google.com, pub-3521758178363208, DIRECT, f08c47fec0942fa0 AUTOentusiastas Classic (2008-2014): Dead
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Whatever is properly done, however humble, is noble

Há algum tempo atrás, existiam duas formas de se fazer um carro. A primeira é uma que permanece até hoje: se define um preço de venda e projeta-se um carro para ele. A segunda, bem mais nobre mas totalmente ultrapassada e impossível para o mundo moderno, era fazer um carro de maneira correta, (“proper”), seguindo uma especificação, e então vendê-lo pelo preço resultante.

A primeira forma foi desenvolvida à perfeição pela General Motors de Alfred Sloan. A segunda, é o método tornado famoso por Sir Henry Royce.

Mas um Rolls-Royce é algo terrivelmente antiquado hoje em dia. Neste tempo em que vivemos, todos os pilares sobre os quais o Honorável Sir Henry Royce criou seus automóveis parecem desaparecidos.

O belo fica em segundo lugar ao que meramente está em voga. A honra de fazer algo bem feito, da maneira correta, é esquecida, substituída pela esperteza de criar algo que pode ser vendido por bem mais do que vale. A tranquila sabedoria dos mais velhos é desprezada pela energia sem sentido da juventude. Honestidade é colocada em segundo plano ao lucro.

Mesmo a Mercedes-Benz, antes uma séria empresa que refletia isso em um desenho despretensioso, seco, invisível de seus carros, que escondia um “tour de force” tecnológico, hoje se limita a criar carros cheios de alargadores de para-lamas, rodas gigantescas, linhas de cintura acentuadas, e mais guelras e aberturas de admissão e escape que qualquer tubarão imaginado por Bill Mitchell. O que antes era um carro sério para pessoas sérias, passou a ser algo em que uma criança de 45 anos possa mostrar que ainda é jovem e acompanha a moda. Triste.

Não é por acaso, então, que o pormenor totalmente adulto de um Rolls-Royce não tenha lugar no mundo moderno. O seu lema, mencionado no início deste post, chamava as pessoas a um ideal superior de vida; aquele que coloca a vocação pessoal e o orgulho de se fazer um trabalho de maneira correta acima de todas as outras considerações. No caso da Rolls, isto se traduzia em carros feitos da melhor maneira conhecida, sem senões e nem porquês. Seus carros foram feitos para carregar seus donos com honra, discrição e tranquilidade, sendo absolutamente confortáveis e confiáveis no processo.

Alguns diriam chatos, lentos e molengas, como fizeram todas as publicações automotivas do mundo desde os anos 60, algo que muito ajudou o fim da empresa. Coincidência ou não, os anos 60 foram a década em que o mundo foi varrido por revoluções de todos os tipos, a maioria delas proclamando uma nova maneira de viver onde um carro tão aristocrático e sério como um Rolls não teria lugar.


De minha parte, pergunto: e daí que Rolls-Royces são como peixes fora d’água numa pista? Porque é agora um pecado comprar algo bem feito, mesmo que custe uma verdadeira fortuna? Nem todo mundo é piloto, e se alguém trabalhou a vida toda para ter algo bom, por que não pode tê-lo? Mas a partir dos anos 60, o mundo mudou, e tais coisas viraram quase um pecado.

Mas decadência da empresa não foi total e imediata. Não, o seu significado é tão forte que sua morte vem se arrastando há quase um século, sem nunca acontecer “de facto”. Para ilustrar essa triste saga de decrepitude e decadência, separei cinco ocasiões em que um pouco desse espírito nobre da empresa foi destruído, até que sobrasse apenas uma placa com os dizeres que abrem este post, e mais nada. São cinco vezes em que a empresa na verdade morreu em espírito, e dela emergiu outra empresa que tenta, até hoje, carregar seus princípios adiante. Os mais versados na história da marca podem estranhar que não incluí entre as cinco mortes da empresa a vez em que ela realmente morreu, a sua falência de 1971. Mas este episódio não tem relação nenhuma com o assunto sobre o qual falamos. Morte espiritual, não real, é o que conta aqui.



