google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014)
Imagem: BMW AG

Foi publicada ontem no Diário Oficial da União a alteração no Código de Trânsito Brasileiro que torna obrigatória a realização de aulas noturnas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação.
A nova exigência começa a vigorar em 60 dias e o projeto é de autoria do deputado federal Celso Russomanno (PP-SP), que afirmou que a condução do veículo durante a noite exige "precauções adicionais".
Aí eu sou obrigado a perguntar: precauções adicionais são exigidas apenas na condução noturna, deputado Russomano? E em outras condições adversas de visibilidade, como chuva ou névoa? E quando é que vão começar a ensinar os motoristas a entrar e sair de vias expressas e rodovias?
Imagem: garageboy.com
Quando eu estava no segundo grau, prestes a completar 18 anos, marquei uma viagem para o interior de São Paulo com alguns colegas de classe, já que um deles era recém-habilitado e havia acabado de comprar um carro. Logo no começo da viagem, um de nós perguntou se o dono do carro tinha muita experiência em estradas.
"Na verdade não..." - disse o colega - "... essa é a primeira vez que estou encarando uma estrada, mas não quis falar nada para não assustar vocês. Fiquei com medo de desistirem da viagem".
É claro que ficamos todos apreensivos, mas já estávamos ali mesmo, não podíamos pular fora. Encaramos como uma verdadeira aventura e fizemos nossa viagem em segurança, mas e as pessoas que não contam com a mesma sorte, como é que ficam?
Dentro de alguns meses chegaria a minha vez de me submeter ao exame para obtenção da CNH e a encrenca começou logo no dia do exame: eu trajava uma bermuda, vejam vocês, um traje bem natural para aquele dia de calor escaldante.
A dona da auto-escola ralhou comigo, dizendo que aquilo era um absurdo, pois até bem pouco tempo atrás exigiam até traje social completo, com gravata (o Bob Sharp sabe bem do que estou falando).
"Instrutor" de auto-escola ordenhando volante.
Depois de muita discussão, os examinadores disseram que eu poderia sim realizar o exame de bermuda, sem problema algum. Passei "raspando", perdi 3 pontos na baliza (um ponto por regular o espelho retrovisor depois de ter colocado o carro em movimento e dois por ter deixado o carro "morrer").
Inesquecível mesmo foi a recomendação do examinador, logo ao descer do carro: "Aqui estão seus protocolos, agora vocês são motoristas habilitados. Pelo amor de Deus, não cometam nenhuma besteira, não matem, não morram."
Apenas isso: uma porcariazinha de uma baliza, uma rampinha fajuta, uma volta no quarteirão e uma recomendação para "não matar e não morrer". Sinceramente, eu não me importaria nem um pouco em realizar o exame de terno e gravata, se de fato eu tivesse um aprendizado digno e sério.
Mas não adianta. Para os nossos "representantes", o que realmente importa é entupir os nossos carros de itens de segurança como ABS e airbags, ainda que o consumidor não faça questão de tê-los. Como se uma canetada cretina fosse resolver um problema grave de formação e educação para o trânsito.
FB

