Um carro exclusivo e com origem intelectual de alto padrão |
Muitos supercarros são apenas concentrados de alto desempenho, já que esta é a principal característica para um carro ser assim classificado. Projetos muitas vezes bem feitos podem não ter nada que os tornem exclusivos, exceto pelo estilo externo e do interior. Podem nem mesmo ter uma origem interessante, quer sejam feitos nos Estados Unidos, na Malásia ou no Turcomenistão. Independente de estilo ou mecânica, buscam extremos, e muitos detalhes são cópias de outros, ou pelo menos usados como referência de escolha ou descarte de soluções. Quase todos carros são feitos assim, inclusive os muito caros e exclusivos.
O Commendatore 112i, contudo, tem como característica que o separa dos demais, o fato de ter sido originado de projetos evolutivos da Mercedes-Benz, no tempo em que ela era famosa pelos carros superengenheirados e que ditavam regras de estilo, não o que ela é hoje, mais seguidora de modas e menos criadora. Não considero tanto quanto afirmou poeticamente o Marco Antônio Oliveira aqui nesse texto, mas é impossível discordar completamente dele.
Com todos esses poréns, uma marca ainda inconfundível e muitas vezes copiada. Basta ver o CLS de 2004 e um Vokswagen Passat CC (hoje apenas Volkswagen CC) de quatro anos depois e, recentemente, o BMW Grand Coupé, para ter essa certeza.
Isso faz do Commendatore algo único, um herdeiro de uma época em que os Mercedes-Benz pareciam ter vindo de outra galáxia, não apenas de outro planeta.
Esse carro não foi construído para venda, infelizmente. Ficou em protótipo único, construído para o ano de 1993, quando foi apresentado em Frankfurt. Isso é o que se encontra nas fontes normais, mas há informações imprecisas de mais unidades produzidas, sem nenhum local onde isso possa ser verificado, nem mesmo no fabricante, cujo site na internet nem mesmo tem tradução do alemão para o inglês, deixando claro que se trata de uma operação bastante local, sem ambições globais. O Commendatore é, assim, um dos mais misteriosos entre os supercarros modernos.
O nome Commendatore 112i designou uma máquina onde o ex-engenheiro da Porsche e da Mercedes-Benz, Eberhard Schulz colocou sua experiência em um carro de sua vontade, auxiliado pelos seus dois filhos.
Interessante entender a origem desse carro a partir dos projetos em que Schultz participou quando trabalhou na Mercedes-Benz. Lá, ele fez parte do grupo que desenvolveu os modelos C111, de motor rotativo Wankel, fabricados em três versões, numeradas em algarismos romanos a partir da segunda, II e III. Para quem é mais novo, vale lembrar que principalmente o C111 inicial, apresentado em 1969, foi um carro de sonho para muita gente.
Mercedes-Benz C111 |
Crianças pequenas e crescidas viam fotos daquela maravilha, o emblema da estrela de três pontas no nariz inclinado, e sonhavam em ter um carro futurístico como ele. Tempos sem internet, de revistas mensais que eram ansiosamente aguardadas para sabermos das novidades. A miniatura da Corgi Toys em escala 1/43 foi item de desejo absoluto desses pequenos entusiastas. O sonho durou muitos anos, pois não haviam carros espetaculares sendo apresentados todos os meses. Vida simples.
Após sair da empresa para abrir seu negócio próprio de projetos e construção em 1982, batizada de Isdera ( Ingenieurbüro für Styling, Design und Racing – Escritório de Engenharia para Estilo, Projeto e Corridas), Schulz foi contratado pela própria Mercedes para fazer o modelo CW311, que, ao ficar apenas na condição de um protótipo com emblema da fábrica de Stuttgart, daria origem ao primeiro carro de sua marca, o Imperator 108i. Chegou em 1984 com relativo sucesso, trinta unidades vendidas daquele ano até 1993, com modificações ao longo do tempo, inclusive modelos targa.
