google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014)
Os carburadores estão hoje completamente obsoletos, diante da precisão e do refinamento da injeção eletrônica, mas nem por isso deixaram de ser muito sofisticados. É um componente que ainda vive no imaginário popular, mas que cada vez menos técnicos sabem dizer como ele funciona. E as perguntas dos apreciadores leigos cada vez se acumulam mais sem respostas.

Um dos componentes mais misteriosos do carburador é o chamado “tubo de emulsão”, popularmente conhecido como “caneta” ou “flauta” em razão de seu formato. Para explicar seu funcionamento, é preciso primeiro entender sua necessidade.

Vamos começar pensando num carburador elementar.


Neste carburador, a bóia regula o nível constante de combustível na exata altura do difusor.

Conforme o ar é aspirado pelo motor através do venturi, sua conformação acelera o fluxo, diminuindo a pressão estática na altura do difusor, o que suga combustível para o ar passante, formando a mistura. O combustível aspirado através do difusor é reposto pela cuba de nível constante, e regulado pela restrição do giclê.

Embora este seja o princípio básico de todos os carburadores, este não serve para alimentar motores, isto porque a curva de aspersão de combustível deste carburador é incompatível com a exigida pelos motores.

Enquanto a proporção de mistura oferecida pelo carburador elementar seja sempre crescente, os motores exigem uma mistura inicial, de marcha lenta, bastante rica, uma mistura de carga intermediária mais pobre para economia, e uma mistura mais rica à plena carga.


Para atender a estes requisitos, todo carburador precisa, em tese, de 3 circuitos, cada um otimizado para cada nível de carga do motor. Entretanto, em alguns carburadores mais simples, o circuito de carga intermediário pode ser calibrado para oferecer a mistura de carga plena.

Para que as necessidades de mistura do motor sejam atendidas, cada circuito precisa de mecanismos de compensação, que tragam a curva do carburador elementar para a mais próxima possível da ideal para o motor.

Ao longo da história do carburador, diversos sistemas de compensação foram propostos, com diversos giclês, poços e ventilações a diferentes pressões, mas nenhum se mostrou tão eficiente e flexível e completo quanto o sistema de tubo de emulsão, patente original da Solex.

O princípio básico do tubo de emulsão pode ser entendido através da sequência de três experimentos.

No experimento A, colocamos um tubo imerso no líquido, e fazemos vácuo na extremidade oposta. Temos apenas a formação de uma coluna de líquido.

No experimento B, instalamos um pequeno tubo capilar, ligado à atmosfera, na lateral do tubo, porém acima no nível do líquido na cuba. O resultado é o aparecimento de grandes bolhas de ar junto com o fluxo de líquido.

Já no experimento C, há uma restrição à entrada do tubo principal, e a conexão com o tubo capilar é feita abaixo do nível do líquido na cuba. Nele observa-se a formação de diminutas bolhas de ar que criam uma espuma densa com o líquido. Esta espuma, uma emulsão de líquido com microbolhas de ar, possui propriedades físicas como inércia e viscosidade diferentes do líquido original. A importância desta alteração veremos mais adiante.


O experimento C foi adaptado e desenvolvido para criar o tubo de emulsão, que é constituído basicamente dos seguintes componentes:


O princípio de funcionamento deste dispositivo é bastante sofisticado, embora não possua uma única peça móvel a não ser combustível e ar.

Conforme o fluxo de ar atravessa o venturi, a pressão estática daquele ponto, menor que a atmosférica, é transmitida ao combustível do poço de emulsão pelo difusor. Estando o ar na entrada do giclê de ar do tubo de emulsão e do combustível na cuba sob pressão atmosférica, estabelecem-se fluxos de ar e combustível através do sistema de emulsão.

O fluxo de ar pelo interior do tubo de emulsão empurra para baixo a coluna de combustível que o preenchia, até que o equilíbrio de pressões seja atingido, e o ar vaze através dos furos capilares na lateral do tubo que ficaram acima do nível da coluna interna de combustível.

Neste ponto, a pressão do ar dentro do tubo de emulsão é intermediário entre a pressão atmosférica e a altura da coluna de combustível, e é função da relação entre a restrição dos furos capilares com a restrição do giclê de ar. Assim, para um mesmo tubo de emulsão, quanto maior o diâmetro do giclê de ar, maior a variação de altura da coluna de combustível no tubo, abrindo mais furos na lateral do tubo, e menor a restrição à entrada de ar atmosférico, arejando mais a emulsão e empobrecendo a mistura. Se usarmos um giclê menor, pelo mesmo raciocínio, enriquecemos a mistura.