1) A morte de Henry Royce
Até sua morte em 1933, o fundador tinha uma presença fortíssima, e os carros eram projetados debaixo de sua vontade. Nesta época não havia possibilidade real da empresa falir, mas sua alma sofreu o maior de todos os baques. O espírito motivador de Royce desapareceu assim que ele se foi, e seu Phantom III V-12 foi o último Rolls-Royce desenvolvido sem preocupação alguma com custo.





2) Arte sobre o capô
O mascote de capô mais conhecido do mundo adorna o radiador dos Rolls. O “Espírito do êxtase” é uma escultura “art-noveau” de uma dama de braços abertos para trás, usando roupas esvoaçantes. A obra é de autoria de Charles Sykes, que usou como modelo Eleanor Thorton, famosa e belíssima amante do pioneiro do automobilismo, Lord Montagu de Beaulieu.

Mas o mais interessante é que a produção dos mascotes de capô foi, até a morte de Sykes, realizada por ele mesmo. O artista fundia em seu estúdio as cópias da escultura original, usando uma mistura de cobre e zinco (e nunca prata como muita gente comenta). Significa que eram reais obras de arte, e como quais, levavam a assinatura do escultor em sua base.

Em 1950, Sykes falecia, a empresa tomava para si sua produção. Mas nunca mais o nome do escultor apareceria em sua base. O que era antes uma obra de arte, se tornou apenas mais uma peça de automóvel.

3) The Fitch is gone
Nos anos 90, a linha de produção da Rolls-Royce inevitavelmente sofre mais uma modernização, mais uma de várias que vinha sofrendo sistematicamente desde os anos 60. Desta vez, era uma tentativa de emular as infames técnicas “Lean”, popularizadas pelo sucesso da Toyota. No ano de 1996, então era adotado mais um robô, este para realizar a pintura de filetes decorativos na carroceria, chamadas aristocraticamente na Rolls de “Body Coachlines”.

Antes do robô, os filetes eram feitos por um artesão velhinho, com a mão muito firme, usando um finíssimo pincel de cerdas bem longas, chamado “Fitch”. O artesão foi aposentado, sua raríssima habilidade de repente sem mais nenhuma utilidade neste mundo.

Na verdade, o sumiço do fitch é só um símbolo do abandono total das antigas práticas de produção da empresa. A Rolls passava a produzir carros como qualquer outra.

4) O motor BMW
Esta foi a mais ignóbil das atrocidades cometidas ao espírito da empresa. A empresa que criou os motores Merlin V-12 que ajudaram os caças ingleses a vencer a Batalha da Inglaterra contra os Messerschmitt movidos pela Daimler-Benz, agora usava motores da BMW? Uma empresa de engenharia e motores, relegada a criar carrocerias apenas? Há destinos piores para uma empresa, mas não muitos...

O carro que levava este motor refletiu os tempos instáveis da empresa: não era melhor que o carro que substituía em praticamente nada, foi esquecido rapidamente e teve uma das menores vidas de um modelo na história da empresa, com longa tradição de manter seus carros por mais de dez anos em produção.

O Silver Seraph era uma afronta aos pilotos da segunda guerra; um sacrilégio para uma marca tão aristocrata e inglesa como a Rolls. A empresa devia ter fechado as portas naquele ano de 1998, mas ao invés disso, além de lançar este carro, foi alvo de uma triste batalha entre a VW e a BMW para sua compra, que terminou com a venda para a duas fábricas, instalações e a marca Bentley para a VW e o nome Rolls-Royce, para a BMW. O que nos leva a:

5) Um Rolls-Royce projetado pela BMW
A marca bávara, cheia de méritos próprios, sabe-se lá porque tem uma grave fixação pela Inglaterra. E hoje usa marcas inglesas, Mini e Rolls-Royce, como sua marca de entrada e de extremo luxo, respectivamente.


O automóvel Rolls-Royce atual, apesar de ser em termos frios e calculistas um dos mais incríveis já criados pela humanidade, é uma caricatura imensa de um passado distante e esquecido. O fato de seu relativo sucesso é devido à sua adoção pelos cantores de rap estadunidenses que falam muito sobre isso. Uma triste realidade, e um triste fim para talvez a mais nobre das marcas que já criaram um automóvel. O que era uma nobre carruagem inglesa é hoje uma super-adornada barca bávara, usada como símbolo de status por gânguesteres que se imaginam poetas modernos.



