google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 QUANDO A AUTORIDADE NÃO ENTENDE - AUTOentusiastas Classic (2008-2014)

QUANDO A AUTORIDADE NÃO ENTENDE

 Foto: billzilla.org
Exemplo de engrenagens soldadas à árvore

Em 1984 fui admitido na Volkswagen especificamente para dirigir a atividade de competições da fábrica. Como eu tinha vivência e trânsito na CBA, e tinha intimidade com os regulamentos técnicos do automobilismo, eu logo passei a representar a VW perante a entidade. Inclusive, precisei tirar a carteira de concorrente, como fábrica, pois disputaríamos o titulo de marcas e só como concorrente eu  estaria qualificado para entrar com algum eventual protesto esportivo.

Bem no final do ano passado escrevi o post "Quem não tem cinco corre com quatro" falando sobre a solução que tivemos que dar quando ficou decidido pelo Conselho Técnico-Desportivo Nacional  (CTDN)- por pressão da Fiat, Ford e General Motors - que nossos Voyages não poderiam usar câmbio de cinco marchas, já que o carro de produção ainda saía com apenas quatro marchas.

Vencemos a prova de aberura, em São Paulo, com um 1-2, mas na corrida seguinte, em Brasília, fizemos 1-2-3-4, esmagando a concorrência.

Terminada a corrida, a notícia de que todos os Voyages teriam de ter os câmbios desmonstados e vistoriados. quanto a  conformidade com o regulamento técnico, o Grupo B Brasil.  Só carros da fábrica, cinco com equipes e pilotos contratados e cinco apenas cedidos para outros pilotos., dez no total. Não me lembro se havia mais Voyages naquela corrida.

O fato é  que os dez transeixos foram desmontados com o objetivo de contagem de dentes as engrenagens, que eu tinha certeza tudo estar conforme a ficha de homologação. Mas...

Os comissários técnicos "descobriram" que havia soldas nas engrenagens. E a notícia logo ecoou na garagem atrás dos boxes, onde a vistoria estava sendo feita, "Os carros da Volkswagen estão fora do regulamento, vão ser desclassificados!!!"

A opinião dos comissários técnicos se baseava num item do regulamento que diz que soldas em componentes mecânicos são proibidas. E de fato são, eu mais do que ninguém sabia disso - lembre-se, eu conhecia a fundo os regulamentos, tanto técnicos quanto esportivos.

Só que o regulamento em que se basearam para concluir que houve infração dizia respeito ao concorrente/[piloto, as chamadas modificações autorizadas e as proibidas.

De fato, para fazer o câmbio de quatro marchas com escalonamento diferente, o que era plenamente amparado pelo regulamento de homologação, tivemos, como fábrica,  que produzir os conjuntos de engrenagens especiais com algumas delas soldadas na árvore primária. Obviamente, não se tratava de um concorrente/piloto aplicando a proibida solda, mas um processo de fabricação que a fábrica escolhera, para o que é soberana. É a fábrica que escolhe os seus processos de fabricação, a autoridade desportiva não pode interferir nisso..

Foi como muito custo, muita conversa com os comissários desportivos e com o presidente do CTDN Caio Alfaya, ali mesmo na pista, que lhes fiz entender o princípio. Por pouco não fomos desclassificados.

O curioso é que era o ano de lançamento do Fiat Uno e pedi à agência de publicidade da VW, a AlmapBBDO, que preparasse um anúncio para jornais e revistas que consistia de fotos dos quatro Voyages e sob cada um, na ordem de chegada, "Uno - Due - Tre - Quattro". Mas o marketing da fábrica considerou-o agressivo demais e vetou as pretensões do departamento de competições...

Nessa corrida a autoridade custou a entender mas entendeu, porém na de Guaporé, alguns meses mais tarde, seria diferente.


O Voyage ainda não tinha discos ventilados de produção e vínhamos obviamente tendo problema de fading. O regulamento de homologação autorizava homologar discos ventilados como Variante Opcional sem produção mínima e tratamos de fazer isso. Lembre-se, quando digo "tratamos" quero dizer a fábrica.

Os únicos discos disponíveis nos fornecedores eram os de Chevrolet Monza, que foram usados por nós. Era necessária uma pequena usinagem para encaixá-los no cubo de roda e isso foi feito rapidamente e sem problema na fábrica. Procedmos à homologação, concedida imediatamente e assinada pelo presidente do CTDN, como o regulamento de homolagação preconizava..

