google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014): Alfetta
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CENT´ANNI DI ALFA ROMEO
Por José Rezende Mahar

Desde sempre, a emoção de dirigir com brio foi vital à marca do Biscione, a cobra que simboliza Milano.


O coração esportivo da Anonima Lombarda Fabbrica Automobili começou a bater em 24 de junho de 1910. Nasceu das cinzas de uma frustrada tentativa de Alexandre Darracq, um dos grandes fabricantes daqueles primórdios do automóvel na França, de montar seus carros em solo italiano para evitar o pagamento de altas taxas de importação. Só que o público comprador local achava os Darracq sem espírito de luta - e o modelo francês encalhou nas vendas apesar de sua alta qualidade.

Foi assim que, naquele 1914, o grupo de investidores liderados pelo Cavaliere Ugo Stella se separou de Darracq e decidiu fazer um automóvel próprio, contratando para tanto Giuseppe Merosi, primeiro dos grandes projetistas que foram a alma da marca ao longo deste glorioso centenário.

Merosi criou uma série de carros leves e velozes capitaneados pelo Alfa 24 HP (a denominação que se referia à categoria fiscal calculada sobre a cilindrada do motor). E foi aí que começou a fama, a lenda e o mito do CUORE SPORTIVO, a essência esportiva da marca. Logo começou a participação em competições, com uma bela participação na Targa Florio de 1911.

ALFA 24 HP (1910)

E desse jeito foi até 1915, quando a I Guerra Mundial interferiu na história da marca. Um napolitano chamado Nicola Romeo, que produzia armas e equipamentos militares no bairro de Portello, mesmo bairro de Milão onde estava a sede da Alfa, entrou na sociedade acionária. Em apenas três anos, ele assumiu o controle da companhia, que foi rebatizada de Alfa Romeo. A guerra trouxe contratos militares lucrativos e a fábrica cresceu muito, só retornando aos automóveis em 1920.

O primeiro modelo com o nome Alfa Romeo foi o 20/30 HP. Foi com um destes que o piloto Enzo Ferrari (que, mais adiante, se revelaria como chefe de equipe) chegou em segundo lugar na prova de estrada Targa Florio.

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Merosi continuava a ser o engenheiro de automóveis (como o vitorioso RL), enquanto a fábrica de Nicola Romeo fazia armas, motores aeronáuticos e equipamentos militares a pleno vapor. E o jovem Ferrari tinha opiniões fortes - entre elas, de que Merosi estava velho e desatualizado.

Foi então que Ferrari conseguiu convencer Vittorio Jano a deixar de ser o projetista de carros de corrida da Fiat para entrar no time da Alfa Romeo. De cara, o Alfa P2, criação inicial de Jano na nova casa, foi vencedor do primeiro campeonato mundial de Grand Prix, em 1925 - a Fórmula 1 da época.

P2 GRAND PRIX (1924)
Outros carros do mesmo projetista foram a série imortal de veículos com duplo comando de válvulas, que ia do 6C 1500, ao 1750 e ao 2000, mais os de oito cilindros em linha, o 2300 e o 2900, (estes,uniam dois blocos de quatro cilindros pelo meio). Com câmara de combustão hemisférica, vela central e as válvulas em ângulos de 90 graus, estava feita a marca da Alfa na tecnologia e nos motores potentes e confiáveis.

ALFA ROMEO 6C 1500 SUPER SPORT (1928)
Esses carros eram os Ferrari de seu tempo - quando Enzo não passava de capo della squadra corse (chefe da equipe de competição) e ainda não era um ícone italiano. Ele provou ser melhor como chefe da equipe do que ao volante dos carros.

Voltando a 1928, os contratos militares acabaram e, com eles, o interesse de Nicola Romeo na marca, que foi definhando até 1932. Foi quando o primeiro-ministro Benito Mussolini resolveu fazer da Alfa Romeo um símbolo italiano e ordenou ao IRI, o Istituto di Ricostruzione Industriale (um BNDES deles) que assumisse o controle acionário e mantivesse a fábrica funcionando.