A Rolls-Royce nunca foi estranha a donos cafonas e exagerados: os sultões árabes e os novos ricos americanos da década de 70, com seus Silver Shadows, veem a cabeça imediatamente. Mas hoje, sendo um Rolls-Royce apenas no nome e no estilo caricato, usando motores alemães e com Hans decidindo seu futuro, de alguma forma ele não consegue se manter imune aos efeitos nocivos desta imagem. Mesmo mantendo as características básicas dos carros da marca: silêncio absoluto, conforto total, melhores materiais possíveis. E a aceleração, que num Rolls é diferente de todo resto: parece movido pela gigantesca mão de Deus, que parece empurrá-lo de forma impossivelmente suave, mas de forma tão poderosa e irreversível quanto a Sua vontade.

Mas como uma empresa pode morrer cinco vezes e ainda estar viva? Talvez o fato de que ela na realidade ainda esteja viva seja o mais triste. Talvez, se tivesse morrido com os Hispano-Suiza, os Stutz e os Duesenbergs, não me incomodasse tanto. Como está hoje, é como um cadáver que se recusa a ser enterrado, um velho senhor doente que, incapaz de fazer todas as coisas pelo que foi famoso, senta-se na sala infeliz e prostrado, esperando o dia que o Senhor tenha piedade de sua pobre alma, e o leve finalmente para seu descanso merecido.

It is gone for ever? I’m not certain. But I tell you it was a good world to live in.” (George Orwell)

MAO


Decidir qual é o melhor carro do mundo hoje em dia é simplesmente impossível.

Existem carros que podem ser dirigidos a mais de 400 km/h. Existem carros que podem levar três apresentadores de televisão descerebrados ao pólo norte. E entre esses dois extremos, existe um sem-fim de veículos cuja eficiência e excelência, se analisados à minúcia, espantariam qualquer pessoa inteligente. Perguntar sobre qual seria o melhor do mundo hoje traria invariavelmente outra pergunta: melhor em quê?

Mas 100 anos atrás, quando o automóvel era um infante descobrindo seu lugar do mundo, esta era uma pergunta válida e recorrente. Esse mundo, que seria em breve sacudido irremediavelmente por Henry e seu T, ainda se preocupava seriamente em descobrir qual era a forma definitiva de automóvel, o melhor entre os melhores, o Santo Graal da carruagem sem cavalo.

Foi nessa época, mais precisamente ao fim de 1906, que Henry Royce apresentava talvez o único carro que jamais mereceu o título de melhor absoluto: o Rolls-Royce 40/50hp.

O que vocês tem que entender logo de cara sobre Royce é que ele era um perfeccionista como nunca mais se viu. Usava somente peças forjadas, acreditando que pouquíssimas vezes um fundido era aceitável. Todas as peças de seus carros eram polidas à exaustão, em TODAS as suas superfícies, não apenas naquelas de trabalho, depois de passar por inspeções minuciosas. Essas inspeções, realizadas com lentes de aumento, procuravam qualquer fissura superficial e rejeitavam as peças com base nisso. Furos eram tratados com um cuidado ímpar, visto que Royce os odiava como descontinuidades em suas perfeitas peças, e então deviam ser realizados com o cuidado necessário para que não iniciassem quebras ou trincas. Suas peças niqueladas tinham uma camada de níquel de 0,15 mm (espessura de uma folha de alumínio caseira), quando todo resto da indústria, até hoje, usa deposição eletroquímica microscópica. Toda peça que girava era totalmente balanceada. Somente os melhores (e muitas vezes mais caros) materiais eram utilizados, sem nenhum e qualquer cuidado com o custo.

E Royce exigia de seus trabalhadores também nada menos que a perfeição; era o pesadelo do chão de fábrica e uma pessoa totalmente e absolutamente incansável. Diz a lenda que seu sócio Rolls contratou um funcionário com a expressa função de fazer ele comer algo. O resultado é que Royce ficava permanentemente perseguido por uma tigela de porridge (um tipo de mingau inglês), que permanecia invariavelmente cheia...

