motores Daimler-Benz DB 601 – era o V-12 usado em caças como o italiano Macchi Mc202 Folgore e o alemão Messerschmitt Bf-109.

O PÓS-GUERRA

O cenário mudou muito após a Segunda Guerra Mundial. A fábrica lombarda, que de anônima nessa altura não tinha nada, lutou para sair da inércia que a destruição pelos bombardeios aliados causou. O Plano Marshall ajudou muito a reconstrução industrial da Itália e, em 1948, foi relançado o modelo mais simples da linha Alfa Romeo pré-guerra, o 6C 2500. Sempre com carrocerias feitas à mão em encarroçadores de automóveis de luxo, logo ficou claro que esses carros não eram o que o mercado podia pagar. Foi aí que chegou Orazio Satta Puliga, o terceiro gênio da marca, que conduziria a Alfa até os anos 70.

Os Alfetta 158 e 159 de antes da guerra mostraram que ainda tinham potencial. Com motores supercomprimidos, rendiam até 400 cv e venceram, em 1950, o primeiro campeonato da Fórmula 1 moderna nas mãos de Giuseppe Farina. A vitória foi repetida em 1951, mas com Juan Manuel Fangio.

TIPO ALFETTA 159 (1951)
Orazio Satta idealizou um veículo que teve muito a ver conosco: o Alfa 1900. Até então, os modelos da marca tinham chassis vestidos por carrozzieri externos. Já o 1900 foi o primeiro Alfa Romeo a ser totalmente fabricado e ter sua carroceria estampada e montada na fábrica de Portello.

1900 BERLINA (1950 A 1958)
Mesmo com valores mais contidos, ainda mantinha o Cuore Sportivo Seu motor de 1.884 cm³ rendia 90 cv - em um tempo onde a concorrência nessa faixa de cilindrada alcançava, se muito, 60 cv. Sua plataforma era concebida de forma que permitisse facilmente a montagem de carrocerias alternativas, iniciativa que favoreceu o nascimento de criações memoráveis da Pininfarina e da Touring.

O 1900 foi aumentando em potência, compressão e cilindrada até chegar aos dois litros e a mais de 130 cv, com os tradicionais carburadores Weber duplos e horizontais e a caixa de cinco marchas. Um câmbio com ”tantas marchas” assim era algo inaudito na época e servia para aliviar o motor nas autoestradas italianas.

Mas o modelo saiu de linha em 1957, quando seus estampos de carroceria e as partes de suspensão foram vendidas para a Indústrias Kaiser de Argentina, prima em 1º grau da nossa Willys-Overland. Assim, a IKA fabricou o Bergantín – com roupa de Alfa 1900 e, que tristeza, motor de quatro cilindros e válvulas laterais de Jeep Willys.

Já havia a percepção de que a Alfa precisava de um carro ainda menor e mais leve. Por isso, em 1954, nasceu o Giulietta. Dotado de um motor totalmente novo, com bloco e cabeçote de alumínio, o modelo deu origem a uma extensa linhagem que sobreviveria até 1993. Foi no Alfa Spider, aliás, que esse motor tornou-se um dos primeiros do mundo a ter comando de válvulas variável, na década de 80.

GIULIETTA SPIDER (1955 A 1962)

O Giulietta foi lançado inicialmente no modelo Berlina (sedã de quatro portas) e, posteriormente gerou o Spider e o Coupé, todos no começo com motor 1300 de 65 cv e carburador vertical duplo Solex. Os primeiros tinham a alavanca de câmbio na coluna, com cinco marchas - embora logo a alma esportiva se manifestasse e fosse oferecido o câmbio de cinco marchas no assoalho.

Foi nessa época que nasceu também o Alfa 2000 Berlina. Sucessor do 1900, tinha motor de quatro cilindros, 1.975 cm³ e 95 cv, sempre com cinco marchas. Conforme a tradição da marca, a plataforma se prestava a fáceis adaptações, de forma que foram oferecidas de fábrica versões Coupé e Spider. O 2000 Berlina foi fabricado na Itália de 1957 a 1961, quando foi substituído pelo 2600. Este tinha motor de seis cilindros e bloco de alumínio, saindo também em versões esportivas.

