google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 "TO THINE OWNSELF BE TRUE" - AUTOentusiastas Classic (2008-2014)

"TO THINE OWNSELF BE TRUE"


Ao contrário de meu amigo VR, que já dirigiu o Mercedes 2.3-16 e é dono de um gloriosamente belo M3 de primeira geração, eu nunca dirigi nenhum dos dois. Mas nem preciso para formar opinião; li o suficiente a respeito deles durante os anos para saber exatamente como são. O meu post sobre o Mercedes na verdade saiu de mais uma incursão aos sebos paulistanos na semana passada, onde comprei um bocado de revistas americanas e inglesas que, por pura coincidência, falavam dos dois carros das mais diversas formas.

Vamos rever o que disse o VR:

“...também brilhante 190 2.3. É um carro de fato também muito bacana. Dogleg, interior que transpira esportividade. Excelente. Mas eu já guiei o 2.3 e posso afirmar que perto do M3 o Mercedes é lento. Não em velocidade, em sensação. Os engates são mais lentos, o motor pede menos para girar, a suspensão é muito mais macia. Não parece te chamar pra brincar como o M3. É um outro bicho.”

Essa é exatamente a impressão geral de todo escriba gringo que já comparou os dois. O Mercedes é menos excitante, o M3 uma festa, e aparentemente bem mais veloz.

Mas olhando-se os números de desempenho, e os tempos em pista dos dois, aprende-se muito. Apesar do M3 ser realmente mais rápido, o é por uma margem ridiculamente baixa para um carro de passeio, quase irrelevante em minha opinião. O Mercedes, como bem disse Vic, parece mais lento que o BMW.

Mas é óbvio, caro leitor. Uma das coisas que me fazem gostar mais deste carro do que os novos e poderosíssimos AMG’s modernos é o fato de que o 190E podia ser esportivo, mas ainda era um Mercedes-Benz. De verdade, daqueles orgulhosos de sua tradição e de sua origem, e que a vestiam sem vergonha alguma. Ele parecia mais lento que o M3, mas na realidade, no mundo fora da pista, não era. Era menos excitante, mas menos cansativo também. O Mercedes 190, como todo Mercedes de verdade, não podia ser excitante no idioma BMW, aquela linguagem crua, sem vergonha, nervosa e orgulhosamente esportiva. Não, Mercedes dão a satisfação com uma linguagem mais madura e polida, que se revela somente quando se faz uma longa viagem a velocidades altíssimas, e com conforto suficiente para poder chegar ao destino e voltar se necessário. Carros de luxo velozes e seguros, Mercedes nas estradas, BMW’s nas pistas. Carros e caminhões, carros e motocas.

É lógico que o 190E parecia menos nervoso, era Mercedes. Volante grande, a tradicionalíssima direção de esferas recirculantes, relação de ride & handling mercediana tradicional.

Mas a imprensa internacional andava aquela época numa cruzada para que todos as carros se tornassem BMW’s, e colocava esse tipo de comportamento tradicional da Mercedes como coisa de velho, de ultrapassado e fora de moda. Não posso negar que para um entusiasta uma BMW era sempre a opção mais lógica, mas daí a colocar esta pecha nos carros de Stuttgart é demais. O único escriba a defender os Mercedes não podia ter sido outro: LJK Setright. Formando sua própria opinião, e não se importando com o que a voz uníssona da turba dizia, Setright defendia leveza nos comandos, conforto e transmissões automáticas, e apesar de parecer realmente fisicamente um velhinho ultrapassado, costumava ser o mais veloz repórter presente a qualquer lançamento, a ponto de ser sempre despachado sozinho nos carros por falta de alguém com coragem suficiente para acompanhá-lo.

Mas a turba conseguiu seu intento. A Mercedes-Benz hoje se dedica a frivolidades e marketices. O design de seus carros, antes sagrado em sua seriedade e sobriedade clássica, mas belíssima, hoje é um festival de infantilidades. Bruno Sacco, que por anos foi o guardião dessa tradição, e que costumava dizer que um Mercedes se desenhava sozinho, precisando apenas ser ajudado por seus designers, hoje deve desacreditar no que se vê. Me parece lamentável que a tradição, a aerodinâmica e a funcionalidade que antes ditavam a forma de um Mercedes-Benz tenham hoje sido jogadas no lixo para que a moda apenas dite a forma dos carros. Para mim, coisas como um CLS são uma afronta a tudo que representava a empresa de Stuttgart.

