google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014)

Ferraris sempre são veículos curiosos. Despertam o falso entusiasta, aquele que pouco conhece, mas que dispara a falar de carros como se fossem parte da vida dele, empolgam pessoas que só usam carros para ir ao trabalho ou supermercado, geram frases descabidas, como dizer que Ferrari é o melhor carro do mundo, e mais uma porção de reações interessantes.

Eu sempre tenho minhas restrições com Ferraris de motor central, cheios de eletrônica de bordo e, digamos, "de entrada". A mim parecem mais carros comprados pelos tais falsos entusiastas, pois Ferrari todo mundo conhece e eles não precisam ficar explicando o poder que estão incorporando às suas personalidades ao possuir um carro dessa marca. Mesmo porque a maioria dos compradores não conseguiria explicar nada mesmo, se fosse uma outra marca de supercarro não-popular. Já imaginaram alguém tentando explicar a origem, ou o propósito de um Ultimate Aero, ou de um Porsche Ruf para quem não se liga em carros?

Sei, a maioria não concordará com isso, e despejarão vários contra-argumentos, como os dados técnicos excepcionais, os números de desempenho, a equipe de Fórmula 1, a vida do Comendador Enzo. Mas não me emociona, não me deixa louco para ganhar na Mega-Sena e sair correndo para a loja, não está na minha wish-list, não são prodígios de engenharia automotiva no nível que deveriam, pela celebridade que a marca possui e, pior, pelo preço cobrado.

Desde os 348, depois os 355, 360, 430 e agora esse 458, sempre estiveram em planos inferiores no mundo dos supercarros de minha preferência. São por demais enfeitados e complicados para me atraírem, por demais comuns aqui no Brasil para terem uma imagem de raridade. Antes desses a situação era um pouco melhor, como o 328 do Magnum, aquele investigador que usava bermudinha com cinto. Era um carro mais honesto.

Muda completamente de ótica quando falamos de Ferraris cruas, F40 o maior exemplo. Feito com UM propósito: ser o mais veloz carro de produção do mundo, proporcionando ao piloto sensações de carro de corrida. Este é o maior expoente moderno da marca italiana mais famosa. Um monstro. Sem frescuras, como eu gosto. Bob Sharp dirigiu um, o único que veio ao Brasil, e pode explicar bem o que é conversar com essa máquina histórica.

Os de motor dianteiro, V-12, são ícones reais. Maior de todos: 250 GTO.

Vejam, são carros diversos dos Ferraris comerciais. Esses que são feitos para sustentar a marca, a equipe de Fórmula 1, atendendo os admiradores incondicionais de gadgets eletrônicos, de botõezinhos coloridos no volante, de escapamentos barulhentos para virar cabeças nas ruas da moda (argh !!!), mesmo andando devagar.

Não chegarei a extremos de críticas, nem direi que a marca morreu, longe disso. Mas que a maior parte do que a Ferrari fabrica hoje é passável, disso não tenho dúvida.

E esse novo Italia....bonitinho, deve ser uma bela arma. Vai mostrar acelerações dignas da Enterprise do Capitão Kirk, fará curvas de estirar músculos de pescoço dos mais enferrujados, freiará de maneira e extrair o almoço dos passageiros (e de alguns motoristas), e causará lentidões em ruas pelo mundo todo, que pararão para ficar apreciando-a.

Mas continuará sendo, para mim, apenas um esportivo com sobrepreço.

Vai melhor um Carrera básico e mais algum outro carro com o troco. Ou melhor ainda, Carrera e uma bela viagem.

JJ

O post abaixo do senhor Marco Antônio Oliveira me fez acelerar as coisas e finalmente preparar um texto sobre um dos meus carros favoritos de todos os tempos. Marco Antônio Oliveira é jornalista por hobby, não faz testes, não faz comparativos, não vai a coquetéis de lançamentos de novos modelos. Se fosse jornalista no sentido clássico, seria sem dúvida dos melhores do mundo. Se texto é mais apaixonado do que técnico e esse é o estilo que mais gosto. José Rezende Mahar no Brasil e Richard Meaden, na Inglaterra, são outros exemplos de textos onde a paixão se sobrepõe à ficha técnica.

Eu não sou técnico, muito menos sei escrever... Mas vamos lá. Vamos falar sobre o brilhante BMW E30 M3, provavelmente o carro de turismo mais vitorioso de todos os tempos.

Com o excelente desempenho do Mercedes 190 2.3 no Campeonato Alemão de Turismo, a BMW resolveu se coçar e decidiu que ser chegada hora de ter a Série 3 com o emblema “M”.



