O Anaconda é um exemplar único de uma empresa que
durou pouco. Uma idéia boa, mas que não foi desenvolvida a ponto de auxiliar a
sobrevivência da empresa. Restou apenas como peça de coleção, apesar de poder
ser usado normalmente, dada a mecânica simples e quase toda oriunda de um
Peugeot 204, carro que teve mais de um milhão e seiscentas mil unidades
fabricadas, característica a ser seguida por todos que tem vontade de um dia construir um automóvel.
O construtor foi batizado de BBM, iniciais dos
nomes de família de Pierre Bertin-Boussu e Jean-Michel Meunier. Boussu era um menino que comprava revistas de
carros e ficava desenhando o que via nelas,
inventando outros carros, além de ter desenvolvido o gosto por desenhar
peças e partes. Nada muito
diferente do que muitos de nós fazíamos quando crianças ou adolescentes.
Meunier estudava eletrônica, era fanático por corridas, e se conheceram na
escola.
Como sempre acontece entre entusiastas, duas ou
três frases, com algumas poucas perguntas e respostas, são suficientes para
descobrir que o outro também é do grupo, e rapidamente puseram-se a bolar um
carro que eles mesmos pudessem fabricar, desejo de ambos.
Em 1966, começaram a trabalhar em um esportivo para
ser usado em corridas, batizado apenas de Berlinette, com mecânica do Renault
R8 Gordini e chassis tubular. A carroceria tinha linhas bastante aerodinâmicas,
mas a execução não era das melhores, com as peças plásticas feitas sobre
moldes bastante rudimentares. Note as rodas do Alpíne, revelando a origem
Renault do pequeno esportivo.
Bastante baixo, o Berlinette foi o primeiro da marca |
Praticidade para acesso mecânico, mas acabamento discutível, visível mesmo em fotos ruins como essas |
Depois do Berlinette começaram a pensar mais longe,
e como não poderia deixar de ser para quem pretende construir algo radicalmente
esportivo, ainda mais sendo franceses, Boussou e Menier almejaram competir em
Le Mans, escolha mais do que óbvia.
Esse novo modelo deveria ser mais caprichado na
aparência para despertar curiosidade no público, e foi batizado de Anaconda.
A traseira lembra um pouco o Lotus Europa |
Dessa vez, a outra marca francesa antiga e de
grande produção, a Peugeot, foi a escolhida para emprestar a mecânica. O motor do
Peugeot 204, tipo XK, com 1.130cm³ , diâmetro e curso 75 x64 mm, duas válvulas
por cilindro com comando de válvulas no cabeçote foi o escolhido, já que era robusto o suficiente para ser
trabalhado a ponto de dobrar a potência. Do original que desenvolvia 53 cv DIN,
alterou-se cabeçote, com modificações nos dutos de admissão e escapamento para
melhor fluxo de mistura, compressão aumentada dos originais 9:1 para 10,5:1, dois carburadores duplos Weber, com isso chegando a 110 cv DIN.
O câmbio desse trem de força é embaixo do bloco do
motor, e instalado em posição central traseira transversal, como era na dianteira
do 204. São quatro marchas à frente mais ré.
Comando de válvulas acionado por corrente metálica |
Com a pequena área frontal e um perfil que favorece
a penetração aerodinâmica, o Anaconda
chegava a 200 km/h segundo seus construtores.
Na área estrutural,
adotaram o metal mais fácil e simples de trabalhar, o aço em chapas. Para
fabricar um chassis de chapas de aço dobradas, formando uma caixa para dar
resistência, sem serem necessárias longarinas e outras peças de mais complexa
fabricação, tiveram o trabalho de Francis Diter. As peças são soldadas com
solda ponto, como quase universalmente utilizado hoje nas fábricas de grande
produção, o que é no mínimo diferente para um pequeno fabricante. A informação que
encontramos é que essa estrutura tem apenas 70 kg.
Suspensão de duplos braços
triangulares superpostos na dianteira, fazendo conjunto na traseira com um
elemento de apenas um braço inferior para cada roda, ancorados diretamente na
estrutura. Molas ajustáveis nos quatro cantos. Os freios são discos nas quatro
rodas, também de origem Peugeot.
O desenho de estilo é
de Bernard Lanseman, que trabalhava na Peugeot, no estúdio que tinha o comando
de Paul Bouvot à época. Essa carroceria foi feita em plástico poliéster.
Tentou-se algo muito moderno que era a
colagem do para-brisas, mas não funcionou, e o molde da carroceria teve que ser
modificado para a montagem convencional do vidro com borracha.
Como sempre padrão de
construtores franceses, inscrever sua criação para a 24 Horas de Le
Mans é o desejo máximo, e aqui não foi diferente.