Hoje há uma horda de Mercedes-AMG que cospe fogo e enxofre, que é mais cheia de guelras e nadadeiras que um cardume de tubarões. Mais un-Mercedes, impossível.

E as coisas não andam melhores em Munique. A BMW também nunca foi uma empresa que desenhava carros com a moda em mente. Não, carros alemães, como o povo que os criava, tinham que ter sempre a função acima da forma. Mas aí veio aquele tal de Bangle...

E é por isso que a melhor coisa que aconteceu à Jaguar foi o XF: depois de anos presa ao desenho “tradicional” do XJ de 1968, a empresa notou que ela não é a Mercedes, que um Jaguar sempre representou um corpo belíssimo em primeiro lugar. Se existe uma empresa de carros de luxo e esporte que deve fazer coisas sempre mais belas, é ela. Dos SS de antes da guerra, passando pelo XK 120, E-type e XJ, a marca formou uma tradição de desenho belíssimo primeiro, carro e função em seguida. O oposto exato da Mercedes-Benz. O XF é então, independentemente de seus donos hindus, um Jaguar de verdade, de uma empresa que volta a entender o porque de sua existência.

O que nos leva a cena III, Ato I do clássico “Hamlet, o Príncipe da Dinamarca”, onde Polônio dá uma série de conselhos para seu filho, Laerte, que parte para tentar a vida longe do pai. É um texto maravilhoso, com conselhos tão úteis hoje quanto séculos atrás, quando foram colocados no papel por William Shakespeare.

Mas o conselho final é o que é relevante aqui, o que queria que os capitães da indústria entendessem como o mantra empresarial de um consultor inglês do século XVII:

“This above all: to thine ownself be true,
And it must follow, as the night the day,
Thou canst not then be false to any man.”

(Mas, sobretudo, sê a ti próprio fiel;
E segue-se disso, como o dia a noite,
que a ninguém poderás jamais ser falso.)

MAO

23 comentários :

  1. MAO, faltou citar Paul Bracq, designer das derradeiras Mercedes, a 300 SEL 6.3 e a 600.
    m

    ResponderExcluir
  2. Viajou!
    O CLS é tido por muitos com um dos mais belos sedans de todos os tempos. E sou da mesma opinião.

    CZ

    ResponderExcluir
  3. Rodrigo Laranjo04/08/2009, 09:48

    Sobre "... a imprensa internacional andava aquela época numa cruzada para que todos as carros se tornassem BMW’s...", a gente vê isso aqui também, claro numa escala bem menor.

    Hoje as pessoas pessoas preferem comprar um popular duro, suspensão quase sem curso, com câmbio esguelado, porque "é mais esportivo", em vez de preferir um carro mais macio que canse menos o trajeto.

    "é mais esportivo" um carro popular, 1.0, 4 portas? Sei...

    ResponderExcluir
  4. Clésio Luiz04/08/2009, 12:47

    Eu acho que os Mercedes atuais são belos, mas continuam Mercedes. Embora seus carros tenham aspecto moderno, eles não são nunca ousados em excesso, com algumas exceções, claro, como o CLS ou o primeiro Classe A. Eu não consigo confundir eles com outros carros. Quando eu olho pra um, sempre tenho a impressão de bom gosto. Se isso não é um Mercedes, então eu não sei o que é.

    Enquanto isso, imitações ao desenho Mercedes não faltam por aí, como o atual Hilux SW4, que parece muito com o Classe M, ou aquela coisa coreana que estão vendendo por aí com a frente do Classe E 1995. Ou as dezenas de sedãs orientais que tentam parecer um Mercedes. Essas imitações são o reconhecimento de que a Mercedes continua liderando a multidão.

    E o que é melhor, eles estão mais bonitos que os BMW. Enquanto o Chris Bangle "bang" os BMW, os carros da Mercedes se modernizaram de forma correta. Modernos sim, mas de bom gosto.

    Obrigado, Bangle :-)

    ResponderExcluir
  5. Carlos Galto04/08/2009, 13:20

    Opinião é igual a base da coluna mesmo... Cada um tem a sua e a defende com unhas e dentes!!

    Eu acho as tradicionais Merças lindonas e as atuais também, principalmente a CLS...
    Ao contrário, prefiro os Volvo até a série 850, quadradões e maciços. Volvo!
    Todos os Jag's são belíssimos! E nem falo de clássicos como XK, Type D ou E. Falo dos XJ, XJS, XK, S-Type antigos e atuais e até dos X-Type "Mondeo". O XF é uma escultura!
    E sim, o Chris Bangle jogou o design da BMW na vala!!

