As pessoas que me conhecem bem já sabem que sou fã de carros mais antigos que tiveram um início de vida interessante, mas que hoje estão no mais completo abandono. Caindo aos pedaços. Calhambeques com fogo saindo do motor e fumaça da traseira. Carros sem freios. Carros sem motor! Caixa de câmbio? Cadê? Será que tem?
Bem, como todos os nossos carros aqui em casa.
Qualquer pessoa pode ter um carro completamente restaurado, em perfeitas condições. Carro 100-pontos. Carro de Pebble Beach. Claro, ter que ser qualificado para isso. Quem tem carro assim tem que ter muito dinheiro e a disposição de gastá-lo. Mas, afinal de contas, que graça tem um carro desses?
Sempre me atraem os carros que são realmente uma vergonha. Cacos. Desgraças. Carros tão ruins que as pessoas querem tapar os olhos. E de vez em quando tapar o nariz também.
Depois dessa conversa toda, apresento-lhes um carro bem ao meu gosto. Um Facel Vega Excellence escondido numa garagem em Norco, Califórnia. Acredito que o ano deve ser 60 ou 61, por aí. Talvez preto. Talvez não. Digamos que a cor é “escura”. Com ferrugem, claro. Na época, o carro mais extravagante e caro da linha Facel. De quatro portas clamshell, tipo concha, as traseiras “suicidas”. E hoje dia esperando num canto de garagem com dezenas de carros mais ou menos assim. Esperando o quê? Ninguém sabe.
O propósito desse artigo não é descrever a história da gloriosa marca francesa Facel Vega. É suficiente dizer que nos anos 50 e até 1965 a Facel Metallon fabricou os carros mais exclusivos e finos da França. E para os fregueses mais interessantes. Stirling Moss tinha um. Peter Sellers, outro. E Ringo Starr. Ava Gardner. Dean Martin. Maurice Chevalier. Le roi du Maroc. O escritor e filósofo francês nascido na Argélia, Albert Camus, morreu num ao sair da estrada a alta velocidade e bater num poste ou árvore, não me lembro exatamente.
Quem quer saber mais pode pesquisar o livro “Facel Vega: Excellence, HK500, Facelia”, por Jean Daninos, o fundador e diretor da empresa Facel. Também o livro definitivo da marca, “Facel Vega – Grande Luxe Sportif”, por Martin Buckley.
E esse carro nas fotos? O motor é Chrysler V-8. Provavelmente 383, mas talvez 413. Menos provável 361. Não importa. Pelo menos tem motor. Câmbio Torque Flite. Grade de alumínio fundido. Possivel que as rodas raiadas não vieram originalmente com o carro. Mais provável rodas de aço com calotas. E os pneus atuais vieram de uma picape ou utilitário esporte. Fora disso, notem-se os bancos com estrutura de alumínio fundido. Imagine-se o custo disso, especialmente para uma peca invisível!
Sabiam que o painel parecia de madeira, mas não era? Era de metal pintado com aparência de madeira por um funcionário na fábrica que só fazia isso. Com pincel! Incrível. E por isso ainda está intacto hoje, uns 50 anos após ter sido produzido.
As pessoas de outros países pensam que todos os carros aqui na Califórnia são do tipo 100-pontos. Claro, muitos são. Mas é bom saber que há exceções. Muitas, inclusive. E que pesquisando bem podemos descobrir carros assim em vários lugares por aqui. Como dizemos, carros “congelados no tempo”.
Bem, um carro assim nos leva a perguntar: o que fazer com ele? Na condição atual é evidente que não ser pode usá-lo na rua. E uma restauração completa iria levar anos e, pelo menos aqui, custaria centenas milhares de dólares. Isso para um carro com atual valor máximo de, digamos, 60~90 mil dólares. O investimento não compensa. Pelo menos este carro fica num lugar fechado, escuro e seco. Com isso, ele não degrada. E como disse antes, fica esperando.
RP
Escrevendo, como sempre, de Huntington Beach, Califórnia