Em 1995, os chassis
construídos por Adrian Reynard comemoraram o quarto título da Fórmula 3000
européia e também o da Formula Indy.
Em maio desse mesmo ano, os designers
britânicos Mark Adams e John Hartnell assistiram a 500 Milhas de
Indianápolis e tiveram a idéia visual do que a Ford estava querendo, um carro
de corrida para andar na rua. A prova foi vencida justamente por um
Reynard-Ford, pilotado por Jacques Villeneuve.
Adams era o diretor de
estilo avançado da Ford e Hartnell basicamente o criador do estilo do Ka
original, que teve a participação do francês Claude Lobo. Sob a coordenação de ambos nasceu o Ford Indigo.
Alexander "Alex" Trotman (1933–2005),
inglês, o primeiro presidente executivo não americano da Ford, era o grande chefe quando o
Indigo foi apresentado em Detroit como protótipo, em janeiro de 1996, com o
objetivo claro de ser um demonstrador de tecnologia do grupo americano.
Trotman foi polêmico
nos anos de liderança da Ford, de 1993 a 1998. Sob seu comando ocorreram as
alterações visuais problemáticas do Ford Scorpio, Escort e Fiesta, europeus, e do Taurus, Contour e Escort, americanos, que também não foram nada homéricamente belos
nem diferentes. O Taurus teve suas vendas muito diminuídas no mercado americano com o modelo conhecido no Brasil como “bagrão”, fabricado de
1996 a 1999, tendo perdido o posto de carro de passeio mais vendido nos EUA para o Toyota Camry. Para os volumes habitualmente enormes, isso era
um desastre.
Ele conseguiu economizar muito dinheiro na sua administração,
mas não será lembrado pelos produtos de sucesso comercial, talvez com exceção
do Mustang como o que tivemos por aqui no Brasil, importado oficialmente entre
1995 e 1998. Parêntese: o que a Ford estará esperando para voltar a trazer esse
carro hoje? Na Europa, a única grande estrela a chamar a atenção para a marca de Henry Ford foi o Ka, inovador e muito cultuado pelos consumidores de carros baratos, e, muito importante para uma boa parcela dos europeus, bons de dirigir.
Assim, o grande chefe
precisava fazer algo para ser bem lembrado e o Indigo nasceu, um ano depois do
GT90, uma interpretação futurista do GT40, mas muito diferente deste, nada
retrô e nem um pouco mirado para a produção a curto prazo. O Indigo era o
oposto nesse ponto.
Esse carro com nome do
vegetal que deu a cor original aos jeans, mas também uma corruptela de Indy Go
(Vai Indy!), foi o primeiro carro materializado no estilo de arestas, o New
Edge, que veria o Ford Ka como seu primeiro produto de grande sucesso na Europa
(esqueça o Brasil, que nunca o entendeu, nem como carro nem como estilo), e
seguido logo após pelo Focus.
Para garantir que o Indigo tivesse comportamento de carro de competição, a Ford chamou a Reynard para desenvolver áreas básicas que seriam muito mais trabalhosas para a gigante empresa americana. Esse trabalho abrangeu os compósitos de fibra de carbono, aerodinâmica e
suspensões, especialidades de quem faz carros de corrida.
As idéias de desenho de
dois colaboradores do departamento de estilo da Ford, Jeff Puppas e Jim
Smith, foram mescladas com as de
Hartnell e Adams para se chegar ao carro, numa decisão rápida e direta, sem
interferência dos diretores do programa nessa escolha.
Para movimentar a criação, usou-se a estratégia de promover um motor grande e de configuração extrema. É um V-12 de seis
litros (5.972 cm³) com 48 válvulas e quatro árvores de comando, baseado em dois
motores Duratec do Taurus, V-6 de três
litros. Há componentes também do V-8 do Mustang, sempre com o objetivo de
abreviar tempo e custo, as molas-mestras
do desenvolvimento de carros de grandes fabricantes em série.
Esse motor foi feito em
bloco único em alumínio pela Cosworth na Inglaterra, e mesmo sem o Indigo se
tornar realidade, o projeto já era pensado para ser utilizado em produção normal, tendo sido colocado posteriormente nos Aston Martin, o primeiro
deles sendo o Vanquish, carro espetacular.
