Ténéré, um
deserto africano que empresta seu nome a motos que são mitos. Tudo começou
quando o malucão francês Thierry Sabine se perdeu exatamente no Ténéré,
participando, com uma Yamaha XT 500, do rali Abdijan-Nice de 1977, chamado também de "Côte a Côte" pois largava
da Costa do Marfim, na África, para chegar à francesíssima Côte D'Azur, na
Europa. O azar de se perder foi a sorte de Sabine, já que saiu da roubada vivo
e decidido a organizar aquele que viria a ser o mais grandioso e polêmico
rali-reide de todos os tempos, o lendário Paris-Dakar.
Thierry Sabine com sua XT 500 no rali Abdijan-Nice, onde tudo começou |
Sabine
morreu na 8ª edição de seu rali, em 1986, mas sua criação está viva, exatamente
como a Yamaha nascida das areias da África. Vencedora das duas primeiras
edições do Paris-Dakar com sua admirável XT 500, a marca nipônica não vacilou, e
logo colocou no mercado uma versão de sua trail batizada de Ténéré e, à partir
daí, o mundo dos motores incorporou a palavra ao seu vocabulário como sinônimo
de motos fortes, tratores sobre rodas.
Grande mesmo: a maior das Ténéré é mais ágil do que se espera. |
Mas aqui o
assunto será mesmo a Super Ténéré, com a qual convivi bom tempo recentemente,
percorrendo estradas boas e ruins e, inclusive, algumas sem pavimentação. E para
começar, afirmo, de boca cheia, achar um despropósito uma moto destinada a
rodar em pisos ruins, em locais ao qual o termo estrada não se aplica, pesar
261 kg como esta XT 1200Z Super Ténéré mas... alto lá! Pretender que só por se chamar
"Ténéré" faria dela automaticamente uma off-road é certo? Talvez não.
Os tempos são outros, e os especialistas da oficina podem ter se rendido ao
marketing, sabendo que emprego depende de vendas, e o nome Ténéré sempre
vendeu, e ainda vende.
Conspurcado
o nome? Não é bem assim. Paralelos não faltam na indústria de quatro rodas.
Talvez esta Yamaha XT 1200Z Super Ténéré (ou sua rival BMW R 1200 GS...) seja
uma moto comparável aos grandes SUV, utilitários tipo Porsche Cayenne, o BMW X5 ou o Range
Rover, bichões capazes de encarar uma terrinha solta, um areiãozinho, mas
incomparavelmente menos competentes em piso ruim de verdade do que um Suzuki
Jimny, um Land Rover ou um Troller T4.
Então, será
com esse espírito que esta grande Yamaha de 1.200 cm³ deve ser encarada, mais
como aventureira para longas percorrências rodoviárias (com habilidade para
mansas escapadelas off-road) do que vetor ideal para trechos travados,
enlameados, para os quais a Yamaha conta com modelos mais adequados, como as
especialíssimas WR 250 e WR 450. Mas, voltando a essa "tenerezona",
uma pincelada na técnica vale a pena...
Inovadora
O motor da Super Tenéré é um bicilindro paralelo com a peculiaridade de ter os
moentes de seu virabrequim, o lugar onde se conectam as bielas, defasados em 90º
(ou 270º, que dá na mesma). Normalmente motores bicilindro paralelos têm os
moentes defasados a 180º ou a 0º, ou seja, no primeiro caso quando um pistão
está no ponto morto superior o outro está no inferior. No segundo caso, ambos
sobem e descem juntos. Ao optar pelo virabrequim a 90º (ou 270º) de
defasagem, a Yamaha explora um know-how que no ambiente motociclístico ficou
famoso nas pistas do mundial de motovelocidade, no qual motores que se valem
deste tipo de tecnologia são apelidados de "big-bang".
Qual a
vantagem que maria leva? Com esse tipo de virabrequim ocorre um pulso de potência diferenciado,
e assim o motor da XT 1200Z se livra de boa parte do indesejado torque inercial,
substituindo-o por força distribuída de maneira mais progressiva, resultando em
uma resposta ao acelerador mais "gorda" desde rotações baixas, o que,
convenhamos, é algo que torna a pilotagem de qualquer moto muito agradável. A
essa feliz característica de seu bicilindro a Yamaha acrescentou um sistema de
transmissão com caixa de seis marchas e transmissão final por cardã que – viva!
