She's real fine my 409
She's real fine my 409
My 4-0-9
Ser tema principal de uma música famosa não é para qualquer carro. Mas se são raras as músicas sobre automóveis, imaginem então músicas sobre motores...Mas é este o caso do Chevrolet 409 V-8 e a famosa música dos
Beach Boys lançada no lado B do vinil “Surfin' Safari”, de 1962. Ah, quando discos tinham lado B e falar sobre carros velozes era tão divertido que se chegava a cantar sobre eles sem culpa alguma...
O motor em questão na verdade não é só um motor, intimamente ligado que está aos Impalas em qual foi montado do ano-modelo de 1961 em diante. Quando alguém fala que tem um 409, vem logo à cabeça o carro também, um sedã duas portas básico e simples, praticamente um carro de
drag-race para as ruas como o que aparece na foto abaixo.
Este motor foi a primeira geração do Chevrolet V-8 big-block, e nasceu em 1958 (e portanto depois do small-block de 1955; clique
aqui para ver a diferença entre os dois, cortesia do AG). Desenvolvido para aplicações principalmente de carga (caminhões com mais de 4 t de PBT), inicialmente deslocava apenas 348 polegadas cúbicas (5.702 cm³) a partir de um diâmetro de 104,8 mm e um curso de 83 mm. Ficou imediatamente conhecido como o motor "W", devido à semelhança das tampas de válvulas com a letra, que ocorria devido ao posicionamento das velas de ignição, agrupadas em dois grupos de duas de cada lado. Como a vasta maioria dos motores de então, tinha bloco e cabeçotes em ferro fundido.

A câmara de combustão havia sido fruto de extensa pesquisa da GM, que resultou em um desenho ímpar, onde ela era localizada toda dentro dos cilindros, e um cabeçote absolutamente plano. O topo do bloco não é paralelo ao pistão, e sim inclinado 16 graus em relação a ele (ou 74 graus em relação à linha de centro do cilindro, ao invés dos 90 graus usuais). A teoria era que este desenho aumentaria o torque (e por conseguinte a potência, claro) nas baixas e médias rotações, via aumento da pressão média efetiva.

Esta configuração morreria quando o chamado Big Block Mark IV apareceu em 1965, deslocando 396 polegadas cúbicas, e efetivamente substituiu os "W". O Mark IV tinha uma configuração tradicional (apesar do intrigante posicionamento de válvulas em planos diferentes,
splayed), com câmara de combustão no cabeçote e "deck" paralelo, e era infinitamente melhor e mais moderno.
Mas nada disso interessa; o que vale mesmo é que muito antes disso, em 1961, a Chevrolet entrava na
horsepower race com força, aumentando o diâmetro e o curso do 348 simultaneamente (para 109,5 x 89 mm), atingindo as famosas 409 polegadas cúbicas cantadas em verso e prosa pelo resto da década. Quatrocentos e nove polegadas cúbicas são generosos 6.702 cm³, e equipado com dois carburadores Carter AFB de corpo quádruplo, taxa de compressão de 11,25:1 e comando com tuchos mecânicos, debitava inacreditáveis 425 cv em sua versão mais potente, de 1963. O motor tinha um trem de válvulas leve, como o de seu antecessor Small-Block, com varetas ocas (por onde passava óleo de lubrificação para o cabeçote), e balancins estampados, e por conta principalmente disso girava com segurança até 6.500 rpm. Com câmbio manual de quatro marchas e diferencial autoblocante (Positraction), os Impalas (e os mais leves e básicos Biscayne) "409" se tornaram praticamente imbatíveis quando a luz ficava verde. Tanto nas ruas quanto nas pistas.

