Por Rex Parker, de Huntington Beach, Califórnia, EUA
Fotos: autor/arquivo pessoal
Alguns meses atrás, no canto de um escuro galpão no leste de Los Angeles, descobri um carro raro e interessante. Um carro com nome tão comprido - “Crown Imperial Ghia Landau Limousine” - quanto ele próprio. Preto por fora, com a cabine do motorista estofada em couro preto, e a dos passageiros num tecido aveludado cinza, com aparência, toque e cheiro de puro luxo. No espaço traseiro, frisos cromados com apliques de uma madeira bem exótica. Uma sensação de qualidade, suntuosidade e exclusividade por fora e por dentro.
Fotos: autor/arquivo pessoal
Alguns meses atrás, no canto de um escuro galpão no leste de Los Angeles, descobri um carro raro e interessante. Um carro com nome tão comprido - “Crown Imperial Ghia Landau Limousine” - quanto ele próprio. Preto por fora, com a cabine do motorista estofada em couro preto, e a dos passageiros num tecido aveludado cinza, com aparência, toque e cheiro de puro luxo. No espaço traseiro, frisos cromados com apliques de uma madeira bem exótica. Uma sensação de qualidade, suntuosidade e exclusividade por fora e por dentro.
Na foto de cima, a cabine do motorista; para os ilustres passageiros, o melhor em conforto |
De lá, a maioria dos carros voltou para os States para serem vendidos. Digo a maioria porque alguns ficaram na Europa ou Oriente Médio para satisfazer os desejos de clientes distintos lá, os famosos VIPs.
Mas, como tudo isso aconteceu? A história começa no fim da Segunda Guerra Mundial com a decisão da Cadillac de produzir uma quantidade limitada de limusines - nesse caso, a definição de limusine é um sedã alongado, com três fileiras de bancos, a segunda escamoteável – e capacidade de entre seis e sete passageiros da Série 75 “feita em casa” ou, como dizemos aqui nos States, in-house production.
Isso variava conforme a situação antes da guerra, quando os enormes 75 e 90 recebiam carroceria feita separadamente pela Fleetwood ou algum outro fornecedor, com apenas o chassi, a grade, as lanternas dianteiras e o capô propriamente dito feitos “em casa” pela Cadillac.
Dois bancos auxiliares escamoteáveis e, claro, divisória para maior privacidade
A produção pós-guerra da Série 75 sempre foi baixa, até o ponto em que a aparência externa nem sempre mudava de ano em ano como os Cadillac normais - o modelo 1947 ficou em produção até 1950, o de 1964 até 1966. Os clientes eram os poucos ricos que ainda tinham chofer particular - geralmente grandes dames idosas que não dirigiam mais, alguns magnatas da indústria em Nova York e algumas funerárias que levavam as famílias dos falecidos da igreja ao cemitério.
A produção in-house das limusines Cadillac acabou em 1984. A Cadillac ainda oferece limusines, mas essas são convertidas por empresas independentes aprovadas e certificadas pela marca.
Voltando aos anos 1950, uma época de grande crescimento econômico nos Estados Unidos – até no mundo inteiro –, o que a Cadillac fazia, a Lincoln e a Chrysler queriam fazer também.
Na Lincoln, fazer uma limusine era mais difícil porque os modelos 1952 a 1955 eram mais “esportivos” que luxuosos, os 1956 e 1957 tinham colunas finas que não davam para construir uma cabine “formal”, e os 1958-60 eram monobloco, não dava para aumentar o entreeixos.
Na Chrysler era diferente. A marca Imperial, oficialmente separada da Chrysler pela primeira vez em 1955, ofereceu carros completamente novos para aquele ano e tinha grandes aspirações de concorrer diretamente com a Cadillac.
