google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014)


Eu nunca tinha passado tantos dias abaixo de zero. De -6 °C a -20 °C. Como vocês podem imaginar, foi uma passagem de ano bem gelada.
Minha primeira vez na Suécia, no inverno, trouxe várias revelações: do frio, do povo, do país, da experiência de dirigir na neve e até de um motor flex não brasileiro.

A companheira foi uma perua Volvo V50 Flexifuel. Modelo de entrada, era a que estava disponível para esta viagem marcada às pressas. Câmbio manual, tração dianteira apenas, o que me preocupou um pouco no início. O carro vem com uma escova/raspador de gelo (para os vidros) e um cabo pra conectar o carro em postes de alimentação de energia elétrica pra manter a bateria viva em períodos mais longos de inatividade (logo me vem à cabeça como será fácil esse povo se adaptar aos elétricos que precisam de recarga à noite, pois a infraestrutura básica já está lá!). Não gostei muito de encontrar um kit de primeiros socorros no porta-malas...

Nesta foto, percebe-se que a convivência com a neve certamente influencia o design sueco!

O acabamento não chega a ser luxuoso, mas os plásticos são todos macios e bem acabados. O carro tem um design interno bem resolvido com o console "flutuando" com os controles de rádio e ar condicionado e o utilíssimo aquecimento de bancos. Usei muito o cruise control nas monótonas estradas de lá.

O simples ato de entrar, arrumar o banco e espelhos e sair dirigindo não funciona na Suécia. O para-brisa estava cheio de neve. Uma passada do limpador, ruído seco e nada. Quem sabe com o líquido de limpeza (acho que é etilenoglicol)? Após o forte cheiro, melhora, mas ainda não dá pra dirigir. Olho pro raspador de gelo e imagino que não deve ser tão complicado assim... De fato, segundos depois estou pronto pra partir (impressionante como somos ágeis quando estamos morrendo de frio!).

Rodando, a primeira coisa que se nota é o alto ruído de rolamento. Todos os carros rodam com pneus de inverno, com desenho específico para tracionar na neve e tachas nas duas fileiras mais externas. Não consigo nem julgar se o asfalto é bom ou não, não tinha como se notar isso. É barulhento. Eu não sabia, mas estava rodando com E85. Não percebi nada de diferente na partida ou na performance, nem no ruído do motor (para se notar aspereza), que era encoberto pela aspereza do rolamento. A autonomia foi terrível, 350 km e já cheguei quase à reserva. Fez menos de 10 km/l, basicamente em estradas. Dias depois, reabasteci o tanque com gasolina (usei a de 98 octanas), rodei 450 km e ainda não havia chegado à reserva. A diferença de preço do E85 para a gasolina (95 octanas) era de cerca de 10%. Economicamente, não valeria a pena. Mas não notei nenhuma dificuldade de partida com E85.

Dirigir na neve é, no mínimo, divertido. Todo semáforo é um exercício de controle (ou uma brincadeira com o controle de tração), em toda rotatória dá pra soltar a traseira (lembrando que elas são emolduradas por 50 cm de neve, não tem uma boa área de escape), dá pra escrever uma tese sobre o funcionamento do ABS (cheguei a freiar por uns 80 m com o pedal tremendo e o ABS funcionando sem parar em um lugar tranqüilo, brincadeira proposital). Lá ABS e controle de tração são essenciais. Eu estava com passageiros no carro, inclusive crianças, então não era possível brincar muito. Mas foi como a viagem da Porsche que relatei meses atrás, muita diversão a baixa velocidade. Apenas em uma alça de acesso, saindo de uma estrada, não percebi a velocidade e tive realmente que controlar a desgarrada. Fica um tal de asfalto/areia/neve que bagunça todo o comportamento do carro.

Na Suécia, eles não usam sal pra derreter a neve, e sim, areia. O sal, além de deteriorar mais os carros, só é efetivo se a temperatura chegar próxima a zero, o que nem sempre acontece nesse país. A areia, por outro lado, cria situações inusitadas. Após algumas horas de fluxo de carros, a estrada fica limpa e sobra uma faixa de areia entre as faixas de rolamento da estrada. Na hora me lembrou de estradas como a Rio-Santos, em trechos à beira-mar que acumulam areia que a brisa traz... Eventualmente, ao passar por essa faixa, há perda de tração em uma roda e o cruise control se desliga. Novidade pra mim. Eles usam areia até nas calçadas, o que diminui muito o risco de escorregões.
A lei exige que o vidro dianteiro e o traseiro estejam sem neve e sem gelo, assim como os faróis e a placa dianteira. Todas as câmeras de velocidade ou controle de pedágio urbano (em Estocolmo é cobrado) são frontais.