Charles Rolls e Henry Royce se juntaram em 1905, quando o primeiro, um rico aristocrata inglês (terceiro filho de Lord Llangattock), tratou de colocar seu nome na frente do seu conhecido engenheiro-chefe para criar sua fábrica de automóveis. O 40/50hp foi apenas seu segundo veículo, mas foi criado com o expresso intuito de ser o melhor carro já criado até então.


E, ao contrário de hoje, isto era perfeitamente possível. A essa época não havia carros esporte, camionetes, sport utilities, minicarros ou outra subdivisão. Existiam apenas carros, vendidos exclusivamente como chassi, sem carroceria, no qual eram montados carrocerias diversas. Carros como o 40/50hp estavam destinados a se tornar speedsters de dois lugares; limusines imensas para 7 pessoas e bagagem; ambulâncias de guerra; tourers abertos de 5 lugares, camionetes para carregar balões; station-wagons de madeira e shooting brakes (uma perua de duas portas para caçada, coisa para qual se usa uma Cherokee hoje). O melhor carro esporte era certamente também a melhor perua, camionete, e assim por diante.


Os carros mais caros, com os maiores chassis e motores, eram invariavelmente reconhecidos como melhores que os mais baratos. E o Rolls-Royce era o melhor de todos eles: seis cilindros em linha em dois blocos de três, sete mancais, lubrificação forçada, válvulas laterais, duas velas por cilindro e sete litros de deslocamento garantiam uma potência e durabilidade nunca vista até então. O carro, numa época em que trocar marchas era um sacrifício e as caixas automáticas não existiam, era capaz de cruzar seu país de origem sem sair da terceira e última marcha, direta.

E mais: era completamente liso, abolindo totalmente vibrações e barulho. Podia se equilibrar copos cheios de vinho até a boca em seu capô e acelerar, sem que uma gota caísse. Outro famoso teste público da companhia colocava uma moeda de 10 pence equilibrada no capô com o motor funcionando, e lá ela permanecia.

Suas suspensões, chassi e direção prezavam leveza aos comandos e conforto total; Rolls-Royces foram os primeiros carros em que se viajava grandes distâncias com um conforto suficiente para torná-las algo usual. O carro era longo e baixo, belíssimo para a época, e sendo mais baixo, facilitava o acesso dos passageiros. Velocidades de cruzeiro de 100 km/h se tornaram de repente possíveis, dependendo apenas das estradas.

Hoje o 40/50hp é conhecido como Silver Ghost, nome de um famosíssimo exemplar de 1907 com carroceria "Roi des Belges" (abaixo) que venceu o Dewar Trophy, bem como alguns reides de durabilidade populares a uma época em que sair de automóvel ainda era uma aventura. "Silver" (Prata) pela aparência (detalhes em prata maciça, carroceria pintada de prata), Ghost (fantasma) pelo silêncio com que se movia", dizia a companhia em sua publicidade. O nome nunca foi oficial para o modelo, que permanecia com a potência fiscal/potência real em hp como nome.


Foi produzido até 1925, e foi montaria de cabeças coroadas mundo afora. Muitos de seus donos aristocratas chegavam ao cúmulo (para o mundo de hoje) de manter em sua garagem duas ou três carrocerias diferentes para o mesmo chassi. desta forma, abandonava-se a carroceria tourer aberta usada no verão, para uma limousine fechada no inverno.

Sir Henry Royce veio a falecer no ano de lançamento de seu último carro, 1933. Este carro, o magnífico Phantom III V12, acabou por se tornar também o último Rolls-Royce construído sem nenhum respeito ao custo, e com o perfeccionismo que Sir Henry exigia.

Parte da personalidade da empresa permaneceu intacta nos carros que se seguiram. Um Rolls ainda é fácil de dirigir a despeito do tamanho, e o conforto e isolamento do exterior ainda são impecáveis. Também permanece a tradição em que num Rolls, você parece ser impelido por uma gentil mas incrivelmente poderosa mão invisível, nunca por algo tão cru como a infame combustão interna. O silêncio, a suavidade e a potência dos carros permaneceram sempre, mesmo quando o motor passou a ser um BMW. Mas um moderno Rolls-Royce é estampado, soldado e pintado tal qual um Mille. Seu acabamento e mecânica são impecáveis, mas desenvolvidos com objetivos de custo como qualquer outro carro. Sir Henry rolando na tumba ou não.

