google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014)




fotos: revista Hot Rod
A revista Hot Rod de abril de 2010 apresenta um carro feito a partir de um Ford Tudor sedã 1936 que os americanos chamam normalmente de trunk sedan, pois apresenta um volume de porta-malas protuberante, tipo de carroceria pouco usada para a construção amadora.
O resultado ficou muito bom, para um trabalho que começou com um carro bem corroído, que teve as partes piores removidas, alterando até mesmo a grade do radiador, pois toda a porção inferior da dianteira do cofre do motor estava irrecuperável. O que sobrou está nas fotos.
O Motor é Cadillac de 1968, 472 polegadas cúbicas, ou 7,7 litros, acoplado a uma caixa automática GM HydraMatic TH400, suspensão dianteira de Dodge 1935, incluindo as molas semi-elípticas e as rodas, traseira provenientes de um Chevrolet Caprice 1990, com rodas doanteiras de Oldsmobile 1935 (mesmo diâmetro de furos), para-brisa de MGB retrabalhado, reservatório de expansão do arrefecimento feito com um antigo extintor de latão, comando da transmissão com as marcações montadas com teclas de máquina de escrever, bancos do tipo chamado de bucket seats, pois parecem ter sido feitos recortando-se um balde de metal. O volante e painel são originais do Ford.
Uma bela mistura que resultou em um carro único. Criatividade no estado mais puro. Um autêntico hot rod.
Abaixo o Ford Tudor original, carroceria trunk sedan
foto: clubs.hemmings.com
JJ
Ontem fui para São Paulo com meu tio José, um folclórico e hilário senhor de 72 anos de idade, comerciante aposentado, homem simples que não possui nem mesmo o primeiro grau completo e que provavelmente não dirige há cerca de 40 anos.
Sem exageros, acredito que ele guiou pela última vez em 1970, quando ainda possuía um caminhão Ford F-350 V-8. Nunca teve um carro de passeio em toda sua vida e o velho Ford (comprado 0-km) era usado apenas para o trabalho pesado do seu comércio.
Logo ao saírmos da casa dele, ficou intrigado com a forma com que eu dirigia. Ao parar no primeiro semáforo, ele, espantado, perguntou: "Felipe, você não troca marcha não?".
Caí na gargalhada e apresentei ao tio essa invenção maravilhosa chamada câmbio automático, explicando como funcionava cada posição da alavanca. E ele, com aquela inocência quase infantil, exclamou: "Só não entendi essa alavanca, pro carro andar pra frente puxa a alavanca para trás, para andar de ré empurra a alavanca para a frente... Não faz muito sentido para mim, não."
Logo percebi que de nada adiantaria explicar para que serve a posição "low", como funciona o "kickdown" e outros recursos: foi igualmente impossível explicar qualquer um deles a pessoas mais cultas, com elevado nível de formação, bem menos ignorantes que o querido tio.
Para essas pessoas, tudo é muito simples: o "P" equivale a uma marcha engatada ao estacionar um carro dotado de câmbio manual; o "R" é a marcha à ré, o "N" é o ponto-morto e o "D" coloca o carro em movimento. Ignoram completamente as posições "3", "2" e "L", que permitem fazer bom uso do freio-motor em declives e ajudam a explorar o limite máximo de rotações do motor em determinadas situações.
O que me levou a abordar este assunto foi o lançamento do modelo 2011 do Toyota Corolla, equipado com motor de 2 litros e câmbio automático de comandos sequencias, acionados pela alavanca (shiftronic) ou através de borboletas atrás do volante. A novidade levou muitas publicações ditas "especializadas" a afirmar que a caixa automática anterior não oferecia a opção de mudanças manuais.
Nada mais longe da verdade: praticamente qualquer câmbio automático permite mudanças manuais, obviamente, se tiver duas ou mais marchas. Do tradicional GM Powerglide de 2 marchas até o Aisin de 4 do Corolla, todos podem operar em modo sequencial, bastando para isso um mínimo de conhecimento por parte de quem comanda o veículo.