As estradas são limpas, prioritariamente, na faixa da direita. Muitas vezes o asfalto é visível apenas nessa faixa, o que torna a ultrapassagem um desafio à parte. A mudança de asfalto para neve nunca é simples e o carro, a mais de 90 km/h, não anda em linha reta, sempre oscila. A estrada também não ajuda. A E4, que usei mais, é uma sucessão de curvas de 2 ou 3 graus. Chatíssima! Como é feita a raspagem da estrada, não há refletores luminosos (olho de gato) como no Brasil. Às vezes a perda de referência visual é inevitável. A velocidade máxima era 110 km/h nas estradas principais, 90 km/h em trechos urbanos (próximo a Estocolmo) e 70 km/h em estradas secundárias.

Nas estradas secundárias, não é feita essa raspagem profunda, nem há tráfego suficiente pra trazer o asfalto à tona. Aí a condução muda, ficando mais divertida. Em estradas, é a regra de países civilizados. Todos na direita, exceto pra ultrapassar. Mas é menos respeitado que na Alemanha. Como mudar de faixa não é trivial, às vezes uns lerdos ficam empacados na esquerda. Mas ninguém passa pela direita. O limite é respeitado, mas com alguma folga.

O trânsito é bem civilizado, como esperado. Como a conversão à esquerda é possível nos semáforos, é comum, próximo a um cruzamento, o fluxo desviar para a fixa da direita para depois retornar, sempre deixando a faixa da esquerda para quem quiser fazer a conversão. Mesmo que não tenha ninguém.

Os semáforos utilizam o amarelo junto com o vermelho para avisar que o verde está por vir. E quase todos possuem sensores no solo, consegue-se um fluxo contínuo em períodos de baixo movimento.

Pedestre é sempre respeitado. Mas não é bobo. Ele sabe que não adianta enfiar o corpo na frente de um carro que trafega na neve "porque é seu direito". Aguarda a certeza que foi visto e que o carro vai conseguir parar.


Passear com o cachorro é tarefa normal. Ou quase normal.

O povo sueco é bem humorado, apesar dos dias curtos. Conviver com o frio de -10 °C, -20 °C é ruim mas gerenciável. Os dias curtos é que são a pior coisa do inverno sueco. Às 15:00 já estava escurecendo e 15:30 era noite. Horrível.

Se existe algo que se aproxime do socialismo teórico, é a Suécia. A desigualdade é baixa, a ponto de ser desmotivador para quem quer subir na vida. A licença PATERNIDADE é de 2 meses, a maternidade de 1 ano e meio. E esse tempo pode ser trocado entre os pais. Mas raramente o parto não é natural. Cesariana, só em último caso.
Como no resto da Europa, mão de obra é cara e faça-você-mesmo é normal. Construir um novo cômodo, reformar banheiro ou trocar papel de parede, tudo é feito pelo proprietário (assim como limpar a neve!). Nas palavras de um amigo sueco, tudo isso é muito legal, mas o encanador que ajudou na reforma da casa dele também mora em uma casa boa (um pouco mais longe do centro), tem 2 carros como ele (um pouco piores), etc. Tem hora que o stress de trabalhar em uma multinacional, cumprir milhares de metas e lidar com chefes chatos parece não valer a pena perto da vida do amigo encanador. Nada é perfeito.

Eles hoje sofrem com imigrantes que pedem refúgio político. Quando aceitos (muitos são, os suecos parecem um pouco ingênuos nessas situações), recebem ajuda do governo e caso tenham filhos, recebem visto de residentes. Como está havendo abuso, o povo nota e reclama.