2600 SPIDER (1962 A 1965)
Mas foi a série 105 – batizada de Giulia – a obra imortal de Orazio Satta. Fabricada em inúmeras variações, que iam desde os cupês GTA alleggeritas, aliviadas, de alumínio, até os belíssimos TZ da Zagato. O Giulia Super foi um triunfo da estética aliada à aerodinâmica. As primeiras séries tinham o motor de 1.590 cm³ e 98 cv com carburador duplo vertical Solex - mas como era tradicional, logo foram oferecidas versões com dupla Weber 40 horizontal (para rua) e até Weber 48 (para pistas).

O Giulia foi pioneiro no uso de freios a disco nas quatro rodas, vaso de expansão do radiador feito de plástico e a ter coeficiente de arrasto aerodinâmico de 0,31 - tudo isso em 1962 e com aquela frente quadrada, prova de que Orazio Satta era um deus da engenharia.

GIULIA BERLINA (1962 A 1978)
GIULIA BERLINA (1962 A 1978)
GIULIA TZ 2 (1965)
Para o Montreal, Orazio Satta bolou um V-8, dois motores de Giulia 1300 em um só cárter e com um virabrequim, exatamente o irmão do Alfa Romeo 33 Stradale. Tinha 2.600 cm³, 197 cv e andava bem, com um som de virabrequim americano cruzado, mas inconfundível. A caixa era de cinco marchas, porém ZF para aguentar o torque do motor, e tinha a primeira para fora do "H" e para trás. O diferencial era autobloqueante e a carroceria foi desenhada por Marcello Gandini, que trabalhou para a Bertone no Lamborghini Miura. Foi fabricado de 1970 a 1977. No Brasil foi imortalizado numa novela da TV Globo como o carro do Diabo.

MONTREAL (1970 A 1977)
O primeiro carro de tração dianteira da marca foi o Alfasud (1971-1989), com motor de quatro cilindros boxer. Projetado por Rudolf Hruska, um checoslovaco também genial, era produzido numa nova fábrica em Pomigliano d´Arco, no sul da Itália próximo a Nápoles.

ALFASUD 1.2 (1971 A 1965)
Enquanto isso, esporte-protótipos Alfa da série 33 TT iam ganhando várias provas de longa duração entre 1967 e 1977, enfrentando bólidos como Porsche 917 e Ferrari 512S. Já na Fórmula 1, a marca atuava como fornecedora de motores para as equipes da qualidade da Brabham, que alcançou o vice-campeonato de 1978. A Alfa retornou como scuderia entre 1979 e 1985, mas sem grande êxito.

33 TT

Com os carros de rua, o último brilho da Alfa como marca independente foi o Alfetta (1972-1984). Eram carros muito sofisticados: tinham motores de comando eletronicamente variável e usavam câmbio no eixo traseiro (o que lhes dava 50/50 de distribuição de peso). Em uma de suas versões, o Alfetta apresentou o último motor de concepção pura Alfa Romeo: o V-6 de 2,5 litros e 160 cv. Nos subsequentes Alfa 75 e 90, sedãs dos anos 80, esta mecânica chegou a ser oferecida com três litros, quatro comandos de válvulas e 210 cv.

ALFETTA 1972
Esse motor V-6 foi a ponte para os carros produzidos sob a égide da Fiat – que comprou a Alfa Romeo do governo italiano em 1986 (e salvou a empresa de apuros financeiros). Nesta época que foi projetado o164, um sedã que tinha monobloco desenvolvido conjuntamente com as marcas Saab, Fiat e Lancia.

Dessa sinergia nasceram os carros Saab 9000, Fiat Croma, Lancia Thema e Alfa 164 – todos tinham tração dianteira, introduzindo a Alfa na fase moderna, com sua primeira carroceria projetada em computador.

Dái em frente foi a era moderna das duras realidades do obrigatório controle de custos levou ao projeto do 155, irmão do Fiat Tempra, sempre com um perfume esportivo diferente, e finalmente aos 145 e 146. Carros do setor dos pequenos que vieram para substituir os Alfettas.

Posteriormente foram elaborados o 156, um carro de tração dianteira e grande sucesso, com sensações incríveis tanto nos modelos de quatro cilindros em linha e dupla ignição como nos GTA, quanto nas versões equipadas com o último cantor, o Pavarotti mecânico que é o 3 litros DOHC V-6. Esse motor também equipou o grande 166 e os atuais 159, inclusive em versões 4x4.

Nos tempos atuais há o mítico Mi.To., cujo nome evoca uma estrada famosa na Itália, os cento e poucos quilômetros que ligam Milano a Torino, as duas cidades-chave da marca. Além do novo Giulietta.