Lembrei do grande José Luiz Vieira ao testar o Opala seis cilindros com câmbio automático de 3 marchas para a revista Motor 3, há cerca de 25 anos: descrevia de maneira quase poética como era colocar a alavanca em "low", pressionar o freio e acelerar até a rotação de estol, sentindo a carroceria do Opala torcer suavemente.
Solta-se o freio e uma nuvem de fumaça depois acelera-se até o limite de rotação do motor, para depois dar uma palmada bem dada na alavanca para que o corpo de válvulas libere o acionamento da segunda marcha. Mais uma vez o limite de rotações chega e você dá outra palmada bem dada na alavanca. Sem segredo nenhum, aí está o seu comando sequencial!
No caso do Corolla, me agrada bem mais a alavanca dos modelos antigos, com botão e catraca ascendente, com acionamento da alavanca para frente e para trás. No modelo atual inexiste o botão na alavanca e o posicionamento da alavanca é determinado por uma grelha, tornando a troca sequencial um pouco mais complexa (duas palmadas para frente e outra para a direita).
Foto: Edmunds
Caixas automáticas estão longe de serem objetos de desejo dos entusiastas (excetuando muitos que moram na Grande São Paulo, meu caso). O fato incontestável é que é, sim, possível efetuar mudanças manuais em caixas automáticas, sem shiftronic, sem borboletas e (para os iniciados), sem sequer tocar na alavanca, apenas pegando o jeito da caixa e comandando as trocas com o pedal do acelerador.
Quando vocês bem entenderem, basta conhecer melhor a máquina e seu funcionamento.
FB
Imagem: BMW AG

Foi publicada ontem no Diário Oficial da União a alteração no Código de Trânsito Brasileiro que torna obrigatória a realização de aulas noturnas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação.
A nova exigência começa a vigorar em 60 dias e o projeto é de autoria do deputado federal Celso Russomanno (PP-SP), que afirmou que a condução do veículo durante a noite exige "precauções adicionais".
Aí eu sou obrigado a perguntar: precauções adicionais são exigidas apenas na condução noturna, deputado Russomano? E em outras condições adversas de visibilidade, como chuva ou névoa? E quando é que vão começar a ensinar os motoristas a entrar e sair de vias expressas e rodovias?
Imagem: garageboy.com
Quando eu estava no segundo grau, prestes a completar 18 anos, marquei uma viagem para o interior de São Paulo com alguns colegas de classe, já que um deles era recém-habilitado e havia acabado de comprar um carro. Logo no começo da viagem, um de nós perguntou se o dono do carro tinha muita experiência em estradas.
"Na verdade não..." - disse o colega - "... essa é a primeira vez que estou encarando uma estrada, mas não quis falar nada para não assustar vocês. Fiquei com medo de desistirem da viagem".
É claro que ficamos todos apreensivos, mas já estávamos ali mesmo, não podíamos pular fora. Encaramos como uma verdadeira aventura e fizemos nossa viagem em segurança, mas e as pessoas que não contam com a mesma sorte, como é que ficam?
Dentro de alguns meses chegaria a minha vez de me submeter ao exame para obtenção da CNH e a encrenca começou logo no dia do exame: eu trajava uma bermuda, vejam vocês, um traje bem natural para aquele dia de calor escaldante.
A dona da auto-escola ralhou comigo, dizendo que aquilo era um absurdo, pois até bem pouco tempo atrás exigiam até traje social completo, com gravata (o Bob Sharp sabe bem do que estou falando).
"Instrutor" de auto-escola ordenhando volante.
Depois de muita discussão, os examinadores disseram que eu poderia sim realizar o exame de bermuda, sem problema algum. Passei "raspando", perdi 3 pontos na baliza (um ponto por regular o espelho retrovisor depois de ter colocado o carro em movimento e dois por ter deixado o carro "morrer").
Inesquecível mesmo foi a recomendação do examinador, logo ao descer do carro: "Aqui estão seus protocolos, agora vocês são motoristas habilitados. Pelo amor de Deus, não cometam nenhuma besteira, não matem, não morram."