Os carros tinham carroceria e chassis separados, que permitia alongamentos. E a Chrysler já tinha uma relação boa com a Ghia para fazer modelos de baixa produção. E aí surgiu o Crown Imperial Limousine, montado inteiramente em Detroit para os modelos 1955 e 1956, e depois na Ghia, começando em 1957 e com os últimos exemplares produzidos em 1965.
Para fabricar os carros na Ghia, a Chrysler mandava à Itália um cupê duas-portas (já com pára-lamas traseiros encompridados) montado num chassi reforçado de conversível e com molas mais duras da station wagon Chrysler. Dentro do interior vazio, a Chrysler mandava quatro portas, uma extensão do cardã e os materiais do interior. Aí a Ghia cortava a carroceria, alongava o chassi em 521 mm, ligava as partes dianteira e traseira, pintava os painéis e instalava o interior.
Todos os espaços entre os painéis eram preenchidos com chumbo – 75 kg por carro. O processo era razoavelmente complicado, sendo que a produção anual variava entre nenhum em 1962 a 36 em 1957.
Em 1960, a intenção era produzir 25 carros. Acabaram produzindo só 16. Nos nove anos de produção na Ghia o total chegou a 132 unidades.
Eram carros imensos. As dimensões e especificações variavam ano a ano, mas no que nos interessa aqui, o de 1960, o entreeixos era 3.797 mm; o comprimento, 6.215 mm; a largura, 2.037 mm; e a altura, 1.486 mm. Os carros de produção normal - ou seja, sem blindagem ou outras modificações - pesavam entre 2.800 e 2.900 kg.
Entre 1957 e 1959 o motor era o lendário Hemi V-8 de 6,4 litros (392 pol³), que em 1960 passou a ser o V-8 OHV de 6,8 litros (413 pol³). A potência? 355 cv (SAE bruta) a 4.600 rpm e o câmbio, automático TorqueFlite de três marchas.
E que carros! Só pesquisando a lista dos donos originais dá para ver que não eram para qualquer um. O chefe da RCA, David Sarnoff, era freguês. A escritora Pearl S. Buck. O presidente Achmed Sukarno da Indonésia. O rei da Arábia Saudita. Um príncipe e um sheik do Kuwait. O emir de Qatar. O ditador Rafael Trujillo da República Dominicana. A empresária de cosméticos Helena Rubinstein.
A Casa Branca alugou um do ano de 1960 para uso pessoal de Jackie Kennedy. Foi esse carro que a levou e os filhos pequenos Caroline e John ao funeral do Presidente Kennedy em Washington, D.C. em 1963.
O dono original do exemplar ano 1960 que descobri no galpão era um certo Nelson A. Rockefeller (ao lado), neto de John D. Rockefeller, fundador da Standard Oil (Esso no Brasil). O Nelson tinha dinheiro que não acabava mais, mas não era propriamente filho do pai – nem neto do avô. Durante uma vida cheia e produtiva, foi governador do estado de Nova York e até vice-presidente da República no governo de Gerald Ford.
Era também um bon vivant, pois parece que o casado Nelson morreu de infarto na companhia de uma assistente bem mais jovem…
De qualquer maneira, e como já dá para ver, era preciso o dinheiro de um Rockefeller para comprar um desses Crown Imperial Ghias. Ainda mais que esse exemplar foi encomenda especial com quatro janelas em vez das seis normais, o único de 1960 que foi fabricado assim. O preço dos carros da produção inicial em 1957 era de US$ 12.000. Subiu para US$ 16.000 em 1960 e US$ 18.500, em 1963.
O normal era ter seis janelas, só o encontrado tinha quatro |
Ainda assim, a Chrysler perdeu milhares de dólares em cada venda. O custo do carro - e a enormidade das perdas - é difícil de calcular, mas a Chrysler estimou em maio de 1956 que se o modelo 1957 tivesse sido produzido em Detroit, o preço teria que ser US$ 33.000 para dar lucro. Como referência, o Rolls-Royce Silver Cloud II saloon ou o Ferrari 250 Pininfarina II cabriolet de 1960 custavam ao redor de US$ 12.000. Como eu já disse, não era carro para qualquer um.