    ResponderExcluir
  6. O mundo dá voltas e ninguém pode se dar ao luxo de ficar parado.

    Também sinto falta da sisudez dos Mercedes, BMWs e até mesmo dos Audis retilíneos. Mas acredito que tudo nessa vida seja cíclico, quem sabe daqui a pouco tempo tudo volte ao normal.

    FB

    ResponderExcluir
  7. Eu sou um grande fã do CLS, acho que é o único MB realmente belo, como um carro italiano.
    Sim, é outra personalidade. E eu também acho que a MB e a BMW perderam muito dessa característica na tentativa de se modernizar. Ganharam vendas, banalizaram-se. A Classe C da geração anterior é vulgar.
    Mas tem luz no fim do túnel, a noca Classe E, e mesmo a C estão retomando as linhas mais imponentes, sem perder a modernidade.

    McQueen

    ResponderExcluir
  8. Paulo Keller04/08/2009, 19:00

    MAO, o mundo anda. As coisas mudam.
    Acho que atualmente rápido demais. Mas não dá pra ficar parado. Para as empresas se manterem no mercado elas tem que se reinventar de tempos em tempos. Eu já não aguentava mais ver Mercedes todos igauis sempre. Foi bom no passado. Tão bom que foi copiado, pela Lexus.
    Mas a Lexus se diferenciou e ganhou mercado. Aí veio a BMW e se reinventou com a GENIALIDADE e CORAGEM do Bangle. Ganhou mercado também. Vai falar que todo consumidor é volúvel e se encanta com novidades fashion. É verdade. Também acho isso ruim.
    Mas o consumidor é movimenta tudo isso. Mesmo sem saber, e mesmo com certa ignorância.
    Com isso a Mercedes fez realmente um dos mais belos sedans de sua história, o CLS. Deixou de ser Mercedes por isso. Não. Continua fazendo carros menos excitantes que os BMW. Mas melhorou. Deixou de ser menos carro de chofer. Com a AMG e seus modelos cuspidores de enxofre (gostei disso) enveredou por um território novo, ajudando a trazer mais entusiasmo para a marca. Não fossem os modelos AMG eu nem olharia mais para a Mercedes.

    Agora veio esse E, que apesar de bem arrojado, tem toda a sobriedade esperada de um Mercedes.

    Não entendo sua grande excitação com o novo Citroen C5 da Jaguar.

    A Mercedes pelo menos teve a coragem de pensar fora da caixa. Errou feio no Série G (a minivam americana). Acertou muito no CLS e no E. Foi conservadora no C (exceto o C63).

    A globalização nos leva a uma imbecilização em massa. A sede de consumo instantâneo acabou com a longevidade dos produtos e marcas.

    Essa mesma internet que nos coloca em comunicação constante me faz achar velho um produto que ainda nem foi lançado devido a quantidade de fotos e vídeos que vemos todo dia na web e também pela quantidade estúpida de lançamentos diários. Tudo fica velho muito rápido.

    Talvez por isso pode ser que o Shakespeare esteja certo. Mas simplesmente não dá pra ficar parado enquanto o mundo gira.

    ResponderExcluir
  9. "Coupé de 4 portas" pra começar, essa expressão já é contraditória.

    Sobre o desenho de BMW e Mercedes, a coisa parece estar voltando aos eixos.
    O E-klässe noo me lembra muito um W124.

    ResponderExcluir
  10. Mister Fórmula Finesse05/08/2009, 08:37

    Considero o CLS maravilhoso e os AMG's atuais excessivos, uma BMW M3 é a imagem do recato em relação as novas Mercedes esportivas. Mas como tão bem escreveu o Paulo Keller acima, as coisas mudam rápido demais!

    ResponderExcluir
  11. Carlos Galto05/08/2009, 10:51

    Caraca!! O novo C5 é sensacional!!!! Estranho ficou o Laguna.
    E não acho o Citroen nada parecido com o XF...

    ResponderExcluir
  12. MAO, parabens pelo texto. Muito bom mesmo. Também acho que o pessoal está exagerando no design. Mas eu aceitaria de muito bom grado uma horda de AMG´s na minha garagem, em especial o SL 63...

    Abraço

    Lucas

    ResponderExcluir
  13. Paulo Keller05/08/2009, 20:05

    Sinto um certo conservadorismo generalizado nos autoentusiastas. Deve ser coisa da idade...