Parecem acreditar piamente no aquecimento global como uma verdade absoluta (talvez pela insistente repetição na mídia), mas não souberam explicar motivos pro White Christmas (Natal com neve). Por vários anos, inclusive no ano passado, a neve chegou apenas em meados de janeiro, neste ano tudo estava branco em meados de dezembro... E como nevou!
Terminando, é interessante notar as preferências locais. Suecos gostam de peruas. Vi muitas, certamente muito acima da média de outros países europeus. E menos SUVs do que eu esperava. As marcas mais freqüentes eram Volvo e Saab, compreensivelmente, seguida de VW e japonesas (principalmente Subarus com seus 4x4). Surpresa foi encontrar picapes americanas (Silverado), Mustangs, até alguns Chryslers. Nenhum Koenigsegg, infelizmente. De carros esportivos, alguns Porsches apenas. Nas bancas, é comum encontrar revistas de muscle cars e vi uma carcaça de um Dodge 68 indo para restauração, em cima de um caminhão-plataforma. Em uma sociedade toda certinha, parece que alguns precisam de uma válvula de escape de muitos cilindros!!!

MM

Mal começou seu governo, e Barack Obama já é figura non-grata entre os entusiastas. Primeiro foi a GM e depois veio o programa Cash for Clunkers, ou "dinheiro por latas velha". O progama consistia na troca subsidiada pelo governo americano de aproximadamente 700.000 carros velhos por novos e custou aos contribuintes algo perto de 2,9 bilhões de dólares durante os 2 meses em que esteve em vigor.
Foi o maior genocídio automobilístico da história. Os carros usados não eram doados ou vendidos a países mais pobres, no lugar tinham silicato de sódio injetado nos seus motores que também tinham seus fluidos totalmente drenados. Uma execução terrível que sensibilizou vários entusiastas pelo mundo.
E quem pensa que todos esses carros eram SUVs antigos, ou banheiras americanas, ou as lava-louças japonesas, se engana tremendamente. Figuras ilustres do mundo entusiasta como David E. Davis Jr. da Car and Driver, entre outras, reclamavam dos Jeeps, pickups ou até Impalas que tiveram triste fim sem saber que a realidade era ainda mais triste.
Eis que saiu uma lista oficial dos carros legalmente exterminados e entre eles é interessante notar ilustres ícones da indústria automobilística. A citar:
- 11 Porsche entre 911, 924, 928 e 944


- 1 BMW M3 1991


- 1 BMW M5 1991


- 1 Mazda RX-7 1993


- 67 Mercedes-Benz 560SL entre anos 1986 e 1989


- 123 Corvette C4 entre 1984 e 1990


- 9 Mercedes-Benz 500SL entre os anos 1990 e 1992


- 1 TVR 280i 1985


- 1 Aston Martin DB7 Volante (sim, o conversível) 1997


- 1 Mazda RX-8 2005


- 3 Mitsubishi 3000GT Syper entre os anos 1997 e 1998


- 1 GMC Thyphoon 1992


Claro, há outros carros que já tiveram valor entusiástico e não estão nessa lista. Imagino que na próxima eleição os entusiastas democratas possam vir a considerar melhor as propostas automobilísticas do lado republicano.


Ao que parece, dia 7 de janeiro é o novo deadline da GM para resolver o assunto Saab.
Como discutimos nos bastidores anteriormente, a Spyker remeteu uma nova oferta. Porém, de acordo com amigos na GM, Merbanco é a favorita.
Merbanco é um grupo de investidores baseados em Wyoming nos Estados Unidos. Merbanco já estava envolvida antes apoiando a Koenigsegg que era considerada a principal potencial compradora.
O problema com a Saab é simples: A GM quer uma garantia de 600 milhões de dólares do novo comprador a ser investido em desenvolvimento da marca. Porém há também uma condição especial nessa quantia de garantia: O governo sueco precisa garantir esse empréstimo.
Christopher Johnston é o executivo-chefe da Merbanco Inc Merchant Banking, cuja sede se encontra em Wilson Wyoming. Johnston tem se manifestado com relação à necessidade do governo sueco apoiar o futuro comprador da Saab dizendo o quão importante a Saab é para a Suécia.
Ao que parece Johnston não está sozinho: do seu lado há um grupo investidor sueco além dos altoa executivos da Saab com interesse em salvar a empresa.
A briga agora é Spyker versus Merbanco porém o segundo grupo parece estar mais forte.
A conclusão está próxima mas eu acredito que a empresa será salva. Os únicos empecilhos no momento são políticos e tenho a certeza que um acordo será fechado.


O Saab 9-5 modelo 2010 aguarda decisão política para chegar ao mercado.