Mais ou menos um mês atrás acabei por usar o Focus de minha esposa por uma semana. É o mais simples e menos potente Focus nacional, um modelo 2005, 1,6 litro a gasolina. Um carro simples, comum, que passa despercebido no trânsito cada vez mais caótico de São Paulo. Aproveitei para me lembrar o que faz deste carro aparentemente mundano algo realmente especial.
Não é segredo nenhum que, desde que foi lançado em 1998, o Focus I é o queridinho da imprensa especializada inglesa, a mais influente do mundo. E um dos principais motivos para isso foi que marcou uma mudança de rumo para a Ford europeia. Antes do Focus, a empresa estava mergulhada em um sem-fim de carros chatos e sem graça, e em termos de estilo, francamente sofríveis. A melhora que tem o Focus como emblema na verdade começou um pouco antes, transformando os Escort e Cia. então vigentes em carros ótimos para dirigir, mas que não conquistavam ninguém por seu estilo mal executado, e pela imagem da empresa, maculada por anos de carros ruins.
Ford Scorpio 1994-1998. Isto era o que a Ford vendia na Europa antes do Focus: um carro ótimo (neste caso, com um V-6 Cosworth), mas com uma aparência que nem uma mãe poderia amar
Vale a pena contar que os entusiastas ingleses adoravam a Ford por seu histórico de Cortinas, Escorts e Capris bravos, e seu pedigree de competições impecável, que incluía memoráveis curvas feitas totalmente de lado por Jim Clark em seu Lotus-Cortina, e incontáveis vitórias em rali. Mas durante os anos 80, a empresa foi sumindo lentamente do radar, até ficar irrelevante, e se tornar piada. Mas o Focus mudaria tudo isto. Seu desenho de carroceria era inacreditável, moderno e, principalmente, original. A imagem da empresa era então a de um venerando avô, que com o Focus apareceu derrepente todo paramentado para andar de skate numa pista de gravidade zero, em Urano: coisa de outro planeta, mesmo. E com o tempo, a forma não envelheceu, o que o torna atemporal, marca básica de um design realmente bem feito.
Mas o melhor é que o carro não era o seu design. É o fato de que foi uma lufada de ar puro no estagnado ambiente de carros de grande série do final dos anos 90. Imediatamente, a imprensa inglesa o adotou como seu novo ídolo, e o resto é história: o carro logo era o mais vendido do mundo, um raro sucesso de público E de crítica.
Mas o que há de tão especial nele?
A primeira coisa que gosto no carro é o tamanho. Um hatchback desta categoria (Golf, 307, Vectra GT, bem como as versões que não temos do Corolla e Civic) é o tamanho ideal para tudo: cabe uma família inteira, mas não é enorme, o que o faria menos econômico, menos veloz, menos ágil. Eu realmente não preciso de mais espaço que isto, e analisando objetivamente, ninguém precisa num carro de cinco lugares. E mais espaço, apesar de bom, sempre influi na agilidade, e na eficiência do carro como um todo. Existem carros maiores e mais leves, mas ainda estão em desenvolvimento, frutos da recente "descoberta" dos grandes fabricantes da massa como fator decisivo na excelência de um veículo.
Depois há o jeito que a carroceria foi desenhada. O Focus não é um carro baixo. Estacione um ao lado de um Escort do mesmo ano (carro que foi substituído pelo Focus) e veja como parece um carro muito maior, apesar de sê-lo apenas na altura. O Focus parece maior porque é mais "denso", no sentido de ter mais carro dentro da mesma "sombra". Meio como uma minivan, o Focus usa essa maior altura para maior espaço interno, mas não sacrifica a ergonomia e a estabilidade por isso, por não chegar ao extremo nesse aumento de altura.
Uma coisa interessantíssima advém disso, algo que nunca li em nenhuma avaliação do carro. E para explicar isto, tenho que voltar um pouco no tempo, até ao início do sáculo XX, na Inglaterra. Um dos maiores pioneiros do automóvel, Frederick Lanchester, cientista e inventor, estudou profundamente a interação entre o homem e a nova máquina, e chegou a várias conclusões interessantíssimas, a maioria delas esquecidas hoje em dia. Mas o Focus trouxe de volta uma delas.
