O Paulo Keller perguntou a todos qual foi o carro que irremediavelmente comprometeu nossos cérebros ao ponto da mania por automóveis não ter mais cura. Isso é bem típico do Paulo, eu me recordo de uma vez em que ele pediu a todos nós aqui do blog para que fizéssemos uma retrospectiva dos carros e experiências automotivas que mais nos marcaram.
Assim como o Paulo, cresci rodeado de Matchbox, daqueles antigos mesmo, que você podia pisar em cima ou atirar na cabeça do irmão mais novo sem que ele se quebrasse (esses Matchbox novos são um desgosto para mim). Isso no meu mundinho pequeno de quintais e playgrounds. No mundo de gente grande eu curtia os VW Passat: meu pai tinha um LS azul metálico e meu tio Luís tinha um TS amarelo, morria de paixão pelos dois carros. Mas não foi o Passat que me tornou um entusiasta.
Não me lembro ao certo em qual dos Passats isso ocorreu, mas foi pela janela traseira de um deles que eu vi o carro que persegue meus sonhos até hoje. O carro que realmente tocou meu coração, que virou meu cérebro do avesso: o Mercedes W116 (1972 - 1980).
Eu lembro muito bem que eu ficava doido quando via um deles na rua. Não podia nem ver a estrela de 3 pontas em cima do capô que já ficava louco. Meu pai logo percebeu o meu alvoroço por Mercedes e já foi tentando me desanimar: "Esquece isso filho, isso é carro de embaixada. Além de ser caro, muito caro."
Mas de nada adiantava meu pai falar, os anos passavam e eu cada vez mais doido em Mercedes. Era difícil achar miniaturas do W116 e eu tinha que me contentar com miniaturas dos Mercedes R107 (a SL/SLC de 1971 a 1989). Um vizinho do condomínio percebeu o fascínio que eu tinha pelos Mercedes e comentou: "Todo ano eu vou visitar minha família no Líbano, em Beirute Mercedes é igual Fusca aqui no Brasil."
Não demorou muito e encontrei uma oficina em São Bernardo do Campo que só trabalhava com Mercedes. Pra mim era como se fosse um paraíso: Mercedes de todos os anos, todos os modelos, todos os motores e todos os tipos de acabamento imagináveis.
Em pouco tempo fiz amizade com o pessoal da oficina e pude conhecer aquela atmosfera típica dos Mercedes mais antigos: o rádio Becker, o cheiro do interior, o volante enorme, detalhes íntimos dos motores, transmissões, suspensões, freios... Até detalhezinhos bestas me encantavam, como o "Made in West Germany" gravado em todas as pecinhas.
O dono da oficina, Marcos, já me dava as dicas: "Os mais fáceis de se manter são os 280 de seis cilindros, pois vieram em grandes quantidades para cá, existe até desmanche especializado em Mercedes. E a maioria usa carburador, é difícil trabalhar com as injeções Bosch Jetronic dos motores V8."
Marcos falava por experiência própria: era o feliz proprietário de um 350 SEL com câmbio automático e rodas BBS RS de aro 16, uma coisa de maluco naquela época. O ronco do V8 nos kickdowns era indescritível, mesmo sendo o menor motor V8 da linha. Eu sonhava mesmo era com o 450 SEL 6.9, de preferência em uma autobahn alemã, para explorar todo o potencial dos 282 hp.
Em meados dos anos 90 o Marcos ficou sabendo de um leilão da Receita Federal, com vários Mercedes apreendidos. Os carros estavam em exposição em um galpão em São Paulo e lá fomos nós dar uma olhada no que estava sendo oferecido. Tinha Mercedes de tudo quanto é jeito, mas eu gamei mesmo foi num 350 SE azul, com câmbio manual de 4 marchas.
Infelizmente o Mercedes foi arrematado por um lance muito acima do que eu poderia bancar. O Marcos fechou a oficina há alguns anos e já faz um bom tempo que os W116 não são vistos pelas ruas com frequência. Vez ou outra vejo um rodando por aí, momento em que faço questão de parar ao lado no primeiro farol fechado, só para cumprimentar o proprietário.
O Mercedes W116 apareceu em diversos filmes, mas creio que sua aparição mais memorável foi em Ronin, de 1998. Jean Reno aparece no filme usando e abusando da suspensão hidropneumática do 450 SEL 6.9 e dos pneus 215/70 HR 14 (estamos falando dos anos 70!).