Roger Moore vivendo Harold Pelham ao volante de seu Islero S 1969
Quando era adolescente, uma de minhas diversões (além de colecionar livros de carros, dirigir tudo que pudesse colocar minhas mãos e andar de moto) era assistir filmes que envolvessem algum automóvel exótico ou alguma máquina extrema que excedesse o aceitável em performance ou que explodisse majestosamente.
Na época (década de 80), a grande maioria dos filmes disponíveis nas poucas locadoras que existiam eram cópias piratas (devidamente apresentadas com o logo da locadora) e em uma visita à uma locadora, por falta de opção, escolhi um filme do Roger Moore (pré-007) de 1971 chamado “The man who haunted himself”.Traduzindo seria, o Homem que assombrava a si mesmo. Bem, não havia o título em português e o filme nem legendado era: perfeito! Eu mal sabia que iria ser apresentado para um dos Grand Tourers mais bonitos que vi até hoje: O Lamborghini Islero. No filme, Moore dirige um belo exemplar na cor prata e interior cinza claro, versão exportação inglesa com volante de direção ao lado direito. As cenas do filme me deixaram com água na boca, apesar da parte em que ele brinca de chicken em cima de uma ponte ter seus defeitos. O Islero é um perfeito exemplo da filosofia : Menos é mais.

Traseira do Islero S de Moore. Notem os faróis Alfa Romeo e os slots do S nos para-lamas dianteiros.
Ferruccio Lamborghini era um magnata industrial, apaixonado por mecânica, rebelde, sangue quente e italiano. Precisa dizer mais? Começou a fabricar tratores e equipamentos agrícolas em 1948, época do Plano Marshal (uma iniciativa americana de ajudar a Europa Industrial pós-guerra). Uma curiosidade, dos fabricantes italianos a única empresa que nao recebeu nenhum auxílio americano foi a Lancia. Qual o motivo? Bem, Vicenzo Lancia era um sujeito de ideias socialistas e, por ser também italiano e ter sangue quente, acabou metendo bala no próprio pé, aborrecendo os americanos que não lhe deram nenhum tostão. Mas isso é motivo para outro texto.

Ferrari 1958 250GT Lusso desenhada por Pininfarina e de propriedade de Ferruccio Lamborghini.
Voltando ao Ferruccio, esse adorava carros e possuia um belíssimo Ferrari 250GT Lusso 1958 desenhado por Pininfarina. Porém, seu 250GT tinha problemas crônicos de embreagem, algo não muito difícil de consertar mas que enfureceu Ferruccio, que disse a Enzo Ferrari que seus carros eram barulhentos (já que quase não tinham acabamento interno, como um carro de corrida), ruins e inpróprios para se dirigir nas ruas. Essa briga resultou nos clássicos GTs e super-carros que Lamborghini iria construir. Já pensaram se o Ferrari de Ferruccio tivesse uma embreagem perfeita ou revestimento para diminuir ruídos? O mundo nunca teria o Islero ou o Miura, Countach, Diablo, Murciélago, para citar alguns. O raciocínio de Ferruccio era: Se Ferrari não pode construir um carro para o meu gosto, construo eu então.

Protótipo do primeiro Lamborghini: O 350GTV.
Mas retomando o assunto Islero: Lamborghini estava querendo fazer um sucessor para o 400GT que assim, como o 350GTV, tinha um design de gosto duvidoso.Em particular, o 400GT parecia um Morgan que foi tratado à base de esteróides. Apesar disso, o interior dos 350GT e 400GT eram muito superiores ao dos Ferrari. Ao mesmo tempo, queria que o novo carro fosse um carro usável no dia a dia e também fosse o entry level, ou seja o carro mais acessível da marca. Tanto o 350GT quanto o 400GT de Lamborghini não impolgaram muito com seu desenho duvidoso e viraram gozação por parte de Enzo. Ainda Ferruccio queria aproveitar o que de bom o 400GT tinha, praticamente alterando seu design e fazendo alguns melhoramentos técnicos. Era uma boa época para Lamborghini, dois anos antes com o lançamento do Miura, os pedidos não paravam de chegar de todo o tipo de playboy, novo rico, artista ou celebridades como Dean Martin e Frank Sinatra querendo um Miura.

O Islero 400GT série 1. Notem as diferenças na carroceira para o Islero S de Moore.
Para desenhar e construir chassis e carroceria do novo carro, Carrozzeria Touring seria a escolha natural, já que tinham trabalhado no primeiro Lamborghini, o 350GTV (protótipo) 350GT (carro de série) e 400GT versão melhorada. Porém, devido à falência da empresa, Ferruccio empregou Carrozzeria Marazzi que era uma nova empresa fundada por Mario Marazzi, um antigo funcionário da Touring. Marazzi deu um desenho moderno, simples e ,ao mesmo tempo, agressivo ao novo carro: fez escola.