O bom Dr. Fred descobriu que a posição ideal para o ocupante do carro, a localização da busanfa do motorista, conhecida tecnicamente como ponto H, devia ser a mesma altura de uma pessoa andando. Desta forma, os ocupantes se sentem melhor, e familiarizados com o movimento nesta altura, tem melhor noção de perspectiva e movimento, e até enjoam menos, no caso de passageiros com esta tendência. O Focus me dá a sensação de ser desta forma, apesar de obviamente não atender exatamente a regra. O ponto H (que na verdade é o ponto de articulação do fêmur na bacia) é mais baixo que o de uma pessoa média em pé, mas quando saio dele (mesmo eu, com quase 2 m de altura) e saio andando, a sensação é de se manter praticamente na mesma altura. E minha filha mais velha, de 10 anos (mas mais alta que um monte de adultos), enjoa em carros mais baixos e em carros mais altos, mas não no Focus. Eu quero acreditar que os engenheiros da Ford estudaram e atualizaram a regra de Lanchaster, aproximando-a para uma posição melhor e mais baixa que causa o mesmo efeito, mas muitos amigos acreditam em mera coincidência. De uma forma ou outra, o bom Dr. Fred está sorrindo em algum lugar...
Outra coisa que é interessante é que o banco traseiro é sutilmente mais alto que o dianteiro, criando um efeito chamado "teatro", supostamente mais agradável para os seus ocupantes.
Depois há a execução do interior. Basta olhar para o painel de porta: como tudo no carro, não há opulência de madeira, couro, e outros materiais nobres, muito menos cromados, como era de se esperar em carros deste preço. Mas como o resto do interior, tal coisa não é desculpa para usar plásticos duros e péssimos ao toque, como acontece aos montes nos carros aqui no .br. Não, o painel de porta não tem uma única superfície mal cuidada ao toque, a maioria dela sendo revestida por um vinil agradável, com espuma por baixo, o que o torna macio. A alça do puxador é separada, e está na posição teórica perfeita, bem como a trava e o gatilho de porta, e o descansa-braço, de largura generosa e macio pelo vinilzinho espumado. O controle do vidro elétrico está um pouco à frente da posição teórica ideal, mas ainda é de facílimo acesso, e um compromisso plenamente aceitável. Afinal de contas, nunca cabe tudo na área teoricamente perfeita (acessível com o com o braço descansando no descansa-braço), e nem precisa, como este carro prova. Dentro do puxador de porta, o plástico é pintado com tinta soft-touch, que parece emborrachada, uma delícia de pôr a mão. Na verdade, apesar da ausência de cromados e outros materiais mais opulentos, o painel de instrumentos, e todo resto do interior, não parece revestido de plástico, graças a um excelente trabalho de textura e materiais. Impecável qualidade, algo raro hoje em dia.
Mas o melhor de tudo neste carro é algo que devia ser básico: suspensão e ergonomia do motorista. Eu não conheço nenhum carro que possa ser comprado por menos de 90 mil reais que seja tão bom nisso. Muito já foi dito sobre a suspensão multibraço traseira, mas o fato é que não é isto que fez a grande diferença. Sim, a Ford foi genial em criar uma sofisticada suspensão deste tipo em um carro barato, usando aço estampado e fazendo um conjunto simples, leve e que ocupa pouquíssimo espaço. Mas se Deus está nos detalhes, os Deuses da combustão interna estão não em criações mirabolantes: estão na execução.
A Ford tomou extremo cuidado para manter as geometrias da suspensão teoricamente perfeitas em todos os seus movimentos. Pode parecer óbvio isso, mas você não acreditaria na quantidade de pequenos "compromissos" que se faz num projeto deste tipo, de produção em massa. Não desta vez: o Focus começou garantindo os movimentos livres e perfeitos teoricamente, e continuou criando uma cultura de obsessão por diminuição de atrito nos componentes de direção e suspensão. Desta forma, o acerto do importantíssimo compromisso estabilidade-conforto ficou bem mais fácil.
O resultado é sensacional. Usando pneus de perfil série 70, e rodas de aro 14, medidas hoje em dia consideradas ridiculamente conservadoras para um carro deste tamanho, o Focus, mesmo não sendo um carro baixo, exibe um controle perfeito de todos os movimentos da carroceria em todas as situações, aliado a um conforto exemplar. E a direção, o mais importante componente para um entusiasta do automóvel, é um instrumento de precisão, algo que parece ser feito numa fábrica de micrômetros. E o volante? Já fiz um post somente sobre ele, mas basta aqui chamá-lo de perfeito.