O projeto era certeiro, chamado
popularmente de modular, e foi do início dos desenhos ao funcionamento em
dinamômetro em dezoito meses. Há um transeixo semi-automático e seqüencial de
seis marchas com comando por alavanca no console, subindo marchas para trás e
reduzindo para frente, e que iria
posteriormente passar a botões no volante, tudo feito pela empresa de Adrian
Reynard. A embreagem é de cinco discos de fibra de carbono, e o curso do pedal
é mínimo, como nos carros de corrida.
O motor gerava 441 cv a 6.100
rpm e 56 m·kgf a 5.250 rpm. Podia chegar a 500 cv fácil, mas na fase de testes
iniciais tinha essa potência menor, pequena para o tamanho do motor.
Com essa potência
inicial, chegava a 290 km/h e ia de 0 a 100 km/h em 4 segundos. A aceleração
lateral máxima é de 1,2 g, com o quarto de milha coberto em 12 segundos.
A fixação do trem de
força é como em carros fórmula desde que Tony Rudd criou essa construção, e Colin
Chapman fez funcionar com sucesso em 1967. Parafusado diretamente no final do
chassis, com as suspensões aparafusadas no transeixo e no motor. Prático
e leve, embora eu nunca consiga entender como há resistência numa carcaça para
isso, ainda mantendo o peso baixo.
Todas as reações de
suspensões, direção e freios são imediatamente passadas ao motorista, com
respostas precisas e instantâneas, o ideal para quando se quer dirigir rápido, ou mesmo mais devagar, mas com precisão.
Esse comportamento foi
ajustado com a participação do piloto Andy Wallace, vencedor de Le Mans em 1988
além de vitórias na 24 Horas de Daytona e na 12 Horas de Sebring. Wallace
viria a ser mais lembrado no universo automobilístico pelo recorde em 1997 com o
McLaren F1 na Alemanha (387 km/h). O time da Ford e o piloto gastaram dois dias
inteiros de testes em Silverstone, que resultaram em pequenos ajustes no Indigo. Com essas definições e detalhados estudos de
viabilidade de produção feitos, só faltava Trotman autorizar a produção dos
aproximadamente 700 carros planejados, custando cerca de US$ 100.000 a unidade.
Uma verdadeira barbada, difícil de acreditar possível.
O entreeixos é o mesmo
de um F-Indy, 2.895 mm, com 4.453 de comprimento, 2.051 de largura, e 1.003 mm
de altura. Peso, apenas 1.045 kg em ordem de marcha. Não há teto nem lugar
para bagagem. Entrada de ar para o motor
fica bem atrás dos apóia-cabeças. Portas abrem para frente e para cima, dois
lugares apenas, alcançáveis por cima de uma soleira muito larga, linha de
cintura (topo da porta) na altura do ombro, como num carro de corrida, volante
bem vertical (idem), cintos de quatro pontos (mesma coisa, só faltou o quinto).
Um dos detalhes mais
interessantes é a asa dianteira com luzes integradas, faróis e piscas em fibra
ótica, minúsculos e potentes. Essas luzes são o complemento dos faróis
principais que estão na frente dos espelhos retrovisores externos, dando uma
perfeita demarcação da largura do carro, e ficando numa altura ótima para o
motorista.
Lanternas traseiras nas bordas externas do aerofólio, integrado à lateral do carro, formam um túnel de passagem de ar e colaboram para a estabilidade direcional em altas velocidades. Essa canalização do ar formava uma depressão acima da cobertura do motor, auxiliando na extração do ar quente desse compartimento. Tudo muito bem-planejado e executado em túnel de vento.
Ao longo da lateral da banheira de colméia de abelha de alumínio revestida com placas de fibra de carbono e também colméia de Nomex que forma o habitáculo, há dutos de passagem de ar de arrefecimento do motor, admitido no corte atrás das rodas dianteiras, formando uma caixa de absorção de impactos laterais e auxiliando na estrutura fortíssima à torção, o pior tipo de movimento para o trabalho preciso de suspensões.