O painel e interior puro do Islero série 1
Os carros eram entregues, chassis mais carroceria pintada, por Marazzi para as instalações da Lamborghini em Sant’Agata Bolognese. Lá, eram instalados motor, câmbio, suspensão, interior, parte elétrica etc. Com o objetivo de economizar recursos, o novo carro seria basicamente uma nova interpretação do 400GT com nova carroceria mais atraente porém com maior largura para acomodar pneus maiores e mais modernos.

Painel do Islero S, maior e com botões como no E-Type III series.
Dentro da tradição Lamborghini (iniciada com o Miura e o Espada) um feroz touro iria batizar o carro. O nome escolhido foi Islero, um touro feroz e mortífero. Islero foi o touro que matou o Jim Clark de todos os matadores: Manuel Rodriguez em 1947. O interessante era a raça do Islero: um Miura. Manolete, como Rodriguez era chamado, criou uma nova técnica de tourada. Basicamente, ficava parado e enganava o touro que passava a centímetros do seu corpo por quatro ou cinco vezes sem se mexer do lugar utlizando um pano vermelho para enganar o bicho. Porém, Islero era mais esperto e aprendeu já na segunda passada onde direcionar seu chifre. A pancada foi tão forte que Manolete morreu imediatamente com uma chifrada fatal. Manolete é retratado no cinema pelo ganhador do Oscar, Adrien Brody no filme de 2007 de Menno Meyjes.

Motor do Islero S. O V-12 que equipava Miura e Espada.
Para o Islero, Marazzi deu uma frente em cunha, com faróis escamoteáveis como no protótipo 350GTV, pequenos para-choques cromados, e uma área envridaçada enorme com pequena colunas A, algo impensável para os padrões atuais de segurança mas de extrema elegância e perfeitas proporções. Por ser o automóvel entry level da marca, alguns itens seriam aproveitados de automóveis de série com o objetivo de economizar custos. Para os mais atentos fãs da Alfa Romeo, as lanternas traseiras, elegantemente posicionadas abaixo dos pequenos para-choques, eram lanternas Alfa montadas ao contrário. O trinco das portas também foram emprestados da Fiat. No interior, um volante de madeira de bom gosto foi empregado, a alavanca do freio de estacionamento era posicionada embaixo do banco do lado do túnel da transmissão sendo à direita para carros com direção à esquerda e à esquerda para os carros direcionados ao mercado inglês. Claro, couro de alta qualidade em todo lugar possível e uma ergonomia bem funcional, apesar da simplicidade do interior que, talvez por isso mesmo, tenha contribuido para torná-lo tão elegante e prazeroso aos olhos. Claro, o interior era muito confortável e espaçoso e por isso o Islero se tornou o carro preferido de uso de Ferruccio além do seu preferido.

Foram feitas duas versões do Islero, a 400GT, que foi de 1968 a 1969, e a 400GTS (também conhecido como Islero S) que somente foi produzida em 1969 em pouquíssimos 100 exemplares. No total, foram produzidos 225 carros entre Islero e Islero S. A primeira vez que o Islero foi apresentado ao público foi durante o Salão de Genebra em 1968. O carro foi mostrado discretamente entre o Miura e o Espada, o último que seria um best seller com quase seis vezes mais vendas que o Islero. A casa Lamborghini estava sendo representada por três carros no salão: o Miura (primeiro supercarro do mundo), o Espada, que era o seu flagship GT e o Islero seu entry level GT.
A pureza do Islero 400GT.
Em termos mecânicos, o Islero não fazia feio. Vinha equipado com um V-12 de 3.929 cm³ (mesmo bloco do Miura e Espada), daí o nome 400, com câmbio todo sincronizado de 5 marchas, como no Miura. O carro era montado em cima de um chassis de aço com panéis de alumínio rebitados para compôr a carroceria. Aliás, o único problema do carro era justamente com o alinhamento dos painéis, que hoje é uma das grandes dores de cabeça também dos colecionadores. Não é incomum ver painéis desalinhados dos Isleros em fotos atuais. Porém, uma grande coisa para o carro foram os esforços de dimunir os ruídos internos do feroz V-12 que tornaram o carro um Grand Tourer bem mais confortável e amigável que o Espada ou o seu predecessor 400GT do qual emprestava o chassis com pequenas modificações.