– não afeta de modo excessivo a suspensão traseira, levantando-a sob
aceleração.
Falando de suspensões, na frente o garfo tipo invertido é totalmente
regulável, assim como o monoamortecedor traseiro, que conta inclusive com um
prático pomo para as intervenções na carga da mola, freqüentes em uma moto cuja
capacidade de carga é grande e pode variar brutalmente, do "modelito"
viagem, plena de malas carregadas, à condição "light" de uso solo.
Frenagem a disco duplo na dianteira e simples atrás com sistema antitravamento
é padrão na Super Ténéré, assim como belas rodas raiadas de alumínio com aros que
permitem uso de pneus sem câmara.
Faltou
algo? Sim, falar do chassi. Como a BMW, a Yamaha não se rendeu ao uso da liga
leve para a estrutura de sua aventureira, preferindo incrustar o motor – que
tem função estrutural – em um mais clássico quadro de tubos de aço. A razão de
usar material menos nobre (e pesado) pode ser creditada às pretensões
aventureiras da XT 1200Z, pois em um chassi de aço é até possível a recuperação
depois de um tombo, enquanto que um quadro de alumínio geralmente deve ir para
a reciclagem na hipótese de acidente.
Vamos andar
Escalar não é um adjetivo exato para definir a ação de assumir o guidão da Yamaha XT 1200Z. Para sorte dos não favorecidos em estatura, a Super Ténéré nem é das mais altas entre estas chamadas big-trails. Seu banco, dividido em dois níveis, tem na porção dedicada ao piloto um interessante "calço" que reduz a sua altura em providenciais 2,5 centímetros. Uma vez montados, o que se vê e se sente é impressionante: o larguíssimo guidão é encimado por um painel completo, onde conta-giros é como gosto, analógico, e as restantes informações dadas por meio de uma tela de LCD de boa iluminação âmbar. Pecado é o computador de bordo, fornido, exigir deslocar a mão do guidão até um botãozinho no painel para "rolar" informações.
Escalar não é um adjetivo exato para definir a ação de assumir o guidão da Yamaha XT 1200Z. Para sorte dos não favorecidos em estatura, a Super Ténéré nem é das mais altas entre estas chamadas big-trails. Seu banco, dividido em dois níveis, tem na porção dedicada ao piloto um interessante "calço" que reduz a sua altura em providenciais 2,5 centímetros. Uma vez montados, o que se vê e se sente é impressionante: o larguíssimo guidão é encimado por um painel completo, onde conta-giros é como gosto, analógico, e as restantes informações dadas por meio de uma tela de LCD de boa iluminação âmbar. Pecado é o computador de bordo, fornido, exigir deslocar a mão do guidão até um botãozinho no painel para "rolar" informações.
Uma iguaria
técnica desta Yamaha é o motor oferecer dois tipos de caráter distintos. Atuando
sobre uma teclinha, passamos do caráter T, de Touring, ao S, de sport. A
potência do bicilindro é, em ambos modos, igual, 110 cv. Muda apenas o modo com
o qual estes cavalos chegam a roda, mérito do sistema "ride-by-wire",
o acelerador eletrônico da Yamaha batizado de YCC-T, Yamaha Chip Controlled
Throttle, sofisticado sistema que se valendo de sensores "lê" vários
parâmetros do motor e da condição de uso da moto para estabelecer a adequada
resposta ao comando. Funciona que é uma beleza e, na prática, em "S"
a resposta do motor é sempre vigorosa mas que cobra seu preço na hora de
abastecer, enquanto em "T" desce o consumo e a ação do acelerador é
mais branda. Outra magiquinha eletrônica desta Yamaha é o controle de tração em
três níveis de intervenção, e que inclusive pode ser desligado para um uso
off-road de caráter mais esportivo.
Passada a
impressão inicial intimidadora que o tamanho "super" da Super Ténéré causa,
os primeiros metros entregam a excelência do trabalho dos técnicos da Yamaha.