ALFA NO BRASIL

A Alfa Romeo foi a empresa escolhida pelo governo brasileiro para ceder a patente dos caminhões 9.500 (e posteriormente dos 11.000) para a Fábrica Nacional de Motores, estatal estabelecida em Xerém, bairro de Duque de Caxias, RJ no sopé da Serra de Petrópolis.

A FNM fora constituída na Segunda Guerra Mundial para produzir motores de avião militar da Pratt & Whitney e depois fez geladeiras e eletrodomésticos. Começou a fabricar veículos com uma série de cem caminhões Isotta-Fraschini mas, pelas precárias condições da Isotta, o governo teve de escolher outro parceiro.

Em 1958, foi estabelecido que, além dos robustos caminhões Alfa Romeo, a FNM faria também um sedã da marca italiana – mais precisamente o Berlina 2000. Seu lançamento se deu em abril de 1960, junto com a inauguração de Brasília e o carro foi batizado de FNM 2000 JK.

FNM 2000 JK
Com duplo comando de válvulas no cabeçote, 95 cv, cinco marchas e pneus radiais, era um dos veículos mais modernos e rápidos por aqui, alcançando mais de 160 km/h. Mesmo com o golpe militar de 1964 (quando “cassaram” o nome JK), o caríssimo sedã FNM continuou a dar crias.

Em 1966, foi elaborada uma variante conhecida por TIMB, ou Turismo Internacional Modelo Brasil. Tinha frente rebaixada e um motor mais esperto, com maior taxa de compressão. Daí resultou, em 1969, o modelo 2150 – era uma espécie de JK mais elaborado que podia vir com bancos individuais e alavanca de câmbio no assoalho, como o TIMB. Houve ainda o cupê Onça, de plástico reforçado com fibra de vidro, que teve menos de dez unidades produzidas.

Onça
A esta altura, a FNM fora privatizada e vendida à matriz italiana da Alfa Romeo. Um novo modelo foi desenvolvido sobre a plataforma que vinha desde os tempos do JK. Assim nasceu o luxuoso Alfa Romeo 2300, um sedã fabricado exclusivamente no Brasil a partir de 1974.

Nesta época foi considerada seriamente a produção do Alfasud no Brasil mas um acidente de estrada matou os engenheiros italianos que coordenavam o processo.

Querendo produzir caminhões, a Fiat comprou a Alfa Romeo no Brasil em 1978 – oito anos antes de assumir a empresa na Itália. Fabricação do modelo 2300 (depois rebatizado de TI) foi transferida para Betim e a linha permaneceu em atividade até 1986, quando mostrou-se definitivamente antieconômica.
2300 TI

Só com a reabertura das importações, em 1990, é que carros Alfa Romeo – como os modelos 164 e 156 - voltaram ao país, trazidos da Itália.

"Senza cuore sportivo saremmo solo macchine..."

JMR

Quando era um adolescente devorador de informações automotivas, durante os anos 80, o que havia de mais exótico e sofisticado naquele Brasil hermeticamente fechado ao exterior era um Alfa Romeo.

O Alfa 2300 nacional (abaixo) tinha tudo de bom que se poderia imaginar naquele tempo: Cabeçote em alumínio DOHC com válvulas de escape refrigeradas por recheio de sódio, dois carburadores duplos horizontais (no Ti4), câmbio de cinco marchas sincronizadas (Cinco! Nossa!), tração traseira, e freios a disco nas quatro rodas. O preço refletia tal sofisticação, e o Alfa custava quase três vezes o preço de um Opala, por exemplo.
E não era só isto que me excitava: lia com frequência notícias de fora que contavam coisas inimagináveis para nós, tupiniquins isolados. Lia sobre o incrível Montreal, sobre os Alfettas com transeixo traseiro, sobre o GTV6 com a lendária melodia de seu então novo V-6 de 2,5 litros. Sonhava com Guilia GTV e com o glorioso 33 stradale, com Spyders e fugas californianas de um jovem Dustin Hoffmann, e me imaginava fazendo o mesmo com um GTV6 twin turbo americano. Eu realmente gostava de Alfas.

Fui dirigir um Alfa pela primeira vez ao redor de 1988, quando um colega de república herdou do pai um Ti4 84, verde-claro. Ansioso para experimentar a mítica alma de Portello, aproximei-me do carro com toda a trepidação de uma freira que se aproxima da praça de São Marco pela primeira vez.