Quanto a mim, incorrigível saudosista, ainda acredito que para um Rolls-Royce merecer o nome, ainda devia ser feito como o fantasma prateado que descrevemos aqui. Devia ser uma peça de arte saída da mão de uma pessoa que nunca deixaria algo tão insignificante, irrelevante e mundana quanto dinheiro interferir na maneira em que seria criado seu legado. Seu LEGADO para a humanidade.

Um legado que o mundo moderno tenta emular com uma grade em um enorme BMW.

MAO
Nota de rodapé:
Este post nasceu para tentar corrigir um erro: deixei o melhor carro do mundo à sua época, que por acaso deslocava sete litros, fora de minha lista de melhores carros com motor de 7 litros...Imperdoável!

Perua AMG 300 TE 6.0 “Hammer”.

Hoje parece coisa corriqueira uma perua média com um V8 DOHC de seis litros e mais de 300 cv.

Mas em 1986...Eu realmente gostaria que os leitores mais jovens soubessem quão exótico era isso. V8 DOHC era coisa de Ferrari e Lamborghini, e os Mercedes Classe E tinham no máximo um seis em linha de 3 litros.

MAO

OK, a pedidos, explico.

Houve um tempo em que a AMG era uma casa de preparação especializada em Mercedes-Benz. O que ela fazia, e bem, era preparar motores. Preparar de verdade. Lembram? Aquela arte esquecida, arcana, quase uma alquimia, uma mágica.

Aquela em que um sujeito igualava pacientemente volumes de câmara de combustão, ajustava sede de válvulas, descobria por testes e experiência aquele perfil de comando ideal, abria diâmetro de blocos usando pistões especiais sobremedida, balanceava tudo, tratava com carinho, ajustava tudo em dinamômetro e acabava em algo que, não importando quão humilde sua origem, era maravilhoso.

Motores feitos assim são algo que nunca será atingido com produção em massa. Como tudo feito com carinho, prazer e dedicação, transcende o puro objeto para ser algo que leva impressa a marca, e muitas vezes a alma, de seu criador.

Agora, se algo humilde já fica maravilhoso se tratado desta forma, o que tem uma origem, digamos assim, mais nobre, se tornava algo realmente extraordinário.Assim eram os motores da AMG.

Nos anos 1980, a empresa chegou a fazer cabeçotes DOHC para os V-8 Mercedes, muito antes da própria Mercedes fazê-lo. E montaram um desses no classe E, coisa que a empresa de Stuttgart dizia ser impossível, criando o famoso "Hammer". A Mercedes, posteriormente, acabou fazendo o mesmo em casa, com os 420E e 500E (este último, na verdade produzido na Porsche).

Nesta mesma época, os anos 1980, a AMG começou a fazer rodas, que ficaram famosíssimas, e também criou o AMG-look, moda que começou com as rodas e a retirada de todos os detalhes cromados dos Mercedes, e foi degringolada a um ponto em que Los Angeles ficou infestada de Mercedes cor de rosa por inteiro, até na roda.

Daí em diante todo mundo sabe o que aconteceu. A Mercedes a comprou, e aos poucos os motores deixaram de ser preparados para ser "desenvolvidos junto com os novos Mercedes-Benz" como dizia a linha oficial da empresa. Na verdade, eram versões mais quentes dos motores, mas produzidos em série.

E a última fase é a atual. Como se já não bastasse a Mercedes-Benz querendo ser BMW, agora a AMG virou M-Power também. Motores "próprios".

O que temos hoje é algo que, por mais interessante que seja (e é, o novo V-8 de 6,3 litros é fantástico), não é mais AMG. É outra coisa.

E que ela descanse em paz.



MAO

Eu acredito que a AMG começou a morrer quando foi incorporada à Daimler-Benz (ou DaimlerChrysler, Daimler-something, ou qualquer outro nome que a empresa tenha hoje). Morreu de vez quando deixou de pegar motores Mercedes e prepará-los, passando a fazer motores próprios recentemente, com o V8 de 6,3 litros.
Ela agora quer ser M-Power. Ninguém mais se contenta em ser o que é hoje em dia? Meu Deus...