Mesmo em velocidades reduzidas a sensação de controle sobre os mais de 250 kg
de moto é soberbo, e não é exagero dizer que muitas motocicletas menores, entre
600 e 800 cm³, não apresentam tanta neutralidade e equilíbrio quando conduzidas
em baixa velocidade. O segredo desta Yamaha está numa hábil distribuição de sua
elevada massa, que inclusive comporta algumas exoticidades técnicas. Exemplo
disso é o posicionamento da bateria e do radiador do líquido refrigerante bem à
frente, a primeira sob a lateral esquerda da carenagem ao lado do tanque, e o
segundo do lado oposto. E este,
curiosamente, não tem sua "colmeia" posicionada de maneira a receber
o fluxo de ar frontal, mas sim de modo a conter a largura – e evitar danos em
queda –, recebendo o auxílio de uma robusta ventoinha elétrica para acalmar os
calores do bicilindro. Aliás, é plenamente suportável o "bafo" quente
que a perna esquerda recebe quando a tal ventoinha entra em ação.
Se na
cidade a Super Ténéré já surpreende, é na estrada que se revela o verdadeiro e
melhor lado da grande Yamaha. A 120 km/h o motor gira a módicas 3.700 rpm,
transmitindo mínimas vibração ao condutor, confortabilíssima. Nas curvas, a capacidade desta
aventureira confirma o equilíbrio sentido em uso urbano: a XT 1200Z é neutra e
bem balanceada, desce à inclinação ideal de modo natural e exige pouca energia
de seu piloto para enfrentar rápidas mudanças de direção. Enfim, age com se
fosse uma esportiva, mantendo-se as devidas proporções relacionadas aos limites
(nem tão limitados assim, diga-se) de pneus, cujo alvo é cumprir sua tarefa em
pavimentação e também não fazer feio quando é terra que se tem pela frente. E
falando nisso, na terra, o que faz a Super Ténéré quando a estrada asfaltada
acaba?
Faz bem:
261 kg em ordem de marcha mais alguma bagagem – enfrentamos a situação off-road
com a Super Ténéré equipada com as malas laterais originais, de alumínio,
parcialmente carregadas – praticamente somem. À grande qualidade já citada, o
equilíbrio e bom balanceamento da relevante massa, se alia uma posição de
pilotagem "ad hoc", especificamente pensada para pilotar em pé nas
pedaleiras. Dá para se sentir o grandioso Stephane Peterhansel, seis vezes
vencedor do Paris-Dakar (sempre com Yamaha de dois cilindros...). Ele
certamente foi ouvido pelos técnicos japoneses, e o guidão cai perfeitamente
nas mãos, os joelhos encontram abrigo na convenientemente estreita confluência
do tanque com o assento, as pedaleiras e comando de câmbio e freio traseiro,
assim como os manetes de embreagem e freio estão no lugar certinho. Em uma só
palavra? Perfeição em ergonomia.
Descrevemos
o que há de melhor na Super Ténéré, mas há também o que poderia melhorar. Nas
versões futuras do modelo a proteção aerodinâmica oferecida pelo amplo
pára-brisa mereceria reestudo, pois uma chata turbulência freqüenta o topo do
capacete quando a velocidade ultrapassa, mesmo se de pouco, o que a lei
determina, o que é uma falha para uma tão habilitada tourer. Outra coisa que
poderia melhorar é a potência. 110 cv estão baixo do que oferece a concorrente
da BMW, e apesar de não termos sentido falta de "pegada" em baixos e
médios regimes, em alta falta alguma "pimenta", que combinaria com a
tremenda capacidade ciclística mostrada nos trechos tortuosos, realmente um
ponto alto desta Yamaha.