Ocorre que em meio a tudo isso havia uma briga no âmbito da CBA, um membro do CTDN andava às turras com o presidente Caio Alfaya. Justamente essa pessoa fora designada pela CBA para ser o comissário desportivo da corrida. Na sexta-feira foi logo dizendo que os Voyages não poderiam correr com aqueles discos porque "eram de Chevrolet'". As fotos na ficha de homologação mostravam a origem, pois o logotipo e a sigla GM estavan no fundido.

Novamente a tentativa de explicar que a fábrica é soberana para produzir da maneira que quiser, mas o comissário desportivo foi irredutível. Ou usávamos os discos não ventilados, ou não corríamos. Isso já no final de tarde de sexta-feira.

O jeito foi procurar um advogado e impetrar mandado de segurança para obter uma liminar, que nos foi concedida sem maiores problemas. O advogado, Dr. Hélio (não tenho certeza, acho que era Silveira) foi de uma eficiência ímpar.e até concordou em fazer o serviço "fiado" - só na semana seguinte o pagaríamos.

Corremos, vencemos, mas no final os Voyages foram desclassificados.pelo comissário desportivo.

Não sei o final dessa batalha jurídica, pois chegamos ao final do campeonato com ampla margem de pontos sobre a segunda colocada Ford, de modo que aqueles pontos não nos fizeram falta para obter título de campeã de Marcas de 1984.

Automobilismo é mesmo complicado!

BS

18 comentários :

  1. Automobilismo, atletismo, esgrima, truco são complicados qdo aparecem os políticos de plantão. Conheço sua ética impar, Bob, mas este cidadão da CBA deveria ter seu nome publicado.

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  2. Ciro Margoni
    Sabe por que não o citei? Primeiro, ele não está mais na CBA. Segundo, éramos muito amigos, mas as circunstâncias nos levaram ao confronto e, claro, isso abalou a amizade. Felizmente voltamos às boas depois de alguns anos. Por isso preferi não expô-lo.

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  3. Bob, gostaria muito de ver um post sobre a tecnica desses Voyages e Passats que voce comandou. Preparaçao, potencia, desempenho e, especificamente, o tempo de volta na pista de Brasilia. Lembro me de um pequeno teste na 4R de um voyage semelhante a esses e o desempenho, principalmente em curvas, era muito bom.

    Abraço

    Lucas CRF

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  4. Bob, tive um Voyage 85 e naquela época se falava que alguns desses carros saíram de fábrica com potência maior do que os demais.
    O meu era para uso comum, mas a regulagem de motor foi feita em Timbó (SC), por uma empresa que trabalhava com motores para corridas.
    Eu posso dizer que esse carro era muito veloz e sempre vencia o páreo
    com carros considerados mais potentes.
    Será que isso era devido a preparação ou o carro tinha mesmo mais potência do que a fábrica dizia ter?

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  5. Gustavo Cristofolini09/07/2011, 11:50

    Bob, por favor faça mais posts sobre esse tipo de assunto. acho muito legal essas interpretações de regulamento e as soluções encotradas na época.

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  6. CCN1410;

    Vou te contar um causo: Meu pai foi sócio de uma construtora e eles tinham um Gol S 1985 4 marchas azul marinho (nao sei se era AP ou MD270).

    O carro, diziam alguns, tinha motor 1.8. para outros, um engenheiro que andava com ele tinha mexido no motor mas o fato é que o apelido do Gol era "Trovão Azul" pois batia qualquer outro numa arrancada. Deixava até Monza S/R para trás

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  7. luiz borgmann09/07/2011, 14:04

    Me parece que os motores bielinha (BS e MD270)foram produzidos até 1983. O ano em que o Bob se refere, 1984, já estariam os motores AP bielão (com bielas de 144mm contra 136mm dos anteriores), além de diâmetro e curso diferentes também. Mas além desses fatores, quer me parecer que na mesma época 1984 referida por Bob aparece o comando 049, amplamente utilizado por preparadores até hoje. Também gostaria que Bob, se o lembrar, fizesse comentário técnico a respeito das técnicas de preparação dos bielinhas (BS ou MD). Vale ainda lembrar que, até hoje, os regulamentos técnicos de preparação para cada categoria são, antes de tudo, amplamente esmiuçados por preparadores ou técnicos da área, visando ao encontro de "brechas" não suficientemente esclarecidas no teor e, portanto, sujeitas a confrontação técnica. Isso "pode", isso "não pode". Muito se viu e vê, nos motores protestados, principalmente em relação à taxa de compressão: para a aferição, o motor deve estar nivelado com a rosca da vela, o volume encontrado deverá ser aferido...blablabla. Houve uma época em que a aferição era mesmo no término da corrida, a patota toda debruçada em cima do motor, os diretamente interessados e mais a turma do lambe-lambe, aquela gritaria, empurra-empurra, era mesmo quando o regulamento era muito apertado, tipo div.1, os olheiros todos de plantão hehehe. Valeu o post Bob.
    luiz borgmann

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  8. Anos 80....

