Cord 810 (foto good-wallpapers.com) |
A grande escritora Beverly Rae Kimes disse certa vez da marca americana que levou o nome de seu famoso fundador, Erret Lobban Cord: “O Cord L-29 atraiu a maior atenção, gerou menos vendas que qualquer outro carro de preço médio da história, exceto é claro o seu sucessor.” Um bom resumo da marca, a terceira do conglomerado automotivo de E.L. Cord, criada depois dele ter comprado a Auburn e a Duesenberg. O L-29, criado sob as patentes de tração dianteira do artístico engenheiro Harry Miller, é talvez o maior clássico da marca que estava destinada a ter vida curta (1929-1937). Mas é do seu sucessor, o Cord 810, que quero falar aqui, famoso não somente pela então incomum tração dianteira, mas principalmente pelo seu antológico e revolucionário desenho de carroceria.
Um Roadster Cord L29 (RM auctions) |
E como este desenho nasceu é uma história interessantíssima, ligada indelevelmente à história de seu criador, o hoje famoso Gordon Buehrig.
O jovem Gordon Buehrig (autogiftgarage.com) |
Buehrig era extremamente criativo e talentoso, mas também irrequieto e iconoclasta. Provavelmente por causa disso, nunca parou por muito tempo em empresa alguma. Começou sua carreira em 1924 como aprendiz na Gotfredson Body Company, de Detroit, mas já em 1926 se mudou para Nova Iork para trabalhar na famosa LeBaron. Em 1927, estava de volta a Detroit, trabalhando na Packard. O ano seguinte passou no departamento de Arte e Cores da GM, o embrião do primeiro departamento de Design como conhecemos hoje, então chefiado pelo lendário Harley Earl. Mas em 1929, uma vaga apareceu na Duesenberg, e Buehrig a agarra; aos 28 anos se torna inesperadamente o único desenhista de carroceria da hoje lendária companhia, empenhada então em fazer os melhores, mais caros, mas velozes e rápidos carros do mundo, baseados no chassi desenhado por Fred Duesenberg. Cerca de metade das carrocerias dos Duesenberg S e SJ foram desenhadas por Buehrig.
O famoso Duesenberg SJ Arlington sedan "Twenty Grand" (Hemmings.com) |
Em 1933, Buehrig volta à GM. Chegando lá, entra direto em um dos famosos concursos internos promovidos por Harley Earl. Em sua apresentação de abertura do concurso, Earl faz uma longa palestra sobre a importância da “face”, e de como os desenhistas deveriam sempre dar ênfase à parte dianteira dos carros.
Prato cheio para o irrequieto Buehrig. Ele acreditava que o que realmente importa é o formato total da carroceria, a forma equilibrada e limpa, o todo. Não ia deixar barato tal provocação de seu chefe. No seu modelo para o concurso, para provar que a frente poderia ser preocupação secundária , Buehrig então criou um carro de forma agradável, mas completamente sem face.
Fez de tudo para tirar a ênfase da frente; o carro não tinha a então tradicional grade frontal, e os faróis ficavam escondidos. O capô parecia um caixão de defunto. Intencionalmente, fez a frente ser o menos chamativa possível. Obviamente, terminou o concurso de Earl em último lugar...
Cord 810 Westchester (gomotors.net) |
Mas logo depois disso, Harold Ames, braço direito de E.L.Cord, chama o antigo funcionário para um almoço informal. Nele, conta a Buehrig sobre sua intenção de fazer um Duesenberg mais barato, visto que as vendas dos carros da marca estavam paradas pelos efeitos da Depressão. Não demora muito para Buehrig voltar para as empresas de Cord, com o modelo do concurso a tiracolo. Harley Earl provavelmente nem se importou que ele o levasse (teoricamente era propriedade da GM), imaginanado que uma aberração como aquela não serviria para nada.
E assim nasceu um dos mais influentes e famosos desenhos de automóvel que chegou às ruas. A idéia do pequeno Duesy acabou se tornando o último Cord, e o resto é história conhecida. E é daí que vem o clássico Cord 810. Da lata do lixo da General Motors.
(macsmotorcitygarage.com) |
O carro não foi um sucesso de vendas, mas tem sua cadeira cativa na história do automóvel, principalmente pelo desenho original e diferente.
Depois do fim da Auburn-Cord-Duesenberg, Buehrig trabalharia para a Budd, para a Studebaker e para Raymond Loewy. Em 1949, entrou para a Ford, onde ficou até a aposentadoria em 1965, o maior tempo que ficou em qualquer empresa, mas também onde criou menos barulho. A única coisa creditada a ele na Ford foram algumas patentes de tetos conversíveis pouco usadas. A idade deve ter apaziguado o fogo daquele criativo rapaz, como ela inevitavelmente faz com todos.
Faz a gente pensar um pouco, não? O que mais deve ter ficado no lixo? A diferença entre o fracasso e o sucesso está muito mais ao acaso do que a gente gostaria de acreditar.
Buehrig em casa em 1984 (museu Henry Ford) |
Faz a gente pensar um pouco, não? O que mais deve ter ficado no lixo? A diferença entre o fracasso e o sucesso está muito mais ao acaso do que a gente gostaria de acreditar.
MAO
Acho que tinha um Cord 810 aqui no Brasil, amarelo, que pertenceu a Carmen Miranda.
ResponderExcluirAlguém tem mais alguma informação?