O trio formado pelo giclê principal, pelo giclê de ar e pelo tubo de emulsão são projetados para trabalharem em conjunto, de forma a oferecer a curva de mistura mais apropriada ao motor em qualquer circunstância.

Entre profissionais de preparação e reparação existe a cultura de que ajustes de mistura do carburador são resolvidos no giclê principal. Isto pode ser verdade para pequenos ajustes, porém para ajustes mais significativos deva-se equalizar os dois giclês mantendo-se o tubo, e nas transformações mais extremas, trocar os três.

Sem esta prática, o sistema de emulsão perde a curva adequada de compensação, e se cai no velho cenário onde o mecânico acerta um ponto e estraga outro indefinidamente após alguma transformação no motor, sem que ele seja capaz de acertá-la adequadamente.

Esta sensibilidade varia de modelo para modelo de carburador. Há alguns anos, preparadores e proprietários afirmam que o carburador Brosol 3E é melhor para preparação que o seu irmão contemporâneo 2E. O que ninguém diz, provavelmente por desconhecimento técnico, é que o 3E, por diferenças de projeto, é menos às diversas mudanças de giclês a que são submetidos nas transformações que o 2E.

Se o trabalho de recalibração do 2E fosse feita por um especialista em carburação, a correção de mistura poderia ser igual ou superior à do 3E alterado apenas no giclê principal.

O equilíbrio entre os três componentes é ainda mais delicado do que parece. Assim como observado no Experimento C, a emulsão afeta as propriedades físicas do líquido. Quanto mais aerada for a emulsão, menor a inércia e maior a fluidez através dos dutos do carburador. Mas não só isso.

O tubo de emulsão revolucionou os carburadores não só pelo controle mais preciso da progressão da mistura, mas também porque o combustível emulsionado é quebrado no difusor em gotículas mais finas do que na forma líquida contínua, que vai de encontro com a necessidade do motor, que é admitir gotículas de combustível menores tanto quanto possível. Esta nebulização tão fina do combustível não era conseguida por nenhum outro sistema anterior.

Mexer na relação do conjunto emulsionador é mexer no tamanho das gotículas admitidas pelo motor, e consequentemente, a eficiência com que ele consegue queimar combustível. Isto afeta diretamente a potência, a economia e a emissão de poluentes do motor.

Para que o sistema funcione a contento, os furos capilares ao longo do tubo emulsionador devem estar posicionados para que formem a emulsão mais homogênea e estável possível. Para tanto, o diâmetro destes furos é calibrado pensando-se no diâmetro ideal de bolhas de ar, e sua distribuição é tal que as bolhas não se concentrem, e que as formadas pelos furos mais baixos interfiram o mínimo possível com as que se formam nos furos de cima.


Portanto, cada furo do tubo emulsionador tem um diâmetro, uma altura e uma posição radial muito bem determinados. A especificação do desenho do tubo emulsionador é, portanto, o resultado de intenso refinamento da peça através de estudos, simulações e testes práticos em bancada.

Até aqui discutimos aspectos de funcionamento estático do sistema de emulsão, porém há um importante efeito dinâmico associado a ele.

Quando o motorista vem andando com baixa carga, a pressão estática dentro do poço de emulsão é baixa. Se neste estado o motorista pisar rapidamente no acelerador, o fluxo de ar através do venturi aumentará rapidamente, diminuindo rapidamente a pressão estática no poço de emulsão. No entanto, por inércia e por resistências dentro do tubo, a coluna de combustível dentro do tubo de emulsão não desce tão rapidamente, limitando o aumento de aeração do combustível e enriquecendo momentaneamente a mistura.

Se, ao contrário, o motorista desacelera rapidamente a partir de alta carga, pelos mesmos motivos, o nível de combustível demora a subir, aerando violentamente o combustível e empobrecendo a mistura. É o caso da troca de marchas.