Apenas isso: uma porcariazinha de uma baliza, uma rampinha fajuta, uma volta no quarteirão e uma recomendação para "não matar e não morrer". Sinceramente, eu não me importaria nem um pouco em realizar o exame de terno e gravata, se de fato eu tivesse um aprendizado digno e sério.
Mas não adianta. Para os nossos "representantes", o que realmente importa é entupir os nossos carros de itens de segurança como ABS e airbags, ainda que o consumidor não faça questão de tê-los. Como se uma canetada cretina fosse resolver um problema grave de formação e educação para o trânsito.
FB

Mais ou menos um mês atrás acabei por usar o Focus de minha esposa por uma semana. É o mais simples e menos potente Focus nacional, um modelo 2005, 1,6 litro a gasolina. Um carro simples, comum, que passa despercebido no trânsito cada vez mais caótico de São Paulo. Aproveitei para me lembrar o que faz deste carro aparentemente mundano algo realmente especial.
Não é segredo nenhum que, desde que foi lançado em 1998, o Focus I é o queridinho da imprensa especializada inglesa, a mais influente do mundo. E um dos principais motivos para isso foi que marcou uma mudança de rumo para a Ford europeia. Antes do Focus, a empresa estava mergulhada em um sem-fim de carros chatos e sem graça, e em termos de estilo, francamente sofríveis. A melhora que tem o Focus como emblema na verdade começou um pouco antes, transformando os Escort e Cia. então vigentes em carros ótimos para dirigir, mas que não conquistavam ninguém por seu estilo mal executado, e pela imagem da empresa, maculada por anos de carros ruins.
Ford Scorpio 1994-1998. Isto era o que a Ford vendia na Europa antes do Focus: um carro ótimo (neste caso, com um V-6 Cosworth), mas com uma aparência que nem uma mãe poderia amar
Vale a pena contar que os entusiastas ingleses adoravam a Ford por seu histórico de Cortinas, Escorts e Capris bravos, e seu pedigree de competições impecável, que incluía memoráveis curvas feitas totalmente de lado por Jim Clark em seu Lotus-Cortina, e incontáveis vitórias em rali. Mas durante os anos 80, a empresa foi sumindo lentamente do radar, até ficar irrelevante, e se tornar piada. Mas o Focus mudaria tudo isto. Seu desenho de carroceria era inacreditável, moderno e, principalmente, original. A imagem da empresa era então a de um venerando avô, que com o Focus apareceu derrepente todo paramentado para andar de skate numa pista de gravidade zero, em Urano: coisa de outro planeta, mesmo. E com o tempo, a forma não envelheceu, o que o torna atemporal, marca básica de um design realmente bem feito.
Mas o melhor é que o carro não era o seu design. É o fato de que foi uma lufada de ar puro no estagnado ambiente de carros de grande série do final dos anos 90. Imediatamente, a imprensa inglesa o adotou como seu novo ídolo, e o resto é história: o carro logo era o mais vendido do mundo, um raro sucesso de público E de crítica.
Mas o que há de tão especial nele?
A primeira coisa que gosto no carro é o tamanho. Um hatchback desta categoria (Golf, 307, Vectra GT, bem como as versões que não temos do Corolla e Civic) é o tamanho ideal para tudo: cabe uma família inteira, mas não é enorme, o que o faria menos econômico, menos veloz, menos ágil. Eu realmente não preciso de mais espaço que isto, e analisando objetivamente, ninguém precisa num carro de cinco lugares. E mais espaço, apesar de bom, sempre influi na agilidade, e na eficiência do carro como um todo. Existem carros maiores e mais leves, mas ainda estão em desenvolvimento, frutos da recente "descoberta" dos grandes fabricantes da massa como fator decisivo na excelência de um veículo.
Depois há o jeito que a carroceria foi desenhada. O Focus não é um carro baixo. Estacione um ao lado de um Escort do mesmo ano (carro que foi substituído pelo Focus) e veja como parece um carro muito maior, apesar de sê-lo apenas na altura. O Focus parece maior porque é mais "denso", no sentido de ter mais carro dentro da mesma "sombra". Meio como uma minivan, o Focus usa essa maior altura para maior espaço interno, mas não sacrifica a ergonomia e a estabilidade por isso, por não chegar ao extremo nesse aumento de altura.
