A origem desse motor está ligada ao desenvolvimento de motores aeronáuticos a diesel, e é notável pela sua construção, em formato de triângulo.
Hugo Junkers (1859-1935) investigava o diesel para aviões desde antes da Primeira Guerra Mundial, na empresa que fundara em em 1913.
Como era de se esperar, durante a guerra o foco foi a produção para combate, e Junkers só retomou as pesquisas em 1926. O motor que surgiu foi o Fo3, vindo a seguir os Jumo 204 e 205, de configuracao vertical e dois tempos, com cilindros contra-opostos e dois virabrequins, o que trazia muita massa.
Foi utilizado em aviões militares e em hidroaviões civis da Lufthansa, mesmo sendo bastante pesado, pois traziam autonomia adequada aos botes voadores que eram os únicos tipos de aviões a fazer longas viagens sobre oceano.
Até 1944, a história do Deltic era pouco divulgada. O Admiralty Engineering Laboratory (Laboratório de Engenharia do Almirantado Britânico) conduzia estudos de opções de motores para lanchas torpedeiras em 1943, e um dos membros, N. Penwarden. propôs uma versao de 3 bancos de 2 cilindros contrapostos para um motor dois-tempos. A ideia era bastante inspirada pelos motores de Hugo Junkers, mas com a meta de reduzir peso, Penwarden teve a ideia de fechar o motor em forma de triângulo, para ter dois cilindros acionados por uma mesma árvore de manivelas.
Mas no caso do motor britânico, a solução foi mais simples que a alemã para acabar com o problema de faseamento de admissão e escapamento. Penwarden foi o dono de uma ideia daquelas que só surgem na cabeça de pessoas abençoadas pelos deuses da mecânica e da termodinâmica: ele percebeu que se um dos virabrequins girasse ao contrário, tudo funcionaria de forma mais homogênea.
Nasceu então o Deltic, de delta, a letra grega em forma de triângulo.
Passada a fase avançada de conceituação, o governo selecionou a English Electric para construir as unidades destinadas às torpedeiras. A Napier, famosa por projetar e construir motores de altíssima qualidade pertencia ao grupo, e o trabalho foi passado a ela. O motivo da escolha foi bastante técnico, como sempre devem ser as decisões inteligentes quando se fala de máquinas. A Napier tinha os direitos de construção do Jumo 204 desde antes da guerra, e detinha o conhecimento de motores de pistões contrapostos pela cabeça. Nesse período, a Segunda Guerra Mundial acabou, mas o contrato foi mantido, e em 1950 ficou pronto para produção o Deltic.
Conceitualmente, o motor é bastante inteligente. Dois tempos não requerem válvulas e nem todo o trem para comandá-las, já que as janelas de admissão e de escapamento são abertas e fechadas pelo movimento dos pistões. Cilindros contrapostos não precisam de cabeçote, pois a câmara é entre as duas cabeças de pistões. Assim, não existe cabeçote também.
Um problema de motores dois tempos é a lavagem do escapamento, que deve ser muito eficiente para limpar o melhor possível a câmara, permitindo que a mistura a ser queimada entre facilmente, e que o pistão não seja excessivamente aquecido.
Essa alta temperatura acontecia no Deltic, mesmo com o arranjo encontrado para as bielas, que fazia com que o pistão do lado do escapamento estivesse à frente do lado de admissão em 20 graus no giro do virabrequim, fazendo com que a passagem para o escapamento abrisse antes da janela de admissão, permitindo um bom fluxo.
Para melhorar a temperatura no pistão do escapamento, foi adicionada refrigeração por óleo, fazendo-o em duas peças, de forma a existir uma região anular para guiar óleo que refrigerava a coroa ou cabeça.
O ar para combustão era pressurizado por um compressor centrifugo tocado por dois dos três virabrequins.
A potência variava de acordo com o uso ferroviário ou marítimo, mas números acima de 1.600 cv a 1.500 rpm eram normais para as unidades de 12 cilindros e 24 pistões.
No uso ferroviário, levava locomotivas de 99 toneladas, batizadas de Deltic também, a cerca de 160 km/h.
Como há pouco tempo a Husqvarna noticiou o lançamento de novos motores de 2 tempos para motos, nossas ideias já derivam para outras possibilidades e começamos a pensar em o que seria um Deltic pequeno em um carro.
Enquanto isso não acontece, fica para a história o mérito da Napier, que desenvolveu e colocou em produção uma ideia que parecia um pouco maluca mas que deu certo comercialmente, tornando-se um dos bons momentos da engenharia.
JJ