Um bicho baixo e largo, com um estilo longe dos carros comuns. Com um preço bem alto, lá no céu. As portas abertas apontam também para o céu. Como num Spyker.

Nunca vi um de perto antes e isso não é tão estranho. São apenas uns 30 a 40 produzidos cada ano desde 2000.
Mas agora está na minha frente, um Spyker de verdade.
Em alguns ângulos que eu vi o carro antes, em fotos, achei-o um pouco estranho, mas agora ao vivo andando uma volta a pé em torno dele, melhor. Ainda tudo muito doido com cinco entradas de ar feitas de alumínio, ou melhor, sem cor, visto que o carro inteiro é de alumínio.
Agora, a chave está comigo. Estou brincando não. Não comprei, mas posso pegar emprestado por algumas horas.
Ah, a chave... chave não é. É um disco de alumínio com quatro botões e um vidro no outro lado, por onde pode se ver o transponder. A chave normal já está no carro, no porta luvas. Não se precisa operar e tirar toda vez, só se você quer ter uma segurança melhor.
Então, abre-se a porta apontando ela para o céu, e pensa-se um pouco como se faz para entrar nele.
Os tanques de gasolina ficam embaixo das portas. Bunda primeiro, sim, tem que ser assim. E depois entrar com as pernas, ok, funcionou bem.
A cabine não é muito grande, mas mesmo com 1,80 m não tive problema para achar uma posição boa. O banco é bem esportivo com um conforto aceitável, até bom. O ajuste da inclinação das costas é elétrico, porque não há espaço para um comando manual para fazer isso. O ajuste longitudinal é manual. O volante tem ajuste de ângulo apenas. A visão dos instrumentos é muito boa, só que a cor é branca, e os mostradores digitais e as marcações são feitas apenas para serem bonitas, e não para melhor visibilidade.
O estilo do painel em geral provoca risos e opiniões variadas de cada pessoa que o vê. Algumas pessoas acham o painel esquisito e feio. Outras acham o painel totalmente maravilhoso. De uma forma ou outra, em 2010 o Spyker deve ser o único carro do mundo com painel de alumínio com acabamento virolado, brilhante.
Mas agora quero escutar o V-8 lá atrás. Tem uma tecla principal no painel que se coloca para cima e em baixo dela um outro botão para apertar.
Agora !
O motor tem um som bastante grave, som de V-8 mesmo. Não como algo americano velho, mais como um Audi RS4 com escape aberto. Nada estranho, visto que o motor é realmente um Audi.
É um S4 com modificações da Spyker para se obter 400 cv. Pode ser que a minha cabeça esteja meio ruim, mas eu pensei na hora: “só” 400… ok, 400 não é pouco. Só que hoje, em 2010, existem muitos carros com mais de 500.
Conversando com algumas pessoas da Spyker, depois, dá para entender que daqui a algum tempo vão aparecer mais deles… Bom, agora, vamos pela estrada, porque afinal de contas com 400 dá para brincar bastante, sem problema.
Tem que fechar a porta primeiro e isso se faz melhor com o cotovelo. Parece estranho mas funciona bem.
A embreagem é um pouco dura mas sem problema para controlar ou usar rápido. Um motivo para isso é que o motor fica muito baixo e não tem espaço para uma embreagem com diâmetro normal, então Spyker utiliza outra com diâmetro menor, mas com três discos.
Agora estamos andando. Na cidade a visibilidade para frente e para cima sofre bastante com o adesivo “Spyker” no para-brisa. Seria melhor tirar esse treco. Ver os semáforos é difícil, sorte que o teto é de plástico transparente. Fora este problema de fácil solução, a visibilidade é boa para um carro tão esportivo. Dar marcha à ré e olhar para trás é algo factível, coisa que não consegui fazer no Pagani Zonda ou no Lamborghini Murciélago.
É melhor sair da cidade.