Aí começou o período de ouro da marca, com carros velocíssimos como o Alfa 8C 2900 de rua que, em suas confecções Touring, bem leves, rendia 220 cv e superava os 200 km/h - algo do outro mundo para os padrões de então.


8C 2900 A (1935 A 1937)

8C 2900 LE MANS (1938)

Nas pistas, o problema eram as verbas do amigo de Mussolini na Alemanha: Hitler proveu a Mercedes-Benz e a Auto Union com caminhões de dinheiro e gerou monstros inalcançáveis, mesmo com a pilotagem heróica de Tazio Nuvolari como no GP de Tripoli, por exemplo. Mas foram dessa época os gloriosos 8C 2900 Tipo 35 de corrida e os primeiros Alfetta Tipo 158, monopostos destinados a muitas glórias já no pós-guerra.

TIPO 158 ALFETTA (1938 A 1940)
Como adendo deve-se registrar que alguns carros, principalmente do tipo 6C 2500, foram produzidos a conta-gotas durante a guerra, no meio de material militar como os motores Daimler-Benz DB 601 – era o V-12 usado em caças como o italiano Macchi Mc202 Folgore e o alemão Messerschmitt Bf-109.

O PÓS-GUERRA

O cenário mudou muito após a Segunda Guerra Mundial. A fábrica lombarda, que de anônima nessa altura não tinha nada, lutou para sair da inércia que a destruição pelos bombardeios aliados causou. O Plano Marshall ajudou muito a reconstrução industrial da Itália e, em 1948, foi relançado o modelo mais simples da linha Alfa Romeo pré-guerra, o 6C 2500. Sempre com carrocerias feitas à mão em encarroçadores de automóveis de luxo, logo ficou claro que esses carros não eram o que o mercado podia pagar. Foi aí que chegou Orazio Satta Puliga, o terceiro gênio da marca, que conduziria a Alfa até os anos 70.

Os Alfetta 158 e 159 de antes da guerra mostraram que ainda tinham potencial. Com motores supercomprimidos, rendiam até 400 cv e venceram, em 1950, o primeiro campeonato da Fórmula 1 moderna nas mãos de Giuseppe Farina. A vitória foi repetida em 1951, mas com Juan Manuel Fangio.

TIPO ALFETTA 159 (1951)
Orazio Satta idealizou um veículo que teve muito a ver conosco: o Alfa 1900. Até então, os modelos da marca tinham chassis vestidos por carrozzieri externos. Já o 1900 foi o primeiro Alfa Romeo a ser totalmente fabricado e ter sua carroceria estampada e montada na fábrica de Portello.

1900 BERLINA (1950 A 1958)
Mesmo com valores mais contidos, ainda mantinha o Cuore Sportivo Seu motor de 1.884 cm³ rendia 90 cv - em um tempo onde a concorrência nessa faixa de cilindrada alcançava, se muito, 60 cv. Sua plataforma era concebida de forma que permitisse facilmente a montagem de carrocerias alternativas, iniciativa que favoreceu o nascimento de criações memoráveis da Pininfarina e da Touring.

O 1900 foi aumentando em potência, compressão e cilindrada até chegar aos dois litros e a mais de 130 cv, com os tradicionais carburadores Weber duplos e horizontais e a caixa de cinco marchas. Um câmbio com ”tantas marchas” assim era algo inaudito na época e servia para aliviar o motor nas autoestradas italianas.

Mas o modelo saiu de linha em 1957, quando seus estampos de carroceria e as partes de suspensão foram vendidas para a Indústrias Kaiser de Argentina, prima em 1º grau da nossa Willys-Overland. Assim, a IKA fabricou o Bergantín – com roupa de Alfa 1900 e, que tristeza, motor de quatro cilindros e válvulas laterais de Jeep Willys.

Já havia a percepção de que a Alfa precisava de um carro ainda menor e mais leve. Por isso, em 1954, nasceu o Giulietta. Dotado de um motor totalmente novo, com bloco e cabeçote de alumínio, o modelo deu origem a uma extensa linhagem que sobreviveria até 1993. Foi no Alfa Spider, aliás, que esse motor tornou-se um dos primeiros do mundo a ter comando de válvulas variável, na década de 80.