A posição de dirigir, o peso e a precisão de todos os controles do carro seguem esse tema: não dá para criticar. Ergonomia, comandos de peso e precisão corretos, aliados a suspensão irrepreensível é a fórmula básica para um carro realmente bom para quem gosta de dirigir. Pouquíssimos carros na faixa de preço do Focus conseguem este tipo de coisa e, como exemplo, a marca que é mais consistentemente boa nisso é a nossa querida BMW. É o segredo de tudo, a fórmula mágica de excelência que poucos seguem à risca.
E é bom que seja assim, porque no caso de meu carro, o motor não está à altura do resto. Não há nada de ruim, criticável, no Rocam 1,6 litro dele. Mas ele também não é algo para se sonhar quando se encosta a cabeça no travesseiro. Com 103 cv, o motor é suficientemente forte, suave e econômico, fazendo seu trabalho de forma perfeita mas não excedendo as expectativas em nada. Ele apenas faz o que se espera dele, sem surpreender ou empolgar, mas também não chateando ninguém. Nisso, o fantástico Duratec de dois litros é muito melhor: pesando o mesmo que o Rocam, totalmente em alumínio, faz do Focus um carro realmente veloz, e bem mais prazeroso ao volante. E para quem faz questão, o Duratec agora é flex, com 148,3 cv com etanol, mais 3,3 cv que quando era só a gasolina.
Os bancos são como o motor: bons, mas não fantásticos. Poderia ter um pouco mais de suporte nas coxas, e laterais mais pronunciadas para segurança maior nas curvas, mas como estão são plenamente satisfatórios. O que, para a Ford brasileira (argentina?), é um grande progresso, pois os do Fiesta estão entre os menos agradáveis hoje. O tecido também é da variedade mais barata, mas este é uma das coisas que temos que aceitar na versão mais simples do carro apenas.
Já o câmbio ajuda muito: relações bem escolhidas, quinta marcha de efeito overdrive (a máxima é em quarta), e uma alavanca de tamanho e localização perfeitas. O acionamento é preciso e suave, e a embreagem de acionamento hidráulico também é suave e fácil de modular.
Os freios para mim foram um alívio neste passeio. Sem o maldito ABS, senti novamente o prazer de modular um freio sozinho, sem intervenção, e num carro em que a sensibilidade do pedal é muito boa. Ah, como é bom novamente se sentir com a responsabilidade e o prazer de cuidar do freio sozinho! É algo que recomendo a todos, pois com o ABS, eu lentamente me tornava um motorista pior.
O que a imprensa inglesa não tinha me contado é o quão confiável é o carro. O de minha esposa é na verdade o carro da família, que usamos para viajar. Comprado zero, está com 80 mil km e ainda roda como um carro novo. Não fiz quase absolutamente nada a não ser manutenção básica no bicho, coisa como pastilha de freio e pneus novos. Simplesmente o carro mais confiável que já tivemos em casa.
Pensando nisso tudo, certo desespero me acometeu. O Focus é na realidade o único carro novo que realmente gostaria de comprar, mas saiu de linha no final do ano passado. Revi em minha cabeça a lista de carros novos que poderia comprar, e na verdade, todos os outros não me animavam em nada, pelo menos não o suficiente para gastar a montanha de dinheiro necessária. Mesmo o Focus II, apesar de muito bom, é outra coisa bem diferente, tão diferente que merecia outro nome. Outra coisa que me deixava angustiado com isso é que, inevitavelmente, o nosso fiel Focus prata não vai continuar perfeito para sempre...
O Focus I, sem dúvida por causa deste monte de motivos que coloquei aqui, teve uma vida longa. Na Europa durou até 2005, nos EUA até 2007, e finalmente aqui na América Latina (foi produzido na Argentina, como é o novo), até o final do ano passado. Os nossos 1,6 litro flex são literalmente os últimos Focus I a venda em todo o mundo. Ou ERAM os últimos? Será que ainda tem algum zero?
Resolvi ligar para as concessionárias Ford de SP, para ver se ainda tinha algum deles à venda. Encontrei nove carros em SP, curiosamente exatamente na mesma faixa de preço de 2005: de 37 a 41 mil reais. Era a última chance, em todo mundo, de se comprar um Focus zero, e este fato requeria ação imediata. No mesmo dia, coisa de três horas depois do primeiro telefonema, sobravam apenas oito deles nas concessionárias paulistanas, e o MAO estava novamente endividado. É ele próprio, o carro preto nas fotos que ilustram este post, um dos últimos Focus 1 zero-km do mundo, tirado da loja dia 3 de março de 2010, mas fabricado na Argentina dia 9 de novembro de 2009, às 7:43 da manhã.