Não é fácil saber como eram feitas essas negociações entre a Isdera e a Mercedes-Benz. Este primeiro carro de Schulz era muito semelhante ao C111. Só podemos entender como sendo uma grande habilidade em utilizar o projeto inicial, baseado em contratos que davam essa liberdade e que, claramente, só poderiam acontecer devido ao mais importante item dos negócios em todo o mundo, o relacionamento pessoal. Seguramente Schulz ainda tinha bons amigos na MB, já que vários elementos dos carros eram de procedência dessa marca.
A Isdera foi em frente, em mais uma evolução, e chegou ao Commendatore 112i, apresentado no mesmo ano em que o Imperator foi descontinuado. O valor estimado gasto no projeto e construção para se chegar a esse carro, atualizado, é próximo de 4 milhões de euros (R$ 10,5 milhões), algo notável para uma pequena operação. O preço a ser cobrado seria de US$ 450.000, ou R$ 930.000.
A estrela no volante diz muita coisa. Teclas, botões, quadro de instrumentos, tudo Mercedes |
Lindo chassis tubular, pintado de vermelho |
Quatro asas (de gaivota) |
Foi um grande salto evolutivo em direção ao patamar dos supercarros. O estilo é interessante, com inspiração e elementos de vitoriosos carros de corrida da Porsche, como o 917 cauda longa, o que já denota cuidado com a aerodinâmica logo de cara. Um exemplo disso é a utilização dos faróis do modelo 968, que os utilizava fixos e inclinados, diferentes dos escamoteáveis do 924/944, modelo do qual derivou. Tem chassis de tubos de aço, o que faz uma estrutura de baixo peso e sem custos de ferramentais de estampagem. Muito mais lógico para carros de baixa produção. A carroceria tem uma ótima característica que é a abertura das portas e do compartimento do motor para cima e para os lados, ao estilo asa de gaivota. Nesse caso, uma gaivota de quatro asas.
Motor de 6 litros, V-12 da Mercedes, com 408 cv, acoplado a um câmbio manual de seis marchas, fazia o carro chegar próximo de 340 km/h, com aceleração de zero a 100 km/h em 4,6 segundos. Aqui também as informações são desencontradas. Algumas revistas chegaram a andar no carro, e pelo menos uma, a Auto Motor und Sport alemã, conseguiu uma velocidade máxima bem maior que essa, acima de 360 km/h. Se o motor era o mesmo de quando o carro foi apresentado, não sabemos.
O V-12 de seis litros, bem espremido |
Um item de alta tecnologia foi incorporado ao projeto desse carro, o controle eletrônico de altura da suspensão. Com curso de 70 mm, ele adaptava a altura livre do solo de acordo com a velocidade. Uma suspensão ativa menos complexa do que as que funcionaram na Fórmula 1 nessa época, que depois foram banidas pelo excessivo custo e pelo desequilíbrio que impingiram á categoria, sendo o carro da Williams o mais famoso exemplo na época. Havia também um aerofólio móvel que atuava também como freio aerodinâmico, gerador de arrasto, na extremidade traseira da carroceria.
Aerofólio visível apenas um pouco deslocado da linha da carroceria |
Aqui mais visível, na posição de freio aerodinãmico, bem acima da grade de saída de ar quente |
Com óbvios problemas de falta de dinheiro, após um investimento tão monstruoso, a empresa foi assumida por investidores suíços por volta de 2005.
Provando que o projeto do Commendatore é algo digno de nota, a Mercedes-Benz utilizou o mesmo projeto de chassis, porém com motor atualizado para a construção do C112i, uma esperada reencarnação do programa do C111, mas mais para cá, em 1999. Foi mais um estudo para se chegar ao carro extremo da marca, e como o tempo muda muita coisa, o supercarro da empresa viria a ser feito junto com a McLaren, teria motor dianteiro e não se pareceria nem um pouco com os "C", sendo batizado com a sigla SLR.
A Isdera permanece hoje como uma prestadora de serviços de engenharia, e sua última incursão no mundo dos supercarros foi o Autobahnkurier apresentado em 2006. Um carro com estilo dos anos 1930 e dois motores Mercedes-Benz V-8.