GIULIETTA SPIDER (1955 A 1962)

O Giulietta foi lançado inicialmente no modelo Berlina (sedã de quatro portas) e, posteriormente gerou o Spider e o Coupé, todos no começo com motor 1300 de 65 cv e carburador vertical duplo Solex. Os primeiros tinham a alavanca de câmbio na coluna, com cinco marchas - embora logo a alma esportiva se manifestasse e fosse oferecido o câmbio de cinco marchas no assoalho.

Foi nessa época que nasceu também o Alfa 2000 Berlina. Sucessor do 1900, tinha motor de quatro cilindros, 1.975 cm³ e 95 cv, sempre com cinco marchas. Conforme a tradição da marca, a plataforma se prestava a fáceis adaptações, de forma que foram oferecidas de fábrica versões Coupé e Spider. O 2000 Berlina foi fabricado na Itália de 1957 a 1961, quando foi substituído pelo 2600. Este tinha motor de seis cilindros e bloco de alumínio, saindo também em versões esportivas.

2600 SPIDER (1962 A 1965)
Mas foi a série 105 – batizada de Giulia – a obra imortal de Orazio Satta. Fabricada em inúmeras variações, que iam desde os cupês GTA alleggeritas, aliviadas, de alumínio, até os belíssimos TZ da Zagato. O Giulia Super foi um triunfo da estética aliada à aerodinâmica. As primeiras séries tinham o motor de 1.590 cm³ e 98 cv com carburador duplo vertical Solex - mas como era tradicional, logo foram oferecidas versões com dupla Weber 40 horizontal (para rua) e até Weber 48 (para pistas).

O Giulia foi pioneiro no uso de freios a disco nas quatro rodas, vaso de expansão do radiador feito de plástico e a ter coeficiente de arrasto aerodinâmico de 0,31 - tudo isso em 1962 e com aquela frente quadrada, prova de que Orazio Satta era um deus da engenharia.

GIULIA BERLINA (1962 A 1978)
GIULIA BERLINA (1962 A 1978)
GIULIA TZ 2 (1965)
Para o Montreal, Orazio Satta bolou um V-8, dois motores de Giulia 1300 em um só cárter e com um virabrequim, exatamente o irmão do Alfa Romeo 33 Stradale. Tinha 2.600 cm³, 197 cv e andava bem, com um som de virabrequim americano cruzado, mas inconfundível. A caixa era de cinco marchas, porém ZF para aguentar o torque do motor, e tinha a primeira para fora do "H" e para trás. O diferencial era autobloqueante e a carroceria foi desenhada por Marcello Gandini, que trabalhou para a Bertone no Lamborghini Miura. Foi fabricado de 1970 a 1977. No Brasil foi imortalizado numa novela da TV Globo como o carro do Diabo.

MONTREAL (1970 A 1977)
O primeiro carro de tração dianteira da marca foi o Alfasud (1971-1989), com motor de quatro cilindros boxer. Projetado por Rudolf Hruska, um checoslovaco também genial, era produzido numa nova fábrica em Pomigliano d´Arco, no sul da Itália próximo a Nápoles.

ALFASUD 1.2 (1971 A 1965)
Enquanto isso, esporte-protótipos Alfa da série 33 TT iam ganhando várias provas de longa duração entre 1967 e 1977, enfrentando bólidos como Porsche 917 e Ferrari 512S. Já na Fórmula 1, a marca atuava como fornecedora de motores para as equipes da qualidade da Brabham, que alcançou o vice-campeonato de 1978. A Alfa retornou como scuderia entre 1979 e 1985, mas sem grande êxito.

33 TT

Com os carros de rua, o último brilho da Alfa como marca independente foi o Alfetta (1972-1984). Eram carros muito sofisticados: tinham motores de comando eletronicamente variável e usavam câmbio no eixo traseiro (o que lhes dava 50/50 de distribuição de peso). Em uma de suas versões, o Alfetta apresentou o último motor de concepção pura Alfa Romeo: o V-6 de 2,5 litros e 160 cv. Nos subsequentes Alfa 75 e 90, sedãs dos anos 80, esta mecânica chegou a ser oferecida com três litros, quatro comandos de válvulas e 210 cv.