Uma coisa interessantíssima advém disso, algo que nunca li em nenhuma avaliação do carro. E para explicar isto, tenho que voltar um pouco no tempo, até ao início do sáculo XX, na Inglaterra. Um dos maiores pioneiros do automóvel, Frederick Lanchester, cientista e inventor, estudou profundamente a interação entre o homem e a nova máquina, e chegou a várias conclusões interessantíssimas, a maioria delas esquecidas hoje em dia. Mas o Focus trouxe de volta uma delas.
O bom Dr. Fred descobriu que a posição ideal para o ocupante do carro, a localização da busanfa do motorista, conhecida tecnicamente como ponto H, devia ser a mesma altura de uma pessoa andando. Desta forma, os ocupantes se sentem melhor, e familiarizados com o movimento nesta altura, tem melhor noção de perspectiva e movimento, e até enjoam menos, no caso de passageiros com esta tendência. O Focus me dá a sensação de ser desta forma, apesar de obviamente não atender exatamente a regra. O ponto H (que na verdade é o ponto de articulação do fêmur na bacia) é mais baixo que o de uma pessoa média em pé, mas quando saio dele (mesmo eu, com quase 2 m de altura) e saio andando, a sensação é de se manter praticamente na mesma altura. E minha filha mais velha, de 10 anos (mas mais alta que um monte de adultos), enjoa em carros mais baixos e em carros mais altos, mas não no Focus. Eu quero acreditar que os engenheiros da Ford estudaram e atualizaram a regra de Lanchaster, aproximando-a para uma posição melhor e mais baixa que causa o mesmo efeito, mas muitos amigos acreditam em mera coincidência. De uma forma ou outra, o bom Dr. Fred está sorrindo em algum lugar...
Outra coisa que é interessante é que o banco traseiro é sutilmente mais alto que o dianteiro, criando um efeito chamado "teatro", supostamente mais agradável para os seus ocupantes.
Depois há a execução do interior. Basta olhar para o painel de porta: como tudo no carro, não há opulência de madeira, couro, e outros materiais nobres, muito menos cromados, como era de se esperar em carros deste preço. Mas como o resto do interior, tal coisa não é desculpa para usar plásticos duros e péssimos ao toque, como acontece aos montes nos carros aqui no .br. Não, o painel de porta não tem uma única superfície mal cuidada ao toque, a maioria dela sendo revestida por um vinil agradável, com espuma por baixo, o que o torna macio. A alça do puxador é separada, e está na posição teórica perfeita, bem como a trava e o gatilho de porta, e o descansa-braço, de largura generosa e macio pelo vinilzinho espumado. O controle do vidro elétrico está um pouco à frente da posição teórica ideal, mas ainda é de facílimo acesso, e um compromisso plenamente aceitável. Afinal de contas, nunca cabe tudo na área teoricamente perfeita (acessível com o com o braço descansando no descansa-braço), e nem precisa, como este carro prova. Dentro do puxador de porta, o plástico é pintado com tinta soft-touch, que parece emborrachada, uma delícia de pôr a mão. Na verdade, apesar da ausência de cromados e outros materiais mais opulentos, o painel de instrumentos, e todo resto do interior, não parece revestido de plástico, graças a um excelente trabalho de textura e materiais. Impecável qualidade, algo raro hoje em dia.
Mas o melhor de tudo neste carro é algo que devia ser básico: suspensão e ergonomia do motorista. Eu não conheço nenhum carro que possa ser comprado por menos de 90 mil reais que seja tão bom nisso. Muito já foi dito sobre a suspensão multibraço traseira, mas o fato é que não é isto que fez a grande diferença. Sim, a Ford foi genial em criar uma sofisticada suspensão deste tipo em um carro barato, usando aço estampado e fazendo um conjunto simples, leve e que ocupa pouquíssimo espaço. Mas se Deus está nos detalhes, os Deuses da combustão interna estão não em criações mirabolantes: estão na execução.