O ano era 1986. Para tanto decidiu-se criar um Homologation Special. A ideia era fabricar 5.000 carros com a especificação de carroceria, características de motor e suspensão exatamente como seriam usadas nas pistas. Ao final da produção, mais de 17 mil carros foram feitos.

Para o desenvolvimento do motor foi convidado o mago dos motores, Paul Rosche, engenheiro responsável pelo desenvolvimento do propulsor de 1,5 litro turbo que impulsionou Nélson Piquet para o primeiro título mundial de Fórmula 1 da BMW. A configuração final ficou bem próxima do 190 2.3 de rua. Um 2,3 litros com 200 cv que passam a existir depois de 4.000 rpm. O limite de rotação é de 6.750 rpm (10.000 rpm na versão de corrida). Alimentação por injeção Bosch Motronic e uma borboleta de admissão por cilindro. O filtro de ar fica em uma caixa de ar, muito parecida com as usadas em monopostos de Fórmula 3.

Caixa de câmbio Getrag de 5 marchas e trambulador dogleg (1a embaixo, 2a, 3a, 4a e 5a no "H") na versão alemã, beneficiando a velocidade de troca entre segunda e terceira marchas, as mais utilizadas em circuito. Tração traseira, obviamente, e diferencial autobloqueante.




A suspensão tem os pontos de ancoragem alterados em relação à Série 3 de uso civil, beneficiando a estabilidade e a tocada esportiva. Amortecedores Sachs de maior carga e acerto da BMW M no circuito norte de Nürburgring (prática pouco comum na época). A carroceria é absolutamente distinta. Única peça em comum com as Série 3 normais é a chapa do teto. A tampa do porta-malas é mais alta e de plástico, a coluna traseira é mais inclinada, ambos para favorecer o melhor fluxo de ar na traseira e no aerofólio. As caixas de roda são alargadas para rodas de tala 10 funcionarem sem problemas na versão de corrida. Pela primeira vez nas Série 3, os vidros dianteiro e traseiro da versão M vinham colados, para aumentar a rigidez e melhorar o fluxo de ar.

Eu tenho a felicidade de ser proprietário de um modelo alemão, ano 1987, câmbio dogleg, cinza bem escuro, quase preto. Daqui pra frente passo a narrar minha experiência com o carro e mando às favas a imparcialidade (já fui parcial aqui?).

Tudo no carro é inspirado nas pistas. A posição de guiar é irretocável, para trocar as marchas basta deixar cair a mão do volante que lá está a alavanca, de encaixes justos e curtos, do alto dos seus 20 anos de idade. O motor pede pra girar... e quanto mais gira mais o carro gosta. Como dito antes, até 4.000 rpm as coisas são mornas... depois é deleite puro. Os freios são hiperadequados, parando o carro em espaços inimagináveis, mesmo com padrões modernos como referência. O ABS é dos menos intrusivos que já experimentei. A suspensão copia muito bem o terreno e traz o carro de volta para o lugar de maneira muito rápida. A caixa de direção é um pouco lenta, talvez para minimizar o efeito “chicotada” em saídas de traseira. O carro é absolutamente neutro. Um primor de equilíbrio (bateria no porta-malas MAO!, as it should be). Em pista não gasta pneu. Por falar em pista, é um carro que “freia mais dentro e acelera primeiro” que eu já guiei em circuito. Ao entrar forte em curva, quando acaba a neutralidade, primeiro a frente começa a sair, daí você pisa e a traseira se pronuncia colocando as coisas no lugar. Um pouco mais de abuso no pedal e a traseira começa a querer ultrapassar a frente, tudo muito comunicativo. Exagerou na dose da traseira? Basta tirar o pé que ela volta. Por mais inacreditável que seja a situação de sobreesterço, ela volta. É basicamente como um kart de motor 125-cm³ dois-tempos, muito da tocada e da mudança de trajetória em curva está no pedal da direita. Em serra, até hoje ela anda junto com carros de 300 cv e tração integral.

A beleza do projeto, a falta de concessões, a beleza clássica dos BMW de quatro farois, fazem do carro um sucesso até hoje. Quando do lançamento do novo M3 V-8 (E90), a revista EVO fez um teste com o título “The Greatest Ever M-Car” O vencedor foi o pequeno BMW esportivo de quatro cilindros. Venceu carros com mais do dôbro da potencia e décadas de juventude de projeto. Venceu pela finesse, venceu pelo que transmite ao condutor. Venceu porque, provavelmente, o slogan da BMW, “Sheer driving Pleasure”, foi baseado nele.