Essa atmosfera dos Mercedes antigos é uma coisa que não existe mais em Mercedes nenhum. O Mercedes W126 (sucessor do W116, fabricado até 1991) conseguiu manter boa parte da aura do W116, mas acabou ali. Há exatamente 18 anos Mercedes não tem mais cheiro de Mercedes , tem é um cheiro esquisito de plástico e coisas menos refinadas.
Acabou-se aquele pedaço setentista de Sindelfingen que vinha como equipamento de série em todos os W116, tão bom quanto ouvir Bert Kaempfert no velho rádio Becker. Os Mercedes mais novos se parecem mais com Kraftwerk tocando em um Ipod: continuam bons, mas jamais serão o que foram nos anos 70.
Acabou-se aquele pedaço setentista de Sindelfingen que vinha como equipamento de série em todos os W116, tão bom quanto ouvir Bert Kaempfert no velho rádio Becker. Os Mercedes mais novos se parecem mais com Kraftwerk tocando em um Ipod: continuam bons, mas jamais serão o que foram nos anos 70.
FB,
ResponderExcluirmexi em algumas com 6 e andei um pouco numa 450 6.9. Nunca imaginei que um carro europeu fosse verdadeiramente torcudo e bom de andar, esse era. Uma fez fizeram um comparativo de uma 6.9 com um Plymouth 440 do mesmo ano, ambos novos. Acho que ficraia com o Plymouth.
Somos dois!
ResponderExcluirComo comentei no post do Paulo Keller, este Classe S foi o que terminou de sedimentar minha paixão por automóveis.
Até hoje, a frente do modelo me deixa louco. Existe nele uma mistura de elegância germânica e refino técnico, ainda difícil de se ver.
E por falar em "carro de embaixada", próximo à minha casa, havia um verde, acho que era um 280 SE, com placas do Corpo Consular.
Absolutamente lindo, o carro foi trocado, bem depois, por um 190 E...
Sds,
Der Wolff
AG
ResponderExcluirEstá cada vez mais difícil manter esses W116, pois você sabe o quanto custa essas pecinhas novas.
Solução? SBC neles ué.
FB
Eu não consigo identificar bem modelos Mercedes das décadas anteriores a 90, mas eu acho que tem um desses aí pra vender aqui em João Pessoa, PB. Eu passo por ele toda noite quando vou buscar a minha irmã. Acho que é ele porque não parece ser um modelo dos anos 80 e pelo porte avantajado. Vou ver se paro pra dar uma olhada de perto agora quando sair agora a tarde.
ResponderExcluirDer Wolff
ResponderExcluirImagine você o abismo da "baleia" W116 para as dimensões enxutas da 190E.
FB
Felipe, tem razão.
ResponderExcluirPor mais interessante que fosse o 190E, eu, mesmo ainda moleque na época, considerava aquela troca como meio incoerente.
Há algum tempo, vi um W116 deixando a fase de abandono mecânico (ainda portava placas amarelas) numa oficina do RJ.
Fiquei com vontade de ir lá saber mais...
Sds,
Der Wolff
Bitu,
ResponderExcluirUm primo comprou um 350 S 1974 em 1998 por R$ 7.000. Estava sobre cavaletes, motor travado. Lindo, BRG com estofamento bege médio, teto solar elétrico de aço. Gastou R$ 8.000 e ficou tremendo carro por R$ 15.000. Um 1-litro zero-km típico custava em torno de R$ 22 mil. O automático é de três marchas. Usa o carro no dia-a-dia, perfeito.
Bob
ResponderExcluirSim, hoje é possível encontrar vários deles em razoável estado por preços não tão altos, a fama de manutenção cara ainda derruba um pouco os preços.
O W116 foi a última obra de Uhlenhaut. Acho que não gaveria carro melhor para encerrar uma carreira.
FB
Esses alemães...
ResponderExcluirQue texto Bitu parabéns!