Durante o encontro com esse carro especifico de 1960 tive a oportunidade de sentar no banco dianteiro e no banco traseiro, mas não de andar na rua. Nem precisava. Já dava para saber que seria grande, confortável, escuro e isolado. A pura definição de luxo 50 anos atrás.
Dizem que o luxo de hoje é diferente do luxo do passado. Acho provável que seja, sendo que o mundo de hoje é mais lotado, mais perigoso e mais igualitário que o mundo dos nossos pais. E com isso - exceto pelo Rolls-Royce Phantom EWB e pelo Maybach 62 - realisticamente falando não é mais possível fazer carros assim.
É como se fosse um mundo um pouco fora do foco, um pouco preto e branco ou até sépia, que o vento levou.
Que trambolhão exagerado...
ResponderExcluirEu, heim!
Ah!
Particularmente não vou com as "caras" de limosines. Acho que aquele encompridamento de suas carrocerias prejudicam demais a estética do modelo original. Então, que tal darem uma olhada nos Chrysler Imperial normais, digitando "1955 (Chrysler) Imperial Home Page" na barra de procura do Google (e a cada ano que puserem no lugar do "1955", aparecerá a home page específica para o ano em questão)? Estas barcas dos 50's sim, me fascinam!!! Se eu salvasse a vida da filha se um sheik do petróleo e ele em agradecimento, me mandasse escolher entre qualquer "transatlântico" (não necessariamente um Chrysler Imperial, poderia ser um Cadillac Broughan, um Pontiac Star Chief, um Lincoln Premier, ou outro destes espetáculos) dos anos dourados em absoluto estado de conservação e originalidade e qualquer super-hiper-mega-baita-ultra-supra esportivo como Ferrari, Lambo, Lotus, Audi R8 Gt, etc, 0Km que ele me daria um, eu não ficaria indeciso nem pela menor fração de tempo que um super-computador da Nasa pudesse calcular. Sem culpa, sem arrependimento, e sem medo de ser feliz, ficaria com a "barca".
ResponderExcluirCorreção: em minha mensagem anterior, onde escrevi "prejudicam", leia-se "prejudica".
ResponderExcluirTambém gosto destas barcas. Lembremos que até as mulheres da época dirigiam estes carros imensos, fazendo baliza e tudo, sem sensores de estacionamento e câmeras de ré que hoje vemos em Palios e Foxes por aí... Gosto muito dos Pontiac Catalina e Mercury Country Cruiser dos anos 60´s, verdadeiras salas de estar climatizadas ambulantes...
ResponderExcluirSou muito Fã do Imperial !
ResponderExcluirPrincipalmente os 1966 e 1970,Com motor 440 e transmissão torqueflite !
Agora me deu vontade de ter um Itamaraty Limusine....
ResponderExcluirSe JFK estivesse nesse carro naquele passeio em Dallas ele ainda estaria vivo.
Ótimo post Rex!
Não tenho tanta certeza mas acho que um desses foi usado nas filmagens do segundo filme da trilogia "The Godfather" como sendo o carro que transportava Michael Corleone, interpretado por Al Pacino, filme esse de 1974. A conferir.
ResponderExcluirMFF
Sei não... não fosse em Dallas seria em outro lugar ou de outra maneira. Quem mata um presidente tem de estar muito determinado a fazê-lo. E possuir muito respaldo, também.
Aleluia! Rex Parker apareceu!
ResponderExcluirE com um excelente post!
Parabens e seja bem vindo!
Não era uma limousine,mas um reles Crown Imperial sedan de pobre q. levava o Paulo Maluf na escola.Mas , com o tempo,o gosto e a conta no banco evoluiram o suficiente para ter um Jaguar by Lister.Eu queria os dois
ResponderExcluirBelo carro sem contar o contexto histórico!!!! Obrigado pelo post! Abraços
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