Esta é uma característica desejável pelo motor. Porém, para atender às necessidades dele, este atraso deve ser incrementado ao ponto ideal. Para tanto, alguns tubos de emulsão possuem uma extensão inferior maior, além do furo mais baixo, para incrementar os efeitos inerciais da coluna de combustível, enquanto outros usam um restritor inferior para isto, e um terceiro tipo de tubo tira proveito das duas possibilidades.

Além de toda esta versatilidade, o sistema de emulsão é menos sensível às variações de altitude que outros dispositivos, se ressente menos da variação das propriedades do combustível com a variação de sua temperatura, e é simples e barato de ser construído.

Tudo isto contribuiu para que outros fabricantes licenciassem as patentes da Solex, ou criassem alternativas que contornassem os direitos de patente originais. Todo tipo de variação possível foi tentado, incluindo misturá-lo com sistemas mais antigos.

No final, a idéia do sistema de emulsão puro era tão superior, que ela se estabeleceu como norma entre carburadores de todos os portes.

AAD

nota: Texto originalmente produzido para o fórum Car & Audio Brasil, e aqui reproduzido na íntegra.

Há cerca de dois meses todos ouviram falar do Fiesta 100, o pequeno Ford que é fonte diária de diversão deste que vos escreve. Um carrinho divertido, econômico e ágil, excelente para encarar diariamente o trânsito de uma cidade como São Paulo.

Ao chegar em casa ontem estacionei o Fiesta 100 em sua vaga habitual (sim, ele dorme na rua, por falta de garagem) e logo percebi que ele parecia estar bem maior: à sua frente havia um Daihatsu Cuore, um kei-car japonês que foi importado em pequenas quantidades na década de 90.

Não resisti e tirei duas fotos, para que todos pudessem ver a diferença entre um carro pequeno e um carro realmente pequeno. Fui até o meu apartamento pensando se seria possível sentir algum entusiasmo dirigindo aquele "carro anão". Olhei-o novamente da sacada e resolvi tirar mais uma foto:

Depois de uma procura rápida no Google surgem os dados: o carro pesa apenas 580 kg, movido por um motor de 847 cm³ capaz de gerar 44 cavalos-vapor. Pode parecer pouco, mas uma continha rápida logo mostra que a relação peso potência fica em torno de 13,2 kg/cv, um pouco melhor que a do Fiesta 100 (15,1 kg/cv).

No Japão a cilindrada é limitada em 660 cm³ e muitos kei-cars são dotados de cabeçotes multiválvulas e sobrealimentação, ainda que a potência máxima seja limitada a 63 hp.(63,8 cv, o que já garante certa diversão). Aí começam os devaneios típicos de quem não tomou a medicação prescrita: como ficaria uma coisinha de 580 kg com aproximadamente 75 cv? Ou mesmo 100 cv?

De fato, mente vazia é oficina do diabo. Descobri hoje que o Daihatsu é de um vizinho, espero que ele NÃO simpatize com a ideia de dar uma voltinha nesse carro de Lilliput. As consequências podem ser catastróficas...

FB




Nesta semana, aqui na Suécia, começou a temporada de caça ao alce. Tem muita gente nas matas tentando matar um, sem matar outra pessoa.


Um alce é um animal grande como um cavalo, ou maior ainda. Vivem selvagens na mata. Mas não pode haver muitos, pois são um perigo quando atravessam as estradas, e outros problemas. No trânsito, ele não entende nada e não tem medo de nada. Ele pode até achar que um trem não é perigoso para ele.

Onde tem bastante alces, normalmente tem esse tipo de placa:
Então, cada país tem seus perigos. Brasil tem ladrões e cobras. Suécia tem alces e lourinhas. Como esse é um blog sobre carros, vamos falar sobre esses animais, os alces.

Como um alce pode ter algo a ver com o desenvolvimento de carros? - pode-se perguntar.

Tem sim. Aqui na Suécia, com 9 milhões de habitantes e não se sabe quantos alces, acontecem uns 5.000 acidentes com alces por ano, cento e poucos com invalidez aos ocupantes dos carros, e cerca de 10 ou mais mortes.

No Canadá dever haver mais.

A primeira influência do alce no desenvolvimento dos carros é a seguinte: não há lei de regulamentação sobre esse tipo de impacto na estrutura de um carro, mas os engenheiros na Saab e Volvo sabem o que pode acontecer.

Seguindo isso, tem um teste para verificar como o carro pode resistir um impacto de 350 kg no nível do teto, andando entre 70 e 90 km/h. O impacto é imenso.