Não é a primeira vez que compro um dos últimos carros de uma espécie. Existe algo nisso que tem algo de definitivo e imperdível, uma última chance de algo acontecer. Sim, existem carros usados, mas nunca são a mesma coisa. O cheiro de um carro novo, a sensação de ter algo virgem e praticamente intocado, me desculpem, mas é única. O monobloco nunca torceu, a suspensão nunca suspendeu, o motor nunca foi ligado fora do ambiente fábrica-loja. Você é que vai levá-lo para o mundo real, lá fora, esse mundão besta de grande e bão. Você é o primeiro, e enquanto mantê-lo, o único.
Mesmo o meu outro Focus, comprado zero-km, mas hoje velhinho, é de uma forma inexplicavelmente clara, diferente de algo usado. A história dele é uma parte da sua desde o início, meio como um cachorro já velhinho, mas ainda extremamente fiel e definitivamente SEU. E tudo isto é ampliado quando o carro é o último de sua espécie, a última chance disto acontecer novamente. Quando eu vender este Focus preto, ou se ele morrer em um acidente, será definitivamente o fim.
Por este motivo que a prece do velho Chingachgook depois da morte de seu filho único, herdeiro de uma tribo desaparecida, é tão emocionante, ao fim do grande clássico filme "O último dos moicanos". Têm-se a sensação clara de ver uma era acabando, de ser testemunha de uma mudança que é definitiva e imutável, de existência corajosa de quem fica, em um mundo que não precisa mais dele, e no qual não deixará nada além de uma lembrança. E é por isso que termino com esta prece:
"Great Spirit, Maker of All Life. A warrior goes to you swift and straight as an arrow shot into the sun. Welcome him and let him take his place at the council fire of my people. He is Uncas, my son. Tell them to be patient and ask death for speed; for they are all there but one - I, Chingachgook - Last of the Mohicans."
(Grande espírito, criador de toda a vida. Um guerreiro está indo para ti, rápido como uma flecha. Que ele seja bem-vindo, e que ele tome seu lugar junto à fogueira do conselho de meu povo. Ele é Uncas, meu filho. E diga a eles para serem pacientes, e peça rapidez a morte; porque estão todos lá, menos um – Eu, Chingachgook – o último dos moicanos.)
MAO
PS: Vejam também o excelente texto do JJ sobre o Focus clicando aqui.
Sorrell Booke, o chefe Hogg
Uma das características bem bacana e únicas do AUTOentusiastas é a diversidade dos leitores e autores que se espalham pelos diferentes cantos do Brasil e mundo de forma que vez ou outra temos um banho de cultura geral misturado com uma pitada de automóvel.
Hora do almoço em Utah (hoje Saint Patrick's day, ou dia de São Patrício, tinha que sair) e vejo parado no restaurante mais uma manifestação de um membro do orgulhoso clã de Rednecks. Redneck é um termo que utlizamos aqui no velho oeste para descrever um caipira. Traduzindo seria "pescoço vermelho" que é algo que acontece quando você trabalha na roça o dia todo com aquele sol e a parte traseira do seu pescoço fica vermelha no final do dia. Claro, é um termo ofensivo e geralmente usado por outros grupos étnicos de forma derrogatória para descrever a raça branca. Apesar que hoje em dia virou algo normal e até legal.
Outra forma carinhosa de se chamar um caipira por essas bandas é Hickie. Hickie é o termo que se usa para chupão (aquele beijo com sucção extrema que causa marcas avermelhadas e roxas na pele dependendo da pressão aplicada). Mas esse termo é muito pouco usado.
Claro, na costa leste usa-se Cracker (especialmente Flórida e Geórgia) e também temos Hillbilly em lugares como Virginia onde se produz o inigualável wiskey da montanha também conhecido como Moon Shine (brilho da lua) ou Mountain Dew (orvalho da montanha e por isso batiza o refrigerante da Pepsi também), nomes esses utilizados para não usar o termo wiskey que não era muito querido pelas autoridades. Graças ao Moon Shine e a lei seca temos hoje a Nascar, mas isso é assunto para outra ocasião.

