
Outro dia fui colocar um som no Corcel 77.
Eu tinha guardado no armário um rádio/toca-fitas Aiko da mesma época do carro, então, era esse pra combinar e relembrar de quando este mesmo rádio tocava no meu Fuscão 74 que eu tirara zero-km.
E lá fui eu à oficina de som.
Lá chegando, os instaladores deram uma torcida de nariz e me questionaram porque raios eu ia botar aquela tranqueira que só dava problemas, tinha som meio ruim e etc. e tal, enquanto que por 200 reais eu poderia colocar um rádio novinho, com um baita som e que tinha uma entrada USB. Com essa entrada eu poderia engatar meu pen-drive cheio de músicas que minha filha grava pra mim e usufruir de todas as facilidades que essa tecnologia permite, e eu nunca teria problemas.
Pensei, “Pombas! Até que não é caro esse rádio aí. Até que os caras têm razão.” É claro que eles tinham razão!, só que o Corcel é um caso específico, romântico, e botei aquela porcaria de Aiko velho mesmo.
E aí passei a comparar meu Aiko aos automóveis. O Aiko seria o paralelo dos carros a combustão e o rádio-pen-drive seria os carros elétricos que estão chegando. O Aiko, em 1974, custou caro. Foi uma grana.
E o safado de vez em quando engolia as fitas e eu, prevenido, já levava uma caneta Bic no portaluvas para reenrolá-las. E toca a tirar o cassete do rádio com um tremendo cuidado pra não rasgar a fita, e toca a sair um monte de fita mascada lá de dentro e toca a ficar fulo da vida porque a melhor parte da música, aquele solo bom de guitarra, ficara engruvinhado num rrulump, rrulump, e toca a ficar chateado com isso. E depois era aquela fita comprida esvoaçando pelo carro, minhas pernas segurando o volante, uma mão na caixinha cassete e outra na caneta, era mão que largava a caneta pra trocar as marchas, e toca a enrolar direitinho a fita para ela não virar de costas pra cabeça de leitura do som, e toca a exercer uma técnica exata em meio ao caos do trânsito. Em suma, era aquele rolo.
E daí era ter um araminho com algodãozinho enrolado na ponta, este devidamente untado com álcool ou acetona que pegara na gaveta dos utensílios de beleza da mamãe, e abrir a gavetinha do toca-fitas e limpar aquela cabeça imunda que lia a fita. E uns diziam que álcool não podia e outros que acetona não podia, e eu nem aí; que se danasse essa joça, que aguentasse.
E daí o filho-da-mãe do toca-fitas começava a patinar, e toca a levá-lo para o conserto pro camarada trocar uma correinha encardida que tinha afrouxado, uma catraquinha que perdera os dentes, uma molinha que ficara mole e etc., etc. e tal.
E para gravarmos as músicas! Uma trabalheira de horas, um equipamento bom e caro em casa, técnicas e mais técnicas para gravar a música entrando na hora certa, sem que a fita começasse com o som da agulha... rrriip, rrriip... na parte não gravada do LP.
E para achar justo a música que queríamos no momento? Era um exercício de noção de timing, calculando o quanto aquela fita estava correndo no Fast Foward ou Rewind.
Era um tal de ir apertando botão pra cá e outro botão pra lá a caminho da casa da namorada, para que quando saíssemos com o carro, com a namoradinha sentadinha ao lado, logo a fita começasse com aquela música que ela gostava tanto, já pra ir amolecendo o coração da gatinha.
Com o rádio-pen-drive fica tudo infinitamente mais fácil, confiável e barato. Ou não?
Daí que prevejo que em breve o mesmo acontecerá com os automóveis. Com a entrada dos elétricos puros -- nada de híbridos, que é só uma etapa complicada e passageira -- eles baratearão, nos darão menos problemas (os a combustão já dão poucos problemas em relação ao passado, convenhamos) terão um custo de manutenção comparativamente bem menor, etc., etc.
Portanto, a conclusão é que será uma revolução como foi a que Henry Ford fez ao lançar o seu Ford T. Era barato, simples de manejar e confiável, e isso popularizou o automóvel, que antes dele era um capricho de ricos.
E então? Onde é que poremos mais essa tantada de carros que estarão ao alcance de mais tanta gente? Carros ainda mais baratos, mais fáceis de dirigirmos, mais confiáveis e duradouros?
Sei lá. Me diga você.
É por isso que estou perguntando, uai.
Nota do PK:
Existe no mercado um pen drive que vem numa embalagem no formato de uma fita cassete antiga. Realmente era muito legal passar algumas horas fazendo gravações caprichadas com a melhor seleção da época escrevendo o nome das músicas a mão na capinha para depois presentear a namorada ou o melhor amigo.
Saiba mais: MIXTAPE 