    PK

    ResponderExcluir
  14. Paulo Keller meu caro Blogmaster supremo,

    Ok, tudo muda muito rápido, internet, não pode ficar parado, blábláblá.

    Mas eu não compro Mercedes mais. E sempre preferi a imagem e dirigibilidade mais madura e sofisticada dos Mercedes, se comparados aos BMW.

    Hoje, quando for comprar meu próximo carro de luxo alemão superpotente, vou no original e não na imitação: compro um BMW. E se ficar com saudades de meus adorados Mercedes, compro um Lexus ou uma Toyota Camry.

    Mercedes-Benz is DEAD!!!!

    E sobre estar ficando velho, qual o problema? Esse mundo cheio de crianças de 55 anos é o fim da picada.

    "I like to act my age. Youth is wasted on the young." - A. J. Cornell

    MAO

    ResponderExcluir
  15. Mahar,

    Sim, Paul Bracq!

    Ele praticamente criou a tradição da qual o Bruno Sacco era guardião.

    Tempo bão, onde Mercedes era tudo igual, mas vendidos em vários tamanhos, pequeno médio e grande!

    MAO

    ResponderExcluir
  16. MAO,

    Bom texto. Eu acho o CLS um dos carros com desenho mais ridiculo dos ultimos tempos. Ou é coupe ou é sedan. Sedan metido a coupe é como alguém com crise de identidade. Um carro que eu não teria.

    ResponderExcluir
  17. Marco Molazzano05/08/2009, 21:12

    O AG é conservador e inovador ao mesmo tempo. Ele gosta mesmo de tudo que começa com V e termina com 8.

    Mas toda hora inventa um lugar diferente pra adaptar um motor desse e criar algo inovador, exclusivo e divertido... (parece folder de lançamento de carro de luxo com motorzão!)

    MM

    ResponderExcluir
  18. CZ and all,

    Reparem que em nenhum momento disse que o CLS é feio, ou um carro ruim.

    Disse apenas que preferia que não existisse, e expliquei o porque.

    Achá-lo bonito ou feio não vem ao caso.

    MAO

    ResponderExcluir
  19. All,

    Mais uma coisinha que acho que esqueci de falar nesse post:

    A Mercedes está virando as costas ao seu comprador tradicional, que a sustentou pos décadas. Eu sei que isto é um fato porque sou um deles.

    Tudo bem que somos uma espécie em extinção, mas no meu livro nos abandonar desta forma só pode ser classificado de uma forma:

    Traição.

    MAO

    ResponderExcluir
  20. MAO,
    A razão de minha divergência é que eu defendo que, assim como nós, seres humanos, uma marca pode e deve se reinventar, de tempos em tempos. Não só na busca louca do sucesso. Faz parte do inovar e talvez eu esteja entendendo que você preferiria cercear a inovação apenas a parte técnica, enquanto eu voto pelo 'unleash reinvention'.
    Uma mulher quando muda a cor do cabelo ou um sofá de lugar, não necessariamente está querendo deixar seu homem, tampouco buscando sucesso com outros.

    ResponderExcluir
  21. CZ,

    Eu não tenho nada contra mudar ou evoluir.

    Mas tem que ser fiel a si mesmo; existem coisas que vc, como pessoa, nunca mudará, sob pena de não ser mais vc mesmo. Chame de princípios, genética, vidas passadas, o que quiser. Vc se reinventa, pero no mucho.

    Para mim, é igual as Mercs. Se vc não gostava da velha e gosta da nova, beleza, mas e se como eu, vc sente exatamente o contrário?

    MAO

    ResponderExcluir
  22. MAO,
    acho chegamos ao ponto, de onde passaremos a convergir.
    Se um dia me vêem (velha gramática) de cabelos rosa-choque, como o De Lorean fez consigo mesmo, há 30 anos? eu também teria traído meus princípios, minha filha viraria a cara, a mulher ia fechar o cabelereiro, etc.
    Não insinuei que estás contra a evolução, mas tentei achar que o seu limite de reinvenção das marcas tradicionais talvez esteja um pouco antes do meu.

    ResponderExcluir
  23. CZ, caro amigo:

    Perfeito! Concordamos!

    MAO

    ResponderExcluir

Pedimos desculpas mas os comentários deste site estão desativados.
Por favor consulte www.autoentusiastas.com.br ou clique na aba contato da barra superior deste site.
Atenciosamente,
Autoentusiastas.

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.