Lembro de um acidente com um Renault 5, carro pequeno e barato. Quatro pessoas dentro, todos morreram. O carro ficou totalmente sem teto. Se o carro tem pára-brisas grande e teto fraco, você pode ter um visitante dentro do carro que pode matar você só com um coice.

Até hoje a maioria dos carros importados tem problema de “sobreviver”a esse tipo de acidente. Mas as marcas nacionais normalmente tem resultados melhores, pois se faz simulações pelo método de elementos finitos (FEM) do impacto do alce, como se faz em todos os outros impactos normais.


A segunda influência do alce é o ESP (electronic stability program). Lembram do primeiro Mercedes-Benz Classe A lançado há mais de 10 anos? Uma revista aqui fez uma manobra com o carro, simulando uma mudança de faixa bem rápido, como ao desviar de um alce entrando na frente do carro de repente, como fazem com todos os carros que são avaliados pela revista, só que o Classe A capotou.

Começou uma urgência imensa em Stuttgart. Primeiro a Mercedes disse que o jornalista estava louco em dirigir assim, mas depois de pouco tempo entenderam que o carro era ruim mesmo. Rapidamente mudaram os pneus para um tipo mais baixo e rígido. E, mais importante, todos Classe-A adotaram o ESP.

Hoje em 2009, 99% dos carros novos vendidos aqui na Suécia têm ESP. E se algum modelo vem para cá sem ESP, é muito criticado nas revistas, e normalmente dentro de pouco tempo os carros deste modelo com destino Suécia vem com ESP. Claro que estradas lisas escorregadias no inverno influenciam isso, mas o alce também é importante..

Pode-se perguntar por que não há cercas ao lado de todas as estradas para evitar que os alces atravessem.


Existem cercas sim, a ilustração acima não é só brincadeira. Abaixo uma foto com pegadas dos alces.


Mas não há cercas em todos os lugares, apenas nos mais frequentados e perigosos. Mas mesmo onde tem, não é totalmente seguro. A cerca tem uns 2 metros de altura, bastante alta. Ainda assim, às vezes se encontra um alce na estrada. Um susto. Normalmente no escuro, e frio. Sai vapor da boca dele. Com sorte, você enxerga a tempo de parar.

Uma vez vi essa cena. Alce grande com chifres, querendo sair da estrada. Ele pulou, e conseguiu passar por cima da cerca. As patas traseiras amassaram a cerca bastante, o alce correu para a mata.
Tem que ter sorte e um carro com faróis e freios bons, um bom chassis e estrutura forte.

Aqui os alces desenham os carros.

HJ


Não sei se aconteceu já com vocês, mas às vezes ler sobre carros me deprime.

Ler sobre viagens exóticas em superesportivos, sobre novos Ferraris e velhos Porsches, sobre os grandes ícones do mundo automotivo, toda esta orgia de prazer, alumínio e comandos múltiplos, era uma coisa muito boa na adolescência. Nesta época, tudo é possível e o futuro é um livro com as páginas em branco que podemos escrever na maneira que quisermos. “Um Homem quando sonha é Deus, quando pondera é um mendigo”.

Mas chega uma hora na vida de todo mundo em que se percebe que, muito provavelmente, não teremos aquela garagem de 20 Porsches diversos. Afinal de contas, não é todo mundo que nasceu para ser o Ferdinand Piëch, ou mesmo ser desonesto o suficiente para se tornar deputado ou senador no Brasil... Não, o fato é que a maioria de nós não tem condições de comprar um Porschezinho sequer. A classe média deste país, principalmente, é ocupada demais sustentando os governantes e suas cortes para gastar dinheiro consigo mesma.

E como ficamos então, nós, os sem-Porsche? Estaremos fadados a uma vida insignificante e xexelenta? Seremos privados nós de todos os prazeres automotivos e relegados à privada da mobilidade? Se não ousamos mais sonhar, seremos então mendigos?