Mercedes é show mesmo. Comecei a gostar da Classe S (especificamente a W116 também) quando assisti ao filme "007 - Somente para seus olhos"; épica a cena do bandido fugindo num exemplar prata, que infelizmente acaba destruído num penhasco. Mas foi por causa daquele exemplar que eu comecei a gostar mais de carros antigos (e Mercedes antigas tb, óbvio xD). Depois vieram outros filmes para fazer eu me apaixonar ainda mais pelo carro: Ronin (como você mencionou), O Pacificador (aí já era a geração W140, mas continuava imponente, belo exemplar prata blindado, aguenta muita bronca no filme). Outro dia, vi um 6.9 aqui perto de casa. Tive a chance de conversar com o dono rapidamente, ele tem outros exemplares (sendo que só vi 1: um 300D 1981). Atualmente, meu sonho em Merças é uma 300D Turbo W123, 1985 mais ou menos, dos últimos anos. O OM-617 continua como um dos motores mais duráveis fabricados até hoje. =)
ResponderExcluirFora que é um carro de vanguarda: como o Jeremy Clarkson afirma no teste da nova Classe S, tudo que os carros terão num prazo de aproximadamente 10 anos já pode ser encontrado nela. Exemplo: foi o primeiro carro com sistema de navegação por satélite, ABS, air-bag...os 2 últimos ainda nos anos 70 eu acho...
ResponderExcluirEsses Mercedes da série W116 são realmente muito bonitos e com personalidade. O ronco dos modelos V8 é de arrasar. Tenho uma miniatura vermelha de um modelo 350 SEL (acho...), escala próximo de 1:43, fabricada pela finada Brinquedos Rei.
ResponderExcluirNo filme Ronin dá dó de ver o que fazem com um belo exemplar 450 SEL 6.9...
Eu andei um bocado nelas na década de 70, um tio teve algumas. Acostumado a Opalas, era um mundo de diferença. Ar condicionado, silêncio total, suspensão macia (mas carro bom de curva), bancos de couro 'furadinho', sonzão do radio Becker.
ResponderExcluirSensacional mesmo.
ResponderExcluirUm tio meu teve uma 350 SEL branca, couro vermelho, teto elétrico... Ficava ao lado de um Mustang fastback do início dos anos 70 e um Maveco GT.
Fazia Rio - BH que nem sentíamos. O Mustangão era um bonde perto dela e o Maveco, coitado, era pro meu tio esmerilhar mesmo...
Ronin é onde rola a melhor perseguição de carros das telas, considero melhor até que Bullit. O S8 arrancando com as 4 rodas jogando terra pra cima, o Mercedão fazendo bonito contra os Citroen e Peugeot, o M5 na contra-mão...
Minha paixão MB é a 450SEL 6.9
ResponderExcluirSempre que falam em Mercedes, eu penso nela.
Muito bacana o texto, Bitu!
ResponderExcluirE sem dúvida é um belo carro. A marca da estrela pisou pouquissimas vezes na bola...
Abraço
Petardo de texto, Mr. Bitu!
ResponderExcluirO final foi acachapante: Kraftwerk num iPod.
Foi por essas e outras que trouxe um LP 7' Taschenrechner comprado numa feira de antiguidades em Berlin.
Entre essas e outras perdemos a essência das coisas na dinâmica da modernidade.
Os vinis viraram CDs, os CDs viraram iPods, o cheiro virou de plástico e o "Made in West Germany" virou "Made in China".
Here we go...
Dirigir um W116 (ou mesmo um W126) numa Autobahn, ouvindo Kraftwerk... Deve ser uma ótima sensação.
ResponderExcluirSds,
Der Wolff
É, esses Mercedes são mesmo fantásticos. Entre 1997 e 1999, morei em São Paulo e, como meu apartamento era próximo ao local de trabalho (ambos na Av. Paulista), eu frequentemente ia e voltava a pé. Numa dessas ocasiões, a caminho do trabalho, passei pela saída da garagem de um banco e havia uma 450 SEL prata entrando na avenida. Passei por trás dela e prestei atenção no som do escapamento: a marcha lenta, baixa e grave, não era muito típica das Mercedes, mais parecendo um Scania. Só fui entender quando vi o logotipo "6.9" na tampa do porta-malas.
ResponderExcluirGostei do blog.
ResponderExcluirSou Brasileiro e vivo em Portugal.
Durante a minha infância no RJ, raramente via um mercedes, mas quando decidi vir para Portugal no inicio dos anos 90 á procura de melhores oportunidades, fiquei maravilhado. Todos os táxis aqui eram mercedes.