Há um preto e um branco numa coleção de um particular em São Paulo.
ExcluirEstão em estado de conservação impecáveis
Infelizmente essa colecao nao e aberta ao publico, mas ha planos para que isso aconteca.
Doravante, são carros que costumam ser expostos em eventos ligados ao antigomobilismo
Abraços
Sim, mas fora exportado nos anos oitenta. Há ainda vários modelos da Cord no Brasil - incluídos dois L-29, um sedã de 1930 e um roadster de 1931. Do 810 e 812, há cerca de dez carros no Brasil - porém, apenas cinco desses que restaram no país chegaram quando novos (Phaeton do museu Matarazzo, westchester do Lee, um phaeton que está em SP, um Westchester que está em Curibita e outro Westchester que está em SP). Permita-me a correção: A Auburn não fora comprada por Cord, e sim criada por ele - apenas a Duesemberg fora comprada e transformada no que conhecemos hoje. Outra correção, é sobre os anos de fabricação: L29 de 1929 a 1932 e, depois de um hiato de 04 anos, voltariam com o 810, de 1936, e o 812, de 1937 - apesar de serem os mesmos automóveis, para cada um dos anos havia uma tipificação. Outra curiosidade: As sobras de carrocerias e ferramentais dos 810 e 812 foram vendidas à Hupmobile/Graham Paige, lançando os modelos Skylark e Hollywood, em 1940 e 1941.
ExcluirA companhia Auburn existia, como fabricante de automóveis, desde o início do século XX. Em 1924, devido a dificuldades financeiras, foi comprada por E. L. Cord que a transformou em um sucesso de vendas. Mas não teve condições de superar a grande depressão dos anos trinta e Cord foi obrigado a abandonar a sociedade. AGB
ExcluirLindos carros, principalmente o L29.
ResponderExcluirAcho que tem mais de um. Pelo mundo a fora tem mais réplica do que verdadeiros.
ResponderExcluirUma vez li que sáo 130 legítimos dos mais de 3 mil produzidos e o resto é réplica.
Luiz CJ.
Caramba, lembro-me de uma reportagem similar sobre o Cord em uma Quatro-Rodas lá pelos idos de 1986/1987. Eu tinha certa de 8 anos e me lembro de como fiquei maravilhado ao ver a foto de um Cord amarelo naquela edição. Foi um design que me marcou pra sempre e lembro-me que serviu de inspiração tanto para o Bat-Móvel quanto para o carro civil de Bruce Wayne em Batman: The Animated Séries.
ResponderExcluirO da Carmem era vinha, e era um 4 portas.
ResponderExcluir"Departamento de arte e cores"...a denominação diz tudo sobre a importância que alguns setores tiveram antes dos décimos de centavos - patrocinados pela contabilidade - pingarem nas paletas.
ResponderExcluirA Ford by Camaçari que o diga!
De resto, ótimo post, o Cord era o carro conceitual produzido em série do seu tempo, uma espécie em filosofia de - não atirem pedras - Veloster elevado a terceira potência.
MFF
O Veloster, no mundo civilizado, até que é um carro legal. Usa a plataforma do Elantra, o motor do Elantra, e custa tanto quanto um Elantra.
ExcluirSó aqui que é vendido como o "sensacional carro de três portas"...
"antes dos décimos de centavos - patrocinados pela contabilidade"
ExcluirTalvez, com uma contabilidade decente, o De Lorean não tivesse quebrado.
Talvez, sem contabilidade, só com designers e / ou engenheiros, muitas das fábricas de hoje não existissem.
É muito fácil malhar uma classe de profissionais sem entender o que ela faz.
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Eu conheço um 810 Westchester em Curitiba, um tom pastel "branco meio bege", muito interessante. Estava à venda há algum tempo, pediam um valor meio lunático, mas para quem pode... Vi ainda um preto em Lindoia.
ResponderExcluirO vinho e o amarelo são conversíveis, já vi em algum site. Mas não devem passar de meia dúzia...
MAO
ResponderExcluirEssa hisória do Cord me trouxe à memória meu irmão e um primo tentando comprar um igual no Rio por volta de 1958/9 para correrem a Mil Milhas com ele, imagine só! Meu irmão tinha 18 anos e o primo (que anos depois teve o Maverick Quadrijet de rua que já contei aqui), 21, Ficaram encantados (e eu também) com a tração dianteira e o câmbio pré-seletivo que, segundo eles, seria perfeito para pista. Mas acabaram não comprando por qualquer motivo.
"A diferença entre o fracasso e o sucesso está muito mais ao acaso do que a gente gostaria de acreditar."
ResponderExcluirRealmente um automóvel à frente do seu tempo. Também fiquei pensando: Talvez bastasse algum famosíssimo da época comprar e falar maravilhas do carro para ele tornar-se um seucesso de vendas.
Ou será que foi a tração dianteira que atrapalhou?
...
Gostaria de ter mais detalhes da mecânica: cruzetas ou algum tipo de homocinética, qual câmbio, quantos cilindros, suspensão?
ResponderExcluirMauro
Errett Loban Cord também era dono da American Airways, Stintson Aviation e as Lycoming, fabricante de motores - que existe até hoje. O Cord é equipado com um motor Lycoming V8 de 4,7 litros. Os modelos 812 vinham com um compressor e tinham 170 hp. O cambio de tipo pré seletor fica na frente do motor, e as cruzetas são do tipo "U-Joint".
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