Todos os dias ouço comentários sobre automóveis. A maioria deles é inócua. Não-entusiastas tentam convencer-me de melhores marcas, melhores modelos, melhores compras, melhores conteúdos, melhores manutenções e blá blá blá.
Não entendo por que as pessoas têm a mania nada saudável de tentar tomar decisões por outras. Por que até mesmo quando se fala de automóveis, não-entusiastas querem que entusiastas troquem de opinião por motivos pífios, como uma maior garantia, ou um preço menor de peças de reposição? Isso importa para quem se interessa por carros da forma como nós aqui nos interessamos? Qual a real necessidade de andar com um carregador de gente, quando não se roda mais de 50 km por dia? Será que a diferença no orçamento da família será assim tão notável, se eu andar com um carro desses que se vê em todo lugar, a qualquer hora, sempre nas mesmas cores, e que mal se encontra em um estacionamento quando esquecemos exatamente onde paramos? Será que eu vou economizar bastante dinheiro se eu aceitar uma condução dessas, ditas "populares", mas que na realidade são caríssimas, frente à situação vergonhosa de impostos cobrados de nós, cidadãos com título de eleitor, esse documento que nada muda, não importa em quem votemos?
Tento quase todos os dias entender e aceitar a evolução, o progresso dos automóveis, tratados como um bem no mesmo padrão da geladeira de casa, mas não consigo. Não dá para trocar de carro porque o outro é mais moderno, porque o feirão de fábrica está maravilhoso, porque ganho uma viagem grátis para um lugar que não quero ir, porque ganho um GPS e um jogo de tapetes e um filme nos vidros e o IPVA e o seguro, porque o vizinho vai pensar que eu estou "bem" pois estou de carro novo, porque o cunhado vai olhar o carro novo e dizer que estou "bem de grana".
Não, quando um carro nos serve bem, ele merece ser mantido, mesmo que pequenos custos surjam devido à sua idade. Se esse carro está funcionando bem, me proporcionando satisfação quando o dirijo, mantendo a segurança minha e de minha família, não vejo porque me desfazer desse amigo.
Vimos nas ruas, de vez em quando, pessoas que pensam assim como eu. Genericamente dizemos, "Esse tiozinho tem esse carro desde zero-km, olha só!". E isso impressiona positivamente, até mesmo alguns não-entusiastas.
A situação ideal, para mim, seria se eu pudesse ter mantido todos os carros que comprei ao longo dos mais de 25 anos em que dirijo. Desde aquele primeiro Chevette até hoje. Seria maravilhoso ter todos eles, mas nunca pude fazer algo tão grandioso. Chega a hora, sim, em que não dá mais para ficar com um carro por qualquer motivo, e ele se vai. Deixa saudades sempre, para mim, que entendo o propósito de cada carro, seus defeitos e qualidades, seu objetivo como produto, mas mais anda, como instrumento de diversão e alegria, como um carregador de vontades e de satisfações, cada qual a seu tempo.
Não tentem me convencer do que não acredito. Eu acredito no carro-amigo, aquele que olha para você e diz, "Vamos cara, vamos passear!".
JJ