É claro que não. Existem pessoas como o AG que podem criar coisas tão legais como um Opaloito, pelo preço de um carro pequeno zero-km. Um Opaloito 350-cid de 300 cv pode não ser algo para todo mundo, e passa longe de ser controlável como um carro esporte moderno, mas é uma coisa que dá o sabor do poder supremo para quem não é milionário. Se você, como eu, tem um lugar guardado no peito para o Opala, ainda é possível, com paciência e dedicação, fazer um carro divertidíssimo. Dou o exemplo do Morcego Negro, sobre o qual já falamos aqui: um carro de aproximadamente 180 cv e pesando 1.150 kg em ordem de marcha, e que custou apenas 18 mil reais para se fazer, com todos os parafusinhos e presilhinhas e parafusetas inclusas neste valor. E tão belo e malvado que murcha as flores a sua passagem, espanta cachorrinhos, e manda crianças correndo para a saia de suas respectivas mamães!

Para quem não pode ou não quer ter mais de um carro, e/ou prefere algo moderno, existem várias opções. Um Peugeot 206 1.6 16V é algo incrivelmente veloz, estável, e é uma delícia para dirigir. O Ford Focus de primeira geração também é ótimo, principalmente com o genial Duratec, e já o defini como o meu Santo Graal pessoal. O Arnaldo Keller já nos contou aqui como adorou o Clio 1.0. Todos estes carros são realmente ótimos para dirigir, e no mundo em que vivemos, cheio de radares e multas, são muito mais do que suficientes. E com preços baixíssimos no mercado de usados.

Mas é claro que, para ter prazer com estes carros, você tem que se desprender da vaidade pessoal, e isto é muito difícil. Mas se você gosta de carro e não tem dinheiro, vai ter que fazer alguns ajustes. Eu consegui me livrar disto faz muito tempo, e sou mais feliz assim. Lembre-se sempre que um carro deve satisfazer a você, e não seus amigos, vizinhos e cunhados. Afinal, quem pagou por ele foi você, e quem tem que viver com ele é você... Meio como sua esposa ou namorada: é melhor o pessoal não saber como ela é entre quatro paredes; pode despertar um interesse desnecessário.

Existem também os importados com mais de 10 anos. A lista é tentadora, e vai de BMW’s série 5 e Audi S6 até Lexus e Mitsubishis. Eu mesmo, acho que todos já sabem, desde ano passado ando com um velho Nissan do ano de 1995, que é muito feio (e uma banheira imensa), mas tem um delicioso V-6 de alumínio que pensa que é um Ferrari. É a primeira aparição, no primeiro ano, do V-6 “VQ” da Nissan, um motor moderno que ainda hoje é usado em vários carros da empresa, inclusive no 370Z e no GT-R. Além disso, a traquitana tem câmbio manual (raro), ar condicionado que funciona bem, bancos em couro cinza, som original bem razoável, freios a disco nas quatro rodas com ABS, e um gigantesco filtro K&N na admissão. Paguei apenas 8 mil reais nele, e no total, hoje, com um ano de uso e vários consertos, me custou coisa de 11 mil reais, preço de compra incluso. Isto para um carro que, segundo a Car and Driver americana, é capaz de fazer 0-60 mph (96,5 km/h) em 6,5 segundos.




Mas não é um caminho que aconselho. Eu preciso de um carro para andar todo dia (quem não precisa neste país?), e ando realmente com as finanças apertadas, portanto não há um dia que passe que não imagine o que pode acontecer se algo realmente sério acontecer com esse exótico motor, por exemplo. Mecânicos que sabem mexer nele são raros, e eu agora tento fazer tudo que posso eu mesmo. Achar peças é sempre estressante: nunca fiquei com ele muito tempo em oficina esperando peça, mas uma hora destas... Vai acontecer, é uma questão de tempo.

Carro velho para uso diário é possível, mas não agradável. Toda hora a jaca resolve fazer um barulho novo, e de novo minha gastrite ataca com a possibilidade de mais gastos inesperados. Tudo que apareceu até agora foi fácil de resolver, mas sempre tenho que fazer algo. Quando se resolve uma coisa, aparece outra, uma chateação. Bom mesmo é um carro novo e confiável feito o Focus de minha esposa...

Mas o danado do Nissan é uma delícia de acelerar. E para não acharem que sou parcial, deixo alguns amigos que já o dirigiram contarem o que acham dele, e assim dar uma perspectiva real para vocês do que é se aventurar por este caminho de pouco dinheiro, perturbações constantes, mas prazeres intensos. Divirtam-se:





Juvenal Jorge

O MAO me entregou as chaves da banheira japonesa, mais respeitosamente conhecida como Cruzador Imperial Yamato. De fato, é um carro nada bonito, realçado por uma cor azul – cinza – preto indefinível, e rodas de aço pretas de impacto visual positivo nulo. Ou seja, com essa roda ou sem nenhuma, a beleza é a mesma.