A Ford tomou extremo cuidado para manter as geometrias da suspensão teoricamente perfeitas em todos os seus movimentos. Pode parecer óbvio isso, mas você não acreditaria na quantidade de pequenos "compromissos" que se faz num projeto deste tipo, de produção em massa. Não desta vez: o Focus começou garantindo os movimentos livres e perfeitos teoricamente, e continuou criando uma cultura de obsessão por diminuição de atrito nos componentes de direção e suspensão. Desta forma, o acerto do importantíssimo compromisso estabilidade-conforto ficou bem mais fácil.
O resultado é sensacional. Usando pneus de perfil série 70, e rodas de aro 14, medidas hoje em dia consideradas ridiculamente conservadoras para um carro deste tamanho, o Focus, mesmo não sendo um carro baixo, exibe um controle perfeito de todos os movimentos da carroceria em todas as situações, aliado a um conforto exemplar. E a direção, o mais importante componente para um entusiasta do automóvel, é um instrumento de precisão, algo que parece ser feito numa fábrica de micrômetros. E o volante? Já fiz um post somente sobre ele, mas basta aqui chamá-lo de perfeito.
A posição de dirigir, o peso e a precisão de todos os controles do carro seguem esse tema: não dá para criticar. Ergonomia, comandos de peso e precisão corretos, aliados a suspensão irrepreensível é a fórmula básica para um carro realmente bom para quem gosta de dirigir. Pouquíssimos carros na faixa de preço do Focus conseguem este tipo de coisa e, como exemplo, a marca que é mais consistentemente boa nisso é a nossa querida BMW. É o segredo de tudo, a fórmula mágica de excelência que poucos seguem à risca.
E é bom que seja assim, porque no caso de meu carro, o motor não está à altura do resto. Não há nada de ruim, criticável, no Rocam 1,6 litro dele. Mas ele também não é algo para se sonhar quando se encosta a cabeça no travesseiro. Com 103 cv, o motor é suficientemente forte, suave e econômico, fazendo seu trabalho de forma perfeita mas não excedendo as expectativas em nada. Ele apenas faz o que se espera dele, sem surpreender ou empolgar, mas também não chateando ninguém. Nisso, o fantástico Duratec de dois litros é muito melhor: pesando o mesmo que o Rocam, totalmente em alumínio, faz do Focus um carro realmente veloz, e bem mais prazeroso ao volante. E para quem faz questão, o Duratec agora é flex, com 148,3 cv com etanol, mais 3,3 cv que quando era só a gasolina.
Os bancos são como o motor: bons, mas não fantásticos. Poderia ter um pouco mais de suporte nas coxas, e laterais mais pronunciadas para segurança maior nas curvas, mas como estão são plenamente satisfatórios. O que, para a Ford brasileira (argentina?), é um grande progresso, pois os do Fiesta estão entre os menos agradáveis hoje. O tecido também é da variedade mais barata, mas este é uma das coisas que temos que aceitar na versão mais simples do carro apenas.
Já o câmbio ajuda muito: relações bem escolhidas, quinta marcha de efeito overdrive (a máxima é em quarta), e uma alavanca de tamanho e localização perfeitas. O acionamento é preciso e suave, e a embreagem de acionamento hidráulico também é suave e fácil de modular.
Os freios para mim foram um alívio neste passeio. Sem o maldito ABS, senti novamente o prazer de modular um freio sozinho, sem intervenção, e num carro em que a sensibilidade do pedal é muito boa. Ah, como é bom novamente se sentir com a responsabilidade e o prazer de cuidar do freio sozinho! É algo que recomendo a todos, pois com o ABS, eu lentamente me tornava um motorista pior.
O que a imprensa inglesa não tinha me contado é o quão confiável é o carro. O de minha esposa é na verdade o carro da família, que usamos para viajar. Comprado zero, está com 80 mil km e ainda roda como um carro novo. Não fiz quase absolutamente nada a não ser manutenção básica no bicho, coisa como pastilha de freio e pneus novos. Simplesmente o carro mais confiável que já tivemos em casa.