Esse post acontece porque eu li o que MAO escreveu sobre o também brilhante 190 2.3. É um carro de fato também muito bacana. Dogleg, interior que transpira esportividade. Excelente. Mas eu já guiei o 2.3 e posso afirmar que perto do M3 o Mercedes é lento. Não em velocidade, em sensação. Os engates são mais lentos, o motor pede menos para girar, a suspensão é muito mais macia. Não parece te chamar pra brincar como o M3. É um outro bicho. Guiar os dois carros, talvez os mais nobres de uma linhagem, me faz citar um amigo que tenho em comum com Marco Antônio Oliveira, o PH. É dele uma frase que trago comigo, que é de uma beleza e compreensão ímpar do mundo que eu gosto. Uma frase que eu não poderia concordar mais.

“Mercedes faz carros e caminhões, BMW faz carros e motos. Por isso os carros da Mercedes são como são, por isso os carros da BMW são como são.”

Pena não haver foto: carros de corrida enguiçados no circuito sendo rebocados até o box por um Jeep -- com a prova em andamento!

Foi o que vi ontem na 500 Quilômetros de Interlagos. Pensei que esse velho hábito, coisa dos anos 50 e 60, havia acabado fazia tempo, pelo perigo que representa.

BS

Sempre lemos aqui os textos apaixonados do MAO a respeito dos Porsche com motor a ar, os carrões americanos dos anos 50 e 60, Chevettes...

Podemos discordar dele em muitas coisas, mas não dá para negar que os carros mais antigos tinham uma aura que os atuais não possuem.

Mas, afinal, que aura é essa?

Talvez alguns afirmem que esses carros são fruto da tecnologia de sua época. É uma boa resposta, mas ela explica só parte dos fatos. A resposta um pouco mais completa é que esses carros são fruto não só da tecnologia, mas também da cultura do seu tempo, em suas mais variadas facetas.

A faceta cultural do design é algo muito fácil de ser percebida e entendida. Mas há outra tão importante quanto ela, mas muito menos conhecida.

Um fator que pesa muito a favor de um c campeão de exposições sobre um vira-latas é seu pedigree, que é um indicador da pureza do seu nascimento.

Carros também nascem após um longo processo de gestação nos escritórios de engenharia das fábricas, e o resultado final depende da forma e da qualidade com que seu projeto foi feito.

Este processo sofreu transformações enormes nas últimas décadas, graças ao avanço da informática.

O computador representou um salto no processo de projeto automotivo. Muitos componentes podem ser parametrizados, e a simples mudança de uns poucos parâmetros são suficientes para testar a resistência e a elasticidade desses componentes, e gerar seu desenho no final do processo. Testar várias alternativas se tornou um processo rápido, barato e muito preciso.

Porém, como todo bom engenheiro sabe, toda escolha implica em vantagens e desvantagens.

O computador ofereceu vantagens enormes ao processo de projeto dos automóveis, mas ele afastou os cérebros pensantes do resultado final da criação. Os engenheiros hoje alimentam de dados os diversos programas de cálculo, e simplesmente acatam os resultados saídos da “caixa preta”. Não interessa como a máquina chegou a aquele resultado, porque cada um tem que ser eficiente e não pode perder tempo com “frivolidades”, criticando números frios.

Antes do computador, a forma de se projetar um automóvel era muito mais imersiva para o engenheiro.

Sentados em suas pranchetas, os engenheiros pensavam cada parafuso, cada mínimo detalhe do automóvel era calculado e desenhado à mão, mas tendo a crítica de cada engenheiro correndo ao lado do processo. Incontáveis horas desenhando cada borda, calculando cada diâmetro eram acompanhadas de pensamentos de como cada detalhe entraria em harmonia com o restante do projeto. Detalhes sutis eram percebidos, discutidos e muitas vezes corrigidos ou modificados, visando alcançar o melhor.

É este senso crítico, que lapidava cada mínima aresta do projeto, que foi perdido para a crua precisão automatizada e burocrática do computador. E este pequeno detalhe fez toda diferença na forma como os carros eram projetados e como são atualmente.

Nesta época, a grande companheira dos engenheiros era a régua de cálculo, a tal ponto que sua imagem era reconhecida como um símbolo do engenheiro nos primeiros três quartos do século 20.

É muito comum ver em filmes antigos os engenheiros mexendo em réguas de cálculo como se fossem o supra-sumo da tecnologia.


O modelo mais tradicional é o reto, com duas partes fixas separadas por uma móvel, assim como um cursor deslizante.



