Em Copenhague está acontecendo mais um encontro de líderes mundiais para estabelecer metas de emissões de gases do efeito estufa, dando continuidade aos encontros anteriores na Rio Eco 92 e em Kyoto, em 1997..
Aquecimento global é um assunto espinhento, que ninguém gostaria de tratar. Porém ele tem marcado sua presença, e virou assunto para tratados internacionais.
Diferente do que se possa pensar, o assunto não é novo. As primeiras evidências surgiram há mais de 50 anos, tomou fôlego na década de 70 com a exploração de Vênus, que possui um efeito estufa infernal, e pela aceleração sensível de seus efeitos a partir do começo dos anos 80.
Para a comunidade científica, as discussões sobre o assunto podem ser divididas em três conjuntos distintos.
- O aquecimento global é real?
Para os cientistas não há mais controvérsias. O assunto deixou de ser uma teoria para ser uma realidade.
Entre 2007 e 2008 foi realizado um esforço mundial entre pesquisadores e especialistas em clima do mundo todo, integrando dados e pesquisas das mais variadas fontes. O objetivo era concluir de uma vez por todas sua existência. Críticos da teoria foram especialmente convidados a participar. As análises preliminares destes dados já convenceram até os mais céticos.
- A humanidade é a responsável pelo aquecimento global?
Embora a maioria dos cientistas acredite nesta hipótese, ela ainda não é um consenso pleno.
- Podemos reverter o aquecimento global?
Aqui simplesmente não há qualquer tendência de consenso. Porém, mesmo os mais otimistas assumem que não será possível revertê-lo totalmente.
A razão para estas dúvidas é que ainda não há concordância entre os modelos climatológicos e os resultados práticos medidos. A grande maioria das previsões feitas apontam as tendências corretamente, porém falham por apresentarem datas e valores mais conservadores que os verificados na prática.
Apesar das dúvidas que ainda pairam sobre o assunto, os cientistas estão unidos em pedir medidas que barrem a crescente emissão de carbono para a atmosfera.
Um oncologista opera imediatamente um tumor recém-descoberto e manda com urgência o material para biópsia, ao invés de ficar esperando pra ver se o tumor atinge a metástase para dizer se ele é um câncer.
Da mesma forma, os cientistas não querem correr o risco de perder tempo precioso discutindo o assunto.
Um relatório do Pentágono de 2004 aponta para conflitos internacionais importantes, basicamente motivados por água, comida e energia, no caso de uma mudança climática brusca.
Um evento colocado em destaque pelo relatório aponta para o rápido derretimento das geleiras do Himalaia. O derretimento destas geleiras alimenta rios importantes para vários países populosos, como a China, a Índia e o Paquistão. O derretimento acelerado tem causado enchentes e vários outros prejuízos, mas algumas destas geleiras já foram reduzidas à metade, e no atual ritmo, desaparecem completamente até 2050. Porém a falta de água e o fracasso da agricultura deverá ocorrer em até 20 anos.
Um quarto da população mundial com sede e fome, pertencendo a três países de cultura beligerante e donos cada um de seu próprio arsenal nuclear é um convite para o desastre.
Geleira Gangotri, que alimenta o rio Ganges, e seus limites em mais de 200 anos.
E este é só um entre vários outros problemas previstos.
Não são só os cientistas e militares que estão pressionando. Quem paga as contas do aquecimento global também.
Pressiona o agricultor que perdeu safras em secas prolongadas regulares que antes não aconteciam, e pressiona a companhia de seguros que assegurou as safras do agricultor.
Pressiona o empresário que tem prejuízos regulares com enchentes cada vez maiores.
Pressiona a cidade turística baseada no esqui, e que vê as temporadas de neve cada vez mais curtas e a camada de neve cada vez mais fina.
Pressionam os cidadãos que tiveram perdas de bens e de familiares em catástrofes climáticas que vem se tornando mais fortes ano após ano.
Por fim, os próprios governos se mobilizam, forçados a destinar uma parcela cada vez maior dos seus orçamentos para reparar estragos que o aquecimento global trás agora e que não aconteciam há 20 anos.
Foi assim que o aquecimento global virou assunto de gabinete presidencial.
O assunto é indigesto, pois afeta diretamente nosso modo de vida.
Tecnologias precisam ser trocadas por outras mais “verdes”, o consumo deixa de ser desenfreado e passa a ser mais responsável, aumento da reciclagem de materiais, reduzindo o descarte de lixo para a natureza e posterior exploração de alguma jazida para fornecer material novo etc.
Não só é difícil de implementar todas estas transformações de uma hora para outra, como isso esbarra em muitos interesses há muito estabelecidos.
Assumir uma cota de emissões hoje é o mesmo que impor um limite ao crescimento econômico do país.
Copenhague, assim como outras reuniões anteriores, se tornou uma praça de guerra onde deveria ser um local de concórdia. Cada grupo de países defende uma menor obrigação para si e joga o resto da responsabilidade para os outros.
E o evento já caminha para terminar sem um tratado técnico de obrigações, mas sim para um documento de intenções meramente político. Um escandaloso desastre político internacional.
Ao lado do fórum principal, dentre os fóruns paralelos, um dos que mais chama a atenção é o referente aos automóveis. E lá há um consenso mais amplo e profundo que no fórum principal.