Tanto que isso era
verdade que também se pensou nos requisitos de segurança para corridas, com a
adição de reforço na estrutura ao redor do pára-brisa, ligando-o através de uma
viga estrutural a um arco traseiro, acima da altura das cabeças dos ocupantes,
atuando como um "santantônio". Para teto, dois painéis removíveis
individualmente, de forma a resultar em um teto targa. Na dianteira, estrutura
deformável para absorver energia em caso de impacto.
O tanque de combustível
foi colocado atrás da cabine, fixado a
uma parede de chapa de aço que atua também como reforço contra torções da estrutura.
A direção é rápida, apenas 1,75 voltas de batente a batente, perfeito para competição em pista, sem dúvida alguma.
A BBM existiu apenas
até 1972, infelizmente sem ter a chance de desenvolver mais suas idéias, que
poderia resultar em um bom concorrente para o Alpine Renault, que com altos e
baixos existe até hoje. Talvez a própria Renault não gostasse da idéia, mas isso fica sendo apenas especulação.
JJ
Fotos: Gtfrancefree.fr; allcarindex.com; auto-museum.net
Exotico.
ResponderExcluirTa valendo que nossos velhos Miuras foram inspirados nesse desenho?
Jorjao
Acho dificil de ser , pois esse carro e pouco conhecido. Eu mesmo nunca tinha lido nada a respeito dele.
ExcluirAcho que o Anaconda foi inspirado/copiado do Lotus Europa.
Quanto ao Miura nao tenho ideia onde buscaram inspiracao para o desenho das primeiras unidades que tinha o motor VW ar. Mas de um modo geral foram felizes e o resultado ficou muito bom.
Fora os Miuras Targa (mecanica AP) os outros modelos sempre carregaram a fama de carro de novo-rico , exibicionistas , ou pessoas de gosto duvidoso. Algumas versoes vinham ate com luz de neon o que reforcava essa fama.
Carro leve, provavelmente bom de curva e sem apresentar números estratosféricos de potência. Provavelmente, deveria ter uma dirigibilidade das melhores. Uma pena que fabricantes pequenos sofrem com a concorrência de grandes empresas e com a desconfiança do mercado, pois esses são quem idealizam os melhores (em termos conceituais) produtos de nicho.
ResponderExcluirEu sou mais um Willys Interlagos!
ExcluirGostei da história, uma pena mesmo que não tenham evoluído com os projetos !
ResponderExcluirBelo e único exemplar, pena que não teve sobrevida para receber aprimoramentos da época.
ResponderExcluirE por falar em aprimoramentos acabei de chegar do evento de pré-apresentação do novo FOCUS SEDAN,na Bienal do Ibirapuera, na minha opinião o carro evoluiu bastante tecnicamente, principalmente no motor duratec 2.0, injeção direta flex e sem tanquinho de gasolina, cambio powershift de 6 velocidades, bem que podia ter um manual de 6 marchas. O carro passa a impressão de ser muito bem construído, bastante solidez.
Abraço,
Marco Antonio
Embora não goste da tecnologia fréquis, gostei de ver que a Ford conseguiu ajustar a injeção direta para esse fim, um dos problemas para tal aplicação. Mas não gostei nem um pouco de não haver opção por câmbio manual. Eita mania besta de só lançar automático nesta terrinha... Eu já ficaria feliz se mantivessem o próprio 5 marchas atual, nem faço questão de um manual de 6 marchas.
ExcluirRoad Runner,
Excluirconcordo completamente.
Câmbio automático sem opção de manual mata o modelo para minha preferencia.
E pior que daqui alguns anos, câmbio manual só nos modelos de entrada, se é que vão sobrar alguns.
Será a vitória dos preguiçosos e chiques sobre os autoentusiastas.
E esse carro ainda existe?
ResponderExcluirNão entendi o lance do cambio. Era integrado igusl aos de motos?
ResponderExcluirCCN1410,
ResponderExcluirsim, o carro está com algum colecionador. Mais informações não foram encontradas.
Desse eu nunca tinha ouvido falar, tampouco do nome dos criadores. Ainda bem que aprimoraram o segundo modelo, pois o acabamento do primeiro era, de fato, sofrível, mesmo para um modelo de competição apenas... Ruim o fato da empresa ter durado pouco, apenas 6 anos de existência.
ResponderExcluirLotus Europa com frente de De Tomaso Mangusta!
ResponderExcluirJJ. Sempre aprendo muito com seus artigos sobre os modelos exóticos e exclusivos que eu tanto admiro.
ResponderExcluirHoje me lembrei de você: um colega me mostrou umas fotos de um tal Fiat Otto Vu Supersonic, algo que eu nunca tinha ouvido falar. Achei incrível. Você fica me devendo um post sobre ele.
CSS,
ResponderExcluirboa pedida. Vou anotar aqui na listinha das esquisitices.
Obrigado.