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O último dos Pegaso, Z103 |
Na Espanha, uma grande parcela do veículos pesados e
militares são da marca Pegaso,
atualmente Iveco, já que a empresa foi absorvida pelo gigante italiano.
Na década de 1950, quando
era 100% espanhola, de Barcelona, a empresa quis mostrar sua capacidade e refinamento
técnico, e fabricou alguns modelos de carros esportivos que estão entre as
raridades interessantíssimas e disputadas por colecionadores abonados. Foram
apenas 125 carros no total, antes da empresa retornar aos comerciais e
militares, especialidade pura.
A parada dessa produção se deve principalmente à
aposentadoria de seu criador, Wilfredo Ricart, um nobre catalão, engenheiro de embates técnicos e pessoais com nada menos
que Enzo Ferrari, na época pré-Segunda Guerra Mundial, quando ambos trabalhavam com os
carros de corrida da equipe de fábrica da Alfa Romeo. Dizem que Ricart o provocava freqüentemente, e Ferrari não entendia as brincadeiras, piorando uma situação já
desconfortável, que culminou com a demissão de Enzo Ferrari, já que Ricart era
seu chefe. Assim, grosso modo, devemos a Wilfredo Ricart a criação da fábrica
Ferrari.
O último modelo de carro Pegaso, o Z103 de 1953, foi recriado em 1992, em uma série que deveria
ser de apenas doze unidades, para deleite de quem é admirador da marca e das
modernizações de carros antigos. Que fique claro, o carro foi feito para ser
caro, exclusivo e perfeitamente adaptado aos tempos quarenta anos mais novos do
que quando foi criado. Assim, todo o interior é diferente, já que as
superfícies excessivamente contundentes foram eliminadas, o que altera
substancialmente os comandos por teclas e botões, apesar da forma geral do
painel ter sido mantida. Ele passou a ser acolchoado, para que uma cabeça não
fosse desintegrada em caso de choque, requisito legal em qualquer país sério do
mundo. Ou pelo menos um requisito técnico de segurança das fábricas sérias.
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Interior muito parecido, mas todo diferente |
Essa recriação foi desenvolvida pela IAD – International
Automotive Design, empresa de Worthing, Inglaterra, apenas e tão somente para
publicidade da marca espanhola, idéia surgida em 1990, quando foi definido que em 1992 o carro deveria estar disponível para um público seleto. Esse ano foi escolhido pois havia sido adotado como o
Ano da Espanha, para celebrar a saúde econômica do país, quando também ocorreu a Olímpíada de Barcelona
e a comemoração dos 500 anos do descobrimento da América por Colombo, italiano
de nascimento mas espanhol de patrocínio de explorações. Imaginar que hoje, vinte anos depois, a
Espanha vive a maior crise econômica de sua história (só comparável à guerra
civil de final dos anos 1940) é uma mostra
que tudo que é tido como permanente e sólido pode mudar. Fiquemos atentos por
aqui também.
O Z103 original de 1953 tinha motor V-8 de projeto e
fabricação próprios, com transeixo na traseira e suspensão do tipo ponte De
Dion. Fazer um novo motor estava além do propósito necessário, já que nunca se
pensou em uma reprodução exata. Foi adotado o eterno Rover V-8 de alumínio com
3,9 litros de cilindrada, o transeixo do Alfa Romeo 75 e uma suspensão de mesmo
tipo de 1953.
O carro foi idéia de duas pessoas, basicamente. O inglês Jim
Mason, que trabalhou na Vauxhall e na Leyland, antes de se tornar o diretor
técnico da Pegaso em 1987, e o espanhol Manuel Lage, gerente de planejamento de
produto, um entusiasta dos antigos esportivos de alto luxo da marca. No meio
tempo entre a idéia, a aprovação da mesma e o início do trabalho, Mason passou
a diretor de operações internacionais da IAD, e obviamente assumiu o comando da
realização do sonho.
O modelo escolhido foi um dos três carros fabricados que ainda
permanecem com a empresa na Espanha, uma carroceria desenhada por Serra, da
qual não haviam desenhos técnicos de fabricação. O carro teve que ser copiado com
base em medições e moldes negativos.
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O Z103 original, de 1953 |
As alterações foram para atender requisitos europeus de segurança,
como, por exemplo, as maçanetas, que têm estilo idêntico, mas que abriam da
frente para trás em 1953, gerando duas pontas que poderiam enganchar um
pedestre. Em 1992 o sentido de abertura foi invertido, de trás para frente. Os
bancos passaram a ser individuais para maior segurança e conforto, já que era
inteiriço.