Outro modelo, não tão popular entre os engenheiros, mas muito usada em topografia, era o de formato circular.



A fabricante de relógios Breitling há décadas enfeita seus cronógrafos de pulso com uma régua de cálculo circular. A Citizen japonesa também usa comumente a mesma solução.



Já o modelo de tambor é bastante raro. Este tipo oferece alta resolução, o que o tornava muito caro e adequado a apenas casos bastante específicos que exigiam precisão nos resultados.



A régua de cálculo, antes de mais nada, não faz contas de adição nem de subtração. Isso o engenheiro tem que fazer à mão ou por outros meios.

Uma coisa importante que o engenheiro precisa ter em mente é a questão de da ordem de grandeza. Na régua de cálculo, o procedimento é o mesmo se quisermos fazer 0,2 x 0,3 ou 20 x 300. Na régua, sempre fazemos 2 x 3, e os deslocamentos da vírgula para a direita ou para a esquerda são feitas de cabeça.

Cálculos com a régua não tem a precisão de uma calculadora. No máximo, se tira dela números com 3 dígitos significativos. Sem os devidos cuidados, uma imprecisão enorme aparece ao final de cálculos repetitivos.

Para resolver o problema, há técnicas de arredondamento, onde uma vez se arredonda o valor para cima, outra para baixo cada valor intermediário, de tal sorte a anular os desvios pela imprecisão do cálculo.

Depois de anos de prática, cada engenheiro desenvolvia sua própria técnica de arredondamento. Os mais hábeis se mantinham dentro de uma precisão aceitável, mesmo após muitos cálculos sucessivos.

Ela é baseada em princípios dos logaritmos, onde o logaritmo de produto entre dois números equivale à soma dos logaritmos destes números. Assim, substitui-se um produto por uma soma. E a divisão é feita pela diferença.

A régua trabalha com escalas logarítmicas, onde os produtos e divisões são convertidas em somas e subtrações de segmentos de escala pelo deslizamento relativo entre elas.

Toda régua de cálculo linear tem duas faces, onde diferentes escalas são impressas. Estas escalas diferiam conforme o modelo e aplicação a que se destinava.

Dependendo do uso da régua, em ambos os lados, tanto as escalas fixas como móveis possuem perfeito alinhamento, de forma que o resultado do cálculo executado de um lado pode ser transportado imediatamente para o outro lado tanto pela escala móvel como pelo cursor.

Em ambos os lados temos as escalas principais em comum, que ficam na linha de divisa de baixo entre a escala móvel e a escala fixa. Ambas as escalas são iguais e são usadas para multiplicações e divisões diretas. Uma propriedade importante das escalas principais é que a partes úteis delas sempre começam e terminam em "1".

Vou dar um pequeno exemplo de multiplicação que se entenda como ela funciona.

Imagine o cálculo 2 x 0,2. Lembrem-se que na régua irei reduzir o cálculo a 2 x 2, e lidar depois com a ordem de grandeza.

Primeiro alinhamos a escala móvel:



O primeiro número do produto é 2, então o escolhemos na escala principal fixa. Aí deslocamos a escala para alinhar o "1" de início da escala móvel para alinhar com o "2" da escala fixa.

Aí, basta deslocarmos o cursor até o valor “2” da escala móvel:



Vê-se que o segundo valor alinha-se perfeitamente com o valor "4" na escala fixa.
Daí se tira que "2 x 2" resulta em "4". No entanto, como o cálculo na verdade é "2 x 0,2", então o resultado final é "0,4".

Da mesma forma eu poderia multiplicar 529 por 6530.

Mantendo o cursor no lugar para marcar o valor intermediário e movendo novamente a escala móvel, podemos fazer produtos encadeados indefinidamente.

Num segundo exemplo, podemos dividir 70 por 0,35.
Começamos alinhando 35 e 70:



Procuramos pelo "1" na escala móvel principal e achamos o resultado:



70 dividido por 35 equivale a 2 dividido por 1. Mas como o cálculo é 70 dividido por 0,35, então o resultado passa a ser 200.

Quem quiser praticar mais, aqui tem um simulador online bastante realista.

Fácil, não? Realmente, o princípio básico é bastante elementar.

Porém todos os antigos cursos de engenharia ofereciam matérias acadêmicas para uso da régua de cálculo que duravam até dois anos. Nelas, os engenheirandos aprendiam a tirar o máximo das réguas de cálculo usando técnicas sofisticadas.