Por mais que os automóveis recebam dispositivos anti-poluentes, a emissão de carbono está associada à geração de energia nos motores a combustão, e não há forma de eliminá-la. No máximo, onde há um motor a combustão o que se pode fazer é otimizar seu funcionamento e seu perfil de uso.
Como isto está aquém das expectativas, há várias discussões sobre mudanças da plataforma tecnológica e fontes alternativas e renováveis de energia, como os biocombustíveis.
Na Europa, as emissões de muitos poluentes vem caindo substancialmente desde o começo dos anos 90, melhorando a qualidade do ar na região.
No entanto, desde 1997, os índices de poluentes particulados em suspensão e ozônio não tem mostrado melhoras, apesar da redução das emissões. Uma parcela significativa da população urbana européia vive exposta a níveis que ultrapassam os permitidos pela Comunidade Européia para proteção da saúde pública.
Estes poluentes estão em grande parte associados ao uso do automóvel, e geram discussões sobre que novas medidas restritivas deverão ser impostas a eles.
Como as intervenções técnicas nos automóveis não vem surtindo efeito, medidas restritivas de outra ordem deverão ser tomadas a curto prazo. As medidas mais discutidas são as de restrição ao uso urbano do automóvel.
Ao dificultar a circulação de veículos particulares em determinadas áreas das cidades, não só se alcança a redução dos índices de poluentes locais altamente nocivos, como reduz as emissões de gases do aquecimento global.
Pode-se esperar daí mais medidas como rodízios e pedágios urbanos em troca de mais transportes públicos pelas principais cidades do velho mundo.
Só nos Estados Unidos, os automóveis e veículos comerciais leves emitem 333 milhões de toneladas de CO2 ao ano, a quinta parte das emissões totais do país.
Comparado ao resto do mundo, as emissões de carros americanos são desproporcionalmente altas. Num país que tem 5% da população e 30% da frota mundiais, as emissões automotivas americanas representam 48% das emissões globais do setor.
Vários esforços vem sendo feitos nos Estados Unidos para lutar contra o aquecimento global, incluindo o corte de emissões dos automóveis.
Entre as medidas tomadas estão:
- Criar uma pressão de opinião pública sobre os fabricantes de automóveis para aderirem a uma política nacional contra o aquecimento global;
- Educar proprietários e motoristas sobre o que eles podem fazer para reduzir as emissões de seus carros;
- Explorar todos os meios para que todos alcancem uma maior eficiência do combustível, cortando a emissão de gases do efeito estufa.
Tal esforço já mostra resultados.
O presidente Obama prometeu no começo deste ano “colocar um milhão de carros híbridos com recarga de tomada até 2015”. Ele pressiona a indústria para produzir uma frota que ofereça um consumo de pelo menos 35,5 milhas por galão (15, 1 km/l) em 2016.
Dando continuidade a esta política, ele deve anunciar um acordo recente de cooperação com a China para o desenvolvimento de pesquisas e padrões para a produção de carros elétricos e híbridos.
A China pretende atingir o estado-da-arte nesta tecnologia, e o acordo com os Estados Unidos garantiria vantagens técnicas e comerciais neste caminho.
A indústria, sentindo a pressão pública e política, já conta com elétricos e híbridos como parte de seu futuro.
Em uma apresentação recente, o presidente executivo da Renault, Carlos Ghosn, disse esperar que os carros elétricos representem 10% do mercado mundial em 2020.
Mas o elétrico de autonomia estendida por motogerador Volt, da GM, e o elétrico Leaf, da Nissan, deverão estar nas concessionárias americanas entre 2010 e 2011, enquanto a Renault investe na construção de uma linha de montagem para oferecer dois modelos elétricos já em 2012.
GM Volt
Nissan Leaf
Há uma abundância de carros elétricos e híbridos sendo demonstrados em Copenhague.
Os ônibus convencionais que levam o público para a área da conferência são todos elétricos.
Ônibus público elétrico que serve o local da conferência.
Os delegados da conferência tem à disposição 60 Citroën C1 elétricos.
Estes carros são montados pela empresa inglesa ECC (Electric Car Corporation), e espera-se que 1.000 deles sejam vendidos na Dinamarca em 2010.
Citröen C1 Elétrico
A Honda também disponibilizou uma frota do modelo Insight para atender delegados, VIP's e jornalistas . O FCX Clarity com célula a combustível também está disponível.
Honda Insight
Honda FCX Clarity
A Renault também disponibilizou três modelos elétricos que os participantes poderão experimentar ao volante e avaliar o procedimento de recarga num posto especialmente construído.
Há também outros carros, elétricos e híbridos em demonstração da Peugeot, Mercedes-Benz, BMW, Volvo e Think.
Um comboio de carros elétricos de várias marcas e modelos partiu de Londres em direção a Copenhague para demonstrar publicamente a viabilidade da tecnologia atual.
Todos os fabricantes enfatizam a ideia de que o futuro não muito distante do automóvel está apoiado cada vez menos no petróleo e mais na eletricidade. E estão apostando alto nessa opção.
A conferência principal de Copenhague, ao que tudo indica, fracassará.
Mas lá governos e fabricantes demonstraram forte compromisso em modificar políticas e tecnologias para a redução da emissão de gases que causem o aquecimento global e que afetará os automóveis a curto, médio e longo prazos.