Foi uma tremenda decepção. Acostumado que estava com o meu Opala 250-S, achei que toda aquela sofisticação não servia para nada, afinal de contas. O carro era lento, sem vontade, e apesar de marginalmente melhor em estabilidade que meu Opala, tinha um curso muito curto na suspensão dianteira que o deixava insuportavelmente desconfortável. Regularmente chegava em qualquer lugar que fôssemos bem antes do Alfa, e isto rapidamente se tornou piada entre os amigos.

Por muitos e muitos anos depois desta época, dediquei a todo Alfa Romeo um profundo desprezo, aquele reservado especialmente aos espancadores de velhinhas e aos torturadores de filhotes de labrador. Experiências recentes com o Spyder V-6 de 95 não ajudaram em nada: me pareceu igual ao meu Maxima do mesmo ano, mas sem a capota, a rigidez, a confiabilidade. E com um preço tresloucadamente alto no mercado de usados. De novo, muito barulho por nada.

Mas ano passado, um grande e próximo amigo comprou um Alfa Romeo GTV 2000 1973, bom de mecânica e estrutura, mas precisando de um pouco de carinho e dedicação.Vindo de uma família de alfistas, este amigo sabe como achar peças e serviços para ele, e durante boa parte do ano se dedicou a arrumar o que estava errado, e vivia me contando o quanto ele era legal e tal, mas, coitado; continuava desprezando-o.

Mas o danado do Alfinha ficou bonito mesmo, e eu comecei a pensar um pouco sobre isto tudo. Estaria eu enganado? Será que minha opinião bem arraigada da marca está realmente certa, ou é um engano fragoroso? Valeria a pena experimentar mais um deles ou a jóia de Portello estaria destinada a se manter desprezada?

Resolvi então dar uma segunda chance a ele. Afinal de contas, só havia dirigido dois Alfas, e ambos, segundo muitos, estão anos-luz de serem exemplos decentes do que é um Alfa de verdade. O 2300 é um carro que nasceu bravo e nervoso tentando ser um carro de luxo, e o Spyder que andei tem tração dianteira, por todos os deuses!!!! Tomei coragem e pedi ao meu amigo para dar uma volta com o bichinho.

E desta vez, a marca Alfa Romeo não tinha maneira de escapar de meu crivo e julgamento possoal, visto que o GTV de dois litros é dos mais emblemáticos exemplos de Alfa Romeo, e um carro universalmente julgado com carinho e boas vibrações. Marcamos um dia e finalmente sábado passado pude andar nele.



Mas antes de contar como foi, um pouco de história se faz necessário. O GTV é derivado do Giulia (abaixo), lançado em 1962, que por sua vez é uma versão pouco maior e modernizada do Giulietta, que apareceu no longínquo ano de 1954. O Giulietta (acima) é um marco de diversas maneiras diferentes. Primeiro, fixou o que seria a Alfa Romeo do pós-guerra: o que era antes uma espécie de Ferrari dos anos 30, se tornaria uma marca com um volume de produção e vendas muito maior, mas ainda com técnica e esportividade intactas. Em segundo, foi um carro incrivelmente moderno para seu tempo, e com um desempenho e comportamento ímpar em sua classe. E, finalmente, foi a base de todo Alfa realmente memorável do pós-guerra. Seu motor (modificado é claro) durou até 1994, e é incrivelmente sofisticado para algo de produção seriada em 1954: todo em alumínio (com camisas de ferro fundido), DOHC acionado por corrente dupla, câmaras de combustão hemisféricas e válvulas de escape refrigeradas a sódio. Tudo isto em uma época em que válvulas laterais (os famosos “cabeça chata”) ainda eram relativamente comuns.



O GTV apareceu como Giulia GT de 1962 , e só depois recebeu o "V" de Veloce. Tinha um desenho do jovem gênio da casa Bertone, o depois famosíssimo Giorgetto Giugiaro. Como quase todas os Giulias, usa freios a disco nas quatro rodas (!!!), suspensão traseira com eixo rígido (bem localizado com um braço triangular em cima do diferencial e molas helicoidais) e dianteira com braços triangulares sobrepostos. Foi desenvolvido para usar pneus radiais (também raros então), inicialmente os Pirelli CF67 Cinturato. O câmbio era uma unidade totalmente sincronizada de cinco marchas.

Os GT/GTV foram oferecidos em vários tamanhos de motor durante sua vida, 1600, 1750 e 2000, e, com o nome de GT Junior, 1300. Teve uma história de sucesso em competições, principalmente na sua versão de peso aliviado GTA (GT “Alleggerita”) um lendário cupê de alumínio e cabeçote de velas duplas, homologado especialmente para competição.

