"Os leitores mais atentos devem ter observado algumas histórias recentes nos jornais e revistas. Sim, a saga da Toyota continua. A mídia e conseqüentemente o público parecem estar histéricos com relação ao debacle provocado pelos recalls da Toyota, que têm dominado as manchetes. Mas recalls têm ocorrido o tempo todo ao longo dos anos. Realmente, se os alarmistas juntassem o número de recalls da Ford (acima de 14 milhões, catastróficos) e os da Ford e da GM ao longo dos anos, perceberiam que a Toyota não se encontraria num mero segundo ou terceiro lugar, mas sim no sexto lugar no ranking geral. Será que um pedal que trava acelerando ou um tapete que trava o pedal do acelerador seria capaz de gerar uma manchete mais emocionante do que uma anunciando risco de incêndio? Aparentemente, sim. E até mais. Eu não estou querendo minimizar a questão que envolve a Toyota, que sem dúvida é um sério problema de segurança, mas já tivemos coisas piores. Será que é a associação com o nome Toyota que está causando tanta polêmica? A velha e boa Toyota. Um nome sério no qual os consumidores podem confiar. Carros para muitos consumidores, sem loucuras, sem egos exacerbados, sem opiniões desencontradas de estilo, simplesmente bons, bem-projetados e impecavelmente engenheirados e manufaturados. Não pense em automóvel, mas voce deseja algo decente e confiável? Compre um Toyota. Eles não dão problemas. Para muitos proprietários de Toyota, o problema de segurança em seus meios de transporte transformou seu anônimo carteiro num serial killer. Bem, o que pode ser feito? Claramente a Toyota está fazendo todo o possível para sanar o problema. Contudo, o altíssimo custo com que vem arcando por isso e o inestimável desgaste para a imagem de sua marca num curto período, demandará muito tempo para ser recuperado. Além disso, há um sentimento geral de traição (até mesmo a postura de reverência típica dos japoneses, tomada por Akio Toyoda, pedindo desculpas, tem sido criticada). Para que tudo isso seja esquecido, algo muito maior deverá ser feito. Talvez com maiores investimentos em procedimentos e instalações de testes para atender ao (até recente) crescimento de demanda? Talvez um acordo pró-ativo com o NHTSA, com esforços e sem rancores, para eliminar as preocupações com segurança? Ao mesmo tempo, um sem número de motoristas inescrupulosos, que têm nitidamente se envolvido em acidentes relacionados com o excesso de velocidade dirigindo Toyotas, encontram não somente uma desculpa, mas também um pretexto para culpar a rica Toyota. Tal comportamento é inadmissível, uma vez que somente poucso realmente sofreram danos em decorrência de falhas de engenharia. As únicas vantagens em tudo isto são o aumento de do interesse do público na qualidade e durabilidade dos veículos e um critério mais apurado na escolha de fornecedores de peças e componentes por parte dos fabricantes. Não devemos nos esquecer que a Toyota, na realidade, não fabrica os tapetes e os pedais de aceleradores em questão, mas admitidamente deve adotar procedimentos de testes mais rígidos para aprovação de peças e componentes, a fim de não estar mais presente em futuras manchetes desabonadoras. Dá mesma forma deverão proceder os demais fabricantes, pois mediante os interesses de público e mídia,a alguém mais poderá estar sob os refletores num futuro bem próximo."
Tudo que está escrito acima é tradução da nota do editor Adam Gavine, impresso na edição de março de 2010 da revista Automotive Testing, uma das mais, senão a mais conceituada revista que trata de assuntos relacionados a testes de desenvolvimento e validação de veículos no mundo.
Esse editorial coincide exatamente com a minha opinião sob vários aspectos. Primeiramente, que se está fazendo uma tempestade num copo d´água, pois já houve recalls muito mais sérios no passado, sem a repercussão destes. E em segundo lugar, porque a Toyota tem grande culpa nesses episódios, pois atirou-se de corpo e alma na missão de se tornar a maior fabricante de veículos do mundo, a custa de reduções de custo e lançamentos a curto prazo, queimando etapas de testes reais, acreditando em testes virtuais como sendo verdades absolutas, sem tomar o devido cuidado com as consequências.
Certamente, testes virtuais foram assumidos como de máxima credibilidade a fim de se ganhar tempo e dinheiro, evitando-se assim a necessidade de construção de mais protótipos. E aí está o resultado.
Há muito tempo me bato na necessidade de testes físicos, não acreditando que somente os testes virtuais são suficientes para se validar uma peça, um componente ou um veículo completo. Hardwares e softwares ajudam a abreviar tempos de projeto, desenvolvimento e validação, mas não os substituem por completo. E mais, devem ser utilizados com muito critério.
Sempre argumentei que se não conseguimos prever fisicamente todas as alternativas de uso de um produto, como podemos sonhar que virtualmente o conseguiremos? Testes físicos são indispensáveis para se validar um produto. Jamais podemos queimar etapas, assumindo riscos absurdos e desnecessários.
Espero que estes fatos sirvam de aprendizado para muitos daqueles big bosses da indústria automobilística que jamais poderiam entender de tudo, como muitas vezes pensam que entendem, para tomarem mais cuidado em suas decisões, não apostando todas as suas fichas em histórias mirabolantes de engenheiros e técnicos que muitas vezes nem experiência suficiente têm para garantir o resultado de seus experimentos milagrosos.
Que aqueles que, como eu, não concordam com essas decisões, carentes de base, gritem mais alto na hora de justificar o dinheiro a ser gasto em determinados testes. Para que desta forma tenhamos realmente veículos mais confiáveis à disposição dos consumidores.
Várias vezes ouvi que deveria assumir riscos para vencer, mas ainda prefiro assumir que automóvel é algo muito sério para ser projetado, desenvolvido, validado e manufaturado, pura e simplesmente através de algoritmos matemáticos. Automóvel é feito para o mundo real. Necessita de realidade para se tornar realidade.