ALFETTA 1972
Esse motor V-6 foi a ponte para os carros produzidos sob a égide da Fiat – que comprou a Alfa Romeo do governo italiano em 1986 (e salvou a empresa de apuros financeiros). Nesta época que foi projetado o164, um sedã que tinha monobloco desenvolvido conjuntamente com as marcas Saab, Fiat e Lancia.

Dessa sinergia nasceram os carros Saab 9000, Fiat Croma, Lancia Thema e Alfa 164 – todos tinham tração dianteira, introduzindo a Alfa na fase moderna, com sua primeira carroceria projetada em computador.

Dái em frente foi a era moderna das duras realidades do obrigatório controle de custos levou ao projeto do 155, irmão do Fiat Tempra, sempre com um perfume esportivo diferente, e finalmente aos 145 e 146. Carros do setor dos pequenos que vieram para substituir os Alfettas.

Posteriormente foram elaborados o 156, um carro de tração dianteira e grande sucesso, com sensações incríveis tanto nos modelos de quatro cilindros em linha e dupla ignição como nos GTA, quanto nas versões equipadas com o último cantor, o Pavarotti mecânico que é o 3 litros DOHC V-6. Esse motor também equipou o grande 166 e os atuais 159, inclusive em versões 4x4.

Nos tempos atuais há o mítico Mi.To., cujo nome evoca uma estrada famosa na Itália, os cento e poucos quilômetros que ligam Milano a Torino, as duas cidades-chave da marca. Além do novo Giulietta.


ALFA NO BRASIL

A Alfa Romeo foi a empresa escolhida pelo governo brasileiro para ceder a patente dos caminhões 9.500 (e posteriormente dos 11.000) para a Fábrica Nacional de Motores, estatal estabelecida em Xerém, bairro de Duque de Caxias, RJ no sopé da Serra de Petrópolis.

A FNM fora constituída na Segunda Guerra Mundial para produzir motores de avião militar da Pratt & Whitney e depois fez geladeiras e eletrodomésticos. Começou a fabricar veículos com uma série de cem caminhões Isotta-Fraschini mas, pelas precárias condições da Isotta, o governo teve de escolher outro parceiro.

Em 1958, foi estabelecido que, além dos robustos caminhões Alfa Romeo, a FNM faria também um sedã da marca italiana – mais precisamente o Berlina 2000. Seu lançamento se deu em abril de 1960, junto com a inauguração de Brasília e o carro foi batizado de FNM 2000 JK.

FNM 2000 JK
Com duplo comando de válvulas no cabeçote, 95 cv, cinco marchas e pneus radiais, era um dos veículos mais modernos e rápidos por aqui, alcançando mais de 160 km/h. Mesmo com o golpe militar de 1964 (quando “cassaram” o nome JK), o caríssimo sedã FNM continuou a dar crias.

Em 1966, foi elaborada uma variante conhecida por TIMB, ou Turismo Internacional Modelo Brasil. Tinha frente rebaixada e um motor mais esperto, com maior taxa de compressão. Daí resultou, em 1969, o modelo 2150 – era uma espécie de JK mais elaborado que podia vir com bancos individuais e alavanca de câmbio no assoalho, como o TIMB. Houve ainda o cupê Onça, de plástico reforçado com fibra de vidro, que teve menos de dez unidades produzidas.

Onça
A esta altura, a FNM fora privatizada e vendida à matriz italiana da Alfa Romeo. Um novo modelo foi desenvolvido sobre a plataforma que vinha desde os tempos do JK. Assim nasceu o luxuoso Alfa Romeo 2300, um sedã fabricado exclusivamente no Brasil a partir de 1974.

Nesta época foi considerada seriamente a produção do Alfasud no Brasil mas um acidente de estrada matou os engenheiros italianos que coordenavam o processo.

Querendo produzir caminhões, a Fiat comprou a Alfa Romeo no Brasil em 1978 – oito anos antes de assumir a empresa na Itália. Fabricação do modelo 2300 (depois rebatizado de TI) foi transferida para Betim e a linha permaneceu em atividade até 1986, quando mostrou-se definitivamente antieconômica.
2300 TI

Só com a reabertura das importações, em 1990, é que carros Alfa Romeo – como os modelos 164 e 156 - voltaram ao país, trazidos da Itália.