O GTV 2000, corrente de 1971 a 1976, é a última evolução para as ruas deste longevo cupê. O motor desloca exatamente 1.962 cm³, a partir de um diâmetro de 84 mm por um curso de 88,5 mm, sua potência é de 130 cv a 5.500 rpm e seu peso total, ao redor de 950 kg. O carro do meu amigo tem um opcional raro e interessante: ar condicionado, o que faz com que a bateria vá para o porta-malas (onde Deus a colocou originalmente), já que o espaço no cofre se tornou exíguo.

Andando de GTV


Olhando o carrinho na frente de casa, recém-lavado e polido num resplandecente e profundo negro, não há como não admirar o trabalho do jovem Giugiaro. O carro é pequeno, mas as proporções e a pureza de linhas são simplesmente sensacionais. A área envidraçada é grande, e o teto é suspenso por delicadas colunas, algo impossível de se fazer hoje em dia, tempo em que um carro é feito para encarar um bloco de concreto imóvel, ao invés de desviar dele. Os para-lamas dianteiros são ligeiramente mais altos que o capô, mostrando sua posição para o motorista, um universal sinal de um carro de mecânica baixa. O pequeno porta-malas e o longo capô são tão perfeitos em sua proporção em relação ao entre-eixos e ao tamanho total do carro que compelem o cientista alemão dentro de mim a tentar criar uma fórmula matemática para que os designers obtenham a partir de um dado entre-eixos e comprimento final, o ideal tamanho de cada volume e o diâmetro das rodas e pneus. Uma perfeita “Lei da GTV”, que os ensinaria a serem tão geniais como Giorgetto, e abandonassem inspirações amalucadas de filmes de ficção e hot rods, tão presentes em estúdios de design hoje em dia.



Os detalhes também são apaixonantes: rodas de aço pintadas no exato tom de cinza original, e com as calotinhas também originais, cromadas. Meu amigo teve que contratar um torneiro mecânico para reproduzir os parafusos de roda originais, que têm um desenho diferente para segurar as calotas. Quatro pneus radiais novos e de boa qualidade (Goodyear) na medida 195/70 R14, de novo mostram o cuidado dele para com o carrinho.



Dentro dele, mais alegria: um vinil de textura perfeita, clarinho, bege, contrasta com a madeira, alumínio, o preto do painel e com a grande área envidraçada, para dar uma atmosfera clara, iluminada e agradabilíssima. Achei isto fantástico, logo de cara, pois um cupê tão pequeno normalmente acaba por ser a ser altamente claustrofóbico.



Senta-se baixo, bem no meio do veículo, como deve ser em um carro esporte. Os dois instrumentos principais em um “binóculo” pronunciado, câmbio com a alavanca curvada para trás (parecida com o do Chevette), volante de madeira e alumínio em posição perfeita, pedais idem. Da posição de direção, como já disse, pode-se ver os para-lamas altos, marcando as extremidades do carro: genial. A sensação é de que, apesar de ser um carro visivelmente pequeno, o acesso, a posição de dirigir, e o espaço para o motorista e um passageiro são ótimos. O banco traseiro, porém, deve ser tratado como espaço extra de bagagem, ou para crianças bem pequenas.



O motor liga fácil, e logo se mantém em uma marcha-lenta estável. Acelerando-o parado, se tem uma ideia do que vem pela frente. Um motor sem frescuras, sem melodia de escape, vibrador. Mas também solto, que sobe de giros fácil, e que engole ar com vontade por suas quatro borboletas de admissão, neste caso acopladas a dois magníficos carburadores duplos horizontais Dell’Orto. Sem modos, mas robusto, com fôlego e disposição de atleta. Humm... Interesting...


Ao colocar o carro em movimento, a primeira surpresa: cadê o freio? Mas logo depois, entendi: é necessário uma forte pisada para acionar realmente as quatro pinças italianas. De cara uma sensação forte me avassala: como parece moderno ao rodar! Para quem está acostumado com carros dos anos 60/70, a impressão de que o carro é muito mais novo do que é impressiona. Que revelação deve ter sido em sua época... Até o freio foi só questão de adaptação; em segundos estava modulando-o e freando instintivamente como se fizesse isto há anos.



E me senti em casa. A alavanca de câmbio se move com facilidade e precisão, o motor pede para ser acelerado, e como sou educado, assim o fiz. Não sei se ela se comporta bem andando devagar; enquanto estive com ele só andei à moda.