Essas são na habitual
configuração de triângulos superpostos nos quatro cantos, e freios Brembo param o carro em 33 metros a 100 km/h, uns 10 metros a
menos que carros normais. Nas quatro rodas, os discos têm 335 mm de diâmetro.
As rodas são de de 11,5x17 polegadas na frente e 12,5x18 polegadas atrás, com pneus respectivos
325/30 ZR17 e 335/35 ZR18.
Na dianteira, os
pára-lamas se movimentam junto com as rodas, uma característica sempre muito
bacana a meu ver e muito eficiente também, em um carro com rodas para fora da
carroceria.
A montagem com
os componentes ingleses e americanos foi feita pela ASC, American Sunroof Corporation,
um especialista em carrocerias sem teto, abertas, tetos solares e estruturas de
capotas de conversíveis desde a década de 1960, empresa que detém contratos de
muitos anos com vários fabricantes para lidar com carrocerias fora do padrão
das grandes produções.
Jacques Nasser era o
vice-presidente de engenharia da empresa, e tinha como objetivo aprovar para produção o único V-12 de fabricação seriada
americano, isso encaixado no plano Ford 2000, que queria economizar 2 bilhões
de dólares anuais em custos de desenvolvimento, reduzindo as 24 plataformas
existentes para 16, mas dobrando o número de produtos.
Ao final, Trotman saiu
da Ford e Nasser foi promovido a presidente executivo em 1998, tendo ficado apenas até 2001. Apesar
de seu entusiasmo pelo Indigo, recursos importantes foram usados na formação do
PAG (Premier Automotive Group), no qual a Ford agrupou as marcas compradas por ela, Volvo, Land
Rover, Aston Martin e Jaguar, além de incluir as marcas da casa, Lincoln e
Mercury. Nâo haveria verba para fazer esse carro quase de corrida ser vendido
ao público esperançoso.
Isso é o Indigo, as
definições de estilo de engenheiros de carros de competição, muito mais semelhante a
um carro de Fórmula do que qualquer outro dessa fase. Deveria ter sido aprovado
para produção em meados de 1997. O único carro completo construído está com a Ford ainda hoje.
Vejam abaixo um video em que o carro aparece andando em autódromo.
JJ
Fotos: Pscars.narod.ru, carstyling.com, Conceptcarz.com
Fotos: Pscars.narod.ru, carstyling.com, Conceptcarz.com
Acho que ele deu as caras no salão do automóvel. Estou certo ou minha memória está me traindo?
ResponderExcluirAssistam o vídeo, o ronco é fantástico!
Com certeza seria um dos carros mais exóticos e hard core a serem fabricados no mundo. Imagina ver na rua um carro com esse design no final dos anos 90?
ResponderExcluirExcelente. Gostei muito em saber tudo isso e pode ver o bloco do motor bem exposto !
ResponderExcluirParabéns, abraços
Eustaquio
Carsvansbussestrucks.wordpress.com
duro e saber que existem carros com projetos fantásticos feitos com bases e pontos de vista que não vemos hoje, são carros que custaram milhões para serem desenvolvidos e tem seus projetos jogados em gavetas.
ResponderExcluirUm dos projetos mais legais que eu já vi! Não entendo carros assim não existirem...
ResponderExcluirLembra um pouco o Ariel Atom. Boa pedida para track-days.
ResponderExcluirE vejam só como um V12 dos bons pode vir de onde menos se espera...
Quem jogou Need for Speed II vai lembrar.
ResponderExcluirAnônimo...
Excluirfoi a primeira coisa que pensei quando vi a imagem... e o bixinho era danado nas pistas....
Grande abraço.
Lembra o peugeot QUASAR dos anos 1980....O segundo concept a me cativar. O primeiro foi o lancia stratus, o concept, mais belo que os stratus de produção.
ResponderExcluirVisto de frente, de longe, me lembrou um pouco a Ferrari 312T4 de 1979/80
ResponderExcluirEu andei nesse carro! Quando a imprensa européia começou a publicar notas acusando a Ford de ter apresentado esse conceito na forma de puro mock-up a empresa levou o modelo para a Austrália na época do GP local e convidou alguns felizardos jornalistas que cobriam a temporada de F1 para dar uma voltinha em um autódromo.
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