"Senza cuore sportivo saremmo solo macchine..."

JMR


Outro dia, há algum tempo já, convenci Egan Sr. a largarmos um dia de trabalho para ir atrás de dois carros de que tínhamos ouvido falar, que estavam no Rio de Janeiro.

A proposta era boa, inicialmente. A pista indicava que eram duas Alfa Romeos, uma Alfetta "esportiva" e uma GT 1967. Ambas quase prontas e as duas pelo preço de uma. Ligamos para o dito dono dos carros. Ele confirmou, dizendo que estavam na oficina de um amigo e poderia buscar-nos no aeroporto e levar-nos lá para ver os carros. Eram dois mesmo, uma Alfetta, "esportivíssima, parecida com uma Ferrari, com o câmbio e diferencial lá atrás e tudo, quase pronta, faltando umas coisinhas pra sair da oficina", e uma GT 1967 "lindo, mas com motor de Opala 4 cilindros; eu tenho o câmbio original, vai junto, só precisa achar um motor por aí em São Paulo. E, ah!, ia esquecendo! Tenho um monte de peças de Alfa, elas vão junto no negócio!". E sim, o preço era bom. Compramos as passagens da ponte aérea para o dia seguinte e lá fomos nós.

O vôo, previsto para decolar às 8h30, levantou vôo às 10h45; chegamos ao RJ com um belo atraso e nosso anfitrião ainda não tinha chegado ao aeroporto. Aquilo já começou a cheirar mal, mas poxa, duas Alfinhas, uma para cada Egan? De repente, um senhor de idade, cambaleante, veio em nossa direção, perguntando "Seu Egan? Sou eu, o João (nome trocado, obviamente). Vamos lá?" Seguimos o velhinho, que entrou em dois (sim, dois) táxis errados antes de encontrar aquele que o tinha trazido ao aeroporto. Na saída, o taxista e "seu" João discutiram e perderam alguma saída importante, e caímos na ponte Rio-Niterói.

Maravilha, já que o tempo já seria escasso sem erros de trajeto. Pedágio no final da ponte, perguntamos como retornar, ouvimos as instruções, mas, obviamente, o taxista errou mais uma vez e perdemos o retorno. Cutuquei o cotovelo de Egan Sr. e lhe falei, "Pai, essa viagem será inesquecível..." O taxista então pára para pedir informações na beira da estrada, e, do nada, o homem para quem perguntamos responde sem pestanejar: "Estão indo ao Rio? Pô, merrmão, deixa eu ir com vocês (enquanto ele dizia isso, esticou a mão pra dentro do carro, destravou a porta e entrou) que eu explico o caminho e vocês me deixam na saída da ponte, ok?"

Naquele momento, pensei que Alfa nenhuma valia aquilo. Paulistanos temem o Rio como cariocas temem São Paulo e não era nada confortável a situação. Mas, já estávamos lá e não tínhamos muita volta naquela hora, então...

Long story short, deixamos o caroneiro no final da ponte, o taxista se entendeu com "seu" João e chegamos a um bairro longínquo da periferia do Rio. "Seu" João, agora mais certo do que fazia, dizia, confiante, a cada esquina "Direita! Esquerda aqui! Direita no final da rua! Esquerda ali, depois da Brasilia parada! Esquerda de novo! Ué, não tinha esse semáforo aqui... dá marcha ré que erramos!" Ao que o taxista respondeu prontamente, atravessando o carro no meio da rua para retornar, sem prestar respeito a nenhum dos dois ônibus que vinham um em cada sentido... "Seu" João, ainda sem se dar conta da situação, gritou: "É aquela oficina ali!" -- e paramos o carro e entramos.

"Seu" João entrou perguntando pelo José (ou qualquer outro nome genérico) e os funcionários da oficina reponderam prontamente "Aqui não tem nenhum José." E "seu" João, coçando a cabeça, sem entender, se lembrou que na verdade a oficina era a outra, vizinha de parede. E finalmente chegamos aos carros.