Seria ótimo que permanecessem criando.
Seria ótimo que permanecessem criando.
JJ
Definitivamente a segunda metade dos anos 80 e a primeira dos anos 90 foram os melhores anos para os supercarros. O Commendatore é um bom exemplo disso e é um carro que hoje beira o esquecimento, sendo lembrado por alguns entusiastas que o viram ainda na época de lançamento ou pouco tempo depois.
ResponderExcluirUma baita injustiça com algo tão bem projetado.
Achei curioso ele ter o espelho retrovisor externo no teto...
ResponderExcluirLembro me de ter sugerido um post desse carro quando o JJ escreveu sobre o Chrysler ME Four-Twelve. Muitíssimo obrigado por atender a minha solicitação!
ResponderExcluirRealmente é um carro fascinante, não era o mais rápido do Need for Speed II, mas era o que mais chamava atenção.
Juvenal, vc chegou a ver este video do Isdera?
http://youtu.be/BGZuRL86hmI
Abraços!
Maravilha de post! Nem me lembrava mais desse carro. Lembro-me que, quando li a respeito pela primeira vez, o que me chamou a atenção foi justamente o fato de possuir quatro portas abrindo-se no estilo asa de gaivota.
ResponderExcluirEu sou mais o DeTomaso Pantera
ResponderExcluirBoa Juvenal! No Need for Speed 2 constava esse carro no playlist, muito interessante a historia. Um abraço do Seu Buce.
ResponderExcluirPutz, botão de farol giratório.... A famosa teimosia germânica...
ResponderExcluirAliás, ninguém vai reclamar das saídas de ar giratórias?
ResponderExcluirQuando eu era criança eu tinha uma miniatura do C111 com as portas "asa de gaivota" que se abriam. Acho que era da match-box. Adorava esse carro!
ResponderExcluirValeu pelo post!
Claro que é uma questão absolutamente subjetiva, mas, em termos de design, o Imperator/CW311 deixava esse Commendatore no chinelo.
ResponderExcluirCurioso é que o CW311, embora fosse um protótipo Mercedes, usava volante e mostradores de Porsche e botões de painel da Opel, por sinal idênticos ao comando de luzes do Chevette!
"Less is more",já dizia Mies van der Rohe. Muito bonito mesmo... a C111 é bem desajeitada em comparação, como é típico das Mercedes velhas.
ResponderExcluirPróximo: Cizeta Moroder (espero...).
ResponderExcluirLembrei dele assim que abri o post. O V16T.
ExcluirEstou reconhecendo esses botões de luzes... Parecem ser dos vw dos anos 80/90...
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=TOeTKlCPOss
ResponderExcluirOMG,,, its too fast!!
ResponderExcluirQue maravilha de carro !
ResponderExcluirImaginem uma evolução em todos os sentidos da linhagem Commendatore !?
Um AMG 7.3 V12 de 700cv cairia muito bem para começar...rs
lanternas traseiras de MB 1113
ResponderExcluirPodem falar o que quiserem! Mas é um modelo que só ao olhar já se percebe que quem fez a criação entende de carro...Beleza ímpar de linhas, harmonia e eficiência aerodinãmica( Fartamente mostrada em carros italianos e difícil de encontrar em designs alemães da época!) associada à simplicidade e confiança de uma mecânica exaustivamete testada,segura e eficiente ( Coisa que os belos italianos numca tiveram!) Belo post! Agradeço por compartilhar conosco. Pode parecer bobagem ou saudosismo mas me sinto orgulhoso por pertencer a uma geração onde um bom e belo automóvel não era apenas um item de consumo e ostentação financeira mas uma prova de que você realmente entendia daquilo que dirigia... Também acho, como alguém já comentou acima, que os anos 80 e 90 foram realmente felizes em criações e desenvolvimentos mecânicos.
ResponderExcluirMuito bom JJ!
ResponderExcluirEsse carro é um dos mais interessantes supercarros de sua época.
abs,
JJ,
ResponderExcluirMais uma pérola resgatada. Parabéns !!
very good car,,i like all
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