A performance do Islero também não fazia feio. O carro pesava apenas 1.315 kg a seco e tinha 325 cv de potência para a primeira série, sendo aumentado para 350 cv na GTS. O Islero fazia 260 km/h fácil e tinha uma vantagem com relação ao Miura: não tinha a tendência de levantar a frente como o Miura fazia em alta velocidade. O proprietário de um Islero tinha um ótimo GT e também um carro de alta performance totalmente previsível a um custo bem inferior comparado ao do Miura.

Na minha opinião, o Islero 400GT tem a carroceria mais pura e bonita. É facil diferenciar um Islero de primeira geração para o Islero S. No S há um slot de ar nos para-lamas, uma entrada de ar discreta atrás da janela traseira, a abertura de ar do motor abaixo do para-choque é maior, os arcos das rodas são mais arqueados em relação ao 400GT, há vidros mais escuros e também desembaçador traseiro que nao existia na série 1. Em termos de interior, a posição dos mostradores foi rearranjada, um aplique de madeira foi usado no painel (que era maior) e os botões do painel foram mordenizados e eram semelhantes ao Jaguar E-Type series III. Além disso, o Islero S foi beneficiado de uma suspensão traseira melhorada baseada no Espada. O carro de Moore era um Islero S, o que é fácil de perceber pelo abertura lateral nos para-lamas. O interessante é que era um carro 1969 num filme de 1971 e mesmo assim poucas pessoas sabiam que carro era aquele, cujo papel coadjuvante foi muito significante, para a personalidade dark de Harold Pelham vivida por Moore com autoridade.

Hoje é possível comprar um Islero entre $ 60.000 a $ 180.000 dependendo do carro e condição (graças aos colecionadores). Existe muita desinformação com relação aos anos em que os Isleros foram produzidos. No que se diz respeito a Carrozeria Marazzi, os últimos chassis do 400GT foram entregues à Sant’Agata em 1968, sendo que os Islero S teriam sido entregues antes de novembro de 1969. Porém devido à natureza artesanal da Lamborghini, a demanda pelo Miura e, em especial, pelo Espada, o último Islero saiu da fábrica em 8 de janeiro de 1970. Porém em 1970 já estavam em rigor algumas leis anti-emissões e de segurança (que o Islero não passaria) e alguns de seus proprietários deram um jeito de registrar os últimos carros como sendo de 1969. Isso tornou a vida de alguns colecionadores e estudiosos da marca difícil.

Os últimos Islero S foam vendidos em 1970 por 10.000 dólares americanos o que, feita a devida conversão inflacionária em 40 anos, seria o equivamente a mais de 150.000 dólares hoje. Para a época, muito caro. Como comparação, um Jaguar E-Type custava 7.000 dólares. O Islero morreu não por ser um carro ruim, mas por ter sido desprezado em relação ao Miura e ao Espada (que vendeu 1.200 exemplares de 1968 a 1978 e era o GT mais luxuoso da marca). A maioria dos clientes Lamborghini não entendeu que o Islero captava a essência de carro GT perfeito que Ferruccio tanto perseguiu no 350GT e 400GT sem êxito.

A Lamborghini criou outros modelos entry level com o passar dos anos, mas nenhum modelo sequer foi tão harmonioso em termos de design e funcionalidade prática como o Islero foi. A citar, Jarama, o Urraco (concorrente do Dino) e o Jalpa (que aparece no filme Rocky III dirigido por Sylvester Stallone). Em geral, carros com participações importantes em filmes se tornam imortais, mas o Islero talvez seja exceção à regra. Talvez dentro de poucos anos receba o devido reconhecimento que merece, já que agora o filme de Moore, que era considerado ruim, tem uma diferente percepção, sendo elevado à categoria cult. Para quem não assistiu “The man who haunted himself”, fica a dica. Com certeza uma das melhores performances de Roger Moore como ator e, sem dúvida,o Islero é uma das melhores obras de arte da Lamborghini.


Vídeo da fábrica de Sant'Agata em 1968




Cenas do filme "The man who haunted himself" com Moore e o Islero.




Nota: Esse texto foi concluído em 14 de dezembro de 2009. Devido às festas de final de ano e vários compromissos não foi possível postar antes.