Quando entrei num á primeira vez, parecia um tanque de guerra, os 240d e os 300d pesam mais de 1600kg, velocidades entre os 160 aos 180 KM, os táxis corriam em grande velocidade em ruas estreitas que só cabem um carro de cada vez. Fiquei fascinado e assim que pude comprei um 240d que apodreceu mas o motor manteve-se impecável e acabei vendendo o motor com 700.000 Km a um taxista.
Hoje tenho um W126 300sd com 1.400.000 KM impecável de motor.
Um abraço.
http://mercedesaquiagoraesempre.blogspot.com/
Boa tarde
ResponderExcluirPrimeiramente, parabéns pelo blog!
Realmente as w116 são, na minha opinião, a melhor mercedes já fabricadas! Desde criança também sempre sonhei com uma, via uma na rua e ficava louco!!!
Já dirigi uma 190e 2.6, 280e w123 e a que tem mais figura de MB(minha opinião pessoal)é a w116!
Até que ano passado consegui realizar este sonho!!!!
Possuo uma 280s 77 branca e não pretendo trocá-la tão cedo!!!!
aqui fala Alan,
ResponderExcluirtenho uma 450 SL 78 e uma 560 SEL 87 e posso afirmar, que mesmo nas estradas do Brasil, andar de 560 SEL no tempomat e ouvindo Kraftwerk é sim uma viagem
Eu trabalho com Mercedes e sou consultor técnico do www.portalmercedes .com , realmente os MB são carros diferenciados, as W116 são excelentes automóveis e foi a minha primeira MB,uma 280S 1977 e teria outra tranquilamente ,hoje tenho uma 280S 1984 (W126) , uma 2.3 16v 1985( desempenho fantástico) ,uma W108 28S 1971 e uma C280 1997 , se manutenção de MB fosse absurdamente cara eu não teria 4 , existe meios para se ter um carro desses sem ir à falencia,abraços,Maluhy.
ResponderExcluirPara vcs se divertirem, uma 6.9 mostrando os seus dotes... http://www.youtube.com/watch?v=JPOVmvR4Vw8
ResponderExcluirConheço essa estrada...
ResponderExcluirinfelizmente meu 'Kaffer" não dá metade disso :'(
Por incrível que pareça a 2.3 16v Cosworth que eu tenho tem praticamente o mesmo handcap da 6.9 , 230 de final e 0 a 100 em 7,5s, 188cv com 1300kg,relação peso/potencia é tudo....
ResponderExcluirRealmente... falar de w116 é algo especial. Já tive várias machinas como Alfa´s e BMW´s. Hoje ando numa 528i no dia a dia. Mas posso garantir que sorriso mesmo só é possível de ser visto em meu rosto quando vou para a garagem e ligo minha 450SEL 1975 preta. Garanto: não há nada igual. Já tive e andei em outros V8 (Maveco, Galaxie, Cherokee...). A W116 é especial. Tem alma. Não sei descrever. E quem é de minha cidade (São Leopoldo/RS) tem o prazer de mer passar. Sem chance para carros zero km. Os olhares são dela. Daquela senhora negra.
ResponderExcluirPossuo uma w114 280CE 1973, ao comprar o carro em 2007 pensei comigo:
ResponderExcluir"logo logo faço uma revisão e troco o q for preciso de parte mecanica" porém minha $ acabou na época e me ví obrigado a ter de úsala como um carro p o dia a dia...
A partir daí comecei a me encantar com o carro mais e mais, eu a uso diariamente a 2 anos e meio sem ela nunca ter me deixado na mão ! Mercedes robusta como as de antigamente não se faz mais e devemos tirar o chapéu para elas !
Abs
Estava dando uma volta por aqui quando encontrei a sua página.
ResponderExcluirEu nasci no Rio de Janeiro e foi lá que vi pela primeira vez um Mercedes e era um W123. Aquele dia ficou marcado. Passado muitos anos em 1990 escolhi viver em Portugal, quando aqui cheguei, estes carros eram vulgares como o "fusca" no Brasil. Os taxis eram quase todos, W220D, W240D, W300D, não descansei enquanto não comprei o meu 240 D. andei com ele até cair de podre, o seu motor com 7000.000 Km ainda foi para um taxi. Hoje tenho um W126 300 SD de 1984 e digo mais tirando a rapidez de arrancada, não perde em nada para os carros mais novos e aonde eu chego tenho sempre muita presença.
Por isso percebo bem da paixão por essas máquinas. felicidade.
http://mercedesw126.blogspot.com/
http://mercedesclassicos.blogspot.com/