Com preço
sugerido de R$ 61 mil e uma fornidíssima série de opcionais de fábrica, quase
todos presentes nesta moto que avaliamos, a Yamaha XT 1200Z Super Ténéré não é
a mais cara nem a mais barata de sua categoria, mas com certeza tem um
"pedigree" nobre e oferece bem mais agilidade do que suas imponentes
dimensões fazem crer. Usá-la para o dia a dia na cidade seria estúpido, pensar
nela como vetor de lazer de fim de semana para explorar trilhazinhas em volta
do sítio, ou passear na avinida beira-mar também, mas para destinos clássicos,
"passeios" até a Terra do Fogo, Alaska, Jalapão ou outros fins de mundo, difícil imaginar
algo melhor. Um veículo que realmente tem muito de "Sport" e de
"Utility".
RA
RA
Gostei!
ResponderExcluirImponente, mais moderna e tecnológica e um motorzão e tanto!
Tenho uma das "tias-avós" desta: A XT 600E, mais próxima das originais XT 500 e Ténéré... e me divirto muito com ela, mesmo "só tendo ~45 CV", módicos 600 cc de cilindrada, monocilíndrica e o acelerador sendo por cabo... alias, de 1995! Alias, a minha ganha desta só na altura, baixinho (como sou) passa apertado...
Uma belíssima máquina, sem dúvida! Não tive ainda o prazer de pilotar uma s. Ténéré, mas com certeza está na lista de coisas a se fazer antes de morrer.
ResponderExcluirhttp://dipoloeletrico.blogspot.com.br/
Legal, Agresti. A moto é sensacional, embora ache que suas dimensões estão mais para caminhão do que para SUV. Anda muito: outro vi uma saindo do sinal acelerando forte e realmente impressiona.
ResponderExcluirPorém, acho o valor cobrado excessivo quando sabemos que a Versys 1000 é encontrada por 50. Embora a Yamaha (teoricamente) esteja melhor preparada para o offroad, a Kawasaki é também fascina, e ainda tem o 4 cilindros roncando bonito. Numa hipotética escolha, iria de Versys e com o troco daria um "pulinho" em Ushuaia...
Aliás, na viagem de carro que fiz até lá, vi diversos grupos de moto, todos de big trail. Detalhes, TODOS de BMW, exceto um, justamente de Super Tenere.
Abraço!
Roberto,
ResponderExcluirMuito boa sua matéria.
Este é meu estilo atual de moto, fui evoluíndo até chegar nele...he he.
Eu concordo com quase tudo o que você disse no texto. Discordo de que usá-la para o dia a dia na cidade seria estúpido. Eu não conheço outro estilo de moto melhor para isso. É óbvio que sobram torque e potência, mas isso não faz mal, aliás é melhor sobrar do que faltar e essa reserva te da mais segurança e agilidade para sair de uma eventual enrascada.
Estúpido mesmo, ou inadequado, seria usar uma super esportiva ou uma custom de grande porte para andar no meio do trânsito. Alás, eu não vejo muito utilidade para uma super esportiva fora de um autódromo. E as custom, além de não terem suspenção para a "qualidade" das nossas ruas e estradas, tem pouca agilidade para andar no meio dos carros.
ABRAÇO E BOAS CURVAS.
Sergio S.
Caro Roberto
ResponderExcluirComo o Sergio S.comentou,tenho uma Super Tenere e realmente fui "evoluindo" até chegar nela,ao longo dos últimos 33 anos desde minha primeira Yamaha RS 125 ano 1978.Já tive moto de tudo quanto é tipo,de RD 350 LC,passando pelas CBX 750F(duas delas),Bandit, FJ e V-Max 1200,etc,mas felicidade igual a que sinto cada vez que monto na Super Ten e saio por aí...tremenda moto!
Abraços
Roberto,
ResponderExcluirExcelente matéria. Sou proprietário de uma ST 1200 2011/12 "first edition" e corroboro com todas as informações dadas. Sou fã da categoria e iniciei com as DT, evolundo para as XL ( 250 e 350 ) e passando pelas DR 800 ( duas, que moto sensacional ). Realmente as Big trail ou Dual porpouse são o que há de melhor em custo/benefício. Entretanto o "boom" está cobrando seu preço no seguro e nos problemas com roubos. Uma pena !
1º Encontro Brasileiro de Proprietários Moto Yamaha Super Ténéré 1200
ResponderExcluirPara inscrever-se no Grupo e informações sobre encontro favor acesse:
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