Em pouco tempo, estava atacando as curvas com vontade, e estava embasbacado com a compostura do Alfa. Já andei em muitos carros da mesma época, e nenhum chega perto. Na verdade, poucos carros que já dirigi, independente da época, são tão apaixonantes no comportamento. Some-se o motor, que é um verdadeiro estivador (forte e eficiente mas nem aí para as boas maneiras e o refinamento), a tração traseira perfeita para posicionar o carro nas curvas, a direção e o câmbio que só ajudam, o pequeno tamanho, e se tem uma experiência ao volante que é mais que boa ou memorável: é excitante.

A coisa realmente esquentou, literalmente. Andando cada vez mais rápido, me sentia cada vez mais unido com o bichinho, e ele parecia adorar. O túnel esquentou ao lado de minha perna; mas não quente “queimadura de primeiro grau”, quente assim como paixão, desejo que se consuma. Um calorzinho danado de bão, se é que me entendem.

Correndo risco de parecer rude, e usando um grande clichê que evito a todo custo: aquilo estava realmente parecendo sexo. Algum esforço físico era necessário para se fazer tudo aquilo, mas durante a brincadeira você nem se toca disso, excitado e no meio de tanta diversão e emoção. A resposta telepática de tudo aquilo que eu tentava fazer me provocava a fazer mais, e seguíamos assim eu e a máquina num crescendo delicioso... É impossível de não se deixar levar, e sentir o abandono clássico da paixão, aquela maravilhosa certeza de que o tempo parou e não há mais nada no mundo além de você e sua companheira.

De repente, meu telefone toca e me lembra do mundo lá fora (todo mundo sabe como é chato isso), e paro para atender: era meu amigo, que estava tentando me seguir com o meu Maxima, e tinha ficado para trás e se perdido. Estava visivelmente irritado, achando que estava muito rápido... Ciúmes totalmente compreensível.

Bem, meninos, acho que vocês entenderam. Para resumir a história, mandei meu amigo para sua casa de Maxima a contragosto, para passar o fim de semana com o Alfa, e ainda estou dolorido e cansado de tanto dirigir. Cansado, mas feliz. Feliz, satisfeito, exaurido. Como quando passamos um fim de semana íntimo com uma nova paixão. De volta a meu ar condicionado e isolado sedã japonês, a vida nunca seria mais a mesma.

E olhem só: nem liguei o ar condicionado do Alfa, e só me lembrei dele agora! Mas também, e daí? Ar condicionado, rádio...tudo isso é supérfluo neste carro, que já é um parque de diversão completo sozinho. Nem me lembro se ele tinha equipamento de som...

O 911 italiano


Então, a conclusão é que realmente há um motivo de tanto falatório sobre Alfas, e este motivo é amor, que desanda inevitavelmente para muito sexo. Mas por que, fazendo carros tão fantásticos, a empresa não dominou o mundo?

Muitos diriam que é por causa de confiabilidade. Mas tirando a ferrugem, um problema bem conhecido, todos os donos de carros derivados do Giulia que conheço só têm boas coisas a dizer da mecânica, que é basicamente bem robusta. Mas é verdade que, quando quebram, dão trabalho para consertar.

Mas a Alfa abandonou cedo o conceito do Giulia, e em 1972 lançou o Alfetta com câmbio traseiro, e dele derivou um novo GTV. Minha impressão é que se perderam; lançaram depois os Alfasud (tração dianteira, 4 cilindros contrapostos) e o Alfa 6, e sua qualidade e confiabilidade, aí sim, decaíram sensivelmente, lançando a empresa, que era estatal,, em uma espiral de problemas que a levou a ser absorvida pela Fiat.

O GTV era um concorrente direto do Porsche 911 em sua época. Tinha um tamanho próximo, eram ambos 2+2, e o deslocamento do motor é semelhante. Mas a Porsche desenvolveu o seu conceito básico até 1998, e ainda até hoje ainda faz evoluções deste carro.

Tendo dirigido o GTV, tenho a dizer que se a Alfa deixasse a sanha de inovar sempre de lado, e tivesse agido como a Porsche, hoje ela dominaria o mundo. Um GTV moderno, evoluindo até o desenho genial de Giugiaro, seria hoje tão icônico quanto o alemão. O GTV não deve nada em prazer ao volante em relação a um 911 contemporâneo. São coisas totalmente diferentes, mas completamente apaixonantes e carismáticas.

MAO