Mas aí ligamos o transversal lá na frente, 3 litros funfantes e aspirantes através de um K&N espertamente montado para melhorar o que as fábricas fazem de mal-feito, que é matar ao máximo o ruído de aspiração de ar, que é algo divino de ser ouvido. Mas fazer o que, o povão prefere ouvir o rádio, não é mesmo?

Engatamos a primeira em uma alavanca curta mas que não requer muito esforço, os engates são bons, e aceleramos. Como saio bem devagar, não impressiona, mas depois de uns minutos para ajustar minhas partes móveis ao carro, uma acelerada mais forte faz o pescoço trabalhar para segurar a cabeça sobre ele.

O japonês é disposto mesmo, apesar dos 14 anos de uso e aparentemente, nenhum excessivo zelo, apenas um pouco de cuidados, refletidos no bom estado geral do carro.

Freia bem, como acelera, o que dá um conjunto bacana, e não chacoalha muito não, tem um conforto sobre pisos ruins bem apreciável.

Como o ponto aqui não é uma avaliação completa, coloco apenas mais um detalhe que não me agrada, e que era característica desse Maxima e do Accord de mesmo ano. Ambos são muito baixos para nossas valetas e lombadas, raspando fácil. E isso me desagrada brutalmente em qualquer carro.

Só que aí o problema não é o carro, são as ruas.

JJ





Rafael Tedesco

(o RT, que deve seu codinome a um certo Charger eternamente em reforma (além suas iniciais, é claro), é um grande amigo deste Blog, mas ainda não conseguiu contribuir. Espero que, depois desta pequena “participação especial”, ele se anime!)

O motor urra furioso pela admissão, que assusta motorista, passageiros e pedestres. O K&N aspira tanto ar, mas tanto ar, que certa vez aspirou um inocente Ford Ka numa acelerada de saída de semáforo. O Ka foi cuspido pelo escapamento um pouco chamuscado, mas sem maiores danos.

Piadas a parte, o motor vale o passeio. O Maxima em geral é um velho jap-car, com suas características um tanto pobres da época: controles do ar condicionado horizontal, tamanho minúsculo dos botões do radio, posição péssima de dirigir (desenhado para japoneses de pernas curtas e braços longos, sem ajuste telescópico na coluna de direção), enfim, tem tudo o que você precisa, e nada alem disso, e nada surpreende. Exceto o motor, incompatível para o jeitão do carro, tem muito mais motor do que você espera num banheirão desses.

Marchas longas, e fortes. Esticar a segunda dentro de SP, mesmo numa avenida larga, é um tanto perigoso (120 km/h ou mais), e faz o motorista borrar o fraldão geriátrico ao engatar terceira e sentir que o carro continua acelerando como se não houvesse amanhã. Não engatei 4a ou 5a, o fraldão já estava no limite para mais abusos.

RT




Bill Egan

Poucos carros nessa vida nos fazem pensar duas vezes quando experimentados pelo assento do banco do passageiro. Ainda mais quando você, no dia de ir buscar o carro na casa de seu antigo dono, se prepara para um treasure hunt daqueles, com pás, galochas, e capacete de minerador. Pelo preço, o estado do carro prometia muito menos. Knee deep in mud, to be precise.

Andei na banheira no dia da descoberta, e entendi o porquê de certos círculos adorarem o velho VQ. Heck, até a minha mulher falou que pagaria o preço do velhinho se o MAO não fechasse na hora. Na semana seguinte, pude provar ao velho Marco o que constatei no dia da busca, que o banco do carona anda mais rápido, como se dois cronômetros ligados ao mesmo tempo, um na mão do motorista, e o outro no passageiro, depois de algumas quadras, registrassem coisa de minutos de diferença. Power corrupts, and I´m very corruptible.