E imagino se os pedantes donos de AMG's modernos sabem que no fundo são iguais aos donos desse Galant velhinho...


(fotos tiradas do blog Jalopnik.com)


MAO

Em 1987, Walter Hayes, um inglês que foi um dos poucos executivos da Ford a chamar Henry Ford II pelo primeiro nome, foi fazer uma visita a ele, que, àquela época, estava morando por uma parte do ano em uma casa nos arredores de Londres. Entre os velhos executivos, então, seguiu-se uma conversa digna de “Pinky e Cérebro”:

- Então, Walt, o que nos resta fazer agora?
- Bem, Henry, nós podíamos, sei lá, comprar a Aston?
- Engraçado você dizer isso, eu ando jogando golfe com Victor Gauntlett, ele bem que me falou que procurava parceria para investimentos...

Ford veio a falecer no final do ano, mas antes disso a Aston Martin já fazia parte de seu império. E, mal sabiam os dois, já estava tão morta quanto Henry. Era inevitável, pois para atender as legislações de emissão de poluentes e segurança passiva futuras, a pequena empresa precisava de um dinheiro que não tinha. A Ford tinha sérias intenções de salvá-la, mas era impossível sem transformá-la em outra coisa. E foi o que aconteceu.

Até ali, os Aston eram feitos por um grupelho de apenas 160 pessoas, numa vilazinha chamada Newport Pagnel, perdida lá no meio da Inglaterra. A "fábrica" era pequenininha, portanto, um casebre daqueles do interior inglês.
Dentro dele, não havia linha de montagem, mas ficava um sujeito velhinho num canto (invariavelmente com seu aprendiz a tiracolo) gastando o dia inteiro para transformar umas folhas de alumínio em uma porta. Em uma FOLHA EXTERNA de porta, nem ela inteira. Na mão, sem molde, no martelinho.
Em outro lado, um cara montava a magnífica ponte traseira De Dion, com discos inboard. E assim por diante, sem pressa, artisticamente, e não industrialmente.

Em outro canto, havia um engenheiro. Esse engenheiro era o responsável pelo motor. Só ele fazia motor na Aston.
Este cara recebia forjados e fundidos, e começava a usiná-los para transformá-los em virabrequins, comandos, mancais, blocos. Recebia os pistões e bielas de fornecedores, mas igualava pacientemente seus pesos, segundo tabelinhas que ele mesmo redigira a lápis e pregou na bancada de madeira em 1976.
Depois montava tudo pacientemente, fazia a rotina básica de testes. Depois, autorizando o motor a ir ao carro, afixava sua plaquinha, que dava seu nome e assinatura, e em que tinha marcado a data com matelinho e marcador. Só a Aston fazia motor desse jeito.

Todo mundo adorava isso, portanto o que aconteceu depois? A prática de realmente se fazer um motor a mão sumiu, mas hoje as tais plaquinha abundam. Tem em Mercedes-Benz, tem em Ford (GT, Mustangs Shelby), Corvette Z06... Mas o cara na verdade só recebeu as peças e montou a jaca, ao ritmo de, sei lá, 325 ao dia.

Mostra como a civilização moderna tem a capacidade de abandonar uma coisa fantástica apenas pela IDÉIA da coisa fantástica. Em tranformar ouro em estrume de vaca. Imagem, como sempre, parece ser o que importa mesmo.

E a Aston, hoje? Suas fábricas hoje, moderníssimas, nada diferem do ABC paulista.

Para mim, então, o canto do cisne foi o carro que vocês podem ver aí em cima. O Aston Martin V8 Vantage de 1988, apesar de feito à mão num casebre perdido no interior da Inglaterra, ainda assim era um carro capaz de atingir 280 km/h reais e só era menos veloz na sua época, ainda que por pouco, que os exóticos Countach e 512BB Italianos.

Então, que descanse em paz essa era em que carros eram pacientemente construídos com carinho, pelas mãos de dedicados artesãos. E que o urro do quarteto de Webers de um V8 Vantage X-pack nos lembre sempre do que o progresso deixou pelo caminho.
MAO