Muitos de vocês que cresceram na década de 70 e 80 se lembram de um seriado na TV chamado The Dukes of Hazzard (Os gatões, no Brasil). Um dos principais personagens era um Dodge Charger 1969 pintado de laranja com o número 01 na porta, uma bandeira dos Confederados no teto e batizado de General Lee (raro, pois geralmente carros tem nomes femininos na língua inglesa).

Daisy Duke
Esse seriado era muito interessante para quem gosta de carros, tinha várias perseguições com a polícia local do fictício condado de Hazzard localizado na Geórgia (não existe Hazzard na Geórgia). O seriado contava a estória dos primos Luke e Bo Duke que eram os herdeiros de uma família produtora de whiskey ilegal e foram pegos transportando a iguaria. Como resultado, estavam na condicional mas ainda dirigiam rápido sempre entrando em confusão com o corrupto político e "dono" da cidade, o chefe Hogg e seu cunhado xerife Roscoe P. Coltrane (James Best). Naturalmente o show foi um sucesso por ser algo bem relaxando: era ridículo mas tinha uma boas tiradas, além da personagem Daisy Duke que sempre estava de shorts jeans bem curtos, marcou época e toda uma geração. No Brasil era mostrado na TV Globo à noite quando o seriado era novo.
Um dos principais personagens do seriado era o carro General Lee. Como sabem, General Lee era o grande general dos Confederados (exército do sul escravista americano). O seriado causou problemas entre os grupos raciais nos Estados Unidos porque, entre outras coisas, o carro General Lee tinha uma bandeira dos confederados no teto. Grupos como o Klu Klux Klan usam a bandeira no sul assim como os grupos racistas extremistas.
Uma das curiosidades do seriado era o ator Sorrell Booke que fazia o papel do Chefe Hogg, um redneck ignorante, corrupto e ganancioso. Sorrell era extremamente culto (formado em Yale e na Universidade de Columbia) e falava 5 idiomas na vida real sendo fluente em japonês e por causa disso serviu como contra-inteligência na guerra da Coreia. Nada mau para o chefe de Hazzard.
Claro, para se criar uma pickup digna do General Lee é preciso se começar com uma Dodge Ram e foi isso que o dono fez. Depois pintou a Ram de laranja, colocou o 01 nas portas, escreveu General Lee no capô e fez o vidro traseiro com a bandeira do exército confederado. Mas, claro, como todo bom redneck tem que haver a cereja do bolo, aquela grande sacada que deixa o redneck orgulhoso para mostrar aos outros meros mortais como ele é uma criatura de inteligência superior. No caso, as Dodge Ram a diesel vem com o motor Cummins. Portanto, o venerável redneck não perdou e escreveu ladenado a terceira luz de freio "Still Cummin". Naturalmente não vou traduzir o trocadilho porque é algo impublicável, porém vocês podem perguntar ao pessoal da Bayer que devem saber do que se trata...
A cereja do bolo do redneck inscrita no teto ladeando a 3a. luz de freio
Observem na Ram que a placa é de Utah e essa especificamente (Ski Utah) tem esse design desde 2008, o que prova que essa pickup foi feita por um redneck e depois vendida para outro que a dirige com orgulho e Still Cummin'.
CS