Tanta exigência tinha seus motivos. A partir do começo do curso até o final da carreira profissional, a régua de cálculo seria a companheira mais constante e fiel do engenheiro.

Em grandes empresas, haviam duas carreiras possíveis para engenheiros dentro dos setores de projetos. Além da carreira como engenheiro projetista, havia a função do engenheiro calculista.

A função do engenheiro calculista era repassar todos os cálculos feitos pelo engenheiro projetista, descritos num documento chamado “memorial de cálculo”, no qual, não só a precisão dos cálculos originais eram conferidas, como o próprio processo de cálculo e o projeto em si eram analisados, se necessário, criticados, discutidos e corrigidos.

Assim, o engenheiro calculista, além de suas habilidades em realizar os cálculos, precisava ter tanta ou mais habilidade em projeto que o engenheiro projetista, afim de que nenhum erro passasse adiante.

Outra função do engenheiro calculista era a de fazer os cálculos no lugar do engenheiro projetista, a partir de um esboço feito por ele, e o trabalho de ambos era reavaliado por um outro engenheiro calculista.

Com tantas revisões e verificações, os erros cometidos eram em grande parte eliminados ou pelo menos reduzidos ao mesmo tempo em que ideias novas podiam surgir e se desenvolver.

E com tantas mentes pensando e repensando cada mínimo detalhe de um carro, o peso do espírito humano se fazia sentir sobre a frieza da técnica pura impressos no produto acabado.

Era uma época onde engenharia era muito mais que uma ciência exata. Ela era uma forma de arte.

É evidente que a criação de um projeto nessa época era um processo lento e muito caro.
Bastou a tecnologia começar a evoluir para que os caríssimos e pouco potentes computadores da época já começassem a tomar terreno na área da engenharia.

Esta propaganda da IBM em 1952 reflete esta realidade, alegando que sua máquina tinha a mesma capacidade de cálculo que um grupo de 150 engenheiros. As vantagens alegadas são evidentes; as desvantagens, nem tanto.


Com o avanço da computação nos anos 60 e 70, muito desse longo processo de projeto foi sendo encurtado com o uso mais intenso dos computadores.

A precisão e o número de detalhes verificados em um projeto cresceu enormemente, gerando economia de processo e de materiais. Até mesmo cálculos que antes seriam inviáveis para calculistas humanos, como a previsão do comportamento da estrutura de um carro num impacto simulado, hoje estão plenamente acessíveis.

Nos anos 70, um subproduto da indústria da computação se torna popular, e crescimento explosivo da calculadora eletrônica enterrou de vez o uso da régua de cálculo na engenharia.

No presente, com a miniaturização de computadores potentes, até mesmo ela está em fase de extinção.

Hoje, um engenheiro usuário de régua de cálculo é uma espécie com passado glorioso mas em vias de extinção, e para as gerações atuais de engenheiros, ela parece um fantasma assustador.

O uso cada vez mais intenso dos computadores é um caminho sem volta. As vantagens que ele oferece são tais que não há como retornar aos métodos do passado.

Porém, muitas coisas importantes, duramente aprendidas no passado, foram sumariamente esquecidas, e agora fazem falta.

Um engenheiro maduro no uso da régua de cálculo era capaz de intuir o valor aproximado de um cálculo antes de realizá-lo. Se houvesse algum erro, este era rapidamente descoberto e corrigido.

E o longo processo de projeto, com a profunda imersão do engenheiro, dava a ele a oportunidade de avaliar, criticar, modificar, criar, inovar.

Um engenheiro atual, totalmente dependente dos equipamentos automáticos de cálculo, é completamente insensível a um possível resultado errado vindo da máquina. Se a máquina oferecer um resultado grotesco por qualquer razão, ele aceitará o resultado sem questionar.

A régua de cálculo e todo o paradigma de projeto do qual ela era parte importante, ainda tem muitas lições a ensinar aos engenheiros do presente. Lições que vão muito além do cálculo frio, e tocam o lado criativo do espírito humano.

Não são apenas os interesses comerciais mais imediatos das fábricas hoje que produzem carros insípidos, meramente transportadores de pessoas.

Os carros de hoje nascem de um processo muito diferente do processo dos carros do passado. A rapidez do computador afastou a mente criativa do engenheiro do projeto final, retirando o espírito induzido e deixando a precisão fria em seu lugar.

Para aqueles que desejarem conhecer um pouco mais da história deste instrumento de cálculo, assim como dos homens que os utilizavam, recomendo dois sites:

http://sliderulemuseum.com/ , de onde muitas das imagens aqui usadas foram retiradas;
http://reglasdecalculo.com/

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