Todos os componentes de carroceria foram fabricados
usando-se moldes de custo menor dos que os utilizados em grande produção. São
chamados de soft tooling (ferramental
macio) , por serem mesmo menos
resistentes. Basicamente são moldes de aço com pouca resistência ou alumínio, dependendo de qual peça devem
fazer. Isso fez o carro ser mais barato do que se fosse feito à mão, e cerca de
vinte operações podiam ser realizadas para cada molde de estampagem de chapa de
metal, ou de injeção de plástico, antes que se deformassem.
A posição de dirigir foi quase totalmente mantida, para
poupar críticas. Dirige-se um pouco espremido na porta à esquerda, com o
volante deslocado mais para a direita, exatamente como no carro original.
A direção não tem assistência hidráulica e os pneus são diagonais, Avon Turbospeed, para dar a mesma sensação de dobrar em curvas e dar bastante aviso de perda de aderência como na década de 1950. Esse sistema é bastante antigo em sensações. O efeito de auto-centragem conseguido com as geometrias mais atuais de direção foi desconsiderado nesse projeto, e o motorista tem que ficar “caçando” a linha reta o tempo todo. Há também o chamado kickback, quando alguma irregularidade passa das rodas às mãos do motorista, e o volante se movimenta vibrando. Mais ou menos como acontece em jipes e picapes de conceito de chassis e direção mais antigos.
As suspensões são feitas de componentes Alfa-Romeo,
modificados para a pequena bitola, e mantêm os movimentos curtos de sobe e
desce típico dos esportivos duros de molejo, além de permitir uma tendência a
sempre sair com a traseira nas curvas tomadas de forma mais forte.
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Um das raras fotos da recriação em movimento |
Não se adotou freios a tambor, que eram juntos da saída do
câmbio na traseira do carro original (inboard), longe das rodas,
uma clara observância às normas modernas, onde distâncias mínimas de parada
devem ser atendidas, algo que os tambores podem fazer, mas teriam que ser muito
grandes e obviamente, mais caros que os discos adotados, com assistência por
servo. Além disso, os freios inboard tem a tendência a colocar forças torcionais em eixos e semi-eixos, o que colabora para diminuir a vida útil dos mesmos, além de serem de pior dissipação de calor.
No final, foram fabricados onze carros dos doze planejados. Acabou sendo uma reprodução um pouco
livre demais de um clássico, e supostamente nunca terão o valor monetário de um
Pegaso autêntico, que ronda os 400.000 euros (1,048.milhões de reais).
JJ
Com todos os senões e não obstantes,um carrinho muito simpático e que chama a atenção. Não conhecia e considero -o mais um dos vários fabricados para marcar um evento qualquer ou a marca do fabricante e que se transformaram em ícones pela raridade ou pela "presença". Legal!
ResponderExcluirHoje minha internet estava intermitente, vamos ver se melhora, não estava abrindo quase nada.
ResponderExcluirMais uma grande empresa automobilística absorvida.
ResponderExcluirLogo, muitas outras também serão!
Parece uma Corvette C1.
ResponderExcluirO uso de geometria de suspensão antiquada não casa com as soluções tecnológicas modernas usadas em outros aspectos do carro. Quem quer sentir o "driving" de um carro de época, deveria comprar um original.
Creio que, com impressão em 3D, em breve teremos uma enxurrada de réplicas por aí.
Ouvi dizer que, em 1979, a Ford fabricou 500 Ford T 1929. Você que é fordista, deve conhecer os detalhes e poderia fazer um artigo sobre isso.
Não conhecia este carro muito interessante, considerando a época de sua fabricação. Sempre bom conhecer um pouco mais sobre a história do automóvel. Concordo com Lorenzo Frigerio, lembra o Corvette C1. Já que a reprodução atendeu a algumas exigências da modernidade quanto à segurança, pneus radiais talvez teriam sido bem-vindos.
ResponderExcluirFala isso para um engenheiro da Mercedes Benz quando ela resolver fazer uma réplica. Se ele revirar os olhos, cair duro no chão e ter uma convulsão, não diga que não avisei.
ExcluirPena que a IVECO pertence ao grupo FIAT. Já tem o Viper com a mesma proposta, apesar do V10. Sem contar as Maseratis, Ferraris e as mais baratas Alfas "competizione"...
ExcluirJJ,
ResponderExcluirGostei muito, não sabia quase nada dessa reprodução, a não ser o fato que existiu.
Parabéns!
Me deu vontade de falar do original, como conversamos...
Abraço
MAO