Mas um motor só não faz um carro, e o velho Maxima segue a velha máxima de que nem tudo é perfeito. Anexo àquele V6 DOHC que jura que noutra encarnação esteve atrás dos bancos de um Dino 246, há uma triste imagem de um japonês velho e cansado. Sim, inteiro, saudável, limpo por dentro (anos de soja e peixe cru, sabem como é...), mas já marcado pela idade no lado de fora. E a questão nem é só a imagem, é o volante ruim, sem regulagem de profundidade, que só dá algum feedback quando é pra dizer que tá difícil de conseguir tração, a alavanca de marchas pesada, e o fato de ser um soul-less bastard. Mas acho que isso faz parte da mágica. MAO, me dê as chaves dele por um mês. Eu quero ver se encontro alguma alma ainda naquele velho corpo ligado naquele forte coração. Maxima´s a bitch, and I wanna spank her.

BE




Paulo Keller

Nos bastidores do blog falamos muito sobre a falta de alma dos carros "lava-louças" feitos pelos japas. É claro que existem muitas exceções como Supra, Honda NSX, Subaru Impreza, Mitsubishi 3000GT, Nissan Z, Mazda Miata e muitos outros. Esses aí tem alguma alma, mas no geral os japas não são desejáveis pela emoção e sim pela razão. Mas como nosso entusiasmo não é racional acabamos preferindo algo mais carnal e com muitas polegadas cúbicas.

O MAO levantou um ponto muito importante sobre como podemos sobreviver nesse mundo, cheio de desejos, a maioria inatingíveis, e encontrarmos felicidade mesmo nas pequenas coisas. Nesse ponto, de certa forma, eu "invejo" o MAO e outros autoentusiastas que conseguem esse tipo de realização. Eu ainda não passei do campo dos sonhos, mas logo terei o meu Charger.

Outro dia fiz uma visita ao MAO inicialmente para avaliarmos um Opaloito a 8 mãos. Mas infelizmente acabou não dando certo. Então o MAO gentilmente me convidou para experimentar "a" Maxima (como ele gosta de chamá-la). Ele usa esse japa todos os dias e deve sentir um imenso prazer ao transitar com a "barca" com todo seu desprendimento e uma sensação de superioridade incompreendida por quem o observa de cima de seus SUVs coreanos pagos a prestação que tentam nos dizer que são bem sucedidos. É, um cara que dirige um V6 noventa e pouco, que custou 8 mil reais e se sente muito bem fazendo isso é de fato superior aos que acham que possuir um carro é uma demonstração de status. Na verdade ele queria dividir comigo esse prazer entusiasta.

É claro que aceitei de pronto! Ao entrarmos no carro ele me falou o ano, o motor, a potência, os dados de performance e mais um monte de coisas. Como eu estava relaxado e descontraído me dediquei mais a experiência de dirigir o Máxima. Esqueci quase tudo que ele me falou e registrei apenas o necessário. Motor V-6, tração dianteira, uns 15 anos de uso, bom estado, excelente performance e 8 mil reais.

Logo ao sairmos reparei no ruído do motor. Achei estranho por ser diferente, incompatível com minha expectativa, mas gostei. O MAO logo explicou que se tratava de um "Cayenne". Vocês sabem que não dá pra entender de todos os assuntos. Então fiquei na minha pensando no que a Porsche teria a ver com esse barulho. Andamos mais um pouco e na conversa entendi que se tratava do filtro de ar, daqueles utilizados pelos "tuneiros". Legal, menos restrição igual a uns cavalinhos a mais.

Pegamos um avenidão e deu para habilitar o "modo binário" de direção. Ou seja, pé direito atuando em apenas duas posições, aceleração máxima ou marcha-lenta. Com uma excelente caixa manual, as passagens de primeira para segunda e segunda para terceira e eventualmente para quarta foram muito divertidas e rápidas. O V-6 fala forte e é muito elástico. Me fez pensar em fazer um comparativo meio maluco, tipo aqueles que o Top Gear adora, desse Maxima com um BMW, ou até um 911 mais antigo. A idéia seria mostrar como um "carro lava-louças" pode ser tão divertido, ou mais, que outros carros mais desejáveis. Logo entendi o entusiasmo que o MAO transmite a falar do Maxima.

Isso prova uma outra teoria que discutimos muito em nosso grupo e que embora não chegamos a um consenso entre todos eu estou do lado daqueles que acreditam nela. Carros tem alma, mas essa alma pode ser mais ou menos entusiasta dependendo do seu dono. No caso do Maxima do MAO, além de alma, tem até personalidade.

PK