Pensando nisso tudo, certo desespero me acometeu. O Focus é na realidade o único carro novo que realmente gostaria de comprar, mas saiu de linha no final do ano passado. Revi em minha cabeça a lista de carros novos que poderia comprar, e na verdade, todos os outros não me animavam em nada, pelo menos não o suficiente para gastar a montanha de dinheiro necessária. Mesmo o Focus II, apesar de muito bom, é outra coisa bem diferente, tão diferente que merecia outro nome. Outra coisa que me deixava angustiado com isso é que, inevitavelmente, o nosso fiel Focus prata não vai continuar perfeito para sempre...
O Focus I, sem dúvida por causa deste monte de motivos que coloquei aqui, teve uma vida longa. Na Europa durou até 2005, nos EUA até 2007, e finalmente aqui na América Latina (foi produzido na Argentina, como é o novo), até o final do ano passado. Os nossos 1,6 litro flex são literalmente os últimos Focus I a venda em todo o mundo. Ou ERAM os últimos? Será que ainda tem algum zero?
Resolvi ligar para as concessionárias Ford de SP, para ver se ainda tinha algum deles à venda. Encontrei nove carros em SP, curiosamente exatamente na mesma faixa de preço de 2005: de 37 a 41 mil reais. Era a última chance, em todo mundo, de se comprar um Focus zero, e este fato requeria ação imediata. No mesmo dia, coisa de três horas depois do primeiro telefonema, sobravam apenas oito deles nas concessionárias paulistanas, e o MAO estava novamente endividado. É ele próprio, o carro preto nas fotos que ilustram este post, um dos últimos Focus 1 zero-km do mundo, tirado da loja dia 3 de março de 2010, mas fabricado na Argentina dia 9 de novembro de 2009, às 7:43 da manhã.
Não é a primeira vez que compro um dos últimos carros de uma espécie. Existe algo nisso que tem algo de definitivo e imperdível, uma última chance de algo acontecer. Sim, existem carros usados, mas nunca são a mesma coisa. O cheiro de um carro novo, a sensação de ter algo virgem e praticamente intocado, me desculpem, mas é única. O monobloco nunca torceu, a suspensão nunca suspendeu, o motor nunca foi ligado fora do ambiente fábrica-loja. Você é que vai levá-lo para o mundo real, lá fora, esse mundão besta de grande e bão. Você é o primeiro, e enquanto mantê-lo, o único.
Mesmo o meu outro Focus, comprado zero-km, mas hoje velhinho, é de uma forma inexplicavelmente clara, diferente de algo usado. A história dele é uma parte da sua desde o início, meio como um cachorro já velhinho, mas ainda extremamente fiel e definitivamente SEU. E tudo isto é ampliado quando o carro é o último de sua espécie, a última chance disto acontecer novamente. Quando eu vender este Focus preto, ou se ele morrer em um acidente, será definitivamente o fim.
Por este motivo que a prece do velho Chingachgook depois da morte de seu filho único, herdeiro de uma tribo desaparecida, é tão emocionante, ao fim do grande clássico filme "O último dos moicanos". Têm-se a sensação clara de ver uma era acabando, de ser testemunha de uma mudança que é definitiva e imutável, de existência corajosa de quem fica, em um mundo que não precisa mais dele, e no qual não deixará nada além de uma lembrança. E é por isso que termino com esta prece:
"Great Spirit, Maker of All Life. A warrior goes to you swift and straight as an arrow shot into the sun. Welcome him and let him take his place at the council fire of my people. He is Uncas, my son. Tell them to be patient and ask death for speed; for they are all there but one - I, Chingachgook - Last of the Mohicans."
(Grande espírito, criador de toda a vida. Um guerreiro está indo para ti, rápido como uma flecha. Que ele seja bem-vindo, e que ele tome seu lugar junto à fogueira do conselho de meu povo. Ele é Uncas, meu filho. E diga a eles para serem pacientes, e peça rapidez a morte; porque estão todos lá, menos um – Eu, Chingachgook – o último dos moicanos.)
MAO
PS: Vejam também o excelente texto do JJ sobre o Focus clicando aqui.