Na estrada o Spyker é um grande divertimento. A aceleração é forte. Trocar marchas é fácil, a alavanca de câmbio parece estranha, mas funciona bem. A direção e bastante direta e gostosa. O chassi é bem calibrado para dirigir rápido e de modo esportivo nas estradas, e é duro de suspensão, mas não tão duro de modo que qualquer coisa no asfalto bata forte.

Nas estradas com muitas curvas eu me divirto pacas, a única coisa que se pode perturbar um pouco é que tem um pouquinho de
bump steer, mas só se a estrada não é plana. Fora isso o Spyker é divertimento puro, eu poderia andar assim o dia inteiro, muito bacana.
Se o carro é barulhento? É. Bastante. Acho que só andei em dois carros “normais” que fazem mais barulho. Acelerando forte num Koenigsegg é uma sinfonia de gritos e barulhos. E o V-10 de um Lamborghini Gallardo às vezes atinge freqências onde o ruído é meio desagradável e alto. Mas estou reclamando? Não. No Spyker vem barulho de toda parte, um pouco do vento, um pouco das rodas, e uma parte do motor, e nenhuma destas partes é muito mais alta de que a outra.
No painel, meio escondido, tem um botão para o som do motor. Andando na estrada com 100 km/h sem acelerar se escuta um pouco de barulho V-8 do motor. Aperte o botão e o motor fica quase de todo silencioso. O escapamento tem válvulas que direcionam os gases de escape, ao toque deste botão, para um silenciador maior. Mas eu andei o tempo todo com o botão no modo barulhento, porque o som é muito bonito.
Desta versão LM85 foram feitas 24 unidades. LM vem de Le Mans, 85 é o número do carro que Spyker tem na corrida, e 24 unidades porque a corrida tem 24 horas. Parece que ainda existem dois deles à venda.
As diferenças em relação a um Laviolette normal são principalmente cosméticas. A única diferença técnica é nos freios, o LM85 tem freios AP com pinças de seis pistões na frente. Nas estradas normais não se sente diferença, mas devem ser muito úteis para um dia numa pista.
Eu conversei com o pessoal da Spyker sobre a corrida de Le Mans. A equipe vem melhorando ano a ano, e em 2009 chegaram em vigésimo quinto lugar (com quatro Ferrari 430 na frente, cinco atrás).
Interessante foi a relação com a Audi na prova. Quando a Spyker disse para a Audi que ia correr em Le Mans, ela respondeu: “Com aquele motor? O nosso motor não é feito para competição! Por exemplo, o virabrequim não é plano, os cabeçotes tem 40 válvulas… não é para corrida.”
A Spyker ficou preocupada, porque na classe GT o carro tem que ser o homologado, derivado do de rua. A empresa então conversou com a FIA, a Ferrari, a Porsche, e no final teve permissão de mudar algumas coisas do motor. E é por isso que o carro para a pista grita, e o carro de rua tem um som mais grave: o de corrida tem virabrequim plano.
Depois de dirigir, fiquei pensando: Quem compra um Spyker?
Um Gallardo ou um 458 são mais baratos, tem mais potência, e apesar de não serem mais fáceis de usar todo dia, o Gallardo se pode usar até na neve sem problema.
Ok, o Spyker é mais caro, mas para alguém que tem o dinheiro parece que isso não importa tanto.
Sobre a potência menor, em qualquer estrada 400 cv são mais que suficientes, com 0-100 abaixo de 5 segundos e velocidade máxima de 300 km/h. O carro definitivamente não é nada de vagaroso, nada.
É só na pista tentando baixar os tempos, ou no bar contando histórias, que uns 500 e pouco seria bom ter.
Humm, então, um Spyker se compra porque você gosta do estilo ou você quer algo diferente e raro.
Nos bairros mais chiques, Gallardos são até comuns. É a conseqüência de produzir 1.000 por ano e não só 30. E, na verdade, as pessoas que compram um Spyker já têm ou já tiveram algum carro italiano deste tipo nas suas garagens.
De qualquer forma, o Spyker é um brinquedo divertido. Já estou com saudades das horas que passei com ele.
HJ