Mas ninguém ficava na frente de ninguém por muito tempo nas pistas de arrancada americanas do início dos anos 60. A Chevrolet teve que, logo em 1963, colocar um RPO (Regular Production Option, opcional de produção normal) novo para se manter competitiva: Z11. Caríssimo, este opcional era na realidade direcionado aos pilotos profissionais que estivessem na procura de uma arma mais efetiva para suas campanhas, e portanto foi produzido em quantidades ínfimas (algo ao redor de 50; historiadores diferem na quantidade exata). Era um verdadeiro monstro: 427 polegadas cúbicas obtidas por mais curso (93 mm), taxa de 13,5:1, coletor de admissão de alumínio alto para maior potência somente a altas rotações. Era declarado como tendo 430 cv, mas se sabe hoje que a realidade estava bem acima dos 500 cv.
Mas tudo isto é história antiga; o Mark IV substituiu o velho 409, e hoje mesmo ele é algo antigo e superado. O atual V-8 de bloco pequeno (ainda menor e mais leve que o de 1955) Chevrolet, chamado de família “LS”, desloca sete litros (427 pol³) como os antigos big-block sem problema algum, e estes gigantescos monumentos ao metal do passado se tornaram apenas curiosidades históricas. Ou não?

Não é bem assim na realidade. Hoje em dia, nos EUA, potência não é mais só o que conta. Sempre interessados no diferente, em demonstrar alguma criatividade, os Hot-Rodders americanos têm causado uma deliciosa volta a motores antigos em geral. Veja o caso do 409: a
Edelbrock tem uma linha completa de componentes para ele, de carburadores e coletores até tampas de válvulas. Mais recentemente, lançou algo ainda mais legal: cabeçotes completos, novos, para o motor, e em alumínio! O 409 completa 49 anos este mês, e ainda hoje tem gente lançando coisas deste tipo para ele. Simplesmente sensacional!
A
revista Hot Rod este ano acompanhou os primeiros testes da Edelbrock com este novo componente, fazendo com a empresa um motor realmente especial para ele (abaixo). Com o diâmetro dos cilindros aumentado para 111 mm, desloca 421 polegadas cúbicas (6 899 cm³) e é equipado com bielas forjadas Eagle, pistões especiais JE, bomba de óleo Melling e Ignição MSD. Obviamente, é fechado com cabeçotes em alumínio, tampas de válvulas, bomba de água, coletor de admissão em alumínio e dois carburadores quádruplos, tudo da Edelbrock. O motor é belíssimo de se ver, com suas tampas de válvula com desenho de época e os “
dual quads” em cima. E furioso; nada menos que 469 cv a 6.000 rpm, usando taxa relativamente baixa de 9,5:1. Pode-se estimar quase 600 cv possíveis com uma taxa ao redor de 12:1.
Mas o que mais gostei dessa história foi de onde tiraram o bloco para a experiência: de um caminhão Chevrolet abandonado (abaixo). Existe algo de sublime, com alma, em um carro cujo motor foi tirado de um caminhão num ferro-velho e hoje pode obliterar carros esporte 50 anos mais novos, nem que seja por um quarto de milha em linha reta apenas. É algo caro ao coração de um entusiasta, um sopro de esperança e simplicidade num mundo hoje complexo e chato demais.

E ainda tem mais. A
World Products anunciou que está desenvolvendo, junto ao especialista americano em 409's Lamar Walden (foto abaixo), um bloco novo, zero-km, de novo em alumínio! O motor usará toda a tecnologia desta empresa, famosa por seus Chevrolet big block “Merlin”, seriamente reforçados para potências acima de 1000 cv. O 409 de alumínio vai resolver um velho problema dos drag-racers dos anos 60: as capas de mancais eram fixas por dois parafusos apenas, e não resistiam a aplicações realmente sérias em competição; o 409 Merlin de alumínio já nascerá com 4 parafusos segurando cada mancal.
Provavelmente custará uma montanha de dinheiro, mas é uma notícia sensacional. É completamente sem lógica se fazer um motor desses gastando tudo isso (muito mais barato e melhor comprar um LS small-block direto da GM) mas a lógica que se dane! Um 409 todo em alumínio será em breve algo possível, e era algo simplesmente impensável em 1963.
Como prega a música, 45 anos depois do último Impala sair da linha com ele, você poderá poupar seus centavos e seus reais, para que um dia você possa comprar seu 409 novinho. Mesmo que seja só o motor. E que você precise de centavos e reais pra chuchu.
Well I saved my pennies and I saved my dimes
'fore I knew there would be a time
When I would buy a brand new 409
MAO