Entramos, eu e Egan Sr., nos espremendo entre vários carros, até chegar a uma Alfa 2300 completamente desmontado, onde o "seu" João parou e disse "Veja só a minha Alfetta, que bela - tá vendo, só falta umas coisinhas pra sair com ela...". Bom, era uma Alfetta sim. Mas não era nenhuma "Alfetta esportiva", não, era o feio sedã cujo feio desenho foi copiado para a nossa 2300, brasileira. E realmente só faltava uma coisa para terminar o carro: o interior. Inteiro.

Decepcionado ao extremo, pensei em esganar o "seu" João ali, na hora, naquela oficininha boca-de-porco na periferia carioca. Respirei fundo, mas pensei na GT 67 e nas peças que, segundo "seu" João, lotavam sua casa e eram motivo de ódio de sua esposa. Ainda poderia haver algo ali.

Seguimos mais em frente na oficina, embrenhando-nos entre carros que lembravam experiências do Dr. Moreau, feitos sem nenhum dó, nem recurso. E lá, no fundo da oficina, rodeada pelo mato já alto, estava a bela carroceria step-nose de uma GT 1967. Ao relento. Sobre UM ÚNICO cavalete (apoiando um braço da suspensão dianteira esquerda) e as rodas traseiras.

Olhei para Egan Sr. e no silêncio que fizemos um observador atento poderia ouvir a Alfa enferrujando. Tomado pelo ódio, revirei as peças e constatei que o câmbio original estava lá. Só que no chão. E com um rombo na carcaça do tamanho de uma moeda de um real (para quem nunca viu uma caixa de câmbio de uma Alfa do período, isso é mais ou menos um quinto da área lateral da caixa). Abri o capô e vi o maldito iron duke, mal e porcamente adaptado. As portas obviamente não abriam, e se abrissem não fechariam mais, mas o interior, apesar de em péssimo estado, era completo.

Ainda tentamos olhar com atenção para ver se algo ali se salvava e ainda tivemos coragem de mandar um oferta por tudo aquilo. Não chegava a 20% da pedida de "seu" João, mas era uma oferta. Ele obviamente não topou e então entramos no táxi. Ele fez questão de mostrar ainda "o lote imenso de peças que ele tinha guardado em casa e "que minha mulher vive reclamando por que não consegue andar em casa". Como era caminho do aeroporto, fomos lá.

No elevador antigo que nos levou ao apartamento, a ansiedade por encontrar aquele carburador Weber perdido, esperando um dono, só crescia. Entramos na casa, empoeirada e fedendo a mofo e maresia e, da porta, "seu" João apontou um pára-brisa de GTV apoiado na parede: "Olha ali todas as peças! Vocês vão adorar!".

Sim, senhores, o "lote de peças" era simplesmente um pára-brisa e três gavetas de peças miúdas debaixo de uma mesa. Dois ou três tipos de buchas de suspensão, lanternas de Alfas nacionais, condensadores e cabos de vela, mas nada mais. Nada de interessante. Eu, já nervoso, falei a Egan Sr. na frente do "seu" João: "Pai, vamos embora que não tem nada aqui..." e fui interrompido pelo "seu" João, que disse: "Calma, eu vou lá dentro pegar os meus carburadores para a gente fazer negócio com eles também"...

Ele trouxe para a sala um belo jogo de Webers 40 horizontais, perfeitos para a Alfa GTV 2000 que Egan Sr. tinha à época. Perfeitos, completos e ideais. "Vou fazer deles um abajur, que tal? Não é uma ótima idéia?", perguntou "seu" João, que emendou: " A não ser que vocês queiram eles também. Vocês me levam os carros pelo meu preço e com só 5 mil reais a mais vocês levam essa preciosidade para casa..."

Egan Sr. disse então umas verdades ao "seu" João e fomos embora do apartamento. Ao nos despedirmos e entrarmos no táxi para o aeroporto, "seu" João ainda soltou: "Como vamos fazer com o custo do dia do taxista? aqui metade do dinheiro, o resto vocês completam, ok?"