    Agradeço ao meu pai p/ me levar em tantas 12H de Goiânia!

    Era lindo ver corridas de verdade c/ carros de verdade!

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  9. Bob, aproveitando o gancho gostaria de pedir q vc fizesse um tópico explicando como se faz o cálculo de reescalonamento de marchas.

    É algo mto pouco difundido e eu gostaria mto de aprender, principalmente como se calcula a 1ª marcha.

    Sou um entusiasta de carros preparados e é mto difícil readequar meus carros preparados às relações de marchas corretas.

    Pense c/ carinho na ideia.

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  10. Lucas CRF
    A fábrica não preparava os motores ao grau máximo, apenas o básico, como definição do comando de válvulas e carburação, que era um Weber 36 duplo vertical. Cabia a cada uma das cinco equipes contratadas a preparação de concorrente propriamente dita, com elevar taxa de compressão para em torno de 15:1, otimizar dutos do cabeçote, providenciar o coletor de escamento dimensionando etc. Os motores beiravam os 140 cv. Os carros usavam Pirelli slick 175/50-13 e eram bem rápidos de curva. Aceleração da imobilidade nunca nos preocupamentos em medir devido à primeira marcha bem longa, que na verdade era a segunda. Não me lembro do tempo de volta típico em Brasília.

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  11. O Voyage foi o primeiro carro que dirigi, fiquei o primeiro ano de carteira com um Voyage 93 do meu avô. Otimo carro! ficou na memória.
    Sempre bom ouvir histórias sobre ele, vlw Bob

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  12. Pisca
    Aguarde, em alguns dias sai. Você vai ver que é relativamente simples.

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  13. Aeeeeeeeee!!!!!!!!!

    Valeu Bob!

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  14. Ok, Bob, valeu. 15 de taxa é bruto!
    Abraço

    Lucas CRF

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  15. Mas o cambio de 4 marchas, soldado, nao era diferente do cambio do carro original?
    Nao era, portanto, uma modificacao, como o cambio de 5 era?
    Pode ser que o regulamento permitisse modificacoes na relacao, mas aih entra a questao da solda, proibida.
    Ou seja: nenhum outro Voyage de rua tinha um cambio soldado. Portanto, nao era um metodo de fabricacao. Era, sim, um metodo de alteracao (que nao podia ser feita mediante solda).

    Nao era porque era feito pela fabrica que era um metodo de producao.
    Senao, nenhum carro precisaria um numero minimo de exemplares fabricado/vendido para ser homologado para competicao...
    Por este raciocinio, bastava que a alteracao fosse feita na fabrica, em um carro jah existente, e tudo bem. Passava a ser um metodo de FABRICACAO porque foi feito na fabrica.

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  16. Anônimo 10/7 13:40
    O câmbio soldado era original de fábrica, nós é que o fazíamos. Como escrevi, a fábrica é soberana para produzir da maneira que quiser. Quem não poderia soldar é quem comprasse um Voyage para correr e aplicasse alguma solda. Isso que você não entendeu, a autoridade desportiva também não, daí o post. O mínimo de produção é para a série. Variantes opcionais (VO) como o câmbio com escalonamento diferente não requerem produção mínima, é inclusive regulamento de homologaçào da FIA. Todo carro é minuciosamente descrito na ficha de homologação, que é o instrumento usado pelos comissários técnicos para verificar conformidade (ou não) com o que está homologado. Isso que você aventou, fazer uma modificação não autorizada na fábrica não a torna autorizada. Há uma distinção clara entre produção (fábrica) e preparação (concorrente/piloto).

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  17. Bob GENIAL o add que tu pensou... pena isso ser incomum no Brasil, fosse na Europa...

    Coloco fé que teria marcado época... Pena...

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  18. João Gabriel12/07/2011, 15:11

    Poxa ,os Voyaginhos papavam todas heim rsrs,quem diria que aquele sedanzinho poderia ser um puro sangue de corridas...rsrs

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