Outro dia, levando meus filhos para almoçar no McDonald's, me peguei matutando um assunto que me incomoda muito. E me lembrei disso ao comer um Big Mac.

Não sei quem de vocês já percebeu isso, mas o Big Mac não tem nada de Big mais. Não tenho como provar isso, mas a impressão que passa é que, ao passar dos anos, ele foi ficando cada vez menor e mais pobre.

E isso não é exclusividade da rede americana: o venerando Bob's é pior ainda. Quem, como eu, foi criado no Rio de Janeiro certamente se lembra da montanha de carne e pão macio, recheados de muito, mas muito molho e alface e cebola picados, que era o Big Bob. Comíamos o lanche de pé, mas era tão bom, tão tenro e suculento e grande, que ainda assim a gente adorava. Era bom para CARAMBA, acreditem.

Veja um sanduíche desses hoje: uma lamentável coisinha insossa, pequena e decadente. Pão mal ajambrado, carne sem suco ou gosto, um pouquinho de molho sem graça. Comer um Big Bob era algo que se fazia com coragem e vontade, prestando atenção, porque molho transbordava para todo lado. Era uma delícia, um prazer simples perdido para sempre.

E por que isto aconteceu? Eu tenho uma teoria, and I think it's a Duesy!

Uma empresa, a cada ano que passa, tem que crescer. Não me pergunte por que, mas é regra. Quem não cresce (leia-se aumenta o lucro) a cada ano é exemplo de empresa estagnada, ineficiente, supostamente um local triste onde ninguém lê "VOCÊ S.A". Ninguém quer isso, não, feio, tabu! Mas como aumentar todo ano num mercado que cresce pouco, e seu produto, bem, é o mesmo sempre? Um dia, alguém teve a maravilhosa ideia de tirar 0,05 grama de alface do sanduba, o que equivalia a, sei lá, à milionésima parte de um centavo de economia. Multiplicado pelo mundaréu de Big Mac que se faz por dia nos shopping centers de todo o mundo... Milhões de dinheiros de lucro. E, olha só, nenhum consumidor nem percebeu!

Até aí tudo bem, até que o mesmo procedimento foi usado para o molho especial secreto (maionese com catchup, como sempre), e depois para os dois hambúrgueres, para o queijo, a alface, a cebola e até o pobre picles. Depois, sem mais ingredientes para mutilar, esqueceram-se que já tinham tirado alface uma vez há uns anos atrás, e tiraram mais um pouco. Mas agora, os objetivos de lucro eram bem maiores, e então, além de tirar logo uma grama inteira duma vez, foram lá e decidiram comprar alface de qualidade "B", e deu muito certo, porque de novo ninguém percebeu! As pesquisas de opinião não mostravam ninguém reclamando do peso da alface! E as vendas continuam aumentando, e o lucro sobre elas também, então está tudo certo.

Agora multiplique esse comportamento por 30 anos, e podemos entender por que quando estava na faculdade eu adorava aquela gordurosa e suculenta montanha de carne e pão, e hoje, bem... Tenho que comer aquele ridículo e caro sanduichinho safado para minhas crianças ganharem um boneco de plástico chinês vagabundo do Avatar.

E o que isto tem a ver com carros, diria o impaciente leitor? Tudo! Esta teoria foi formulada porque eu conheço como funcionam os fabricantes de automóvel modernos. Eles têm enormes departamentos cujo objetivo único é fazer "otimização de valor" do produto, o que traduzido para o português significa "sacanear o comprador". A lógica é a mesma explicada acima: seis meses depois do lançamento, depois que todo mundo já conhece e gostou do carro, o cara vai lá e tira um parafuso, um “pqp”, um pedaço de carpete, qualquer coisa. Os caras são como urubus mesmo, procurando uma forma de dar menos ao cliente sem que ele possa perceber, e obviamente sem mudar o preço do carro.

Todo fabricante tem estes departamentos, e eles trabalham com um budget reverso: os objetivos são contabilizados como lucro antes de acontecer, o que aumenta sobremaneira a pressão nos pobres funcionários. É por causa disso que quando você trocou seu carro por outro igual, mais novo, sentiu falta de um “pqp”, de uma soleira de porta de plástico, e percebeu que o tecido dos bancos, antes felpudo e gordo, é no carro mais novo algo que parece ter sido confeccionado a partir de pelo de rato trançado.

Pouco a pouco, a qualidade do produto decai como um todo. Mas como gente continua comprando, e cada caso é analisado separadamente, a empresa não percebe o mal que faz. Re-fraseando: não se importa com o mal que faz. Realmente, não podíamos esperar menos: ganhar dinheiro é só o que importa, e quando a grana vira Deus, o fim e o objetivo supremo, é isto que recebemos em troca. Fazer algo corretamente? Tentar melhorar algo? Para quê? Piorar dá mais dinheiro!!!!

Antigamente, se dizia que se devia esperar um ano para comprar um novo produto, para evitar problemas ainda não resolvidos. Ainda é verdade, mas aos seis meses já se tem os depenadores em ação. O que fazer então? Olha, tenta reclamar com o bispo...

MAO
PS: Um amigo me chamou a atenção de que as reclamações dos compradores de carros novos são ouvidas sim, ficam num banco de dados que é usado como referência para novos projetos. Normalmente, se veta itens que tenham qualquer reclamação de cliente, porque reclamações são na verdade, raras para itens do tipo que coisa que descrevi no post.

Então nada de Bispo; reclamem sim com os fabricantes sempre que perceberem algo deste tipo, seja por e-mail, seja pela pesquisa que é sempre enviada via correio para os compradores. Ajuda e é importante para mudar este nefasto comportamento.

E o amigo CZ lembrou de outra coisa: os japoneses não tem este tipo de departamento em suas empresas. Nisto, são claramente melhores que a indústria mais antiga.